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Tempo de Páscoa
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Evangelho: Jo 15, 12-17
12 «O Meu preceito é este: Amai-vos
uns aos outros, como Eu vos amei. 13 Não há maior amor do que dar a própria
vida pelos seus amigos.14 Vós sois Meus amigos se fizerdes o que vos mando.15 Não
mais vos chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas
chamo-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de Meu Pai. 16 Não
fostes vós que Me escolhestes, mas fui Eu que vos escolhi, e vos destinei para
que vades e deis fruto, e para que o vosso fruto permaneça, a fim de que tudo o
que pedirdes a Meu Pai em Meu nome, Ele vo-lo conceda. 17 Isto vos mando:
Amai-vos uns aos outros.
Comentário
O preceito que Jesus nos deixa parece muito simples.
Não manda que observemos regras, normas ou rituais, que
cumpramos uma série de obrigações, que tenhamos comportamentos específicos. Só
quer que nos amemos uns aos outros.
A história humana atesta bem de quão difícil de cumprir é
este 'mandamento novo'.
Por outro lado, nós cristãos, sabemos bem o poder
extraordinário do amor.
Porque, no fim e ao cabo, amar é dar e receber fácil se
torna perceber porque são tão felizes os que se amam.
(ama, comentário sobre Jo 15, 12-17, 2012.05.11
Leitura espiritual
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Doc. do Conc. Vatic. II |
CARTA ENCÍCLICA
MATER ET MAGISTRA
DE SUA SANTIDADE JOÃO XXIII
AOS VENERÁVEIS IRMÃOS PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS,
BISPOS E OUTROS ORDINÁRIOS DO LUGAR, EM PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA, BEM
COMO A TODO O CLERO E FIÉIS DO ORBE CATÓLICO
SOBRE A RECENTE EVOLUÇÃO
DA QUESTÃO SOCIAL À LUZ DA DOUTRINA CRISTÃ
Introdução
1.
Mãe e mestra de todos os povos, a Igreja Universal foi fundada por Jesus
Cristo, a fim de que todos, vindo no seu seio e no seu amor, através dos
séculos, encontrem plenitude de vida mais elevada e penhor seguro de salvação.
A esta Igreja, "coluna e fundamento da verdade" (cf. 1 Tm 3, 15), o
seu Fundador santíssimo confiou uma dupla missão: de gerar alhos, e de os
educar e dirigir, orientando, com solicitude materna, a vida dos indivíduos e
dos povos, cuja alta dignidade ela sempre desveladamente respeitou e defendeu.
2.
O cristianismo é, de facto, a realidade da união da terra com o céu, uma vez
que assume o homem, na sua realidade concreta de espírito e matéria,
inteligência e vontade, e o convida a elevar o pensamento, das condições
mutáveis da vida terrena, até às alturas da vida eterna, onde gozará sem
limites da plenitude da felicidade e da paz.
3.
De modo que a Santa Igreja, apesar de ter como principal missão santificar as
almas e de as fazer participar dos bens da ordem sobrenatural, ao mesmo tempo
não deixa de preocupar-se com as exigências da vida cotidiana dos homens, não
só no que diz respeito ao sustento e às condições de vida, mas também no que se
refere à prosperidade e à civilização em seus múltiplos aspectos, dentro do condicionalismo
das várias épocas.
4.
Ao realizar tudo isto, a Santa Igreja põe em prática o mandamento de Cristo,
seu Fundador, que se refere sobretudo à salvação eterna do homem, quando diz:
"Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (Jo 14,6) e "Eu sou a luz
do mundo" (Jo 8,12); mas noutro passo, ao contemplar a multidão faminta,
exclamou, num lamento sentido: "Tenho pena de toda esta gente" (Mc
8,2); manifestando, assim, como se preocupa também com as exigências materiais
dos povos. E não foi só com palavras que o Divino Redentor demonstrou esse
cuidado: provou-o igualmente com os exemplos da sua vida, multiplicando, várias
vezes, por milagres, o pão que havia de saciar a fome da multidão que o seguia.
5.
E com este pão, dado para alimentar o corpo, quis anunciar e significar aquele
pão celestial das almas, que iria deixar aos homens na véspera da sua Paixão.
6.
Não é, pois, para admirar, que a Igreja católica, à imitação de Cristo e em
cumprimento das suas disposições, tenha mantido sempre bem alto, através de
dois mil anos, isto é, desde a instituição dos antigos diáconos, até aos nossos
tempos, o facho da caridade, não menos com os preceitos do que com os numerosos
exemplos que vem proporcionando. Caridade, que ao conjugar harmoniosamente os
mandamentos do amor mútuo com a prática dos mesmos, realiza de modo admirável
as exigências desta dupla doação que em si resume a doutrina e a acção social
da Igreja.
7.
Documento verdadeiramente insigne desta doutrina e desta acção desenvolvida
pela Igreja ao longo dos séculos, deve considerar-se a imortal encíclica Rerum
Novarum, [1] que o nosso predecessor de feliz memória, Leão XIII, há setenta
anos promulgou para formular os princípios que haviam de resolver cristãmente a
questão operária.
8.
Poucas vezes a palavra de um papa teve ressonância tão universal, pela
profundeza e vastidão da matéria tratada, bem como pelo vigor incisivo da
expressão. A linha de rumo ali apontada e as advertências feitas revestiram-se
de tal importância, que nunca poderão cair no esquecimento. Foi aberto um
caminho novo à acção da Igreja. O Pastor supremo, fazendo próprios os
sofrimentos, as queixas e as aspirações dos humildes e dos oprimidos, uma vez
mais se ergueu como defensor dos seus direitos.
9.
E hoje, apesar de ter passado tanto tempo, ainda se mantém real a eficácia
dessa mensagem, não só nos documentos dos papas sucessores de Leão XIII, os
quais, quando ensinam em matéria social, continuamente se referem à encíclica
leonina, ora para nela se inspirarem, ora para esclarecerem o seu alcance, e
sempre para estimular a acção dos católicos; mas até na própria organização dos
povos. Tudo isso mostra como os sólidos princípios, as directrizes históricas e
as paternais advertências contidas na magistral encíclica do nosso predecessor
conservam ainda hoje o seu valor e sugerem, mesmo, critérios novos e vitais,
para os homens poderem avaliar o conteúdo e as proporções da questão social,
tal como hoje se apresenta, e decidir-se a assumir as responsabilidades daí
resultantes.
PRIMEIRA
PARTE
ENSINAMENTOS DA ENCÍCLICA
RERUM NOVARUM E OPORTUNOS
DESENVOLVIMENTOS NO MAGISTÉRIO DE PIO XI E PIO XII
A
época da encíclica "Rerum Novarum"
10.
Os tempos em que Leão XIII falou eram de transformações radicais, de fortes
contrastes e amargas rebeliões. As sombras daqueles tempos fazem-nos apreciar
melhor a luz que promana do seu ensinamento.
11.
Como é sabido de todos, o conceito do mundo económico, então mais difundido e
posto em prática, era um conceito naturalista, negador de toda a relação entre
moral e economia. O motivo único da acção económica, dizia-se, é o interesse
individual. Lei suprema reguladora das relações entre os operadores económicos
é a livre concorrência sem limites. Juros dos capitais, preços das mercadorias
e dos serviços, benefícios e salários, são determinados, de modo exclusivo e
automático, pelas leis do mercado. O Estado deve abster-se de qualquer
intervenção no campo económico. Os sindicatos, nalguns países, eram proibidos;
noutros, tolerados ou considerados como de direito privado.
12.
Num mundo económico assim concebido, a lei do mais forte encontrava plena
justificação no plano teórico e dominava no das relações concretas entre os
homens. E daí derivava uma ordem económica radicalmente perturbada.
13.
Enquanto, em mãos de poucos, se acumulavam riquezas imensas, as classes
trabalhadoras iam gradualmente caindo em condições de crescente mal-estar.
Salários insuficientes ou de fome, condições de trabalho esgotadoras, que não tinham
nenhuma consideração pela saúde física, pela moral e pela fé religiosa.
Sobretudo inumanas as condições de trabalho a que eram frequentemente
submetidas as crianças e as mulheres. Sempre ameaçador o espectro do
desemprego. A família, sujeita a contínuo processo de desintegração.
14.
Daí uma profunda insatisfação nas classes trabalhadoras, entre as quais se
propagava e se consolidava o espírito de protesto e de rebelião. E assim se
explica porque encontraram tanto aplauso, naqueles meios, as teorias
extremistas, que propunham remédios piores que os próprios males.
Os
caminhos da reconstrução
15.
Coube a Leão XIII, nos momentos difíceis daquele conflito, publicar a sua
mensagem social, baseada na consideração da natureza humana e informada pelas
normas e o espírito do Evangelho; mensagem que, desde que foi conhecida, se bem
que não faltassem oposições compreensíveis, suscitou admiração e entusiasmo
universais. Certamente, não era a primeira vez que a Sé Apostólica descia à
arena, em defesa dos interesses materiais dos menos favorecidos. Outros
documentos do mesmo Leão XIII tinham já preparado o caminho; mas, desta vez,
formulava-se uma síntese orgânica dos princípios e desenhava-se uma perspectiva
histórica tão ampla que fizeram da encíclica Rerum Novarum um verdadeiro resumo
do catolicismo no campo económico-social.
16.
Nem careceu de audácia este gesto. Enquanto alguns ousavam acusar a Igreja
católica de se limitar, perante a questão social, a pregar resignação aos
pobres e a exortar os ricos à generosidade, Leão XIII não hesitou em proclamar
e defender os legítimos direitos do operário. Ao encetar a exposição dos
princípios da doutrina católica no campo social, declarava com solenidade: "Entramos
confiadamente nesta matéria e fazemo-lo com pleno direito, já que se trata de
uma questão para a qual não é possível encontrar solução eficaz, sem recorrer à
religião e à Igreja".[2]
17.
Bem conheceis, veneráveis irmãos, os princípios basilares expostos pelo imortal
Pontífice, com tanta clareza como autoridade, segundo os quais deve ser
reconstruído o sector económico e social da comunidade humana.
18.
Dizem respeito, primeiramente, ao trabalho que deve ser considerado, em teoria
e na prática, não mercadoria, mas um modo de expressão directa da pessoa
humana. Para a grande maioria dos homens, o trabalho é a única fonte dos meios
de subsistência. Por isso, a sua remuneração não pode deixar-se à mercê do jogo
automático das leis do mercado; pelo contrário, deve ser estabelecida segundo
as normas da justiça e da equidade, que, em caso contrário, ficariam
profundamente lesadas, ainda mesmo que o contrato de trabalho fosse livremente
ajustado por ambas as partes.
19.
A propriedade privada, mesmo dos bens produtivos, é um direito natural que o
Estado não pode suprimir. Consigo, intrinsecamente, comporta uma função social,
mas é igualmente um direito, que se exerce em proveito próprio e para bem dos
outros.
20.
O Estado, cuja razão de ser é a realização do bem comum na ordem temporal, não
pode manter-se ausente do mundo económico; deve intervir com o fim de promover
a produção de uma abundância suficiente de bens materiais, "cujo uso é
necessário para o exercício da virtude"; [3] e também para proteger os direitos
de todos os cidadãos, sobretudo dos mais fracos, como são os operários, as
mulheres e as crianças. De igual modo, é dever seu indeclinável contribuir
ativamente para melhorar as condições de vida dos operários.
21.
Compete ainda ao Estado velar para que as relações de trabalho sejam reguladas
segundo a justiça e a equidade, e para que nos ambientes de trabalho não seja
lesada, nem no corpo nem na alma, a dignidade de pessoa humana. A este
propósito, a encíclica leonina aponta as linhas que vieram a inspirar a
legislação social dos estados contemporâneos: linhas, como já observava Pio XI
na encíclica Quadragesimo Anno, [4] que eficazmente contribuíram para o
aparecimento e a evolução de um novo e nobilíssimo ramo do direito, o
"direito do trabalho".
22.
E aos trabalhadores, afirma ainda a encíclica, reconhece-se o direito natural
de constituírem associações, ou só de operários, ou mistas de operários e
patrões; como também o direito de darem às mesmas a estrutura orgânica que
julgarem mais conveniente para assegurarem a obtenção dos seus legítimos
interesses económico-profissionais, e o direito de agirem, no interior delas,
de modo autônomo e por própria iniciativa, para a consecução dos mesmos
interesses.
23.
Operários e empresários devem regular as relações mútuas, inspirando-se no
princípio da solidariedade humana e da fraternidade cristã; uma vez que, tanto
a concorrência de tipo liberal, como a luta de classes no sentido marxista, são
contrárias à natureza e à concepção cristã da vida.
24.
Eis, veneráveis irmãos, os princípios fundamentais em que deve basear-se, para
ser sã, a ordem económica e social.
25.
Não devemos, pois, admirar-nos, se os católicos mais eminentes, atendendo aos
apelos da encíclica, empreenderam iniciativas múltiplas, para traduzirem em
prática aqueles princípios. De facto, nessa tarefa se empenharam, sob o impulso
de exigências objectivas da natureza, homens de boa vontade de todos os países
do mundo.
26.
Por isso, a encíclica, com razão, foi e continua a ser considerada como a Magna
Carta [5] da reconstrução económica e social da época moderna.
A
encíclica "Quadragesimo Anno"
27.
Pio XI, nosso predecessor de santa memória, comemorou o quadragésimo
aniversário da encíclica Rerum Novarum, com um novo documento solene: a
encíclica Quadragesimo Anno. [6]
28.
Nesta, o sumo-pontífice insiste no direito e dever da Igreja de prestar a sua
contribuição insubstituível para a feliz solução dos problemas sociais mais
urgentes e mais graves, que angustiam a família humana; confirma os princípios
fundamentais e as directrizes históricas da encíclica leonina; e aproveita a
ocasião para precisar alguns pontos de doutrina sobre os quais tinham surgido
dúvidas, mesmo entre católicos, e para desenvolver o pensamento social cristão,
atendendo às novas condições dos tempos.
29.
As dúvidas, levantadas diziam respeito, de modo especial, à propriedade
privada, ao regime dos salários, e à atitude dos católicos perante uma forma de
socialismo moderado.
30.
Quanto à propriedade privada, o nosso predecessor torna a afirmar o seu carácter
de direito natural, e acentua o seu aspecto e a sua função social.
31.
Com relação ao regime de salários, nega a tese que o declara injusto por
natureza; mas reprova ao mesmo tempo as formas inumanas e injustas que, não
poucas vezes, se praticou; inculca e desenvolve os critérios em que se deve
inspirar e as condições a que é preciso satisfazer para não se lesar a justiça
nem a equidade.
32.
Nesta matéria, o nosso predecessor indica claramente ser vantajoso, nas
condições atuais, suavizar o contrato de trabalho com elementos tomados do
contrato de sociedade, de modo que "os operários se tornem participantes
ou na propriedade ou na gestão, ou, em certa medida, nos lucros obtidos". [7]
33.
Deve considerar-se da mais alta importância doutrinal e prática a afirmação de
Pio XI que o trabalho não se pode "avaliar justamente nem retribuir
adequadamente, quando não se tem em conta a sua natureza social e
individual". [8] Por conseguinte, para determinar a remuneração, declara o
papa, a justiça exige que se tenham em conta, além das necessidades de cada
trabalhador e a sua responsabilidade familiar, a situação da empresa a que os
operários prestam o seu trabalho, e ainda as exigências da economia geral. [9]
34.
Entre comunismo e cristianismo, o pontífice declara novamente que a oposição é
radical, e acrescenta não se poder admitir de maneira alguma que os católicos
adiram ao socialismo moderado: quer porque ele foi construído sobre uma
concepção da vida fechada no temporal, com o bem-estar como objectivo supremo
da sociedade; quer porque fomenta uma organização social da vida comum tendo a
produção como fim único, não sem grave prejuízo da liberdade humana; quer ainda
porque lhe falta todo o princípio de verdadeira autoridade social.
35.
Nem deixa Pio XI de notar que, nos quarenta anos passados desde a promulgação
da encíclica leonina, a situação histórica mudara profundamente. A livre
concorrência, em virtude da dialéctica que lhe é própria, tinha acabado por
destruir-se a si mesma ou pouco menos; levara a uma grande concentração da
riqueza e além disso à acumulação de um poder económico desmedido nas mãos de
poucos, "os quais, muitas vezes nem sequer eram proprietários, mas simples
depositários e administradores do capital, de que dispunham a seu bel-prazer".
[10]
_____________________________________________
Notas:
[1] Acta Leonis XIII, 11(1891), pp,
97-144.
[2] Cf. ibid. p.107.
[3] S. Tomás, De Regimine Principum, I,15.
[4] Cf. AAS, 23 (1931), p.185.
[5] Cf. ibid. p.189.
[6] Cf. ibid. pp.177-228.
[7] Cf. ibid. p.199.
[8] Cf. ibid, p. 200.
[9] Cf. ibid, p. 201.
[10] Cf. ibid. p. 210-211.