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Leitura Espiritual
Amar a Igreja |
São Josemaria Escrivá
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É
provável que sobre muitos assuntos temporais e humanos, entendam mais do que
muitos leigos.
Mas,
desde que são sacerdotes, calam com alegria essa competência para continuarem a
fortalecer-se espiritualmente através da oração constante, para falarem só de
Deus, para pregarem o Evangelho e administrarem os sacramentos.
Este
é, se assim se pode dizer, o seu novo TRABALHO profissional, ao qual dedicam
todas as horas do dia, que sempre serão poucas, porque é preciso estudar
constantemente a ciência de Deus, orientar espiritualmente tantas almas, ouvir
muitas confissões, pregar incansavelmente e rezar muito, muito, com o coração
sempre posto no Sacrário, onde está realmente presente Aquele que nos escolheu
para sermos seus, numa maravilhosa entrega cheia de alegria, inclusivamente no
meio de contrariedades, que a nenhuma criatura faltam.
Todas
estas considerações podem aumentar, como vos dizia, os motivos de admiração.
Alguns
continuarão talvez a perguntar a si mesmos: mas porquê esta renúncia a tantas
coisas boas e nobres da terra, a uma profissão mais ou menos brilhante, a
influir cristãmente, com o exemplo, no âmbito da cultura profana, do ensino, da
economia, ou de qualquer outra actividade social?
Outros
ficarão admirados lembrando-se de que hoje, em não poucos sítios, grassa uma
desorientação notável sobre a figura do sacerdote; apregoa-se que é preciso
procurar a sua identidade e põe-se em dúvida o significado que, nas
circunstâncias actuais, possa ter a entrega a Deus no sacerdócio.
Finalmente,
também poderá surpreender alguns que, numa época em que escasseiam as vocações
sacerdotais, estas surjam entre cristãos que já tinham resolvido - graças a um
trabalho pessoal exigente - os problemas de colocação e trabalho no mundo.
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Sacerdotes e leigos
Compreendo
essa estranheza, mas não seria sincero se afirmasse que a compartilho.
Estes
homens que, livremente, porque assim o quiseram - e isto é uma razão muito
sobrenatural - abraçam o sacerdócio, sabem que não fazem nenhuma renúncia, no
sentido em que vulgarmente se emprega esta palavra.
Já
se dedicavam - pela sua vocação ao Opus Dei - ao serviço da Igreja e de todas
as almas, com uma vocação plena, divina, que os levava a santificar o trabalho
e a procurar, por meio dessa ocupação profissional, a santificação dos outros.
Como
todos os cristãos, os membros do Opus Dei, sacerdotes e leigos, sempre cristãos
correntes, encontram-se entre os destinatários destas palavras de S. Pedro:
Vós sois raça eleita,
sacerdócio real, nação santa, povo adquirido, afim de anunciantes as virtudes
d'Aquele que vos chamou das trevas para a Sua luz admirável. Vós que outrora
não éreis o Seu povo, mas que agora sois o povo de Deus; vós que antes não
tínheis alcançado misericórdia e agora a alcançastes.
Uma
única e a mesma é a condição de fiéis cristãos nos sacerdotes e nos leigos,
porque Deus Nosso Senhor nos chamou a todos à plenitude da caridade, à
santidade: bendito seja Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos
abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo.
Foi
assim que n'Ele nos escolheu antes da constituição do mundo, para sermos santos
e imaculados diante dos Seus olhos.
Não
há santidade de segunda categoria: ou existe uma luta constante por estar na
graça de Deus e ser conformes a Cristo, nosso Modelo, ou desertamos dessas
batalhas divinas.
O
Senhor convida todos para que cada um se santifique no seu próprio estado.
No
Opus Dei esta paixão pela santidade - apesar dos erros e misérias individuais -
não se diferencia pelo facto de se ser sacerdote ou leigo; e, além disso, os
sacerdotes são apenas uma pequeníssima parte, em comparação com o total de
membros.
Olhando
com olhos de fé, a chegada ao sacerdócio não constitui, portanto, nenhuma
renúncia; e chegar ao sacerdócio também não significa um passo mais na vocação
ao Opus Dei.
A
santidade não depende do estado - solteiro, casado, viúvo, sacerdote -, mas sim
da correspondência pessoal à graça, que a todos é concedida, para aprendermos a
afastar de nós as obras das trevas e para nos revestirmos das armas da luz, da
serenidade, da paz, do serviço sacrificado e alegre à humanidade inteira.
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Dignidade do Sacerdócio
O
sacerdócio leva a servir a Deus num estado que, em si mesmo, não é melhor nem
pior do que os outros; é diferente.
Mas
a vocação de sacerdote aparece revestida duma dignidade e duma grandeza que
nada na terra supera.
Santa
Catarina de Sena põe na boca de Jesus Cristo estas palavras: Não quero que diminua a reverência que se
deve professar aos sacerdotes, porque a reverência e o respeito que se lhes
manifesta, não se dirige a eles, mas a Mim, em virtude do Sangue que lhes dei
para que o administrem. Se não fosse isso, deveríeis dedicar-lhes a mesma
reverência que aos leigos e não mais...
Não devem ser ofendidos:
ofendendo-os ofende-se a Mim e não a eles.
Por isso o proibi e
estabeleci que não admito que toqueis nos meus Cristos.
Alguns
afadigam-se à procura, como dizem, da identidade do sacerdote.
Que
claras resultam estas palavras da Santa de Sena!
Qual
é a identidade do sacerdote?
A
de Cristo.
Todos
os cristãos podem e devem ser, não já alter
Christus, mas ipse Christus:
outros Cristos, o próprio Cristo!
Mas
no sacerdote isto dá-se imediatamente, de forma sacramental.
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Para
realizar uma obra tão grande - a da Redenção - Cristo está sempre presente na
Igreja, principalmente nas acções litúrgicas.
Está
presente no sacrifício da Missa, tanto na pessoa do Ministro -
"oferecendo-se agora por ministério dos sacerdotes O mesmo que se ofereceu
a si mesmo na cruz" -, como, sobretudo, sob as espécies eucarísticas.
Pelo
sacramento da Ordem, o sacerdote torna-se efectivamente apto para emprestar a
Nosso Senhor a voz, as mãos, todo o seu ser: é Jesus Cristo quem, na Santa
Missa, com as palavras da consagração, transforma a substância do pão e do
vinho no Seu Corpo, Alma, Sangue e Divindade.
Nisto
se fundamenta a incomparável dignidade do sacerdote.
Uma
grandeza emprestada, compatível com a minha pequenez. Eu peço a Deus Nosso
Senhor que nos dê, a todos os sacerdotes, a graça de realizar santamente as
coisas santas, e de reflectir também na nossa vida as maravilhas das grandezas
do Senhor.
Nós,
que celebramos os mistérios da Paixão do Senhor, temos de imitar o que fazemos.
E
então a hóstia ocupará o nosso lugar diante de Deus, se nós mesmos nos fizermos
hóstias.
Se
alguma vez encontrais um sacerdote que, exteriormente, não parece viver de
acordo com o Evangelho - não o julgueis, Deus o julga - , sabei que, se
celebrar validamente a Santa Missa, com intenção de consagrar, Nosso Senhor não
deixa de descer até àquelas mãos, ainda que sejam indignas.
Pode
haver maior entrega, maior aniquilamento?
Mais
do que em Belém e no Calvário!
Porquê?
Porque
Jesus Cristo tem o Coração oprimido pelas suas ânsias redentoras, porque não
quer que ninguém possa dizer que não foi chamado, porque se faz encontrar pelos
que não O procuram.
É
amor?
Não
há outra explicação.
Que
insuficientes se tornam as palavras, para falar do Amor de Cristo!
Ele
baixa-se a tudo, admite tudo, expõe-se a tudo - a sacrilégios, a blasfémias, à
frieza da indiferença de tantos - com o fim de oferecer, ainda que seja a um
único homem, a possibilidade de descobrir o bater de um Coração que salta no
Seu peito chagado.
Esta
é a identidade do sacerdote: instrumento imediato e diário da graça salvadora
que Cristo ganhou para nós.
Se
se compreende isto, se isto é meditado no silêncio activo da oração, como se
pode considerar o sacerdócio uma renúncia?
É
um ganho impossível de calcular.
A
Nossa Mãe Santa Maria, a mais santa das criaturas - mais do que Ela, só Deus -
trouxe uma vez Jesus ao mundo; os sacerdotes trazem-no à nossa terra, ao nosso
corpo e à nossa alma, todos os dias: Cristo vem para nos alimentar, para no
vivificar, para ser, desde já, penhor da vida futura.
(cont)