Quaresma I Semana
Evangelho: Mt 6 7-15
7 Nas
vossas orações não useis muitas palavras como os gentios, os quais julgam que
serão ouvidos à força de palavras. 8 Não os imiteis, porque vosso
Pai sabe o que vos é necessário, antes que vós Lho peçais. 9 «Vós,
pois, orai assim: Pai-nosso, que estás nos céus, santificado seja o Teu nome. 10
«Venha o Teu reino. Seja feita a Tua vontade, assim na terra como no céu. 11
O pão nosso supersubstancial nos dá hoje. 12 Perdoa-nos as nossas
dívidas assim como nós perdoamos aos nossos devedores. 13 E não nos
deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. 14 «Porque, se vós
perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso Pai celeste vos perdoará.
15 Mas, se não perdoardes aos homens, também o vosso Pai não
perdoará as vossas ofensas.
Comentário:
Deveríamos examinar a nossa oração!
Será que quando rezamos é principalmente para pedir
algo?
E está certo, porque o Senhor quer que Lhe peçamos o
que julgamos fazer-nos falta.
Mas a nossa oração não pode ficar-se por aqui!
Quando conversamos com o nosso Pai não nos limitamos a
pedir-lhe coisas, mas, também, em estabelecer um diálogo de amor entre Pai e
filho que se amam e se querem.
E o que se diz nessas conversas?
Tudo absolutamente!
(ama comentário sobre Mt 6, 7-15, 2014.06.19)
Leitura espiritual
Santíssima Virgem
Vida
de Maria (XIII)
Os
anos de Nazaré
Depois
de ter narrado o encontro do Menino Jesus entre os doutores do Templo, o
Evangelho continua: desceu com eles e foi para Nazaré; e era-lhes submisso. A
Sua Mãe guardava todas estas coisas no seu coração. Jesus crescia em sabedoria,
em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens[i].
Em
dois versículos do evangelho resumem-se dezoito anos da vida de Jesus e de
Maria. Anos em que a Sagrada Família leva uma existência como a dos outros
habitantes de Nazaré, mas repleta de amor. Anos decisivos na epopeia da
Redenção, que o Verbo encarnado estava já a levar a cabo por meio da obediência
e do trabalho, no contexto de uma vida normal.
Depressa
ficou para trás aquele acontecimento do Templo, mas as palavras que Jesus lhes
disse nessa altura ofereceram a José e a Maria constante tema de meditação.
Perceberam, com uma luz nova, o sentido da vida de Jesus na terra, toda voltada
para o cumprimento da missão que o Pai celestial lhe tinha confiado. E, embora
deva ter deixado uma profunda marca nas suas almas, a vida em Nazaré prosseguiu
como habitualmente.
Cada
dia tinha as suas próprias ocupações. As tarefas de Maria eram as próprias de
uma dona de casa: caminhadas à única fonte da aldeia para encher o cântaro de
água fresca; amassar a farinha e levá-la ao forno para fazer o pão da semana;
manter a casa limpa e agradável, servindo-se talvez também de flores simples
que dessem cor e aroma ao ambiente; fiar
a lã macia e o linho suave e tecer depois os panos necessários; ocupar-se das
compras imprescindíveis quando chegava à aldeia um vendedor ambulante
apregoando as suas mercadorias... Mil tarefas domésticas que Maria realizava
como as outras mulheres da aldeia, mas com um imenso amor.
Quando
o Menino era ainda pequeno, acompanharia a Sua Mãe nas tarefas caseiras ou nas
suas deslocações pela aldeia. À medida que foi crescendo, passaria mais tempo
com José. Durante os anos que agora nos ocupam, começaria a ajudá-lo no seu
trabalho, que era abundante. A oficina de José era como as outras existentes
naquele tempo na Palestina. Talvez fosse a única de Nazaré, uma aldeia pequena.
Cheirava a madeira e a limpo. Os trabalhos que se realizavam eram os próprios
do ofício de artesão, como o designa o Evangelho, em que se fazia um pouco de
tudo: fazer uma viga, fabricar um armário simples, arranjar uma mesa ou um
telhado, passar a plaina numa porta que não encaixava bem... Jesus, primeiro
adolescente e depois jovem, aprendeu de José a trabalhar bem, com cuidado nos
detalhes, com um sorriso acolhedor para o cliente, cobrando o justo, embora
concedendo facilidades de pagamento a quem estivesse a passar uma temporada de
apuros económicos.
A VIDA DE MARIA NÃO CHAMAVA A ATENÇÃO DOS PARENTES E
VIZINHOS.
NEM SEQUER A SUA DOÇURA E A SUA DELICADEZA, QUE A TODOS
ATRAÍA.
PORQUE ERA COMO O ORVALHO, QUE DÁ FRESCURA E COR AOS
CAMPOS E MAL SE CHEGA A VER.
Um
dia José morreu. Jesus tinha crescido, já se podia encarregar da casa e cuidar
da Sua Mãe. Maria e Jesus devem ter chorado ao enfrentar esse transe, enquanto
o Santo Patriarca, acompanhado muito de perto pelos seus dois grandes amores,
expirava em paz. Tinha cumprido a sua missão.
Com
a morte do Patriarca, a Mãe e o Filho estreitaram ainda mais a sua intimidade.
Quantas vezes o recordariam nas suas conversas a sós, ou com outros membros da
família, nas longas veladas do inverno, ao calor da lareira! E iriam desfiando
tantos detalhes do esquecimento de si próprio, do serviço aos outros, que
constituíam o quadro da vida de José, o artesão.
Na
tranquila paz daquela casa, Maria continuou as suas tarefas de sempre: cozinhar
e lavar louça; moer e amassar a farinha; coser as vestes de Jesus e as suas;
receber com um gesto amável as pessoas que a iam visitar... Cada vez com mais
amor, pois tinha perto, muito perto, ao seu lado, Aquele que é a Fonte do Amor.
No entanto, a sua vida não chamava a atenção dos parentes e vizinhos. Nem sequer
a sua doçura e delicadeza, que atraía a todos e fazia com que todos se
sentissem bem ao seu lado. Porque era
como o orvalho, que dá frescura e cor aos campos e mal se chega a ver.
E
enquanto Jesus crescia e trabalhava, a Virgem guardava todas estas coisas no
seu coração[ii],
ponderando-as e meditando-as, fazendo de cada uma ocasião e tema do seu diálogo
ininterrupto com Deus.
j.a. loarte
A
VOZ DO MAGISTÉRIO
«Em
Maria, a consciência de cumprir uma tarefa que Deus lhe tinha confiado atribuía
um significado mais excelso à sua vida quotidiana. Os afazeres simples e
humildes de cada dia assumiam, aos seus olhos, um valor singular, já que eram
vividos por Ela como serviço à missão de Cristo.
O
exemplo de Maria ilumina e encoraja a experiência de inúmeras mulheres, que
realizam o seu trabalho quotidiano exclusivamente entre as paredes domésticas.
Trata-se de um empenho humilde, oculto, repetitivo e, muitas vezes, não
apreciado de modo suficiente. Contudo, os longos anos, vividos por Maria na
casa de Nazaré, revelam as suas enormes potencialidades de amor autêntico e,
portanto, de salvação. Com efeito, a simplicidade da vida de tantas donas de
casa, sentida como missão de serviço e de amor, contém um valor extraordinário
aos olhos do Senhor.
E
pode-se até dizer que a vida de Nazaré, para Maria, não era dominada pela
monotonia. Em contacto com Jesus que crescia, Ela esforçava-se por penetrar o
mistério do seu Filho, contemplando e adorando. São Lucas diz: «Maria
conservava todas estas coisas, ponderando-as no seu coração»[iii].
«Todas
estas coisas»: são os acontecimentos de que Ela foi, ao mesmo tempo,
protagonista e espectadora, a começar pela Anunciação; mas, sobretudo, é a vida
do Menino. Cada dia de intimidade com Ele constitui um convite a conhecê-l’O
melhor, a descobrir mais profundamente o significado da Sua presença e o
mistério da Sua pessoa.
Poder-se-ia
pensar que para Maria era fácil acreditar, dado que Ela vivia quotidianamente
em contacto com Jesus. A respeito disso, porém, é preciso recordar que os aspectos
singulares da personalidade do Filho permaneciam habitualmente ocultos; embora
o Seu modo de agir fosse exemplar, Ele vivia uma vida semelhante à de tantos
dos Seus coetâneos.
Durante
os trinta anos da permanência em Nazaré, Jesus não manifesta as Suas qualidades
sobrenaturais nem realiza gestos prodigiosos. Às primeiras manifestações
extraordinárias da Sua personalidade, ligadas ao início da pregação, os Seus
familiares (chamados no Evangelho «irmãos») assumem — segundo uma interpretação
— a responsabilidade de O reconduzir a casa, porque julgam que o Seu modo de Se
comportar não é normal[iv].
Na
digna e laboriosa atmosfera de Nazaré, Maria esforçava-se por compreender a
trama providencial da missão do Filho. Nesse sentido, para a Mãe foi certamente
objecto de particular reflexão a frase que Jesus pronunciara no Templo de
Jerusalém, quando tinha doze anos: «Não sabíeis que devia estar em casa de Meu
Pai»[v].
Ao meditar sobre isto, Maria podia entender melhor o sentido da filiação divina
de Jesus e o da sua maternidade, empenhando-se em divisar, no comportamento do
Filho, os traços reveladores da Sua semelhança com Aquele a Quem Ele chamava
«Meu Pai».
A
comunhão de vida com Jesus, na casa de Nazaré, levou Maria a progredir não só
«na peregrinação da fé»[vi],
mas também na esperança. Essa virtude, alimentada e sustentada pela lembrança
da Anunciação e das palavras de Simeão, abrange toda a Sua existência terrena,
mas é de modo particular exercida nos trinta anos de silêncio e ocultamento
passados em Nazaré.
Entre
as paredes domésticas a Virgem vive a esperança de forma excelsa; sabe que não
ficará desiludida, ainda que não conheça os tempos e os modos com que Deus
realizará a Sua promessa. Na obscuridade da fé e na ausência de sinais
extraordinários, que anunciem o início da missão messiânica do Filho, Ela
espera, para além de qualquer prova, aguardando de Deus o cumprimento da
promessa.
Ambiente
de crescimento da fé e da esperança, a casa de Nazaré torna-se um lugar de
sublime testemunho da caridade. O amor que Cristo desejava infundir no mundo
acende-se e arde, antes de tudo, no coração da Mãe: é precisamente no lar que
se prepara o anúncio do Evangelho da caridade divina.
Olhando
para Nazaré, contemplando o mistério da vida oculta de Jesus e da Virgem, somos
convidados a reflectir sobre o mistério da nossa própria existência, que —
recorda São Paulo — «está escondida com Cristo em Deus»[vii].
Trata-se,
com frequência, de uma existência humilde e obscura aos olhos do mundo; porém,
de uma existência que na escola de Maria pode manifestar inesperadas
potencialidades de salvação, irradiando o amor e a paz de Cristo.»
são joão paulo ii ( século XX), Discurso na audiência geral, 29-I-1997.
«Nazaré
recorda-nos o dever de reconhecer e de respeitar a dignidade e a missão
conferidas por Deus às mulheres, assim como os seus carismas e talentos
especiais. Seja como mães de família, como uma presença vital no mercado de
trabalho e nas instituições da sociedade, seja na vocação particular a seguir o
Senhor mediante os conselhos evangélicos da castidade, pobreza e obediência, as
mulheres desempenham um papel indispensável na criação daquela "ecologia
humana"[viii],
de que o mundo e também esta terra têm tão urgente necessidade: um ambiente em
que as crianças aprendam a amar e a estimar os outros, a ser honestos e
respeitadores para com todos, a praticar as virtudes da misericórdia e do
perdão.
Aqui
pensamos também em São José, o homem justo que Deus colocou à frente da sua
casa. Do exemplo forte e paterno de José, Jesus aprendeu as virtudes da piedade
viril, da fidelidade à palavra dada, da integridade e do trabalho duro. No
carpinteiro de Nazaré, pôde ver como a autoridade posta ao serviço do amor é
infinitamente mais fecunda do que o poder que procura dominar. Quanta necessidade
tem o nosso mundo do exemplo, da orientação e da força calma de homens como
José!
Enfim,
ao contemplar a Sagrada Família de Nazaré, dirijamos o nosso olhar ao Menino
Jesus, que na casa de Maria e de José cresceu em sabedoria e conhecimento, até
ao dia em que deu início ao seu ministério público. Gostaria de transmitir um
pensamento particular aos jovens aqui presentes. O Concílio Vaticano II ensina
que as crianças desempenham um papel especial para fazer crescer os seus pais
em santidade[ix].
Peço-vos que reflectis sobre isto, permitindo que o exemplo de Jesus vos
oriente não apenas na manifestação do respeito aos vossos pais, mas também
ajudando-os a descobrir mais plenamente o amor que confere à vossa vida o
sentido mais completo. Na Sagrada Família de Nazaré, Jesus ensinou a Maria e
José um pouco da grandeza do amor de Deus, seu Pai celeste, fonte última de
todo o amor, o Pai do qual toda a paternidade no céu e na terra adquire o seu
nome[x].»
bento xvi (Século XXI), Alocução em Nazaré, 14-V-2009.
***
A
VOZ DOS PADRES E ESCRITORES ANTIGOS
«Aprendamos,
filhos, a estar submetidos aos nossos pais. Aqui o maior submete-se ao mais
pequeno. Com efeito, vendo que José é maior do que Ele, Jesus honra-o com o
respeito que se deve a um pai, dando a todos os filhos um exemplo de submissão
aos pais ou, se são órfãos, àqueles que têm a autoridade paterna.
Mas
porque é que falo dos pais e dos filhos? Se Jesus, o Filho de Deus, se submete
a José e a Maria, não deverei eu submeter-me ao Bispo que Deus me deu por pai?
Não deverei estar sujeito ao sacerdote que o Senhor me mandou?
Penso
que José compreendia bem que Jesus era superior a ele, embora lhe estivesse
submetido; e, sabendo isto, dava-lhe ordens com prudência e moderação. Reflicta
cada um sobre este facto. Ocorre com frequência que um homem de pouco valor
esteja colocado acima de outros melhores do que ele e às vezes sucede que o
inferior vale mais do que o superior que governa. Se quem está investido de uma
elevada dignidade compreende estas coisas, não se encherá de orgulho por causa
da sua mais elevada categoria, mas estará consciente de que o inferior pode ser
melhor do que ele, do mesmo modo que Jesus estava submetido a José».
orígenes (século III), Homilias sobre São Lucas 20, 5
A
VOZ DOS SANTOS E AUTORES ESPIRITUAIS
«Não
nos esqueçamos de que a quase totalidade dos dias que Nossa Senhora passou na
Terra decorreram de forma muito semelhante à vida diária de muitos milhões de
mulheres, ocupadas em cuidar da sua família, em educar os seus filhos, em levar
a cabo as tarefas do lar. Maria santifica as mais pequenas coisas, aquilo que
muitos consideram erradamente como não transcendente e sem valor: o trabalho de
cada dia, os pormenores de atenção com as pessoas queridas, as conversas e as
visitas por motivo de parentesco ou de amizade... Bendita normalidade, que pode
estar cheia de tanto amor de Deus!
Na
verdade, é isso o que explica a vida de Maria: o amor. Um amor levado até ao
extremo, até ao esquecimento completo de si mesma, contente por estar onde Deus
quer que esteja e cumprindo com esmero a vontade divina. Isso é o que faz com
que o mais pequeno dos seus gestos nunca seja banal, mas cheio de significado.
Maria, nossa Mãe, é para nós exemplo e caminho. Havemos de procurar ser como
Ela nas circunstâncias concretas em que Deus quis que vivêssemos.
Procedendo
deste modo, daremos aos que nos cercam o testemunho de uma vida simples e
normal, com as limitações e com os defeitos próprios da nossa condição humana,
mas coerente. E assim, vendo-vos iguais a eles em tudo, os outros serão levados
a perguntar-nos: como se explica a vossa alegria? Donde tirais forças para
vencer o egoísmo e o comodismo? Quem vos ensina a viver a compreensão, o
espírito de convivência, a entrega, o serviço dos demais?»
são josemaria (século XX), Cristo que passa, n. 148.
«A
Virgem Maria conservava no seu coração, com suma diligência, tudo o que tinha
ouvido dizer do Senhor e tudo quanto Ele próprio dizia e fazia. Confiava tudo à
memória, para que, quando chegasse a altura de pregar ou de escrever acerca da
Sua encarnação, pudesse relatar com exactidão todas as coisas, tal como tinham
sucedido.
Imitemos,
irmãos, a Santa Mãe do Senhor. Também nós conservemos zelosamente no coração as
palavras e as obras do nosso Salvador; meditemo-las de dia e de noite,
afastando os incómodos assaltos dos desejos vãos e perversos. Porque, se efectivamente
desejamos habitar na casa do Senhor e louvá-Lo por toda a eternidade, na
bem-aventurança celestial, é muito necessário que já nesta vida demonstremos claramente
o que desejamos para a vida futura: não só indo à igreja cantar os louvores do
Senhor, mas testemunhando também com as palavras e com as obras, em qualquer
lugar do Seu reino, tudo o que redunde em glória e louvor do nosso Criador».
são beda o venerável (séculos VII-VIII),
Homilias , 1, 19.
[viii] cf. Centesimus
annus, 39
[ix] cf. Gaudium et
spes, 48