19/04/2023

Publicações em Abril 19



 

Dentro do Evangelho

 

(Re Jo III, 21)

 

6 Aquilo que nasce da carne é carne, e aquilo que nasce do Espírito é espírito. 7 Não te admires por Eu te ter dito: Vós tendes de nascer do Alto. 8 O vento sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todo aquele que nasceu do Espírito. 9 Nicodemos interveio e disse-lhe: ‘Como pode ser isso?’ 10 Jesus respondeu-lhe: Tu és mestre em Israel e não sabes estas coisas? 11 Em verdade, em verdade te digo: nós falamos do que sabemos e damos testemunho do que vimos, mas vós não aceitais o nosso testemunho. 12 Se vos falei das coisas da terra e não credes, como é que haveis de crer quando vos falar das coisas do Céu? 13 Pois ninguém subiu ao Céu a não ser aquele que desceu do Céu, o Filho do Homem. 14 Assim como Moisés ergueu a serpente no deserto, assim também é necessário que o Filho do Homem seja erguido ao alto, 15 a fim de que todo o que nele crê tenha a vida eterna. 16 Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna. 17 De facto, Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele. 18 Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado, por não crer no Filho Unigénito de Deus. 19 E a condenação está nisto: a Luz veio ao mundo, e os homens preferiram as trevas à Luz, porque as suas obras eram más. 20 De facto, quem pratica o mal odeia a Luz e não se aproxima da Luz para que as suas acções não sejam desmascaradas. 21 Mas quem pratica a verdade aproxima-se da Luz, de modo a tornar-se claro que os seus actos são feitos segundo Deus.

 

Comentários:

O Evangelista São João ocupa praticamente um capítulo – o XIII - do Evangelho que escreve a discorrer sobre a conversa de Jesus com o fariseu Nicodemos. É muito importante que o faça para que fique bem claro que o Senhor não Se exime a discorrer em termos e com argumentação de cariz mais elevado – por assim dizer – mas que é o mais indicado para a cultura do ouvinte. Também nós, seguidores de Cristo encarregados por Ele de disseminar por todas as partes a Sua Palavra, temos de fazer um verdadeiro esforço para nos adaptarmos quer às circunstâncias quer às audiências e não nos limitarmos a “papaguear” frases feitas e argumentos genéricos. Uma homilia, palestra ou conferência, tem de ser preparada e pensada detidamente sem o que se estará a faltar ao respeito aos ouvintes como, talvez, as nossas palavras não tenham o impacto e acolhimento que deveriam ter. Não temos que ser “doutores” nem ter qualidades oratórias especiais, bastará sermos honestos, sinceros e pedir a assistência do Espírito Santo.

Há um pormenor interessante na declaração inicial de Nicodemos: ‘sabemos que foste enviado por Deus». Este "sabemos" permite-nos pensar que haveria outros Fariseus e outros principais entre os judeus que partilhavam a mesma opinião que Nicodemos a respeito de Jesus Cristo. É uma conclusão que além de lógica nos deve alegrar muito e, sobretudo, a não aceitar a opinião que TODOS estes estavam contra Cristo.

Não sabemos porque prevaleceu a vontade de dar a morte ao Senhor se por maioria, por temor, ou outra razão qualquer, seja como for, pelo menos dois – José de Arimateia e Nicodemos – demonstraram uma coragem e desassombro que de alguma forma “redime” a atitude dos outros. Ao pedirem a Pilatos o corpo do Senhor e dar-lhe sepultura condigna, obtiveram um lugar entre os que o Senhor consideraria Seus amigos.

Renascer! A resposta de Jesus a Nicodemos que não a compreende de imediato. As pessoas estão mais habituadas a falar das coisas temporais que das do espírito e, portanto, vêm com maior facilidade com os olhos do corpo que com os olhos da alma. O que se trata aqui é do chamado "homem novo" que aparece, por assim dizer, com a ressurreição de Cristo, assumindo com pleno direito a filiação divina. Mas, argumenta-se, antes o homem não era filho de Deus? Realmente, antes, o homem era uma criatura pertencente a Deus, depois, com a Ressurreição, assume o estatuto de Filho deixando de ser uma "posse" para passar afazer parte de uma família: a Família Divina.

Nicodemos não entende que Cristo lhe fala de uma vida nova, a vida dos filhos de Deus. E, naturalmente, fala-lhe da fé imprescindível para acreditar e para, acreditando, renascer. Garante-lhe que o Seu sacrifício na Cruz será o sinal e o penhor dessa nova vida.

A conversa de Jesus com Nicodemos não pode ser mais esclarecedora. O fariseu é, sem dúvida, uma pessoa bem-intencionada e com evidente vontade de conhecer em profundidade a doutrina de Jesus e a Sua Pessoa. Por isso mesmo o Senhor o esclarece num tom e com argumentos que deixam antever uma especial relação entre os dois. Nicodemos é um homem sereno e justo e, para Jesus Cristo, estas são qualidades absolutamente necessárias a quem quer intimar com Ele. Podemos legitimamente presumir que as conversas entre os dois foram inúmeras e que Jesus se comprazia em atender e acolher aquele homem bem-intencionado que O procurava com honestidade intelectual e sinceros desejos de compreender para poder acreditar.

A Cruz – a Cruz de Cristo – ficará para todo o sempre como o sinal do Amor Maior, da Doação Suprema. Não se pode separar Cristo da Cruz porque foi nela que deu a Sua Vida para redenção dos homens e salvação da humanidade. No deserto, os que eram mordidos por serpentes olhavam para a serpente de bronze que Moisés colocara no alto de um poste e ficavam curados, nesta nossa vida corrente, olhamos para a Cristo na Cruz e ficamos curados das nossas dúvidas e medos, sentimos a tranquila certeza de que Ele vela por nós. Ninguém, seja quem for, fica imune ou indiferente a Cristo na Cruz, atrai o olhar de todos, todos têm de O ver.

Esta afirmação de Jesus Cristo: «Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele» contém toda a razão que moveu a Vontade de Deus em enviar o Seu Filho Unigénito ao mundo. O Criador via a que, a criatura humana estava irremediavelmente perdida depois do pecado de Adão e Eva, por si só, fizesse o que fizesse, não poderia salvar-se porque o “fosso” aberto pelo pecado original lhe era impossível de transpor. O Amor de Deus pelas criaturas é de tal ordem que unicamente prevê a sua salvação, ou seja, a sua companhia por toda a eternidade. Mas, esta “decisão” do Senhor tem, talvez, um objectivo principal: teria de ser de tal forma grandiosa, excedendo todo o amor de forma total e definitiva que, a partir desse momento, acontece uma clivagem tão profunda e marcante que a criatura jamais será a mesma. Mantendo a sua liberdade dá-lhe a possibilidade se ser Seu filho verdadeiro e com Ele gozar a bem aventurança eterna.

A Bíblia relata que Deus mandara Moisés colocar no alto de um poste uma serpente de bronze de modo a que quantos fossem mordidos por serpentes a olhassem e ficassem curados. Aqui, Jesus Cristo faz como que uma analogia entre este episódio e a Sua própria crucificação. «Et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum.» O Crucificado atrai o olhar de toda a humanidade, contemplar a Cruz de Cristo onde nos salvou e redimiu, é um acto de fé e de amor, de gratidão e confiança, é como que o “emblema” que o cristão transporta consigo onde quer que vá, onde quer que esteja. Tal como a tradição refere, “com este sinal… vencerás”, é o estandarte que nos guiará sempre à vitória final que é a conquista do Reino dos Céus.

Já o dissemos, mas, repetimos: Cristo e a Cruz são inseparáveis. Parece que alguns arquitectos ou decoradores de Igrejas, ignoram esta afirmação e, então, vemos imagens de Cristo pendendo de uma parede ou uma Cruz simples, sem o Crucificado. Não pode ser e NUNC COEPI chama a tenção para este assunto. Junto do altar onde se celebra a Santa Missa, - seja de lado, em cima do próprio altar ou atrás deste – tem de existir um Crucifixo bem visível por toda a assembleia.

Também a nós o Senhor nos diz constantemente:
Levanta-te, sai desse torpor, desse comodismo em que estás mergulhado e anda, vem comigo! Muitos estão à tua espera para que os assistas nas suas necessidades, fales de salvação e de esperança, de amor e solidariedade, de fé e confiança. Não fiques deitado quando podes andar, não te detenhas metido em ti mesmo e nos teus problemas. Estão à tua espera para que os ajudes a resolver os deles. Levanta-te! Anda!

A atracção autêntica, real que a Cruz exerce sobre a humanidade torna-se irresistível quando está presente o Amor. Sim, o amor autêntico tal como o do próprio Deus Criador que quis salvar-nos de nós próprios dando-nos o Seu Próprio Filho como garantia desse mesmo Amor. E o Filho levou ainda mais longe – se assim se pode dizer – esse Amor ao oferecer em holocausto a Sua Vida na Cruz. Por mais que alguns tentem fugir-lhe ou negá-la, a Cruz de Cristo está sempre presente e assim permanecerá até ao final dos tempos.

São João é radical, não deixa nada por dizer e escreve o que ouviu da própria boca de Jesus. Então, podemos dizer, que O Senhor É radical? Se radicalismo significa dizer a absoluta verdade sem qualquer desvio ou "nuance" então, podemos dizer que sim. Mais... penso que não poderia ser de outro modo porque, sendo Ele Próprio a Verdade, como poderia dizer e agir diferentemente? A Verdade não se compadece com "meias palavras", talvez para não "chocar" ou não desagradar a alguns, a Verdade é, por isso mesmo, a expressão completa da justiça e, uma vez mais afirmamos, que Deus é a própria Justiça.

São João enfatiza, mais uma vez, que o Amor de Deus pelos homens não conhece limites.Podemos perguntar que Deus é Este que quer, deseja e “paga um preço” tremendo para salvar as criaturas que Lhe pertencem – porque as criou? A resposta parece clara: É um Deus de Amor! Que o homem se salve ou não, passa a depender exclusivamente da vontade própria, Ele, o Criador, pôs à sua disposição os meios necessários e suficientes para que o consiga. Este Deus de Amor também É um Deus de Liberdade! A salvação do homem não acrescenta em nada a Sua Glória Incomensurável, mas compraz o Seu Amor Infinito.

Este mistério da Santíssima Trindade tem sido, ao longo dos tempos, desde que Jesus Cristo o revelou, estudado e meditado por inúmeras pessoas, algumas de enorme craveira, de escassa cultura, outras. Mas, a verdade, é que a revelação de Jesus se dirigia a quantos O escutavam, o povo simples, anónimo, como a todos os outros, incluindo, por exemplo, os Doutores da Lei. Assim devemos pensar que todos estamos incluídos e, sobretudo, acreditar na revelação divina e que um dia tudo se tornará claro e transparente.