Cartas
de São Paulo
Tito
Tito
foi, juntamente com Timóteo, um dos principais colaboradores de Paulo. De
origem grega, aderiu à fé, provavelmente através de Paulo, durante a primeira
viagem missionária deste. Certo é que o acompanhou a Jerusalém, para a
assembleia apostólica, constituindo um exemplo vivo da decisão tomada de não
impor os costumes judaicos aos cristãos oriundos do mundo pagão, pois, embora
sendo grego, não foi obrigado a circuncidar-se (Gl 2,1.3).
ACÇÃO
DE TITO Na sua colaboração com Paulo, foram-lhe confiadas tarefas delicadas
como a organização da colecta em favor das igrejas da Judeia (2 Cor 8,6-17) e,
provavelmente, a pacificação da comunidade de Corinto e a reconciliação entre
esta e o próprio Paulo (2 Cor 2,1-13).
Paulo
refere-se a ele sempre em termos muito elogiosos (2 Cor 7,6-7.13-16; 12,18).
Segundo 2 Tm 4,10, foi-lhe ainda confiada uma missão na Dalmácia. A presente
Carta dá-o como "bispo" de Creta (Tt 1,5), onde, segundo a tradição,
exerceu o ministério até ao fim dos seus dias.
É
estranho que os Actos dos Apóstolos, que mencionam várias vezes Timóteo, não
façam nenhuma referência a Tito. Nunca foi apresentada uma explicação
convincente para o facto, sugerindo alguns que Tito é o redactor das passagens
"nós" dos Actos (Act 16,10-17; 20,5-21,18; 27,1-28,16).
AUTENTICIDADE
A maioria dos exegetas contesta a autenticidade paulina da CARTA A TITO, quer
pelo vocabulário utilizado, que se afasta bastante do que encontramos nas
autênticas Cartas de Paulo, quer pelos problemas tratados, que fazem supor uma
fase de desenvolvimento da Igreja posterior à época apostólica.
Além
disso, a Carta encontra-se redigida num tom muito impessoal, com excepção do
título de "meu verdadeiro filho" que se encontra na saudação (1,4),
longe, pois, das afectuosas referências de Paulo a Tito noutras Cartas.
DIVISÃO
E CONTEÚDO A Carta pode estruturar-se do modo seguinte:
Saudação
inicial (1,1-4);
Orientações
a Tito sobre os critérios de escolha dos responsáveis das comunidades (1,5-9);
Aviso
contra os falsos mestres (1,10-16);
Ensinamentos
sobre o modo de comportamento de várias categorias de crentes (2,1-15);
Elenco
de deveres sociais (3,1-11);
Recomendações
de carácter pessoal (3,12-14);
Saudação
final (3,15).
Amigos de Deus
256
A
vocação cristã, que é um chamamento pessoal do Senhor, leva cada um de nós a
identificar-se com Ele.
Não
devemos esquecer-nos, porém, de que Ele veio à Terra para redimir o mundo
inteiro, porque quer que os homens se salvem.
Não
há uma só alma que não interesse a Cristo. Cada uma lhe custou o preço do seu
Sangue.
Ao
considerar estas verdades, vem-me à memória a conversa dos Apóstolos com o
Mestre momentos antes do milagre da multiplicação dos pães.
Uma
grande multidão acompanhara Jesus.
Nosso
Senhor ergue os olhos e pergunta a Filipe: «Onde
compraremos pão para dar de comer a toda esta gente?»
Fazendo
um cálculo rápido, Filipe responde: «Duzentos
dinheiros de pão não bastam para cada um receber um pequeno bocado.»
Como
não dispõem de tanto dinheiro, lançam mão de uma solução caseira.
Diz-lhe
um dos seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro: «Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixes, mas que
é isto para tanta gente.»
257
O fermento e a massa
Nós
queremos seguir o Senhor e desejamos difundir a Sua Palavra. Humanamente
falando, é lógico que também perguntemos a nós mesmos: mas que somos nós para
tanta gente?
Em
comparação com o número de habitantes da Terra, ainda que nos contemos por
milhões, somos poucos.
Por
isso, temos de considerar-nos como uma pequena levedura, preparada e disposta a
fazer o bem à humanidade inteira, recordando as palavras do Apóstolo: “Um pouco de levedura fermenta toda a massa,
transforma-a.”
Precisamos,
portanto, de aprender a ser esse fermento, essa levedura, para modificar e
transformar as multidões.
Por
si mesmo é o fermento melhor do que a massa?
Não.
Mas
é o meio necessário para que a massa se transforme, tornando-se alimento
comestível e são.
Pensai
mesmo que seja a traços largos, na eficácia do fermento, que serve para
fabricar o pão, alimento básico, simples, ao alcance de todos.
A
preparação da fornada, em muitos sítios, é uma verdadeira cerimónia, e dali sai
um produto estupendo, saboroso que se come "com os olhos"...
Talvez
já a tenhais presenciado.
Escolhem
farinha boa; se é possível, da melhor.
Trabalham
a massa na masseira, para a misturar bem com o fermento, em longo e paciente
labor.
Depois
um tempo de repouso, imprescindível para que a levedura cumpra a sua missão,
inchando a massa.
Entretanto
arde o lume no forno, animado pela lenha que se consome...
E
aquela massa, metida no calor do lume, torna-se o pão fresco, esponjoso, de
grande qualidade.
Resultado
impossível de conseguir, se não fosse pela levedura - em pouca quantidade - que
se diluiu, que desapareceu no meio dos outros elementos, num trabalho
eficiente, mas que não se vê...
258
Se
meditarmos com sentido espiritual no texto de São Paulo, compreenderemos que
temos de trabalhar em serviço de todas as almas. O contrário seria egoísmo.
Se
olharmos para a nossa vida com humildade, veremos claramente que o Senhor nos
concedeu talentos e qualidades, além da graça da fé.
Nenhum
de nós é um ser repetido.
O
Nosso Pai criou-nos um a um, repartindo entre os Seus filhos diverso número de
bens.
Pois
temos de pôr esses talentos, essas qualidades, ao serviço de todos; temos de
utilizar esses dons de Deus como instrumentos para ajudar os homens a
descobrirem Cristo.
Não
vejais este afã como um acrescentamento, como uma espécie de enfeite que se
junta à nossa condição de cristãos.
Se a
levedura não fermenta, apodrece.
Pode
desaparecer dando vida à massa, mas também pode desaparecer porque se perde em
homenagem à ineficácia e ao egoísmo.
Não
prestamos um favor a Deus Nosso Senhor quando o damos a conhecer aos outros: “por pregar o Evangelho não tenho de que me
gloriar, pois me é imposta essa obrigação, por mandato de Jesus Cristo; e ai de
mim se eu não evangelizar!”
259
Fainas de pesca
Eis
que mandarei muitos pescadores, promete o Senhor, e pescarei esses peixes.
Assim
nos indica Deus o nosso grande trabalho: pescar.
Falando
ou escrevendo, às vezes compara-se o mundo com o mar. E há muita verdade nessa
comparação.
Na
vida humana, tal como no mar, há períodos de calma e períodos de borrasca, de
tranquilidade e de forte ventania.
Muitas
vezes, os homens nadam em águas amargas, no meio de grandes vagas; caminham no
meio de tormentas; viajam cheios de tristeza, mesmo quando parece que têm
alegria, mesmo quando falam ruidosamente: gargalhadas que pretendem encobrir o
seu desalento, o seu desgosto, a sua vida sem caridade nem compreensão.
E
devoram-se uns aos outros, tanto os homens como os peixes...
É
missão dos filhos de Deus conseguir que todos os homens entrem - com liberdade
- dentro da rede divina, para que se amem.
Se
somos cristãos, temos de converter-nos nos pescadores de que fala o profeta
Jeremias.
Jesus
Cristo também utilizou repetidamente essa metáfora: "Segui-me e Eu vos
farei pescadores de homens", diz a Pedro e a André.
260
Acompanhemos
Jesus nesta pesca divina.
Jesus
está junto do lago de Genesaré e as pessoas comprimem-se à sua volta, ansiosas
por ouvirem a palavra de Deus.
Tal
como hoje!
Não
estais a ver?
Estão
desejando ouvir a mensagem de Deus, embora o dissimulem exteriormente.
Talvez
alguns se tenham esquecido da doutrina de Cristo; talvez outros, sem culpa sua,
nunca a tenham aprendido e olhem para a religião como coisa estranha... mas
convencei-vos de uma realidade sempre actual: chega sempre um momento em que a alma
não pode mais; em que não lhe bastam as explicações vulgares; em que não a
satisfazem as mentiras dos falsos profetas.
E,
mesmo que nem então o admitam, essas pessoas sentem fome, desejam saciar a sua
inquietação com os ensinamentos do Senhor.
Deixemos
São Lucas continuar a sua narrativa: «E viu duas barcas à beira do lago; e
os pescadores tinham saído e lavavam as redes. Entrando numa das barcas, que
era a de Simão Pedro, pediu-lhe que se afastasse um pouco da terra. E
sentando-se dentro, ensinava o povo.»
Quando
acabou a sua catequese, ordenou a Simão: «Faz-te mais ao largo e lançai as
vossas redes para pescar»; é Cristo o dono da barca; é Ele quem prepara a
faina.
Para
isso é que veio ao mundo: para tratar de que os Seus irmãos descubram o caminho
da glória e do amor ao Pai.
Não
fomos nós, portanto, quem inventou o apostolado cristão.
Nós,
os homens, só o dificultamos, com a nossa rudeza, com a nossa falta de fé.