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Card. Antonio Cañizares |
Neste sentido, aqui se codifica uma herança cristã essencial na sua forma específica de validade. Que há realidades, valores, direitos, que não são manipuláveis por ninguém, «sagrados», é a verdadeira garantia da nossa liberdade, da grandeza do ser humano, de um futuro para o homem: a fé vê nisso o mistério do Criador e a semelhança conferida por Ele ao homem; por isso, vê também a constatação do que está entranhado na máxima de Jesus: «dai a Deus o que é de Deus, e a César o que é de César», tão acordo, além disso, com a recta razão, que pressupõe a limitação, o controlo e a transparência do poder, a não manipulação do direito e o respeito pelo seu próprio espaço intangível, e, finalmente, a fundamentação do direito sobre normas morais, sobre a verdade e o bem, o que é bom e verdadeiro por si mesmo.
Em tudo isso está implicado, de alguma forma, que se reflicta sobre o laicismo ideológico imperante, derivado de todo um processo de secularização ilustrada, que leve à sociedade actual – sobretudo a europeia – a situar-se ante o desafio de tomar uma nova decisão a favor de Deus, Criador.
A unidade e a convivência das gentes e dos povos só serão possíveis se surge, no actual horizonte da Historia, um sujeito social capaz de construí-las pacientemente, porque a sua experiência de vida e a sua resposta a interrogações fundamentais do homem o tornam capaz de amar a toda pessoa humana em tanto que pessoa, participe do mesmo mistério e da mesma vocação, por cima de qualquer outra determinação de raça, cultura e religião, povo, classe social ou filiação política. Tal reclama superar o processo de secularização que desembocou no laicismo radical e ideológico de alguns lugares.
Além do mais, «a absoluta profanidade que se construiu no Ocidente é profundamente alheia às culturas do mundo. Essas culturas fundamentam-se na convicção de que um mundo sem Deus não tem futuro» (J. Ratzinger, 1). Esta é, opino, uma das grandes questões e desafios que o islamismo coloca hoje ao mundo secularizado e submetido a um laicismo ideológico.
Card. antonio cañizares, trad ama