Vida de Maria
Imaculada
Conceição
A VOZ DO MAGISTÉRIO
«Deus
inefável escolheu e assinalou desde o princípio, antes dos tempos, uma Mãe para
que o Seu unigénito Filho encarnasse e nascesse d’Ela na ditosa plenitude dos
tempos. E em tal grau a amou, acima de todas as criaturas, que só n’Ela se
deleitou com singular benevolência. Por isso a cobriu da abundância de todos os
dons celestiais, tirados do tesouro da Sua divindade, muito acima de todos os
anjos e santos. E assim Ela, sempre absolutamente livre de toda a mancha de
pecado, toda formosa e perfeita, possui uma tal plenitude de inocência e de
santidade, que não é possível conceber maior plenitude depois de Deus e que
ninguém pode imaginar fora de Deus».
«Era
certamente convenientíssimo que uma Mãe tão venerável brilhasse sempre adornada
com os resplendores da mais perfeita santidade e que, imune da mancha do pecado
original, alcançasse um triunfo total sobre a antiga serpente. Com efeito, Deus
Pai tinha disposto entregar-lhe o Seu Filho Unigénito — gerado do Seu coração,
igual a Si mesmo e a quem ama como a Si mesmo — de tal modo que Ele fosse, por
natureza, o próprio Filho único comum de Deus Pai e da Virgem; já que o mesmo
Filho tinha determinado fazê-la substancialmente Sua Mãe e o Espírito Santo
tinha querido e fez que fosse concebido e nascesse Aquele de Quem Ele próprio
procede».
«Os
Padres e escritores eclesiásticos ao considerarem que a Santíssima Virgem foi
chamada cheia de graça pelo anjo Gabriel — por mandato e em nome do próprio
Deus — quando lhe anunciou a altíssima dignidade de Mãe de Deus ,
ensinaram que, com esta saudação solene e singular, jamais ouvida, se
manifestava que a Mãe de Deus era a sede de todas as graças divinas e que
estava adornada de todos os carismas do Espírito Santo».
«Daí
decorre a sua opinião, clara e unânime, segundo a qual a gloriosíssima Virgem,
em quem o Todo-poderoso fez grandes coisas ,
brilhou com tal abundância de dons celestiais, com tal plenitude de graça e com
tal inocência, que se tornou como um inefável milagre de Deus; mais ainda, como
o milagre máximo de todos os milagres e digna Mãe de Deus; e chegando-se a Deus
o mais próximo possível, tanto quanto lho permitia a condição de criatura, foi
superior a todos os louvores, quer de homens quer de anjos».
«Pelo
qual, para honra da santa e indivisa Trindade, para glória e ornamento da
Virgem Mãe de Deus, para exaltação da fé católica e incremento da religião
cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, com a dos Santos
Apóstolos Pedro e Paulo e com a nossa, declaramos, pronunciamos e definimos que
foi revelada por Deus e, em consequência, deve ser acreditada firme e
constantemente por todos os fiéis, a doutrina que sustenta que a Santíssima
Virgem Maria foi preservada imune de toda a mancha de pecado original, no
primeiro instante da sua concepção, por singular graça e privilégio de Deus
omnipotente, em atenção aos méritos de Jesus Cristo, salvador do género
humano».
Beato Pio IX, Bula
Ineffabilis Deus, 8-XII-1854, ao definir como dogma de fé a Imaculada
Conceição
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A VOZ DOS PADRES
«Exulte
hoje toda a criação e estremeça de gozo a natureza. Alegre-se o céu nas alturas
e as nuvens derramem a justiça. Destilem os montes doçura de mel e júbilo as
colinas, porque o Senhor teve misericórdia do Seu povo e nos suscitou um
poderoso Salvador na casa de David Seu servo, ou seja, nesta imaculadíssima e
puríssima Virgem, através de quem chega a saúde e a expectativa dos povos».
«Que
as almas boas e agradecidas entoem um cântico de alegria; que a natureza
convoque todas as criaturas para lhes anunciar a boa nova da sua renovação e o
início da sua reforma. Saltem as mães de alegria, pois a que carecia de
descendência (Santa Ana) gerou uma Mãe virgem e imaculada. Alegrem-se as
virgens, pois uma terra não semeada pelo homem trará como fruto Aquele que
procede do Pai sem separação, segundo um modo mais admirável de quanto se possa
imaginar. Aplaudam as mulheres, pois se noutros tempos uma mulher foi ocasião
imprudente de pecado, também agora uma mulher nos traz as primícias da
salvação; e a que antes foi ré, manifesta-se agora aprovada pelo juízo divino:
Mãe que não conhece varão, escolhida pelo Seu Criador, restauradora do género
humano».
«Que
todas as coisas criadas cantem e dancem de alegria e contribuam adequadamente
para este dia gozoso. Que hoje seja una e comum a celebração do Céu e da terra
e que tudo o que há neste mundo e no outro faça festa de comum acordo. Porque
hoje foi criado e erigido o santuário puríssimo do Criador de todas as coisas e
a criatura preparou para o seu Autor uma hospedagem nova e apropriada».
«Hoje
a natureza, antigamente desterrada do paraíso, recebe a divindade e corre com
passo alegre para o cume supremo da glória. Hoje Adão oferece Maria a Deus em
nosso nome, como as primícias da nossa natureza; e estas primícias, que não
foram misturadas com o resto da massa, são transformadas em pão para a
reparação do género humano.
«Hoje
a humanidade, em todo o resplendor da sua nobreza imaculada, recebe o dom da
sua primeira formação pelas mãos divinas e reencontra a sua antiga beleza. As
vergonhas do pecado tinham obscurecido o esplendor e os encantos da natureza
humana; mas nasce a Mãe do Formoso por excelência e esta natureza retoma n’Ela
os seus antigos privilégios e é modelada seguindo um modelo perfeito e verdadeiramente
digno de Deus. E esta formação é uma perfeita restauração; e esta restauração
uma divinização; e esta, uma assimilação ao estado primitivo».
«Hoje
apareceu o brilho da púrpura divina e a miserável natureza humana revestiu-se
da dignidade real. Hoje, de acordo com a profecia, floresceu o ceptro de David,
o ramo sempre verde de Aarão, que para nós produziu Cristo, ramo da força.
Hoje, de Judá e de David saiu uma jovem virgem, com a marca do reino e do sacerdócio
d’Aquele que, segundo a ordem de Melquisedec, recebeu o sacerdócio de Aarão.
Hoje a graça, purificando o éfode místico do divino sacerdócio, teceu — à
maneira de símbolo — a veste da semente levítica e Deus tingiu com púrpura real
o sangue de David».
«Dizendo
tudo numa palavra: hoje começa a reforma da nossa natureza e o mundo
envelhecido, submetido agora a uma transformação totalmente divina, recebe as
primícias da segunda criação»
Santo André de Creta, Homilia 1 na Natividade da
Santíssima Mãe de Deus.
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A VOZ DOS SANTOS
«Este
é um mistério de amor. A razão humana não o consegue compreender. Só a fé pode
explicar como é que uma criatura foi elevada a tão grande dignidade, até se
tornar o centro amoroso em que convergem as complacências da Trindade. Sabemos
que é um segredo divino. Mas, por se tratar da nossa Mãe, sentimo-nos capazes
de o compreender melhor – se é possível falar assim – do que outras verdades da
fé.»
«Os
teólogos formularam com frequência um argumento para tentar compreender de
algum modo o significado desse cúmulo de graças de que Maria se encontra
revestida, e que culmina com a Assunção aos Céus. Dizem: convinha; Deus podia
fazê-lo; e por isso o fez. É a explicação mais clara das razões que levaram
Cristo a conceder a sua Mãe todos os privilégios, desde o primeiro instante da
sua Imaculada Conceição. Ficou livre do poder de Satanás; é formosa – tota pulchra! – limpa, pura na alma e no
corpo».
(São Josemaria, Cristo que passa, n. 171)
«Como
gostam os homens de que lhes recordem o seu parentesco com personagens da
literatura, da política, do exército, da Igreja!... - Canta diante da Virgem
Imaculada, recordando-Lhe: Ave, Maria, Filha de Deus Pai; Ave, Maria, Mãe de
Deus Filho; Ave, Maria, Esposa de Deus Espírito Santo... Mais do que tu, só
Deus!
(São Josemaria, Caminho, n. 496)
«Talvez
agora algum de vós possa pensar que o dia normal, o habitual ir e vir da nossa
vida, não se presta muito para manter o coração numa criatura tão pura como
Nossa Senhora. Convidar-vos-ia a reflectir um pouco. Que procuramos sempre,
mesmo sem dar especial atenção, em tudo o que fazemos? Quando nos move o amor
de Deus e trabalhamos com rectidão de intenção, procuramos o que é bom, o que é
limpo, o que dá paz à consciência e felicidade à alma. Também cometemos muitos
erros? Sim, mas precisamente reconhecer esses erros é descobrir com maior
clareza que a nossa meta é esta: uma felicidade que não seja passageira, mas
sim profunda, serena, humana e sobrenatural.
Existe
uma criatura que conseguiu nesta terra essa felicidade, porque é a obra-prima
de Deus: a Nossa Mãe Santíssima, Maria. Ela vive e protege-nos; está junto do
Pai e do Filho e do Espírito Santo, em corpo e alma. É a mesma que nasceu na
Palestina, que se entregou ao Senhor desde menina, que recebeu a anunciação do
Arcanjo Gabriel, que deu à luz o Nosso Salvador, que esteve junto d'Ele ao pé
da Cruz.
N'Ela
tornam-se realidade todos os ideais, mas não devemos concluir que a sua
sublimidade e a sua grandeza a apresentem para nós inacessível e distante É a
cheia de graça, a soma de todas as perfeições: e é Mãe. Com o seu poder diante
de Deus alcançar-nos-á o que lhe pedirmos; como Mãe, quer-no-lo conceder. E,
também como Mãe, entende e compreende as nossas fraquezas, anima-nos,
desculpa-nos, facilita o caminho, tem sempre o remédio preparado, mesmo quando
parece que já nada é possível».
(São Josemaria, Amigos de Deus, n. 292)
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A VOZ DOS POETAS
À
Conceição da Virgem Nossa Senhora
Para se namorar do que criou,
te fez Deus, santa Fénix, Virgem pura.
Vede que tal seria esta feitura
que a fez quem para si só a guardou.
No seu santo conceito te formou
primeiro que a primeira criatura,
para que única fosse a compostura
que de tão longo tempo se estudou.
Não sei se direi nisto tudo quanto
baste
para exprimir as santas qualidades,
que quis criar em ti quem tu criaste.
És filha, mãe e esposa. E se
alcançaste,
uma só, três tão altas dignidades,
foi porque a três e um só tanto
agradaste.
Luís de Camões