Tempo de Natal
Epifania
Evangelho:
Jo 3, 22-30
22 Depois disto, foi Jesus com os Seus discípulos para
a terra da Judeia. Convivia com eles e baptizava. 23 João estava também a baptizar
em Enon, junto a Salim, porque havia ali muita água e o povo concorria para ser
baptizado. 24 João ainda não tinha sido metido na prisão. 25 Levantou-se uma
questão entre os discípulos de João e um judeu acerca da purificação. 26 Foram
ter com João e disseram-lhe: «Mestre, O que estava contigo além Jordão, de Quem
tu deste testemunho, ei-l'O que está a baptizar e todos vão a Ele». 27 João
respondeu: «O homem não pode receber coisa alguma se lhe não for dada do céu.
28 Vós próprios sois testemunhas de que vos disse: Eu não sou o Cristo, mas fui
enviado diante d'Ele. 29 O que tem a esposa é o esposo, mas o amigo do esposo,
que está ao lado e o ouve, enche-se de gozo com a voz do esposo. Esta é a minha
alegria e ela é perfeita. 30 Convém que Ele cresça e eu diminua.
Comentário:
A importância do
Baptismo fica bem patente neste trecho de São João.
O anúncio da
chegada eminente do Messias começou com o Baptismo de João; a confirmação da
Pessoa de Jesus Cristo como esse mesmo Messias, a Segunda Pessoa da Santíssima
Trindade confirma-se no Baptismo de Jesus.
A admissão na Igreja
Católica instituída por Jesus Cristo começa com o Sacramento do Baptismo e,
também, a constituição fundamental do Baptizado em Filho de Deus.
(ama, comentário
sobre Jo 3, 22-30 2015.01.10)
Leitura espiritual
CARTA
ENCÍCLICA
LAUDATO SI’
DO
SANTO PADRE
FRANCISCO
SOBRE
O CUIDADO DA CASA COMUM
CAPÍTULO IV
UMA
ECOLOGIA INTEGRAL
1.
Ecologia ambiental, económica e social
3.
Ecologia da vida quotidiana
147. Para se poder falar de autêntico
progresso, será preciso verificar que se produza uma melhoria global na
qualidade de vida humana; isto implica analisar o espaço onde as pessoas
transcorrem a sua existência.
Os ambientes onde vivemos influem sobre a
nossa maneira de ver a vida, sentir e agir.
Ao mesmo tempo, no nosso quarto, na nossa
casa, no nosso lugar de trabalho e no nosso bairro, usamos o ambiente para
exprimir a nossa identidade.
Esforçamo-nos por nos adaptar ao ambiente
e, quando este aparece desordenado, caótico ou cheio de poluição visiva e
acústica, o excesso de estímulos põe à prova as nossas tentativas de
desenvolver uma identidade integrada e feliz.
148. Admirável é a criatividade e
generosidade de pessoas e grupos que são capazes de dar a volta às limitações
do ambiente, modificando os efeitos adversos dos condicionalismos e aprendendo
a orientar a sua existência no meio da desordem e precariedade.
Por exemplo, nalguns lugares onde as
fachadas dos edifícios estão muito deterioradas, há pessoas que cuidam com
muita dignidade o interior das suas habitações, ou que se sentem bem pela
cordialidade e amizade das pessoas.
A vida social positiva e benfazeja dos
habitantes enche de luz um ambiente à primeira vista inabitável.
É louvável a ecologia humana que os pobres
conseguem desenvolver, no meio de tantas limitações.
A sensação de sufocamento, produzida pelos
aglomerados residenciais e pelos espaços com alta densidade populacional, é
contrastada se se desenvolvem calorosas relações humanas de vizinhança, se se
criam comunidades, se as limitações ambientais são compensadas na interioridade
de cada pessoa que se sente inserida numa rede de comunhão e pertença.
Deste modo, qualquer lugar deixa de ser um
inferno e torna-se o contexto duma vida digna.
149. Inversamente está provado que a
penúria extrema vivida nalguns ambientes privados de harmonia, magnanimidade e
possibilidade de integração, facilita o aparecimento de comportamentos desumanos
e a manipulação das pessoas por organizações criminosas. Para os habitantes de
bairros periféricos muito precários, a experiência diária de passar da
superlotação ao anonimato social, que se vive nas grandes cidades, pode
provocar uma sensação de desenraizamento que favorece comportamentos
anti-sociais e violência.
Todavia tenho a peito reiterar que o amor
é mais forte.
Muitas pessoas, nestas condições, são
capazes de tecer laços de pertença e convivência que transformam a superlotação
numa experiência comunitária, onde se derrubam os muros do eu e superam as barreiras
do egoísmo.
Esta experiência de salvação comunitária é
o que muitas vezes suscita reacções criativas para melhorar um edifício ou um
bairro.[i]
150. Dada a relação entre os espaços
urbanizados e o comportamento humano, aqueles que projectam edifícios, bairros,
espaços públicos e cidades precisam da contribuição dos vários saberes que
permitem compreender os processos, o simbolismo e os comportamentos das
pessoas.
Não é suficiente a busca da beleza no
projecto, porque tem ainda mais valor servir outro tipo de beleza: a qualidade
de vida das pessoas, a sua harmonia com o ambiente, o encontro e ajuda mútua.
Por isso também, é tão importante que o
ponto de vista dos habitantes do lugar contribua sempre para a análise da
planificação urbanista.
151. É preciso cuidar dos espaços comuns,
dos marcos visuais e das estruturas urbanas que melhoram o nosso sentido de
pertença, a nossa sensação de enraizamento, o nosso sentimento de «estar em
casa» dentro da cidade que nos envolve e une.
É importante que as diferentes partes duma
cidade estejam bem integradas e que os habitantes possam ter uma visão de
conjunto em vez de se encerrarem num bairro, renunciando a viver a cidade inteira
como um espaço próprio partilhado com os outros.
Toda a intervenção na paisagem urbana ou
rural deveria considerar que os diferentes elementos do lugar formam um todo,
sentido pelos habitantes como um contexto coerente com a sua riqueza de significados.
Assim, os outros deixam de ser estranhos e
podemos senti-los como parte de um «nós» que construímos juntos.
Pela mesma razão, tanto no meio urbano
como no rural, convém preservar alguns espaços onde se evitem intervenções
humanas que os alterem constantemente.
152. A falta de habitação é grave em
muitas partes do mundo, tanto nas áreas rurais como nas grandes cidades,
nomeadamente porque os orçamentos estatais em geral cobrem apenas uma pequena
parte da procura.
E não só os pobres, mas uma grande parte
da sociedade encontra sérias dificuldades para ter uma casa própria.
A propriedade da casa tem muita
importância para a dignidade das pessoas e o desenvolvimento das famílias.
Trata-se de uma questão central da
ecologia humana.
Se num lugar concreto já se desenvolveram
aglomerados caóticos de casas precárias, trata-se primariamente de urbanizar
estes bairros, não de erradicar e expulsar os habitantes.
Mas, quando os pobres vivem em subúrbios
poluídos ou aglomerados perigosos, «no caso de ter de se proceder à sua
deslocação, para não acrescentar mais sofrimento ao que já padecem, é
necessário fornecer-lhes uma adequada e prévia informação, oferecer-lhes
alternativas de alojamentos dignos e envolver directamente os interessados».[ii]
Ao mesmo tempo, a criatividade deveria
levar à integração dos bairros precários numa cidade acolhedora:
«Como são belas as cidades que superam a
desconfiança doentia e integram os que são diferentes, fazendo desta integração
um novo factor de progresso! Como são encantadoras as cidades que, já no seu
projecto arquitectónico, estão cheias de espaços que unem, relacionam,
favorecem o reconhecimento do outro!»[iii]
153. Nas cidades, a qualidade de vida está
largamente relacionada com os transportes, que muitas vezes são causa de
grandes tribulações para os habitantes.
Nelas, circulam muitos carros utilizados
por uma ou duas pessoas, pelo que o tráfico torna-se intenso, eleva-se o nível
de poluição, consomem-se enormes quantidades de energia não-renovável e torna-se
necessário a construção de mais estradas e parques de estacionamento que
prejudicam o tecido urbano.
Muitos especialistas estão de acordo sobre
a necessidade de dar prioridade ao transporte público.
Mas é difícil que algumas medidas
consideradas necessárias sejam pacificamente acolhidas pela sociedade, sem uma
melhoria substancial do referido transporte, que, em muitas cidades, comporta
um tratamento indigno das pessoas devido à superlotação, ao desconforto, ou à
reduzida frequência dos serviços e à insegurança.
154. O reconhecimento da dignidade
peculiar do ser humano contrasta frequentemente com a vida caótica que têm de
fazer as pessoas nas nossas cidades.
Mas isto não deveria levar a esquecer o
estado de abandono e desleixo que sofrem também alguns habitantes das áreas
rurais, onde não chegam os serviços essenciais e há trabalhadores reduzidos a
situações de escravidão, sem direitos nem expectativas duma vida mais
dignificante.
155. A ecologia humana implica também algo
de muito profundo que é indispensável para se poder criar um ambiente mais
dignificante: a relação necessária da vida do ser humano com a lei moral
inscrita na sua própria natureza.
Bento XVI dizia que existe uma «ecologia
do homem», porque «também o homem possui uma natureza, que deve respeitar e não
pode manipular como lhe apetece».[iv]
Nesta linha, é preciso reconhecer que o
nosso corpo nos põe em relação directa com o meio ambiente e com os outros
seres vivos.
A aceitação do próprio corpo como dom de
Deus é necessária para acolher e aceitar o mundo inteiro como dom do Pai e casa
comum; pelo contrário, uma lógica de domínio sobre o próprio corpo transforma-se
numa lógica, por vezes subtil, de domínio sobre a criação. Aprender a aceitar o
próprio corpo, a cuidar dele e a respeitar os seus significados é essencial
para uma verdadeira ecologia humana.
Também é necessário ter apreço pelo
próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade, para se poder reconhecer a
si mesmo no encontro com o outro que é diferente.
Assim, é possível aceitar com alegria o
dom específico do outro ou da outra, obra de Deus criador, e enriquecer-se
mutuamente.
Portanto, não é salutar um comportamento
que pretenda «cancelar a diferença sexual, porque já não sabe confrontar-se com
ela».[v]
(cont)
[i] Alguns autores puseram em evidência os valores que
muitas vezes se vivem, por exemplo, nas «villas», «chabolas» ou favelas da
América Latina: ver Juan Carlos Scannone S.I., «La irrupción del pobre y la
lógica de la gratuidad», in Juan Carlos Scannone e Marcelo Perine (eds.),
Irrupción del pobre y quehacer filosófico. Hacia una nueva racionalidad (Buenos
Aires 1993), 225-230.
[ii] Pontifício Conselho «Justiça e Paz», Compêndio da Doutrina
Social da Igreja, 482.
[iii] Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium (24 de
Novembro de 2013), 210: AAS 105 (2013), 1107.
[iv] Discurso ao Bundestag, Berlim (22 de Setembro de
2011): AAS 103 (2011), 668; L’Osservatore Romano (ed. portuguesa de
24/IX/2011), 5.
[v] Francisco, Catequese (15 de Abril de 2015):
L’Osservatore Romano (ed. portuguesa de 16/IV/2015), 20.