Tempo comum XXII Semana
Evangelho:
Lc 4, 31-37
31 Foi a Cafarnaum,
cidade da Galileia, e ali ensinava aos sábados. 32 Admiravam-se da
Sua doutrina, porque falava com autoridade. 33 Estava na sinagoga um
homem possesso de um demónio imundo, o qual exclamou em alta voz: 34
«Deixa-nos. Que tens Tu que ver connosco, Jesus de Nazaré? Vieste para nos
perder? Sei quem és: o Santo de Deus». 35 Jesus o repreendeu,
dizendo: «Cala-te e sai desse homem». E o demónio, depois de o ter lançado por
terra no meio de todos, saiu dele sem lhe fazer nenhum mal. 36 Todos
se atemorizaram e falavam uns com os outros, dizendo: «Que é isto, Ele manda
com autoridade e poder aos espíritos imundos, e estes saem?» 37 E a
Sua fama ia-se espalhando por todos os lugares da região.
Comentário:
As pessoas que ouviam Jesus
admiravam-se da «Sua doutrina, porque falava com autoridade».
No apostolado – missão de todo o
cristão – não se pode falar sem a certeza absoluta que o que se diz é correcto.
A Doutrina bem estruturada é fundamental para que os outros possam acreditar em
nós e, como pretendemos, ser convencidos a acreditar em Jesus Cristo Nosso
Senhor.
Até ao fim da nossa vida não deve
passar um dia sem que aprofundemos a Doutrina que enforma a nossa Fé.
(ama, comentário sobre Lc 4, 31-37,
2012.09.04)
Leitura espiritual
Documentos do Magistério
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
INSTRUÇÃO
LIBERTATIS CONSCIENTIA
SOBRE A LIBERDADE CRISTÃ E A LIBERTAÇÃO
CAPÍTULO
V
A
DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA: POR UMA PRAXIS CRISTÃ DA LIBERTAÇÃO
I. Natureza da doutrina
social da Igreja
Princípios fundamentais
Critérios de julgamento
74.
Esses princípios estabelecem critérios para efectuar um julgamento acerca das
situações, das estruturas e dos sistemas sociais.
Assim,
a Igreja não hesita em denunciar as situações de vida que lesem a dignidade e a
liberdade do homem.
Tais
critérios permitem também julgar o valor das estruturas. Estas são o conjunto
das instituições e das práticas que os homens já encontram em acção ou criam,
em plano nacional e internacional, e que orientam ou organizam a vida
económica, social e política. Em si necessárias, elas tendem, frequentemente, a
fixarem-se e enrijecerem-se em mecanismos relativamente independentes da
vontade humana, paralisando ou pervertendo assim o desenvolvimento social e
gerando a injustiça. No entanto, elas dependem sempre da responsabilidade do
homem, que pode modificá-las, e não de um pretenso determinismo da história.
As
instituições e as leis, quando são conformes à lei natural e ordenadas ao bem
comum, são a garantia da liberdade das pessoas e da sua promoção. Não se pode
condenar todos os aspectos coercitivos da estabilidade de um estado de direito
digno desse nome. Pode-se falar, portanto, de estruturas marcadas pelo pecado,
mas não se pode condenar as estruturas enquanto tais.
Os
critérios de julgamento dizem respeito também aos sistemas econômicos, sociais
e políticos. A doutrina social da Igreja não propõe algum sistema particular,
mas à luz dos seus princípios fundamentais, permite ver em que medida os
sistemas existentes são ou não conformes às exigências da dignidade humana.
Primado das pessoas sobre
as estruturas
75.
A Igreja tem certamente consciência da complexidade dos problemas que as
sociedades devem enfrentar e das dificuldades de se encontrar soluções
adequadas. No entanto, ela pensa ser necessário, antes de tudo, apelar para as
capacidades espirituais e morais da pessoa e para a exigência permanente de
conversão interior, se se quiser obter mudanças económicas e sociais que
estejam realmente ao serviço do homem.
O
primado atribuído às estruturas e à organização técnica e não à pessoa e às
exigências da sua dignidade, é a expressão de uma antropologia materialista,
contrária à edificação de uma ordem social justa. 112
Entretanto,
a prioridade reconhecida à liberdade e à conversão do coração não elimina, de
forma alguma, a necessidade de uma mudança das estruturas injustas. É, portanto,
plenamente legítimo que aqueles que sofrem opressão por parte dos detentores da
riqueza ou do poder político ajam, por meios moralmente lícitos, a fim de obter
estruturas e instituições nas quais os seus direitos sejam verdadeiramente
respeitados.
A
verdade, porém, é que as estruturas instauradas para o bem das pessoas, por si
mesmas são incapazes de realizá-lo e de garanti-lo. Prova-o a corrupção que, em
certos países, atinge dirigentes e burocracia de Estado, destruindo qualquer
vida social honesta. A rectidão dos costumes é condição indispensável para a
saúde da sociedade. É preciso, pois, trabalhar, ao mesmo tempo, pela conversão
dos corações e pela melhoria das estruturas, pois o pecado que se encontra na
origem das situações injustas é, em sentido próprio e primário, um acto
voluntário que tem a sua origem na liberdade da pessoa. É só num sentido
derivado e secundário que é aplicado às estruturas e que se pode falar de
«pecado social». 113
Por
outro lado, no processo de libertação, não se pode fazer abstracção da situação
histórica da nação, nem atentar contra a identidade cultural do povo. Por
conseguinte, não se pode aceitar passivamente – e menos ainda activamente
apoiar – grupos que, pela força ou pela manipulação da opinião, se apoderem do
aparelho estatal para impor abusivamente à colectividade uma ideologia
importada, oposta aos verdadeiros valores culturais do povo. 114 A esse
propósito, convém recordar a grave responsabilidade moral e política dos
intelectuais.
Diretrizes de acção
76.
Os princípios fundamentais e os critérios de julgamento inspiram directrizes de
acção: uma vez que o bem comum da sociedade humana está ao serviço das pessoas,
os meios de acção devem ser conformes à dignidade do homem e favorecer a
educação da sua liberdade. Este é um critério seguro de julgamento e de acção:
não haverá verdadeira libertação se, desde o princípio, não forem respeitados
os direitos da liberdade.
É
preciso denunciar, no recurso sistemático à violência apresentado como caminho
necessário da libertação, uma ilusão destruidora, que abre estrada a novas
servidões. Deve condenar-se, com o mesmo vigor, a violência contra os pobres,
exercida pelos que têm posses, o arbítrio policial, como também toda forma de
violência transformada em sistema de governo. Nesses campos, é preciso saber
aprender das lições de trágicas experiências que a história do nosso século
conheceu e conhece ainda. Não se pode tampouco admitir a culpável cumplicidade
dos poderes públicos nas democracias em que a situação social de um grande
número de homens e mulheres está longe de corresponder ao que exigem os
direitos individuais e sociais constitucionalmente garantidos.
Uma luta pela justiça
77 . Quando encoraja a criação e a acção de
associações como os sindicatos, que lutam pela defesa dos direitos e dos
interesses legítimos dos trabalhadores e pela justiça social, nem por isso a
Igreja admite a teoria que vê na luta de classes o dinamismo estrutural da vida
social. A acção que preconiza não é a luta de uma classe contra outra, em vista
de obter a eliminação do adversário; ela não procede da submissão aberrante a
uma pretensa lei da história. Trata-se, antes, de uma luta nobre e ponderada,
visando a justiça e a solidariedade sociais. 115 O cristão preferirá sempre a
via do diálogo e do acordo.
Cristo
deu-nos o mandamento do amor aos inimigos. 116 No espírito do Evangelho, a
libertação é, portanto, incompatível com o ódio pelo outro, considerado
individual ou colectivamente, inclusive com o ódio ao inimigo.
O mito da revolução
78.
Situações de grave injustiça requerem a coragem de reformas em profundidade e a
supressão de privilégios injustificáveis. Porém, os que descreem do caminho das
reformas em proveito do mito da revolução, não apenas alimentam a ilusão de que
a abolição de uma situação iníqua basta por si mesma para criar uma sociedade
mais humana, mas ainda favorecem o advento de regimes totalitários. 117 A luta
contra as injustiças só tem sentido se for conduzida para a instauração de uma
nova ordem social e política conforme às exigências da justiça. Esta deve
determinar as etapas da sua instauração, já desde o início. Existe uma
moralidade dos meios. 118
Um recurso extremo
79.
Esses princípios devem ser aplicados especialmente no caso extremo do recurso à
luta armada, indicado pelo Magistério como remédio último para pôr fim a uma
«tirania evidente e prolongada, que atingisse gravemente os direitos
fundamentais das pessoas e prejudicasse perigosamente o bem comum de um país». 119
Entretanto, a aplicação concreta desse meio não pode ser encarnada, senão após
uma análise muito rigorosa da situação. Com efeito, por causa do contínuo
desenvolvimento das técnicas empregues e da crescente gravidade dos perigos
implicados no recurso à violência, o que hoje vem sendo chamado de «resistência
passiva» abre um caminho mais conforme aos princípios morais e não menos prometedor
de êxito.
Jamais
poderia admitir-se, nem por parte do poder constituído nem por parte dos grupos
sublevados, o recurso a meios criminosos como as represálias feitas contra a
população, a tortura, os métodos do terrorismo e a provocação calculada para
acarretar a morte de pessoas durante manifestações populares. São igualmente
inadmissíveis as odiosas campanhas de calúnia, capazes de destruir uma pessoa,
psíquica e moralmente.
O papel dos leigos
80.
Não compete aos Pastores da Igreja intervir directamente na construção política
e na organização da vida social. Tal tarefa faz parte da vocação dos leigos,
agindo por sua própria iniciativa, juntamente com seus concidadãos. 120 Eles
devem realizá-la, conscientes que a finalidade da Igreja é difundir o Reino de
Cristo para que todos os homens sejam salvos e que, por eles, o mundo seja efectivamente
ordenado a Cristo. 121
A
obra da salvação aparece, pois, indissoluvelmente unida à missão de melhorar e
elevar as condições da vida humana neste mundo.
A
distinção entre ordem sobrenatural da salvação e ordem temporal da vida humana
deve ser vista sob o prisma de um único desígnio de Deus, o de recapitular
todas as coisas em Cristo. É por isso que, num e outro campo, o leigo, ao mesmo
tempo fiel e cidadão, deve deixar-se guiar constantemente pela consciência
cristã. 122
A
acção social, que pode comportar uma pluralidade de caminhos concretos, terá
sempre em vista o bem comum e será conforme à mensagem e ao ensinamento da
Igreja. Evitar-se-á que a diferença de opiniões prejudique o sentido da
colaboração, conduza à paralisia dos esforços ou produza desorientação no povo
cristão.
A
orientação dada pela doutrina social da Igreja deve estimular a aquisição das
competências técnicas e científicas indispensáveis. Ela estimulará também a
busca da formação moral do carácter e o aprofundamento da vida espiritual.
Fornecendo princípios e conselhos de sabedoria, essa doutrina não dispensa a
educação para a prudência política, indispensável para o governo e gestão das
realidades humanas.
(cont)
(Revisão da versão portuguesa por ama)
____________________________________
Notas:
112
Cfr. Paulo VI, Exort. apost. Evangelii Nuntiandi, n. 18: AAS 68 (1976), 17-18;
Instr. Libertatis Nuntius, XI, 9: AAS 76 (1984), 901.
113
Cfr. João Paulo II, Exort. apost. Reconciliatio et Poenitentia, n. 16: AAS 77
(1985), 213-217.
114
Cfr. Paulo VI, Carta apost. Octogesima Adveniens, n. 25: AAS 63 (1971),
419-420.
115
Cfr. João Paulo II, Enc. Laborem Exercem, n. 20: AAS 73 (1981), 629-632; Instr.
Libertatis Nuntius, VII, 8; VIII, 5-9; XI, 11-14: AAS 76 (1984), 891-892.
894-895. 901-902.
116
Cfr. Mt 5, 44; Lc 6, 27-28. 35.
117
Cfr. Instr. Libertatis Nuntius, XI, 10: AAS 76 (1984), 905-906.
118
Cfr. João Paulo II, Homilia em Drogheda, 30 de setembro de 1979: AAS 71 (1979),
1076-1085; Documento da 3a Conferência do Episcopado latino-americano em
Puebla, nn. 533-534.
119
Paulo VI, Enc. Populorum Progressio, n. 31: AAS 59 (1967), 272-273; cfr. PIO
XI, Carta enc. Nos es muy conocida: AAS 29 (1937), 208-209.
120
Cfr. Const. past. Gaudium et Spes, n. 76 § 3; Decr. Apostolicam Actuositatem,
n. 7.
121
Cfr. Loc. cit., n. 20.
122
Cfr. Loc. cit., n. 5.