Páscoa
Evangelho:
Jo 6, 16-21
16 Quando chegou a tarde,
os Seus discípulos desceram para junto do mar 17 e, tendo subido para uma
barca, atravessaram o mar em direcção a Cafarnaum. Era já escuro, e Jesus ainda
não tinha ido ter com eles. 18 Entretanto, o mar começava a encrespar-se, por
causa do vento forte que soprava. 19 Tendo remado cerca de vinte e cinco ou
trinta estádios, viram Jesus caminhando sobre o mar, em direcção à barca, e
ficaram atemorizados. 20 Mas Ele disse-lhes: «Sou Eu, não temais». 21 Quiseram
então recebê-l'O na barca e logo a barca chegou à terra para onde iam.
Comentário:
A tempestade
aparece quando menos esperamos.
Não interessa nem a idade nem a experiência que possamos ter quando a
tempestade ultrapassa as nossas forças e capacidade de resistência.
É então que devemos contar com Cristo que não se poupa nem a trabalhos nem
obstáculos para vir em nosso auxílio.
Deixemos que entre na barca da nossa vida e tudo ficará tranquilo e a segura
confiança voltará.
(ama, comentário sobre Jo 6 16-21
2015.04.18)
Leitura espiritual
SANTO
AGOSTINHO – CONFISSÕES
LIVRO
DÉCIMO
CAPÍTULO
V
A
ignorância do homem
És tu, Senhor, quem me
julga, porque ninguém conhece o que se passa no homem, a não ser o seu espírito
que nele está, todavia há no homem coisas que até o espírito que nele habita ignora.
Mas tu, Senhor, que o criaste, conheces todas as coisas. E eu, embora diante de
ti me despreze e me considere como terra e cinza, sei algo de ti que ignoro de
mim mesmo. É certo que agora vemos por espelho, em enigmas, e não face a face.
Por isso, enquanto peregrino longe de ti, estou mais presente a mim do que a
ti. Sei que em nada podes ser prejudicado, mas ignoro a que tentações posso
resistir e a quais não posso. Todavia há esperança, pois és fiel, e não permites
que sejamos tentados além de nossas forças; com a tentação, dás também meios
para suportar, para que possamos resistir.
Confessarei, portanto, o
que sei de mim, e também o que de mim ignoro, porque o que sei de mim só o sei
porque me iluminas, e o que de mim ignoro continuarei ignorando até que as minhas
trevas se transformem em meio-dia, na tua presença.
CAPÍTULO
VI
Quem
é Deus?
O que sei, Senhor, sem
sombra de dúvida, é que te amo. Feriste o meu coração com a tua palavra, e amei-te.
O céu, a terra e tudo quanto neles existe, de todas as partes me dizem que te ame;
nem cessam de repeti-lo a todos os homens, para que não tenham desculpas. Terás
compaixão mais profunda de quem já te compadeceste; e usarás de misericórdia
com quem já foste misericordioso. De outro modo, o céu e a terra cantariam os teus
louvores a surdos.
Mas, que amo eu, quando te
amo? Não amo a beleza do corpo, nem o esplendor fugaz, nem a claridade da luz,
tão cara a estes meus olhos, nem as doces melodias das mais diversas canções,
nem a fragrância de flores, de unguentos e de aromas, nem o maná, nem o mel,
nem os membros tão afeitos aos amplexos da carne. Nada disto amo quando amo o
meu Deus. E, contudo, amo uma luz, uma voz, um perfume, um alimento, um abraço
do meu homem interior, onde brilha para a minha alma uma luz sem limites, onde
ressoam melodias que o tempo não arrebata, onde exalam perfumes que o vento não
dissipa, onde se provam iguarias que o apetite não diminui, onde se sentem
abraços que a saciedade não desfaz. Eis o que amo quando amo o meu Deus!
Então, o que é Deus?
Perguntei à terra, e ela disse-me: “Eu não sou Deus”. E tudo o que nela existe
me respondeu o mesmo. Perguntei ao mar, aos abismos e aos répteis viventes, e
eles responderam-me: “Não somos o teu Deus; busca-o acima de nós”. Perguntei
aos ventos que sopram; e todo o ar, com os seus habitantes, disse-me: “Anaxímenes
está enganado eu não sou Deus”. Perguntei ao céu, ao sol, à luz e às estrelas.
“Tampouco somos o Deus a quem procuras” –responderam-me.
Disse então a todas as
coisas que meu corpo percebe: “Dizei-me algo do meu Deus, já que não sois Deus;
dizei-me alguma coisa dele” – e todas exclamaram em coro: “Ele nos criou”.
A minha pergunta era o meu
olhar, e a sua resposta a sua beleza.
Dirigi-me, então, a mim
mesmo, e perguntei: “E tu, quem és?” – e respondi: “Um homem”.
Para me servirem, tenho um
corpo e uma alma: aquele exterior, esta interior. A qual deles deverei
perguntar pelo meu Deus, a quem já havia procurado com o corpo desde a terra
até ao céu, até onde pude enviar os raios do meu olhar como mensageiros?
Melhor, sem dúvida, é a parte interior de mim mesmo. É a ela que dirigem as suas
respostas todos os mensageiros do meu corpo, como a um presidente ou juiz, respostas
do céu, da terra, e de tudo o que existe, e que proclamam: “Não somos Deus” – e
ainda – “Ele nos criou”. O homem interior conhece essas coisas por meio do
homem exterior; mas o homem interior, que é a alma, também conhece essas coisas
por meio dos sentidos do corpo.
Interroguei a imensidão do
universo acerca do meu Deus, e ele respondeu-me: “Não sou eu, mas foi ele quem
me criou”.
Mas essa beleza não se
manifesta a quantos têm sentidos perfeitos? E por que não fala a todos a mesma
linguagem?
Os animais, pequenos ou
grandes, veem-na; mas não podem interrogá-la, porque não receberam a razão que,
como juiz, interprete as mensagens dos sentidos. Os homens, porém, podem
interrogá-la, para que as perfeições invisíveis de Deus se manifestem pelas
suas obras.
Mas o amor às coisas
criadas escraviza-os, e assim os torna incapazes de julga-las. Ora, elas só respondem
aos que podem julgar-lhes as respostas. Elas não mudam a sua linguagem, isto é,
a sua beleza, quando um só as vê, e outro as interroga; elas não lhes aparecem
diferentes mas, para uns ficam mudas, enquanto falam a outros. Ou melhor: eles
falam a todos, mas apenas se entendem os que comparam a sua expressão exterior
com a verdade interior. De facto a verdade diz-me: “O teu Deus não é nem o céu,
nem a terra, nem corpo algum. A natureza das coisas o diz para quem sabe ver; a
matéria é menor em seus elementos que em seu todo. Por isso, minha alma, digo-te
que és superior ao corpo, pois vivificas a sua matéria, dando-lhe vida, como
nenhum corpo pode dar a outro corpo. Mas o teu Deus é também para ti a vida de
tua vida.
CAPÍTULO
VII
Deus
e os sentidos
Que amo, então, quando amo
o meu Deus? Quem é aquele que está acima da minha alma? É por minha alma;
portanto, que subirei até ele. Hei-de sobrepujar a força que me ata ao corpo, e
que enche o meu organismo de vida, pois não encontro nela o meu Deus. Se assim
fosse, o cavalo e a mula, que não têm inteligência, também o encontrariam,
porque essa mesma força vivifica os seus corpos.
E existe outra força, que
não só vivifica, mas que também torna sensível a minha carne que o Senhor me
deu, ordenando ao olho que não ouça, e ao ouvido que não veja, mas àquele que sirva
para ver, e a este para ouvir; e que determinou a cada um dos outros sentidos o
respectivo lugar e ofício. É deles que se serve a minha alma para exercer as suas
diversas funções, permanecendo, contudo, uma só.
Vencerei também essa
força, que também o cavalo e a mula possuem, pois também eles sentem por meio
do corpo.
(Revisão
de versão portuguesa por ama)