Grande Vígilia de Quinta-Feira Santa
Reflectir e
meditar (cerca de duas horas)
NOTA: Esta é uma
meditação pessoal.
Não pretende ser um
documento-guia, nem, de resto, tenho “categoria” para tal. Ao publicá-la não
tenho outro intuito de que de algum modo possa ser útil, a alguém.
Tomando como base de
meditação o Santo Evangelho, procurarei seguir a par e passo os acontecimentos
memoráveis deste dia santo.
Evangelho
«Ora, antes da festa
da páscoa, sabendo Jesus que já era chegada a sua hora de passar deste mundo
para o Pai, como havia amado os seus, que estavam no mundo, amou-os até o fim.
E, acabada a ceia, tendo o diabo posto no coração de Judas Iscariotes, filho de
Simão, que o traísse, Jesus, sabendo que o Pai tinha depositado nas suas mãos
todas as coisas, e que havia saído de Deus e ia para Deus, Disse-lhe Jesus:
Aquele que está lavado não necessita de lavar senão os pés, pois no mais todo
está limpo. Ora vós estais limpos, mas não todos. Porque bem sabia ele quem o
havia de trair; por isso disse: Nem todos estais limpos. Depois que lhes lavou
os pés, e tomou as suas vestes, e se assentou outra vez à mesa, disse-lhes:
Entendeis o que vos tenho feito? Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem,
porque eu o sou. Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós deveis
também lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como
eu vos fiz, façais vós também. Na verdade, na verdade vos digo que não é o
servo maior do que o seu senhor, nem o enviado maior do que aquele que o
enviou. Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sois se as fizerdes. Não falo
de todos vós; eu bem sei os que tenho escolhido; mas para que se cumpra a
Escritura: O que come o pão comigo, levantou contra mim o seu calcanhar. Desde
agora vo-lo digo, antes que aconteça, para que, quando acontecer, acrediteis
que eu sou. Na verdade, na verdade vos digo: Se alguém receber o que eu enviar,
me recebe a mim, e quem me recebe a mim, recebe aquele que me
enviou. Tendo Jesus dito isto, turbou-se em espírito, e afirmou,
dizendo: Na verdade, na verdade vos digo que um de vós me há-de trair. Então os
discípulos olhavam uns para os outros, duvidando de quem ele falava. Ora um de
seus discípulos, aquele a quem Jesus amava, estava reclinado no seio de Jesus.
Então Simão Pedro fez sinal a este, para que perguntasse quem era aquele de
quem ele falava. E, inclinando-se ele sobre o peito de Jesus, disse-lhe:
Senhor, quem é? Jesus respondeu: É aquele a quem eu der o bocado molhado. E,
molhando o bocado, o deu a Judas Iscariotes, filho de Simão. E após o bocado, entrou
nele Satanás. Disse pois Jesus: O que fazes, fá-lo depressa. E nenhum dos que
estavam assentados à mesa compreendeu a que propósito lhe dissera isto; Porque,
como Judas tinha a bolsa, pensavam alguns que Jesus lhe tinha dito: Compra o
que nos é necessário para a festa; ou que desse alguma coisa aos pobres. E,
tendo Judas tomado o bocado, saiu logo. E era já noite. Tendo ele, pois, saído,
disse Jesus: Agora é glorificado o Filho do homem, e Deus é glorificado nele.
Se Deus é glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e logo o há
de glorificar. Filhinhos, ainda por um pouco estou convosco. Vós me buscareis,
mas, como tenho dito aos judeus: Para onde eu vou não podeis vós ir; eu vo-lo
digo também agora. Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros;
como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto todos
conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros. Disse-lhe
Simão Pedro: Senhor, para onde vais? Jesus lhe respondeu: Para onde eu vou não
podes agora seguir-me, mas depois me seguirás. Disse-lhe Pedro: Por que não
posso seguir-te agora? Por ti darei a minha vida. Respondeu-lhe Jesus: Tu darás
a tua vida por mim? Na verdade, na verdade te digo que não cantará o galo
enquanto não me tiveres negado três vezes».
«Não se turbe o vosso
coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas
moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar. E
quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim
mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também. Mesmo vós sabeis para onde
vou, e conheceis o caminho. Disse-lhe Tomé: Senhor, nós não sabemos para onde
vais; e como podemos saber o caminho? Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a
verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim. Se vós me conhecêsseis a
mim, também conheceríeis a meu Pai; e já desde agora o conheceis, e o tendes
visto. Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, o que nos basta. Disse-lhe
Jesus: Estou há tanto tempo convosco, e não me tendes conhecido, Filipe? Quem
me vê a mim vê o Pai; e como dizes tu: Mostra-nos o Pai? Não crês tu que eu
estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não as digo
de mim mesmo, mas o Pai, que está em mim, é quem faz as obras. Crede-me que
estou no Pai, e o Pai em mim; crede-me, ao menos, por causa das mesmas obras.
Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras
que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai. E tudo
quanto pedirdes em meu nome eu o farei, para que o Pai seja glorificado no
Filho. Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei. Se me amais, guardai
os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para
que fique convosco para sempre; O Espírito de verdade, que o mundo não pode
receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita
convosco, e estará em vós. Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós. Ainda um
pouco, e o mundo não me verá mais, mas vós me vereis; porque eu vivo, e vós
vivereis. Naquele dia conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em
vós. Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda esse é o que me ama; e
aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a
ele. Disse-lhe Judas (não o Iscariotes): Senhor, de onde vem que te hás de
manifestar a nós, e não ao mundo? Jesus respondeu, e disse-lhe: Se alguém me
ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele, e faremos
nele morada. Quem não me ama não guarda as minhas palavras; ora, a palavra que
ouvistes não é minha, mas do Pai que me enviou. Tenho-vos dito isto, estando
convosco. Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu
nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos
tenho dito. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo a
dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize. Ouvistes que eu vos disse:
Vou, e venho para vós. Se me amásseis, certamente exultaríeis porque eu disse:
Vou para o Pai; porque meu Pai é maior do que eu. Eu vo-lo disse agora antes
que aconteça, para que, quando acontecer, vós acrediteis. Já não falarei muito
convosco, porque se aproxima o príncipe deste mundo, e nada tem em mim; Mas é
para que o mundo saiba que eu amo o Pai, e que faço como o Pai me mandou.
Levantai-vos, vamo-nos daqui».
«Eu sou a videira
verdadeira, e meu Pai é o lavrador. Toda a vara em mim, que não dá fruto, a
tira; e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto. Vós já estais
limpos, pela palavra que vos tenho falado. Estai em mim, e eu em vós; como a
vara de si mesma não pode dar fruto, se não estiver na videira, assim também
vós, se não estiverdes em mim. Eu sou a videira, vós as varas; quem está em
mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. Se
alguém não estiver em mim, será lançado fora, como a vara, e secará; e os
colhem e lançam no fogo, e ardem. Se vós estiverdes em mim, e as minhas
palavras estiverem em vós, pedireis tudo o que quiserdes, e vos será feito.
8 Nisto é glorificado meu Pai, que deis muito fruto; e assim sereis
meus discípulos. Como o Pai me amou, também eu vos amei a vós; permanecei no
meu amor. Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; do
mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai, e permaneço no seu
amor. Tenho-vos dito isto, para que o meu gozo permaneça em vós, e o vosso gozo
seja completo. O meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros, assim
como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida
pelos seus amigos. Vós sereis meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. Já
vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas
tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho feito
conhecer. Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei,
para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo
quanto em meu nome pedirdes ao Pai ele vo-lo conceda. Isto vos mando: Que vos
ameis uns aos outros. Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós,
me odiou a mim. Se vós fósseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas
porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo
vos odeia. Lembrai-vos da palavra que vos disse: Não é o servo maior do que o
seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se guardaram
a minha palavra, também guardarão a vossa. Mas tudo isto vos farão por causa do
meu nome, porque não conhecem aquele que me enviou. Se eu não viera, nem lhes
houvera falado, não teriam pecado, mas agora não têm desculpa do seu pecado.
Aquele que me odeia, odeia também a meu Pai. Se eu entre eles não fizesse tais
obras, quais nenhum outro tem feito, não teriam pecado; mas agora, viram-nas e
me odiaram a mim e a meu Pai. Mas é para que se cumpra a palavra que está
escrita na sua lei: Odiaram-me sem causa. Mas, quando vier o Consolador, que eu
da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito de verdade, que procede do
Pai, ele testificará de mim. E vós também testificareis, pois estivestes comigo
desde o princípio».
«Tenho-vos dito estas
coisas para que vos não escandalizeis. Expulsar-vos-ão das sinagogas; vem mesmo
a hora em que qualquer que vos matar cuidará fazer um serviço a Deus. E isto
vos farão, porque não conheceram ao Pai nem a mim. Mas tenho-vos dito isto, a
fim de que, quando chegar aquela hora, vos lembreis de que já vo-lo tinha dito.
E eu não vos disse isto desde o princípio, porque estava convosco. E agora vou
para aquele que me enviou; e nenhum de vós me pergunta: Para onde vais? Antes,
porque isto vos tenho dito, o vosso coração se encheu de tristeza. Todavia
digo-vos a verdade, que vos convém que eu vá; porque, se eu não for, o
Consolador não virá a vós; mas, quando eu for, vo-lo enviarei. E, quando ele
vier, convencerá o mundo do pecado, e da justiça e do juízo. Do pecado, porque
não crêem em mim; Da justiça, porque vou para meu Pai, e não me vereis mais; E
do juízo, porque já o príncipe deste mundo está julgado. Ainda tenho muito que
vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele
Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si
mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir. Ele
me glorificará, porque há de receber do que é meu, e vo-lo há de anunciar. Tudo
quanto o Pai tem é meu; por isso vos disse que há de receber do que é meu e
vo-lo há de anunciar.
Um pouco, e não me
vereis; e outra vez um pouco, e ver-me-eis; porquanto vou para o Pai. Então alguns
dos seus discípulos disseram uns aos outros: Que é isto que nos diz? Um pouco,
e não me vereis; e outra vez um pouco, e ver-me-eis; e: Porquanto vou para o
Pai? Diziam, pois: Que quer dizer isto: Um pouco? Não sabemos o que diz.
Conheceu, pois, Jesus que o queriam interrogar, e disse-lhes: Indagais entre
vós acerca disto que disse: Um pouco, e não me vereis, e outra vez um pouco, e
ver-me-eis? Na verdade, na verdade vos digo que vós chorareis e vos
lamentareis, e o mundo se alegrará, e vós estareis tristes, mas a vossa
tristeza se converterá em alegria. A mulher, quando está para dar à luz, sente
tristeza, porque é chegada a sua hora; mas, depois de ter dado à luz a criança,
já não se lembra da aflição, pelo prazer de haver nascido um homem no mundo. Assim
também vós agora, na verdade, tendes tristeza; mas outra vez vos verei, e o
vosso coração se alegrará, e a vossa alegria ninguém vo-la tirará. E naquele
dia nada me perguntareis. Na verdade, na verdade vos digo que tudo quanto
pedirdes a meu Pai, em meu nome, ele vo-lo há de dar. Até agora nada pedistes
em meu nome; pedi, e recebereis, para que o vosso gozo se cumpra. Disse-vos
isto por parábolas; chega, porém, a hora em que não vos falarei mais por
parábolas, mas abertamente vos falarei acerca do Pai. Naquele dia pedireis em
meu nome, e não vos digo que eu rogarei por vós ao Pai; Pois o mesmo Pai vos
ama, visto como vós me amastes, e crestes que saí de Deus. Saí do Pai, e vim ao
mundo; outra vez deixo o mundo, e vou para o Pai. Disseram-lhe os seus discípulos:
Eis que agora falas abertamente, e não dizes parábola alguma. Agora conhecemos
que sabes tudo, e não precisas de que alguém te interrogue. Por isso cremos que
saíste de Deus. Respondeu-lhes Jesus: Credes agora? Eis que chega a hora, e já
se aproxima, em que vós sereis dispersos cada um para sua parte, e me deixareis
só; mas não estou só, porque o Pai está comigo. Tenho-vos dito isto, para que
em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ánimo, eu venci o
mundo».
«Jesus falou assim e,
levantando seus olhos ao céu, disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu
Filho, para que também o teu Filho te glorifique a ti; Assim como lhe deste
poder sobre toda a carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste.
E a vida eterna é esta: que te conheçam, a ti só, por único Deus verdadeiro, e
a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu glorifiquei-te na terra, tendo consumado a
obra que me deste a fazer. E agora glorifica-me tu, ó Pai, junto de ti mesmo,
com aquela glória que tinha contigo antes que o mundo existisse. Manifestei o
teu nome aos homens que do mundo me deste; eram teus, e tu mos deste, e
guardaram a tua palavra. Agora já têm conhecido que tudo quanto me deste provém
de ti; Porque lhes dei as palavras que tu me deste; e eles as receberam, e têm
verdadeiramente conhecido que saí de ti, e creram que me enviaste. Eu rogo por
eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus. E
todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e nisso sou
glorificado. E eu já não estou mais no mundo, mas eles estão no mundo, e eu vou
para ti. Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um,
assim como nós. Estando eu com eles no mundo, guardava-os em teu nome. Tenho
guardado aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da
perdição, para que a Escritura se cumprisse. Mas agora vou para ti, e digo isto
no mundo, para que tenham a minha alegria completa em si mesmos. Dei-lhes a tua
palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do
mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do
mundo, como eu do mundo não sou. Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a
verdade. Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. E
por eles me santifico a mim mesmo, para que também eles sejam santificados na
verdade. E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela sua
palavra hão de crer em mim; Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em
mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu
me enviaste. E eu dei-lhes a glória que a mim me deste, para que sejam um, como
nós somos um. Eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade,
e para que o mundo conheça que tu me enviaste a mim, e que os tens amado a eles
como me tens amado a mim. Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver,
também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque
tu me amaste antes da fundação do mundo. Pai justo, o mundo não te conheceu;
mas eu te conheci, e estes conheceram que tu me enviaste a mim. E eu lhes fiz
conhecer o teu nome, e lho farei conhecer mais, para que o amor com que me tens
amado esteja neles, e eu neles esteja».
«Tendo Jesus dito isto,
saiu com os seus discípulos para além do ribeiro de Cedrom, onde havia um
horto, no qual ele entrou e seus discípulos. E Judas, que o traía, também
conhecia aquele lugar, porque Jesus muitas vezes se ajuntava ali com os seus
discípulos. Tendo, pois, Judas recebido a coorte e oficiais dos principais
sacerdotes e fariseus, veio para ali com lanternas, e archotes e armas.
Sabendo, pois, Jesus todas as coisas que sobre ele haviam de vir, adiantou-se,
e disse-lhes: A quem buscais? Responderam-lhe: A Jesus Nazareno. Disse-lhes Jesus:
Sou eu. E Judas, que o traía, estava com eles. Quando, pois, lhes disse: Sou
eu, recuaram, e caíram por terra. Tornou-lhes, pois, a perguntar: A quem
buscais? E eles disseram: A Jesus Nazareno. Jesus respondeu: Já vos disse que
sou eu; se, pois, me buscais a mim, deixai ir estes; Para que se cumprisse a
palavra que tinha dito: Dos que me deste nenhum deles perdi. Então Simão Pedro,
que tinha espada, desembainhou-a, e feriu o servo do sumo sacerdote,
cortando-lhe a orelha direita. E o nome do servo era Malco. Mas Jesus disse a
Pedro: Põe a tua espada na bainha; não beberei eu o cálice que o Pai me
deu? Então a coorte, e o tribuno, e os servos dos judeus prenderam a
Jesus e o maniataram».[i]
Nestas circunstâncias
difíceis para tantos seres humanos, um pouco por todo o mundo, sofrendo as
consequências devastadoras desta pandemia que assola as nossas vidas,
condicionando-as de forma tão marcante e, muitas vezes, dolorosa, com as
privações, o afastamento familiar e, sobretudo, a perda de entes queridos,
também eu procuro viver este dia – esta Quinta-Feira Santa – com os meus
sentidos colocados naquela sala onde decorre a Última Ceia Pascal de Jesus
Cristo.
Em primeirissímo lugar,
começo por dar graças a Deus, muitas graças, por poder fazê-lo na minha casa
confortável e amena, com saúde e com o espírito livre de tristezas e amarguras.
Sim, como sempre,
sinto-me abençoado pelo Senhor que não Se cansa de me cumular com o Seu cuidado
amoroso.
Como terá sido o dia de
Jesus?
Sabemos como terminou, a
ceia pascal, os acontecimentos no horto das oliveiras, o “julgameno” no
sinédrio.
Mas, antes disso?
O Senhor não vivia por
antecipação embora conhecesse o futuro tal como aconteceria com todo o detalhe.
Estaria alegre e
bem-disposto como sempre, falando com quantos O procuravam, instruindo,
doutrinando, distribuindo sem reservas o Seu interesse por cada um, escutando
com simpatia as queixas, os problemas, os pedidos. Um dia "normal",
portanto.
Mas, mais que isso,
talvez redobrasse - por assim dizer - o Seu carinho por todos, talvez, para nos
deixar uma última lição: viver cada momento com a intensidade que merece, com
todo o empenho e interesse, sem pressa nem activismo, como Ele próprio disse «a
cada dia a sua preocupação».
De facto, de que vale
viver o momento presente condicionado pelo futuro?
Acaba-se sempre por não
o viver em plenitude que é o que Ele deseja e quer.
Jesus é o mesmo de
sempre - hodie et semper - esperando por todos, recebendo
todos, acolhendo todos os que livremente O procuram.
12 No primeiro dia dos Ázimos, quando imolavam a Páscoa, os discípulos perguntaram-Lhe: «Onde queres que vamos preparar-Te a refeição da Páscoa?». 13 Então, Ele enviou dois dos Seus discípulos e disse-lhes: «Ide à cidade e encontrareis um homem levando uma bilha de água; ide atrás dele, 14 e, onde entrar, dizei ao dono da casa: “O Mestre manda dizer: Onde está a Minha sala onde hei-de comer a Páscoa com os Meus discípulos?”. 15 E ele vos mostrará uma sala superior, grande, mobilada e já pronta. Preparai-nos lá o que é preciso». 16 Os discípulos partiram e chegaram à cidade; encontraram tudo como Ele lhes tinha dito, e prepararam a Páscoa.[ii] Quando chegou a hora, pôs-se à mesa; e com Ele os Apóstolos».[iii]
Quando chegou a
hora?
Esta “nota” do
Evangelista São Lucas dá-me que pensar: que hora?
As horas têm a ver com o
“plano de vida” que, qualquer cristão deve ter.
Um plano de vida tem,
evidentemente de prever, considerar ”tempo” para o mundo – as tarefas
quotidianas – e “tempo para” Deus – as orações e particpação em actos
litúrgicos como a Santa Missa.
Mas, na verdade, esta
“distinção de tempos” não tem razão de ser, já que, as obras, as tarefas, seja
o que for, devem sempre ter como critério fazer – em tudo – a Vontade de
Deus.
Se tivermos, como
devemos, a consciência da presença de Deus, esta disposição converter-se-á num
comportamento natural.
A Ceia
Neste momento, o rito
obriga os que o presidem a falar, a interromper por breves momentos a onda
arrebatadora de cantos e cerimónias, a quebrar um silêncio que, por si só,
poderíamos considerar encantador. A grande memória da Última Ceia do Senhor,
triste e doce ao mesmo tempo, domina-nos a todos nós; o mistério eucarístico,
com a sugestividade de sua presença real e de sua validade sacrificial, absorve
-nos, encanta -nos e, por fim, torna-nos contemplativos e adoradores. Deixo
cada um de vós nesta atitude espiritual, concentrado no ponto focal desta
celebração reminiscente da instituição do Santíssimo Sacramento, e tenso no
esforço de rever a cena evangélica desta última Páscoa do Antigo Testamento e
daquela primeira Páscoa do Novo Testamento, e sentir a reflexão que ela, aquela
cena, reverbera nesta, que agora nos acolhe a todos, em quantas cenas estamos
aqui e em quantas cenas semelhantes estão sendo celebradas na Igreja.
UMA MEDITAÇÃO NECESSÁRIA
E então percebo um facto
espiritual, para o qual chamo a atenção; o facto da consciência que cada um de
nós sente surgir em si mesmo diante do mistério eucarístico em torno do qual
estamos reunidos. Sentimo-nos iluminados e aquecidos por aquele fogo central,
que é Jesus, que se faz sinal ao mesmo tempo do alimento que quer ser para a
nossa vida cristã e como vítima da nossa salvação; e perguntamo-nos qual é o
nosso comportamento, a nossa atitude espiritual e prática, como convidados da
Ceia do Senhor, como homens diante do mistério da Sua presença sacramental e
sacrificial tão prodigiosa e viva e perene. A meditação não nos distrai se, à
luz da meta atraente e radiante, que é o Cristo eucarístico, observamos, por um
momento, o comportamento dos que o rodeiam.
Não é uma consideração
nova.
Já São Paulo, a primeira
testemunha histórica da tradição litúrgica sobre este tema, descreve e critica:
“Quando vos juntais, não é assim que se faz a ceia do Senhor”[iv]. E ainda antes, o
próprio Jesus havia falado disso, quando uma disputa de precedência surgiu
entre os discípulos sentados «qual deles seria o maior»[v]; e quando Jesus, para
lhes dar uma lição de suprema humildade, quis lavar os pés dos próprios
discípulos, e Pedro protestou que isso não devia ser feito por ele, Mestre e
Senhor; mas Cristo Se impôs condicionando a participação na Sua mesa para
acolher, compreender, imitar o mistério da humildade, o Kénosis [vi] que envolve toda a
economia da revelação divina. Toda a história da Ceia pode ser comentada, quase
como um quadro do que Jesus fez e disse na época, observando o comportamento da
pequena comunidade, a começar pelo clima de intimidade singular, que aí reina,
pelo menos em alguns momentos, quase de sentimentalismo afectuoso[vii], de doçura profunda[viii], depois do espanto
angustiado com o anúncio de uma traição iminente[ix] e, portanto, de
grande tristeza, porque Jesus deixa entender o Seu fim terreno iminente[x] e prediz as
tribulações destinadas aos seguidores fiéis[xi], E, finalmente,
da suspensão mística das almas, quando Jesus desabafa nos discursos reveladores
do Paráclito, animador de uma nova forma de vida interior e eclesial, que
respira amor, verdade e unidade.
O SACRAMENTO DE
EMMANUEL: DEUS CONOSCO
Bastaria respirar um
pouco aquela atmosfera da Última Ceia, doce e dolorosa, profunda e aberta,
fortemente humana e primorosamente espiritual, para compreender algo do
mistério eucarístico e sentir-se embriagado pelo surrealismo evangélico. Os
piedosos, os meditativos, os místicos sabem disso; os adoradores da Eucaristia
sabem disso.
Para nós agora basta um
corolário, ao qual cada um pode remeter para futuras reflexões: o culto
eucarístico não se esgota no acto litúrgico que o gera; ele requer um entendimento,
uma reflexão, uma espiritualidade, que deve dar a cada fiel e para toda a
comunidade no sentido sacramental de Emmanuel, de Deus conosco[xii]. Por outras palavras,
uma renovação, um renascimento da piedade eucarística, como a teologia do
"mistério da fé", a advertência da instituição simultânea do
sacerdócio ministerial, que isso acarreta, e o espírito da reforma litúrgica
conciliar hoje exigem do Povo de Deus.
Talvez os próprios
discípulos, presentes na Ceia do Senhor, fossem um pouco como nós, não
totalmente conscientes do que havia acontecido com as estranhas palavras de
Jesus: «Este é o meu corpo» , «Este é o cálice do meu sangue».
Eles também precisaram
entender mais tarde.
É sempre assim com as
revelações divinas que por causa de formas sensíveis; exigem um repensar
posterior, uma penetração profunda[xiii]. E que esse espaço de tempo
entre o que Jesus fez e disse naquela noite e a compreensão dos discípulos foi
notável é mostrada pelas atitudes dos próprios discípulos, que estamos
observando.
O NOVO MANDAMENTO
Pedro.
Falamos sobre seu
comportamento rebelde no início, depois dócil ao excesso.
Após a promulgação do
novo mandamento do amor mútuo[xiv], ele, curiosamente,
refere-se a uma palavra anterior de Jesus: «Para onde eu for, vós não podeis
ir»[xv], sem falar - dando
assim a impressão de não apreender a sua enorme importância - ao grande
preceito da caridade, há pouco proclamado pelo Divino Mestre.
Com efeito, o interesse
do Apóstolo expressa-se nesta pergunta: «Senhor, para onde vais? quo vadis
Domine?»[xvi]. E então quando Jesus,
transbordando de tristeza, revela a próxima traição de um dos convidados[xvii] , e a fuga dos
próprios discípulos, Pedro protesta com a sua generosidade impetuosa, ignorando
a advertência premonitória do Senhor: «Em verdade te digo: ainda esta noite,
antes que o galo tenha cantado duas vezes, três vezes me terás negado a mim»[xviii].
Episódio horrível, que
ferirá profundamente o coração de Cristo[xix], e que custará a Pedro
as lágrimas mais amargas[xx], e a reparação com um
triplo certificado de amor[xxi].
Caberá àqueles que
primeiro falarem convosco fazerem dela um tema de meditação perene, e a todos
aqueles, ministros e fiéis que se sentam à mesa do Senhor, reflictam quão
frágil e inconstante é a nossa fidelidade, e quanto ela sempre precisa.
O carisma, que também
naquele momento dramático o misericordioso Jesus quis assegurar ao próprio
Pedro; Oh! ouçam as palavras poderosas e doces: ‘Simão, Simão! Aqui está que
Satanás obteve permissão para te peneirar como tu peneiras o trigo. Mas eu orei
por ti (pensemos! Jesus orando pelo apóstolo escolhido por ele para o
fundamento da Sua Igreja!)[xxii]; «Rezei por ti, para
que a tua fé não desfaleça, e tu, quando te convertes, confirma os teus irmãos»[xxiii].
É bom ouvir estas palavras,
que fazem parte do relato da instituição da Eucaristia, e repensá-las aqui e
neste momento!
Então, entre os
personagens da Última Ceia, não podemos esquecer outro protagonista.
É comovente vê-lo
sentado no ágape pascal. E não podemos sufocar a emoção relendo a narrativa do
Evangelho, e vendo como a presença do traidor pesa no coração do Mestre,
que «de espírito perturbado»[xxiv] não quis mais
conter o opressor segredo: «Na verdade, eu digo a verdade: um de vós vai
trair-me»[xxv].
Sabemos o resto; como
aconteceu discretamente a identificação do traidor e como ele, descoberto,
furtivamente saiu do Cenáculo: «Era noite»", conclui o Evangelista[xxvi].
“E ele mesmo saiu era
noite”, comenta Santo Agostinho[xxvii].
Quem não sente arrepios
no coração ao ouvir o comentário ainda mais sério e terrível de Jesus: «Teria
sido melhor se aquele homem nunca tivesse nascido!»[xxviii].
IMPLORAÇÃO ESPECIAL DE
JESUS: O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA
Irmãos!
Não consigo pensar neste
trágico drama pascal sem a lembrança do abandono, da fuga de tantos Irmãos sacerdotais
do nosso cenáculo como "dispensadores dos mistérios de Deus"[xxix].
Eu sei, eu sei; devemos
distinguir caso a caso, devemos compreender, devemos ter pena, devemos perdoar,
e talvez devamos esperar novamente, e devemos sempre amar.
E recordo no amor
angustiado que mesmo estes confrades, infelizes ou desertores que o são, são
marcados pela marca indelével do Espírito, que os qualifica como Sacerdotes
para sempre, qualquer que seja a metamorfose por que passam exterior e
socialmente e muitos deles por eles próprios, por razões terrenas vis, afirmam.
Mas como deixar de
perceber, nesta hora de comunhão, as vagas desses que um dia foram nossos
comensais?
Como não clamar pela
deserção consciente de alguns, como não deplorar a mediocridade moral que
gostaria de achar natural e lógico quebrar a própria promessa, há muito
premeditada, solenemente professada diante de Cristo e da Igreja?
Como, esta noite, não
rezar por esses irmãos fugitivos e pelas comunidades que eles deixaram e
escandalizaram?
Como não intensificar a
nossa invocação afectuosa pela nova geração de ministros, que na nossa Igreja
latina, acolhendo o sacerdócio, realizam livre e conscientemente a sua opção
generosa pelo único amor por Cristo, pelo único serviço à Igreja, pelo
ministério único e total aos irmãos, consumindo assim na própria carne “o que
ainda falta na paixão de Cristo”[xxx], para que o seu
sacrifício de amor seja válido como sinal, como exemplo, como mérito da
eficácia da Redenção na nossa era moderna secularizada e hedonista?
Sim, então vamos orar.
E para completar a nossa
escuta, deixaremos então que as respostas divinas ecoem aos outros
interlocutores da Última Ceia, a Tomé, Filipe, Tadeuo e os Onze restantes; e
uma entre todas as respostas dadas a Tomé, sempre positivas e concretas nas
suas perguntas: «Senhor, não sabemos para onde vais; como saberemos então o
caminho? ».
E Jesus responde: "Eu
sou o caminho, a verdade e a vida"[xxxi].
A resposta, a grande
resposta, também se aplica a todos nós esta noite. E para sempre.
UT SINT OMNES UNUM!
E, por fim, recordo a
impressão resumida que o olhar dirigido ao grupo em torno do acto instituinte
da Eucaristia suscita nas mentes; a impressão de que descobre uma realidade
produzida no Cenáculo, a união dos Onze com Cristo, na verdade a unidade, uma
unidade nova e sobrenatural; ela é anunciada como facto incipiente e final pelo
próprio Cristo no final dos discursos incomparáveis daquela última
noite: ut sint unum, que todos sejam um![xxxii]
A Eucaristia, vista em
quem nela participa, é comunhão; comunhão em Cristo, comunhão com os
irmãos solidários na mesma fé e na mesma caridade: é a Igreja! A Igreja é
comunhão.
E estou feliz por
expressar o voto, que vejo aqui cumprido nesta celebração da Quinta-feira
Santa: a vossa presença torna-se comunhão! Saúdo e abençoo esta comunhão! Saúdo
com o sentimento de formar um só Corpo todos nós, que partilhamos do mesmo Pão[xxxiii], os membros do Sagrado
Colégio aqui presentes e os Prelados da Cúria Romana; Saúdo o Cardeal Vigário,
Arcipreste desta Basílica com o clero que a ela pertence, e o presbitério
romano que lhe pertence, com todo o povo romano; Saúdo o Presidente da Câmara,
o Primeiro Magistrado da Cidade e as demais personalidades civis
representativas que participaram neste rito de harmonia e paz; Saúdo o Corpo
Diplomático e os notáveis da Cidade, as Associações Católicas e todos os
fiéis presentes; e a saudação de unidade estende-se a toda a Santa Igreja
Católica, onde quer que ela celebre a Quinta-feira Santa; e também alcança
horizontes ecuménicos com esperança amorosa; a toda a humanidade, para que
encontre paz e harmonia.
Ut sint omnes unum: que todos sejam um!
Cristo é o princípio e o
centro da verdadeira e superior unidade humana e da comunhão sobrenatural que
Nós, nesta noite, bênção em Seu nome, celebramos aqui![xxxiv]
E sentaram-se à mesa.
Imaginei, ou melhor,
vivi esta “Última Ceia” tantas vezes ao largo da minha longa vida que posso
dizer que conheço de cor todas as palavras trocadas, os gestos, as atitudes,
enfim… os detalhes de quanto se passou naquela «sala no andar de cima»[xxxv]
Logo no início começa
uma discussão entre os doze.
Houve ainda uma
discussão entre eles sobre qual deles devia ser considerado o maior. Jesus,
porém, lhes disse: “Os reis das nações dominam sobre elas, e os que exercem o
poder se fazem chamar benfeitores. Entre vós, não deve ser assim. Pelo
contrário, o maior entre vós seja como o mais novo, e o que manda, como quem
está servindo. Afinal, quem é o maior: o que está à mesa ou o que está
servindo? Não é aquele que está à mesa? Eu, porém, estou no meio de vós como
aquele que serve. Vós sois aqueles que permaneceram comigo em minhas provações.
Por isso, assim como o meu Pai me confiou o Reino, eu também vos confio o
Reino. Havereis de comer e beber à minha mesa no meu Reino, e vos sentareis em
tronos para julgar as doze tribos de Israel.[xxxvi]
Ser o maior?
Por estranho que possa parecer deixo-me arrastar por este sentimento espúrio e sem nenhum sentido.
Tenho, forçosamente, de
Lhe dizer com o coração nas mãos: Senhor: Quase que não vejo a necessidade
de Te pedir humildade.
Ser humilde é, para mim,
um objectivo que persigo desde sempre. Sempre longe, parece, cada vez mais
distante porque, pobre de mim, sou formado por este barro duro e seco que é o
meu carácter, que resiste a ser moldado pelas Tuas divinas mãos.
Mas não Te importes
Senhor, não Te importes com este barro que não vale nada.
Parte-o, esfrangalha-o
nas Tuas mãos amorosas e, estou certo, daí sairá algo que se possa - que Tu
possas - aproveitar.
Não dês importância à
minha prosápia, à minha vaidade, ao meu desejo incontido de protagonismo e
evidência.
A verdade, que Te
confesso, é esta: Não sei nada, não posso nada, não tenho nada, não valho nada,
não sou absolutamente nada.
O cristão tem uma
“categoria” excepcional: É a imagem e semelhança de Deus; é filho de
Deus.
Nenhum outro vínculo ou
atributo é maior que este. Mas nem por isso se pode vangloriar mas, antes,
agradecer o que lhe foi graciosamente dado, pelo seu Criador.
O exemplo de Jesus
Cristo deve impedir-me de me atribuir qualquer importância, sim… porque Ele,
sendo Homem Perfeito e Perfeito Deus, Se humilhou até à morte e Morte de
Cruz.
A criatura é mais
autenticamente humana na medida em que aperfeiçoa a imagem e a semelhança de
Deus.
Nesta determinação o
homem e a mulher encontram o sentido mais profundo e mais feliz da sua
existência.
Temos que rejeitar a
ideia, desgraçadamente difundida, de que imitar Cristo supõe um nível de
conduta que nos supera.
Nada mais longe da verdade.
Enquanto não nos
persuadirmos de que, com a graça de Deus, podemos conseguir essa identificação,
significa que continuamos a pactuar com a mediocridade, renunciando à
incomparável aventura de tratar Cristo de perto, como Amigo, Irmão, Mestre,
Médico.[xxxvii]
A traição de Judas
«…enquanto eles comiam,
disse: «Amen vos digo: um de vós me há de entregar». Profundamente
entristecidos, começou cada um a perguntar-lhe: «Não sou eu, Senhor, pois
não?». Ele, respondendo, disse: «O que pôs comigo a mão no prato, esse me
entregará. De facto, o Filho do Homem parte, tal como está escrito acerca dele,
mas ai daquele homem por quem o Filho do Homem é entregue! Melhor seria para
esse homem não ter nascido». Em resposta, Judas, que o ia entregar, disse: «Não
sou eu, Rabi, pois não?». Ele disse-lhe: «Tu o disseste!».[xxxviii]
Não consigo compreender
e, como não compreendo, tenho dificuldade em aceitar.
Como é possível que um
homem que conviveu com Jesus durante três anos, assistindo, acompanhando a Sua
vida diária, ouvido os Seus discursos, presenciando os Seus milagres seja capaz
de uma acto tão torpe como a traição!
A única explicação que
encontro é… uma alma corrompida e, a corrupção é sempre o resultado de uma
ambição desordenada que tolda, escurece, os verdadeiros motivos que levam a
seguir alguém ou a abraçar uma causa.
Percebemos, hoje, que os
verdeiros motivos que levaram Judas a seguir Jesus foram apenas o
que a sua “filiação de zelota” descobria em Jesus: Um chefe extraordinário, um
líder incontestado, carisma, valor, potência, capacidade… tudo quanto um verdadeiro
chefe precisa para conduzir outros a um objectivo superior, e, neste
caso, Jesus seria esse chefe, o líder que conduziria a nação à liberdade do
jugo romano, à conquista do seu lugar primordial entre as nações de então.
Judas seguia Jesus sem O
ouvir, sem O entender, sem dar qualquer importância às Suas palavras de amor,
de vida eterna.
Apenas via as multidões
que O seguiam ávidas de O ouvir, “dominadas” pelo desejo genuíno de entender a
Sua doutrina.
E, nestas multidões
sonhava com os seguidores da “grande revolta triunfante.
Motivos meramente
humanos, portanto, quando, para seguir Jesus os motivos têm de ser inteiramente
outros: enformados pelo amor e não pelo ódio; pela solidariedade e não pelo
exclusivo; pela união e não pela divisão; pela verdade substancial e não pelo
sonho mais ou menos quimérico.
Judas não é de facto um
homem sério, honesto, procura aproveitar-se de um ensejo para alcançar um fim
sem ter em conta se o que pretende usar é conveniente para tal.
E… pasmo! Jesus não
sabia quem era Judas?
Os motivos, a razão
porque O seguia?
Evidentemente que sim!
Jesus sabia tudo, o
passado, o presente e o futuro mas, o Seu Amor infinito esperaria uma
reconvenção do discípulo, como que um cair em si e, constatando o seu engano,
afastar-se ou, o que realmente esperava, converter-se à Sua doutrina e abraçar
decididamente a esperança de alcançar o Reino de Deus.
Assim, depois de pensar
mais um pouco já compreendo e, portanto, aceito.
Deus espera sempre o
nosso arrependimento e dá-nos todas as oportunidades para para tal mas, porque
é sumamente Justo, não pode mais que respeitar a nossa liberdade que Ele
Próprio nos deu, mesmo quando o uso dessa liberdade seja causa da nossa
perdição.
E, humanamente
considerando, porque não posso fazer de outra forma, o uso da liberdade pessoal
de cada um é de sua exclusiva responsabilidade quando não, seria falsa.
A questão da liberdade
que os seres humanos possuem tem sido, ao longo dos tempos, motivo de debates e
questões.
Alguns aduzem que não
somos inteiramente livres porque devemos obediência a Deus e, se não
formos obedientes, sofreremos um castigo.
Pessoalmente vejo assim:
Eu sou um ser criado.
Não tive qualquer
interferência na minha criação logo, não posso atribuir-me uma propriedade
minha.
Serei, quando muito, um istrumento
do meu criador e, porque ele me dotou de inteligência e vontade será
absolutamente lógico e natural que faça o que Ele quer que faça e da forma
melhor e mais perfeita que as minhas capacidades permitirem.
Se assim proceder vou ao
encontro dos desejos “objectivos” do Criador e, obviamente satisfaço a Sua
vontade a meu respeito.
Ele não tem porque
dar-me um prémio por ter cumprido quanto devia mas considera-me verdadeiramente
seu e chama-me para a sua companhia.
Este é, de facto, o
“prémio” porque estar na intimidade do criador é o maior bem a que posso
aspirar.
Considerando, agora, que
opto por não fazer o que devo, ou o faço a contragosto, sem esmero – mal-feito
-, o resultado não o posso entregar a quem mo pediu sob pena de não ser
aceite.
Um trabalho
deficientemente feito, mal acabado, não é aceite por quem
no-lo encomendou, antes é atirado fora por não ter o préstimo que
deveria ter.
O Criador continuará a
desejar que eu reconsidere “refazer” o mal-feito e, enquanto o não fizer,
manter-se-á a distância entre o Criador e o criado.
Esta situação é, de
facto um castigo.
Resumindo assim: Faço o
que devo obtenho… um prémio; não faço o bem que devo… sou castigado… parece
que, de facto, não sou livre de fazer ou não fazer conforme me apeteça!
Esta é uma falsa lógica
que conduz, óbviamente, a uma conclusão profundamente errada.
Que satisfação posso ter
em possuir um cavalo que não consente que o cavalgue?
De facto… tenho um
cavalo, mas, não me serve para nada.
Transpondo para o meu
Criador, Deus, de que Lhe sirvo se não faço a Sua Vontade tal e como Ele
deseja?
Manter-me-á como Seu e
continua a contar comigo para o que quer de mim.
Ao longo da minha vida
foi-me dando abundantes bens, lições, conhecimentos, talentos para eu poder
fazer – bem – o que devo.
Se eu desprezo esses
bens, lições, conhecimentos, talentos não os pondo em prática fico sem meios
para cumprir o que de mim legítmamente espera.
Para que serve um
estudante que não estuda?[xxxix]
A resposta será: Serve…
para nada!
Em primeiro lugar, não
aprende; depois consome recursos da família sem qualquer fruto ou retorno;
desgosta os que lhe querem bem e desejam a sua felicidade; compromete o seu
futuro pessoal; vive enganando-se a si mesmo e enganando os outros.
Volto a considerar o meu
papel como ser criado por Deus.
Na verdade muitas vezes
me interrogo qual é a Sua Vontade?
Sim… neste momento,
nestas circunstâncias específicas o que Ele quer que faça?
Com a humildade que sou
capaz de reunir, dirigi-me confiadamente a Ele: Domine; quid me vis facere?
Docere me facere
voluntatem tuam quia Deus meus es tu!
Este, quero que seja o
meu lema-objectivo diário, constante.
Ajuda-me, Senhor, a
concretizá-lo
E, depois, peço mais
ajuda: Minha Mãe, Maria Santíssima, São José meu Pai e Senhor, Anjo da Minha
Guarda tomai-me pela mão para que não me desvie do meu caminho.
Fico tranquilo.
Molhando o bocado, deu-o
a Judas Iscariotes, filho de Simão. E, após o bocado, entrou nele Satanás.
Disse, pois, Jesus: O que fazes, faze-o depressa.[xl] E, tendo Judas
tomado o bocado, saiu logo. E era já noite. E nenhum dos que estavam assentados
à mesa compreendeu a que propósito lhe dissera isto. Porque, como Judas tinha a
bolsa, pensavam alguns que Jesus lhe tinha dito: Compra o que nos é necessário
para a festa; ou que desse alguma coisa aos pobres.[xli]
Jesus retoma a palavra
para, num longo discurso, lhes falar de Amor, do que os espera, da fé e
confiança que têm de ter n'Ele.
Vou deter-me com
redobrada atenção em cada palavra que os Evangelistas fazem constar.
Sinto que me são
dirigidas a mim para que me dê conta do seu real significado, da “substância”
que contêm.
Sim… são palavras de
vida, da vida que, decididamente quero viver.
Ora, antes da festa da
páscoa, sabendo Jesus que já era chegada a sua hora de passar deste mundo para
o Pai, como havia amado os seus, que estavam no mundo, amou-os até o
fim. E, acabada a ceia, tendo o diabo posto no coração de Judas
Iscariotes, filho de Simão, que o traísse, Jesus, sabendo que o Pai
tinha depositado nas suas mãos todas as coisas, e que havia saído de Deus e ia
para Deus, Disse-lhe Jesus: Aquele que está lavado não necessita de
lavar senão os pés, pois no mais todo está limpo. Ora vós estais limpos, mas
não todos. Porque bem sabia ele quem o havia de trair; por isso
disse: Nem todos estais limpos. Depois que lhes lavou os pés, e
tomou as suas vestes, e se assentou outra vez à mesa, disse-lhes: Entendeis o
que vos tenho feito? Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem,
porque eu o sou. Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós
deveis também lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei o
exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também. Na verdade, na verdade
vos digo que não é o servo maior do que o seu senhor, nem o enviado maior do
que aquele que o enviou. Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sois se as
fizerdes. Não falo de todos vós; eu bem sei os que tenho escolhido;
mas para que se cumpra a Escritura: O que come o pão comigo, levantou contra
mim o seu calcanhar. Desde agora vo-lo digo, antes que aconteça,
para que, quando acontecer, acrediteis que eu sou. Na verdade, na verdade vos
digo: Se alguém receber o que eu enviar, me recebe a mim, e quem me recebe a
mim, recebe aquele que me enviou.[xlii]
Não se turbe o vosso
coração; credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há
muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos
lugar. E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos
levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós
também. Mesmo vós sabeis para onde vou, e conheceis o
caminho. Disse-lhe Tomé: Senhor, nós não sabemos para onde vais; e
como podemos saber o caminho? Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a
verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim. Se vós me
conhecêsseis a mim, também conheceríeis a meu Pai; e já desde agora o
conheceis, e o tendes visto. Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o
Pai, o que nos basta. Disse-lhe Jesus: Estou há tanto tempo
convosco, e não me tendes conhecido, Filipe? Quem me vê a mim vê o Pai; e como
dizes tu: Mostra-nos o Pai? Não crês tu que eu estou no Pai, e que o
Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não as digo de mim mesmo, mas o
Pai, que está em mim, é quem faz as obras. Crede-me que estou no
Pai, e o Pai em mim; crede-me, ao menos, por causa das mesmas
obras. Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim
também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou
para meu Pai. E tudo quanto pedirdes em meu nome eu o farei, para
que o Pai seja glorificado no Filho. Se pedirdes alguma coisa em meu
nome, eu o farei. Se me amais, guardai os meus
mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador,
para que fique convosco para sempre; O Espírito de verdade, que o
mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis,
porque habita convosco, e estará em vós. Não vos deixarei órfãos;
voltarei para vós. Ainda um pouco, e o mundo não me verá mais, mas
vós me vereis; porque eu vivo, e vós vivereis. Naquele dia
conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em vós. Aquele
que tem os meus mandamentos e os guarda esse é o que me ama; e aquele que me
ama será amado de meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a
ele. Disse-lhe Judas (não o Iscariotes): Senhor, de onde vem que te
hás de manifestar a nós, e não ao mundo? Jesus respondeu, e
disse-lhe: Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e
viremos para ele, e faremos nele morada. Quem não me ama não guarda
as minhas palavras; ora, a palavra que ouvistes não é minha, mas do Pai que me
enviou. Tenho-vos dito isto, estando convosco. Mas aquele
Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará
todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho
dito. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o
mundo a dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize. Ouvistes
que eu vos disse: Vou, e venho para vós. Se me amásseis, certamente exultaríeis
porque eu disse: Vou para o Pai; porque meu Pai é maior do que
eu. Eu vo-lo disse agora antes que aconteça, para que, quando
acontecer, vós acrediteis. Já não falarei muito convosco, porque se
aproxima o príncipe deste mundo, e nada tem em mim; Mas é para que o
mundo saiba que eu amo o Pai, e que faço como o Pai me mandou. Levantai-vos,
vamo-nos daqui.[xliii]
Eu sou a videira
verdadeira, e meu Pai é o lavrador. Toda a vara em mim, que não dá fruto, a
tira; e limpa toda aquela que dá fruto, para que dê mais fruto. Vós já estais
limpos, pela palavra que vos tenho falado. Estai em mim, e eu em vós; como a
vara de si mesma não pode dar fruto, se não estiver na videira, assim também
vós, se não estiverdes em mim. Eu sou a videira, vós as varas; quem está em
mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. Se
alguém não estiver em mim, será lançado fora, como a vara, e secará; e os
colhem e lançam no fogo, e ardem. Se vós estiverdes em mim, e as minhas
palavras estiverem em vós, pedireis tudo o que quiserdes, e vos será
feito.Nisto é glorificado meu Pai, que deis muito fruto; e assim sereis meus
discípulos. Como o Pai me amou, também eu vos amei a vós; permanecei no meu
amor. Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor; do mesmo
modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai, e permaneço no seu amor.
Tenho-vos dito isto, para que o meu gozo permaneça em vós, e o vosso gozo seja
completo. O meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros, assim como eu
vos amei. Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos
seus amigos. Vós sereis meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando. Já vos não
chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos
chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho feito conhecer.
Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei, para que
vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto em meu
nome pedirdes ao Pai ele vo-lo conceda. Isto vos mando: Que vos ameis uns aos
outros. Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós, me odiou a mim. Se
vós fósseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas porque não sois do
mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos
odeia. Lembrai-vos da palavra que vos disse: Não é o servo maior do
que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se
guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa. Mas tudo isto
vos farão por causa do meu nome, porque não conhecem aquele que me
enviou. Se eu não viera, nem lhes houvera falado, não teriam pecado,
mas agora não têm desculpa do seu pecado. Aquele que me odeia, odeia
também a meu Pai. Se eu entre eles não fizesse tais obras, quais
nenhum outro tem feito, não teriam pecado; mas agora, viram-nas e me odiaram a
mim e a meu Pai. Mas é para que se cumpra a palavra que está escrita
na sua lei: Odiaram-me sem causa. Mas, quando vier o Consolador, que
eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito de verdade, que procede
do Pai, ele testificará de mim. E vós também testificareis, pois estivestes
comigo desde o princípio.[xliv]
Tenho-vos dito estas
coisas para que vos não escandalizeis. Expulsar-vos-ão das sinagogas; vem mesmo
a hora em que qualquer que vos matar cuidará fazer um serviço a Deus. E isto
vos farão, porque não conheceram ao Pai nem a mim. Mas tenho-vos dito isto, a
fim de que, quando chegar aquela hora, vos lembreis de que já vo-lo tinha dito.
E eu não vos disse isto desde o princípio, porque estava convosco. E agora vou
para aquele que me enviou; e nenhum de vós me pergunta: Para onde vais? Antes,
porque isto vos tenho dito, o vosso coração se encheu de tristeza. Todavia
digo-vos a verdade, que vos convém que eu vá; porque, se eu não for, o
Consolador não virá a vós; mas, quando eu for, vo-lo enviarei. E, quando ele
vier, convencerá o mundo do pecado, e da justiça e do juízo. Do pecado, porque
não crêem em mim; Da justiça, porque vou para meu Pai, e não me vereis mais; E
do juízo, porque já o príncipe deste mundo está julgado. Ainda tenho muito que
vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele
Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si
mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir. Ele
me glorificará, porque há de receber do que é meu, e vo-lo há de anunciar. Tudo
quanto o Pai tem é meu; por isso vos disse que há de receber do que é meu e
vo-lo há de anunciar. Um pouco, e não me vereis; e outra vez um pouco, e
ver-me-eis; porquanto vou para o Pai. Então alguns dos seus discípulos disseram
uns aos outros: Que é isto que nos diz? Um pouco, e não me vereis; e outra vez
um pouco, e ver-me-eis; e: Porquanto vou para o Pai? Diziam, pois: Que quer
dizer isto: Um pouco? Não sabemos o que diz. Conheceu, pois, Jesus que o
queriam interrogar, e disse-lhes: Indagais entre vós acerca disto que disse: Um
pouco, e não me vereis, e outra vez um pouco, e ver-me-eis? Na verdade, na
verdade vos digo que vós chorareis e vos lamentareis, e o mundo se alegrará, e
vós estareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em
alegria. A mulher, quando está para dar à luz, sente tristeza,
porque é chegada a sua hora; mas, depois de ter dado à luz a criança, já não se
lembra da aflição, pelo prazer de haver nascido um homem no mundo. Assim também
vós agora, na verdade, tendes tristeza; mas outra vez vos verei, e o vosso
coração se alegrará, e a vossa alegria ninguém vo-la tirará. E naquele dia nada
me perguntareis. Na verdade, na verdade vos digo que tudo quanto pedirdes a meu
Pai, em meu nome, ele vo-lo há de dar. Até agora nada pedistes em meu nome;
pedi, e recebereis, para que o vosso gozo se cumpra. Disse-vos isto por
parábolas; chega, porém, a hora em que não vos falarei mais por parábolas, mas
abertamente vos falarei acerca do Pai. Naquele dia pedireis em meu nome, e não
vos digo que eu rogarei por vós ao Pai; Pois o mesmo Pai vos ama, visto como
vós me amastes, e crestes que saí de Deus. Saí do Pai, e vim ao mundo; outra
vez deixo o mundo, e vou para o Pai. Disseram-lhe os seus discípulos: Eis que
agora falas abertamente, e não dizes parábola alguma. Agora conhecemos que
sabes tudo, e não precisas de que alguém te interrogue. Por isso cremos que
saíste de Deus. Respondeu-lhes Jesus: Credes agora? Eis que chega a hora, e já
se aproxima, em que vós sereis dispersos cada um para sua parte, e me deixareis
só; mas não estou só, porque o Pai está comigo. Tenho-vos dito isto, para que
em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ánimo, eu venci o
mundo.[xlv]
Jesus falou assim e,
levantando seus olhos ao céu, disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu
Filho, para que também o teu Filho te glorifique a ti; Assim como lhe deste
poder sobre toda a carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste.
E a vida eterna é esta: que te conheçam, a ti só, por único Deus verdadeiro, e
a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu glorifiquei-te na terra, tendo consumado a
obra que me deste a fazer. E agora glorifica-me tu, ó Pai, junto de ti mesmo,
com aquela glória que tinha contigo antes que o mundo existisse. Manifestei o
teu nome aos homens que do mundo me deste; eram teus, e tu mos deste, e
guardaram a tua palavra. Agora já têm conhecido que tudo quanto me deste provém
de ti; Porque lhes dei as palavras que tu me deste; e eles as receberam, e têm
verdadeiramente conhecido que saí de ti, e creram que me enviaste. Eu rogo por
eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus. E
todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e nisso sou
glorificado. E eu já não estou mais no mundo, mas eles estão no mundo, e eu vou
para ti. Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um,
assim como nós. Estando eu com eles no mundo, guardava-os em teu nome. Tenho
guardado aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da
perdição, para que a Escritura se cumprisse. Mas agora vou para ti, e digo isto
no mundo, para que tenham a minha alegria completa em si mesmos. Dei-lhes a tua
palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do
mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do
mundo, como eu do mundo não sou. Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a
verdade. Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. E
por eles me santifico a mim mesmo, para que também eles sejam santificados na
verdade. E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela
sua palavra hão de crer em mim; Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és
em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que
tu me enviaste. E eu dei-lhes a glória que a mim me deste, para que
sejam um, como nós somos um. Eu neles, e tu em mim, para que eles sejam
perfeitos em unidade, e para que o mundo conheça que tu me enviaste a mim, e
que os tens amado a eles como me tens amado a mim. Pai, aqueles que me deste
quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha
glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo. Pai justo,
o mundo não te conheceu; mas eu te conheci, e estes conheceram que tu me
enviaste a mim. E eu lhes fiz conhecer o teu nome, e lho farei conhecer
mais, para que o amor com que me tens amado esteja neles, e eu neles esteja.[xlvi]
E, finalmente, pratica
este amor pelos homens oferecendo-Se como alimento para todo o sempre e, mais,
garante que o milagre se repetirá sempre que repetirem aquelas palavras e
aqueles gestos em Sua memória.
Tomou um pão e, depois
de dar graças, partiu-o e deu-lho, dizendo: Isto é o Meu corpo, que vai ser
dado por vós; fazei isto em Minha memória. Depois de jantar, fez o mesmo com o
cálice, dizendo: Este cálice é a nova Aliança no Meu sangue, que por vós se vai
derramar»[xlvii]
Este milagre de puro
amor – talvez que, maior que o Sacrifício da Cruz – renova-se constantemente,
por Sua Vontade expressa, no Santo Sacrifício da Missa.
De facto, na Cruz,
Cristo merece-nos a Redenção e a Salvação Eterna, numa imolação cruenta,
terrível, excepcionalmente humilhante e completa.
Na Eucaristia a Sua
humilhação é bem expressa ao converter pão e vinho no Seu Corpo e no Seu Sangue
para servir de alimento – perene – a todos os homens.
Fico abismado com a
magnitude desta humilhação do Senhor de quanto existe em consubstanciar-Se em
alimento que, por sua vez, - na Comunhão Eucaristica e enquanto as Sagradas
Espécies subsistirem - se transforma no meu corpo e sangue!
“Apoiado nesta fé da
Igreja, o Concílio de Trento confessa “aberta e simplesmente que no
fortalecedor sacramento da Eucaristia, depois da consagração do pão e do vinho,
se contém verdadeira, real e substancialmente, Nosso Senhor Jesus Cristo,
verdadeiro Deus e verdadeiro homem, sob a aparência daquelas coisas sensíveis”.[xlviii] Portanto, o
nosso Salvador está presente segundo a Sua humanidade, não só à direita do Pai,
conforme ao modo normal de hexistir, mas ao mesmo tempo também no Sacramento da
Eucaristia segundo um modo de hexistir que, ainda que mal possamos exprimir por
palavras, podemos, contudo, alcançar com a razão ilustrada pela fé e devemos
crer firmissímamente que é possível para Deus”.[xlix]
A minha alma, o meu
espírito agustiam-se, por vezes, ao considerar os “ultrajes, as ofensas e
sacrilégios com que tantas vezes é ofendido”.[l]
Com frequência durante o
dia esta constatação leva-me a actos e considerações de reparação: actos de
pequenas sacrifícios ou renúncias, considerações que são preces e jaculatórias.
Sobretudo quando me
aproximo da Comunhão Eucaristica, peço por todos esses pobres seres que cometem
esses actos tão vis de desrespeito e profanação, atrevendo-me a implorar:
Senhor… eles não sabem o que fazem!
Hoje, neste ano de 2020,
não posso receber-Te na Sagrada Comunhão e limito-me a fazer a comunhão
espiritual que aprendi de São Josemaria: “Eu quisera Senhor, receber-vos com
aquela pureza, humildade e devoção com que Vos rebeu a Vossa Santíssima Mãe,
com o espírito e fervor dos Santos”.
Foi o que fiz hoje ao
participar – pela Televisão - na Santa Missa celebrada na Basília de São Pedro,
pelo Papa Francisco.
Comoveu-me aquela figura
de homem idoso, com vísiveis dificuldades motoras, mas com um espírito lúcido e
determinado.
A sua homília foi
centrada nos Sacerdotes.
Foram palavras de afecto
e de esperança, inspiradoras de confiança e aconselhando o serviço a Deus, e,
por Deus aos outros.
Fiquei envergonhado e
triste por considerar que não rezo tanto como devia pelos Sacerdotes.
Envergonhado, porque
falto ao meu dever como cristão.
Triste, por me mostrar
tão ingrato por tantos inestimáveis serviços que deles tenho recebido ao longo
dos anos.
Tenho tomado o propósito
concreto de diariamente rezar:
Meu Senhor Jesus Cristo:
Dai à Vossa Igreja Sacerdotes Santos que se entreguem ao serviço exclusivo da
Igreja e das almas, ao anúncio fiel da palavra de Deus, à administração dos
Sacramentos, em especial da Eucaristia e da Penitência, obedientes ao
Magistério da Igreja e observando amorosamente a Sagrada Liturgia, para exemplo
e guia seguro do Povo de Deus.i
A ceia continua…
Segue-se um discurso
longo, detalhado.
Jesus tem um tom de voz
que denuncia a importância do que diz e, talvez, para que fique bem gravado na
memória dos que O ouvem – ou o leem, como eu – pelos tempos fora.
Anúncio da negação de
Pedro
Disse-lhes, então,
Jesus: Esta noite todos vós caireis em escândalo por causa de mim, pois está
escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas serão dispersas do rebanho. Mas, depois
de Eu ter ressuscitado, irei à vossa frente para a Galileia. Pedro, em
resposta, disse-lhe: Ainda que todos caiam em escândalo por causa de ti, eu
nunca cairei em escândalo. Disse-lhe Jesus: Amen te digo: nesta noite, antes
que o galo cante, três vezes me negarás. Disse-lhe Pedro: Mesmo que seja
necessário eu morrer contigo, jamais te negarei. E o mesmo disseram todos os
discípulos.[lii]
Estou tão “metido” nesse
discurso que mal me dou conta que tudo já acabou, que se «cantaram os hinos»[liii] e todos se vão
embora.
Já passa das vinte e
duas horas, é noite cerrada e, eu, recomponho-me das emoções vividas e
apresso-me a sair também.
Chegamos ao Horto das
Oliveiras; o meu coração, uma vez mais, confrange-se com as cenas
que presencio. Tenho de fazer um esforço de contenção para que não estravase
para fora quanto sinto vai acontecer e não fugir desta situação.
Não!
Vim para ficar!
Vim para acompanhar,
custe o que possa custar, este momento soleníssimo que me é dado viver para que
o guarde na minha memória como marco inequecível de uma Paixão que está prestes
iniciar-se. Paixão de Jesus Cristo, o meu Senhor e Mestre que Se submete por
amor aos homens, a mim, a tamanha prova.
Oração de Jesus no
Getsémani
Então Jesus disse aos
discípulos: Sentai-vos, enquanto vou ali rezar. Tomando consigo Pedro e os dois
filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes então:
«Profundamente entristecida está a minha alma até à morte; permanecei aqui e
estai vigilantes comigo. E, indo um pouco adiante, caiu com o rosto por terra e
rezava, dizendo: Meu Pai, se é possível, que se aparte de mim este cálice; no
entanto, não se faça como Eu quero, mas como Tu queres. Veio, então, ter com os
discípulos, encontrou-os a dormir e disse a Pedro: Nem uma hora fostes capazes
de estar vigilantes comigo? Estai vigilantes e rezai para que não entreis em
tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca. Afastando-se, de
novo, pela segunda vez, rezou dizendo: Meu Pai, se não é possível apartar este
cálice sem que o beba, faça-se a tua vontade. Ao vir de novo, encontrou-os a
dormir, pois os seus olhos estavam pesados. Deixando-os, de novo se afastou e
rezou pela terceira vez, repetindo as mesmas palavras. Então foi ter com os
discípulos e disse-lhes: Ireis dormir e descansar o resto da noite? Eis que se
aproxima a hora em que o Filho do Homem é entregue nas mãos dos pecadores.
Levantai-vos! Vamos! Eis que se aproxima o que me vai entregar.[liv]
O meu Senhor retirou-se
para rezar.
Procurou a solidão no
silêncio do fim do dia.
A Sua Humanidade sofria intensamente
com a visão dos tormentos que se aproximavam.
Poderia Jesus ter
suportado a flagelação, as vergastadas, os espinhos cravando-se na Sua cabeça,
os pregos rasgando a carne, o horror do suplício da Cruz?
Estou certo que sim.
Jesus era um homem perfeito
e o sofrimento, por excessivo que fosse não deveria atemorizá-Lo de forma tão
esmagadora.
Outros, por amor a Jesus
Cristo, sofreram também horrores, tormentos inauditos de incrível crueldade e,
ainda nos dias de hoje, continuam a sofrer e a dar as suas vidas pela fé que
abraçaram..
Julgo que o atroz
sofrimento de Jesus, no Horto das Oliveiras, nascia principalmente no Seu
espírito, no Seu coração.
Ele tinha dado tudo
quanto tinha para dar, oferecido todos os meios, apontado todos os caminhos e,
agora, iam fazer pouco, escarnecê-Lo, violentá-Lo na Sua inteireza de homem bom
e recto, iam negá-Lo como Filho de Deus, Deus verdadeiro feito homem.
Tudo isto, e muito mais,
e não só nessa noite e no dia seguinte, mas depois, em todas as noites e todos
os dias até ao final dos tempos.
Milhões de homens e
mulheres que sempre O iriam negar, escarnecer, cuspir e crucificar outra vez.
Que peso, Senhor, que peso incrível seria o conhecimento de tudo isto!
Ah! Meu Jesus, se ainda
se salvassem todos os homens!
Se, apesar de tudo,
essas almas conhecessem a Vida Eterna no seio de Deus Pai, como tinhas previsto
e desejado desde o início dos tempos!
Mas não, Jesus, o que
mais Te dói agora, neste fim de dia no Horto das Oliveiras, é que tantos
milhões de homens e mulheres se percam eternamente.
Dói-te tanto, Senhor,
não pelo Teu sacrifício ter sido inútil para esses, mas porque o Teu coração
bondoso, a Tua misericórdia infinita, se entristece mortalmente com esse fim
trágico dos Teus filhos.
Não foi isso que
quisesTe.
Nunca desejas-Te outra
coisa senão a eterna felicidade de todos os homens, que todos, absolutamente
todos, se salvassem e pudessem estar conTigo, com o Pai, com o Espírito Santo,
com a Tua Santíssima Mãe, com a legião de Anjos e Santos, por toda a
eternidade.
Não tens, ali, a Tua Mãe
extremosa, para Te amparar e dar consolo. Nesta hora tão triste, de certeza que
o seu coração se contrai também na dor que não pode deixar de sentir em
uníssono com o seu Filho.
Talvez, na casa onde
pernoita, vele angustiada, esperando as horas gravíssimas que adivinha.
Decerto que Tu, Filho
fiel, com todo o carinho e ternura lhe terás desvendado algo do que irá
acontecer nas próximas horas.
Soube, antes que lho
contasses, da tristeza que já Te invadia o coração, bastava-lhe olhar o rosto
adorado do seu divino Filho para se aperceber do vendaval de emoções que n'Ele
se chocavam.
Também ela, a Tua
Santíssima Mãe, reza com fervor repetindo o “Fiat” que pronunciara
trinta e três anos antes.
Punha nas mãos de Deus,
Teu e seu Pai, toda a vida, toda a morte, todos os sofrimentos do seu Filho.
Tem confiança, tem
esperança mas, sobretudo, sabe, que há-de voltar a ver-Te ressuscitado e
glorioso.
Esta certeza, do
sofrimento de Tua Mãe, junta-se às dores que Te partem o coração e tornam tão
grande, tão incomensurável, a Tua dor, tens tanta pena, que suas sangue[lv] e, numa fraqueza
momentânea, pedes a Teu Pai que afaste esse cálice.[lvi]
Por momentos, Senhor, a
Tua humanidade tornou-se mais evidente. Mas logo, a Tua perfeição absoluta,
reduziu a nada esse desejo legítimo, a esse desabafo: «não se faça o que Eu
quero, senão o que Tu queres!»
Também eu digo: Faça-se
a Tua vontade, Deus e Senhor de tudo e de todas as coisas e não a minha vontade
de homem!
A Tua dor, Senhor, é uma
dor de amor que só pode ser mitigada com amor.
Minha Mãe Santíssima,
ajuda-me a ter uma dor de amor tão completa que me faça despertar deste sono
que me carrega o espírito e permanecer ao lado do teu divino Filho, vigilante e
decidido a não ceder nem à dor nem ao cansaço.
Jesus, ajuda-me a
acompanhar a Tua Santíssima Mãe e compartilhar com Ela estes Mistérios
Dolorosos, animando-a e confortando-a na sua dor e angústia”.
Se vês que adormeço; se
descobres que me assusta a dor; se notas que me detenho ao ver mais de perto a
Cruz, não me deixes!
Diz-me como a Pedro,
como a Tiago, como a João, que necessitas da minha correspondência, do meu
amor.
Diz-me para seguir-Te,
para não voltar a deixar-Te abandonado com os que tramam a Tua morte, tenho que
passar por cima do sono, das minhas paixões, da comodidade.[lvii]
Na oração perseverante e
entregue de Jesus Cristo vemos, no Amor humano de Jesus, o Amor de
Deus pelas criaturas, gratuito e infinito; e na oração sonolenta e por fim
abandonada dos Apóstolos, o pobre amor – o desamor – da criatura centrada no
seu eu e dobrada pela sua dibiliade.[lviii]
É sintomática esta
reacção dos três discípulos perante o "peso" ou solenidade de
situações que vivem com o Mestre.
Na agonia em Getsémani perante o indizível sofrimento do Senhor também são
vencidos pelo sono.
Como se a realidade fosse de tal forma "chocante ou extraordinária"
que a sua amizade e carinho pelo Senhor se recusam a admitir o que constatam.
O sono é muitas vezes desculpa para muitas faltas de coragem em que é
necessário mostrar solidariedade, apoio, solicitude.
Não poucas vezes sou vencido pelo sono, o torpor que me leva a não considerar
as realidades que não compreendo.
É como que uma "defesa" do meu espírito recusando-se a encarar algo
difícil que se me apresenta como que fora do comum e, a verdade, é que a minha
Fé cristã necessita debruçar-se continuamente sobre os seus fundamentos num
constante exame e estudo para melhor compreender.
Tenho de vencer uma atávica tendência para a rotina que, na prática da Fé,
talvez seja o pior defeito que possa ter.
Que a Doutrina não muda sei-o bem, o que deve ser mais uma razão para que não
deixe nunca de aprofundar, esmiuçar, detalhar para alcançar a segurança que é
necessária para o seu fiel cumprimento.
Não ceder ao cansaço ou modorra; são tentações que pretendem levar-me ao
abandono do dever; não deixe para “mais tarde” o que tenho de fazer
agora; NUNC COEPI – agora começo - é, deve ser, a
minha disposição permanente.
Prisão de Jesus
Ainda Ele falava, eis
que chegou Judas, um dos Doze e, com ele, uma numerosa multidão com espadas e
varapaus, da parte dos chefes dos sacerdotes e anciãos do povo. O que o ia
entregar dera-lhes um sinal, dizendo: «É aquele que eu beijar; prendei-o». E, indo
imediatamente ter com Jesus, disse: «Salve, Rabi!», e beijou-o efusivamente.
Jesus disse-lhe: «Amigo, a que vieste?». Então, avançando, deitaram as mãos a
Jesus e prenderam-no. E eis que um dos que estavam com Jesus estendeu a mão,
puxou da sua espada e, atacando o servo do sumo-sacerdote, cortou-lhe a orelha.
Disse-lhe, então, Jesus: «Volta a pôr a tua espada no seu lugar, pois todos os
que pegam na espada, pela espada perecerão. Ou pensas que não posso suplicar a
meu Pai e prontamente Ele poria à minha disposição mais de doze legiões de
anjos? Como é que, então, se cumpririam as Escrituras, segundo as quais é
necessário que assim aconteça?». Naquela hora, disse Jesus às multidões: «Como
se faz a um salteador, saístes com espadas e varapaus para vos apoderardes de
mim. Dia após dia sentava-me no templo a ensinar, e não me prendestes! Porém,
tudo isto aconteceu para que se cumprissem as Escrituras dos profetas». Então
todos os discípulos, abandonando-o, fugiram.[lix]
A traição é sempre um
acto vil e reprovavel.
Mais ainda quando se
abusa da posição de amigo de quem se trai.
A amizade, bem expresa
nesse acto íntimo que é o beijo, só o é, verdadeiramente, se incondicional
sejam quais forem as circunstâncias ou os “valores” que possam apresentar-se.
Um dos “pilares” da
amizade é ter a certeza de poder contar com o outro SEMPRE para solidariamente
acompanhar, ajudar, acudir no que for preciso, partilhar os mesmos sentimentos
de alegria ou tristeza, na ventura e na desgraça na abundância e na escassez.
A amizade é como uma
muralha firme contra a qual embatem os inimigos pessoais, as vicissitudes e
que, também guardam os bens de cada um, o que têm.
Os amigos querem-se
verdadeiramente um ao outro, com as virtudes e defeitos que cada um possa ter
já que, como é suposto, se complementarão.
Na família a amizade é a
expressão do sentimento comum porque cada um se quer não pelo que tem mas pelo
que é.
No fim e ao cabo, a
amizade consubstancia-se no Amor e, este, ou é total e sem condições ou não o é
de todo.
Nas minhas orações
diárias considero:
Esta realidade que me
atinge como um raio, deixa-me sem palavras: Jesus é meu amigo!
Sendo eu como sou, sendo
eu o que sou!
É extraordinário.
Durante os anos, e não
são poucos, quantas conversas, quantos desabafos, queixas e pedidos não Lhe
fiz!
Meu amigo!
Jesus é meu amigo.
Com esta certeza, com
este AMIGO que mais posso precisar?
Que posso temer!
Judas, então, guiando o
destacamento romano e os guardas ao serviço dos sumos sacerdotes e dos
fariseus, munidos de lanternas, archotes e armas, entrou lá. Jesus, sabendo
tudo o que lhe ia acontecer, adiantou-se e disse-lhes: «Quem buscais?»
Responderam-lhe: «Jesus, o Nazareno.» Disse-lhes Ele: «Sou Eu!» E Judas, aquele
que o ia entregar, também estava junto deles. Logo que Jesus lhes disse: ‘Sou
Eu!’, recuaram e caíram por terra. E perguntou-lhes segunda vez: «Quem
buscais?» Disseram-lhe: «Jesus, o Nazareno!» Jesus replicou-lhes: «Já vos disse
que sou Eu. Se é a mim que buscais, então deixai estes ir embora.» Assim se
cumpria o que dissera antes: ‘Dos que me deste, não perdi nenhum.’ Nessa
altura, Simão Pedro, que trazia uma espada, desembainhou-a e arremeteu contra
um servo do Sumo Sacerdote, cortando-lhe a orelha direita. O servo chamava-se
Malco. Mas Jesus disse a Pedro: «Mete a espada na bainha. Não hei-de beber o
cálice de amargura que o Pai me ofereceu?» Então, o destacamento, o comandante
e os guardas das autoridades judaicas prenderam Jesus e manietaram-no.[lx]
O Evangelista conta o
que viu: «Logo que Jesus lhes disse: ‘Sou Eu!’, recuaram e caíram por terra.»
Os Evangelhos não
relatam nada por acaso, como se fosse uma “reportagem” pura e simples de
acontecimentos.
O mesmo São João diz que
não haveria lugar no mundo para todos os livros que seria preciso escrever para
contar quanto Jeus disse e fez.
Ao mencionar expressamente
este caso o Evangelista quer registar que o poder de Jesus é real e absoluto e
que só Ele pode dispor da Sua Pessoa como entender ou, por outras palavras será
preso, detido, quando Ele quiser, independentemente do número de soldados que o
pretendam fazer.
Quem impera aos ventos e
tempestades, quem acalma as vagas alterosas do mar revolto, quem com uns poucos
de peixes e alguns pães alimenta dezenas de millhares de pessoas,
quem sabe o que vai no íntimo de cada um «Jesus, conhecendo os seus pensamentos,
disse-lhes: Porque alimentais esses maus pensamentos nos vossos corações? »[lxi] não pode fazer
absolutamente quanto quiser?
Mas, talvez que Jesus
não tenha querido concretamente derrubar os captores mas, estes cairam por
terra como que subjugados – embora momêntaneamente - pela majestade que emanava
daquEle que procuravem deter.
Estes serão, talvez,
detalhes em que me perco, quase sem querer, quando me proponho imaginar a
Pessoa de Jesus Cristo.
Considero a verdadeira,
autêntica atracção que exercia sobre aqueles com quem Se cruzava.
Desde logo os dícipulos
que O seguiam para onde fosse, de tal forma atraídos pela Sua figura, os Seus
gestos, as Suas palavras.
Tudo n’Ele seria
cativante, atraíria como iman poderoso crianças e adultos, pessoas de cultura
ou de escassos conhecimentos.
Factos inexplicáveis –
até científicamente – como, por exemplo, quando rodeado por multidões todos O
ouviam distintamente fosse qual fosse a distância a que se encontravam e,
ainda, compreendiam o que dizia não obstante muitos não falassem
aramaico.
Este Homem que em tudo
era semelhante a qualquer um, não precisa de grandiloquência, gestos
espectaculares.
Quanto faz é de forma
tranquila, serena; quanto diz é comprendido por todos, vai “directo” ao coração
de cada um, desfaz as dúvidas, esclarece as interrogações.
Usa, na Sua comunicação,
de frequentes parábolas que mais não são que histórias da vida real e comum de
todos os dias para que melhor entendam o que quer dizer.
Aos mais próximos,
quando necessário, explicava com maior detalhe quanto dissera pois bem sabia
que, alguns dos outros, O escutavam apenas por curiosidade e não com
o coração disposto a aprender.
O génio de São Lucas
deixou-nos constantes algumas destas parábolas de enorme beleza literária como
a parábola do Filho Pródigo que releio com frequência sempre com enorme deleite
e onde encontro sempre novos motivos de meditação.
Algumas vezes me detenho
considerando quem é o personagem central desta parábola: o Pai; o Filho mais
novo; o Filho mais velho… e concluo que os três são CENTRAIS, porque me revejo
em cada um.
Ao amor incondicional do
Pai pelos dois filhos, tão diferentes um do outro, mas que ama de igual modo
precisamente porque são seus filhos; o Filho mais novo rebelde e desejoso se
aventurar-se por caminhos que não conhece, vivendo situações que deveria
evitar; o Filho mais velho cumpridor dos seus deveres por calculismo,
interesse, conveniência mas… sem amor.
Os três “jogam” um papel
importantíssimo na parábola.
Começando pelo Filho
Mais Novo reconheço-me no meu desejo de aventura, sair do que considero a
rotina de todos os dias, observando as mesmas regras e normas dispostas pelo
chefe da família.
Não compreendo – não
quero compreender – que essas regras e normas são o fruto da experiência de
vida, a lógica ilacção do que sabe ser o melhor para os seus filhos.
A mim parecem-me
“coisas” antigas, muito afastadas da realidade que adivinho lá fora e que vou
almejando conhecer num crescendo incontrolável.
Mas, para me lançar
nessa aventura preciso de meios que não possuo e na minha desfaçatez atrevo-me
a pedir a meu Pai que mos proporcione.
É claro para mim que ele
não tem porque me dar o que lhe peço mas, uso de astúcia porque sei que o seu
coração de Pai cederá com facilidade ao pedido do filho.
Foi o que fez, com
simplicidade, disfarçando a ansiedade e preocupação que sentia, sem juntar num
discurso interminável, recomendações a que, desde logo sabia, eu nem sequer
prestaria atenção.
E saí da casa paterna
depressa encontrando companheiros solicítos a que afortuna que transportava não
deixava indiferentes.
Confesso que não me
lembro por onde andei porque num atordoamento profundo, deixei-me levar por
onde quiseram até que, quando me dei conta estava absolutamente só e sem um
cêntimo no bolso.
Na vera do caminho
chorei a minha triste sorte, o meu infortúnio tentando encontrar uma razão
qualquer para quanto acontecera.
Mas, claro, não
procurava essa “razão” onde devia, dentro de mim, preferindo culpar outros da
minha irresponsabilidade.
Alguém se compadeceu de
mim e me ofereceu trabalho: guardar porcos!
Algo inconcebível,
aviltante para um judeu que tem um profundo desprezo por esses animais. Mas,
que fazer?
O magro salário não
chegava sequer para substituir os andrajos em que se tinha tornado as minhas
finas vestes e, muito menos, adquirir umas simples sandálias para proteger os
pés.
Tinha frio, sentia fome.
As alfarrobas que os porcos comiam poderiam muito bem servir para mitigar essa
fome que me roía as entranhas mas… ai de mim… não me atrevia a apanhá-las e
tinha vergonha de pedir que mas dessem.
Foi no meio deste
tormento avassalador que me detive a pensar:
«Quantos jornaleiros
de meu pai têm pão com fartura, e eu morro aqui à fome»[lxii]
Tomei uma decisão: «Vou
ter com o meu pai e digo-lhe: Pai, pequei contra o Céu e para contigo. Já não
sou digno de chamar-me teu filho. Trata-me como um dos teus jornaleiros».[lxiii] E sem mais
delongas, «Partiu e foi ter com o pai.»[lxiv]
Detenho-me agora a
considerar na parábola a figura do pai.
Mal consigo imaginar o
seu estado de espírito, a sua preocupação e angústia desde que o filho mais
novo saíra de casa.
Seguramente que teria informações
a seu respeito, quanto se passava, a vida dissoluta, as aventuras constantes,
os perigos e armadilhas que a cada passo os companheiros lhe estenderiam. Temia
o pior sim, o pior como seria a morte violenta aque se sujeitam esses que
procuram viver a vida sem observar nem regras de conduta ou comportamento
pessoal e se vão deixando ir ao sabor das paixões e das miragens do momento.
Mas… não obstante
guardava bem no fundo do seu coração de pai uma secreta esperança que, um dia,
o filho que estremecia caísse em si, reconsiderasse na lembrança de quanto lhe
transmitira na juventude, os valores autênticos, os princípios que interessam,
numa palavra, a educação formativa que procurara transmitir-lhe.
Algumas vezes terá
pensado “acabar com aquilo”, enviar empregados seus à sua procura a
convencê-lo, trazê-lo à força se necessário, a regressar à casa paterna.
Mas, o pai, era um homem
justo e, por isso, respeitava a vontade do filho e, portanto, resolveu dar-lhe
tempo – o que fosse preciso - para que o regresso fosse uma decisão
inteiramente sua.
Aliás, a não ser assim,
como ter a esperança que a “história” não voltaria a repetir-se?
Todos os dias subia à
açoteia mais alta da morada familiar, prescrutando o horizonte na esperança de
o ver regressando.
«Estando ele ainda
longe, viu-o o pai, e encheu-se de compaixão e correu a lançar-se-lhe ao
pescoço. Beijando-o».[lxv]
O pai não pode retardar
por mais tempo a alegria de sentir o filho nos braços e, por isso, correu ao
seu encontro, não fosse ele, por pudor ou falsa vergonha, reconsiderar e voltar
para trás.
Quantas vezes penso
neste abraço que o meu Pai do Céu corre a dar-me logo que Se apercebe que quero
regressar ao Seu convívio de que me afastei por decisão minha!
Sinto, constato, a Sua
alegria que imediatamente apaga a minha vergonha por O ter ofendido, o meu
pesar por ter demorado tempo a reconsiderar e admitir a minha culpa.
Mas não posso “ficar por
aí”, sinto que é necessário, embora Ele o saiba, dizer-Lhe o que me vai na
alma.
«Pai, pequei contra o
Céu e para contigo. Já não sou digno de chamar-me teu filho. Trata-me como um
dos teus jornaleiros».[lxvi]
Mas, o meu Pai do Céu
parece não ouvir o que Lhe digo e diz aos Seus criados: «trazei depressa o
fato melhor e vesti-lho; ponde-lhe um anel na mão, e calçado nos pés. Trazei o
vitelo gordo, matai-o, e comamos em festa»[lxvii]
Fico sem mais palavras.
Não uma veste qualquer
mas: «o fato melhor»!
Declara a minha nobreza
de filho e manda: «ponde-lhe um anel na mão»!
Restitui-me a dignidade
e ordena; «ponde-lhe calçado nos pés»!
A Sua alegria tem de ser
sentida e vivida por todos os de sua casa e, por isso, determina «Trazei o
vitelo gordo, matai-o, e comamos em festa»!
E, para que fique bem
claro para todos, explica o porquê de tudo: «Porque este meu filho estava
morto e voltou à vida, estava perdido e controu-se».[lxviii]
Sinceramente não sei se
a alegria do perdão ultrapassa a tristeza do pecado. Ao longo da minha vida me
tenho interrogado sobre o significado da “felix culpa” de que fala a Escritura
e julgo compreender que o perdão de Deus é tão incomensuravelmente grande que
“esmaga” a falta mais grave, o pecado mais soêz que possa cometer
Ah! E eu posso ser capaz
de praticar as faltas mais vis, os pecados mais abjectos e, se não os cometo é
unicamente porque a Graça de Deus me assiste e a minha Querida Mãe do Céu me
coloca sob o seu manto Virginal resguardando-me de mim mesmo, aconchegando-me e
insinuando com a sua Doce Voz de Mãe estremecida: Meu Filho, meu querido Filho…
porta-te bem!
E, isto que acabo de
considerar, não são belas palavras, poesia inspirada, mas a expressão da
certeza absoluta que tenho que NUNCA estou sozinho!
Voltemos a Getsemani
para considerar que, tão pouco o Senhor perdeu o ensejo para fazer o bem a quem
Lhe fazia mal.
Depois de ter beijado
sinceramente Judas, admoestou-o, não com a dureza que merecia, mas com a
suavidade com que se trata um doente. Chamou-o pelo seu nome, que é sinal de
amizade... «Judas, com um beijo entregas o Filho do Homem?»[lxix] Com mostras de paz
fazes-me a guerra? E ainda, para o mover mais a que reconhecesse a sua culpa,
fez-Lhe outra pergunta cheia de amor: «Amigo, a que vieste?» [lxx]
Amigo, é maior a injúria
que me fazes porque foste Meu amigo, mais o dano que me fazes. "Porque se
fosse um inimigo o que maldissesse, suportá-lo-ia..., mas tu, meu amigo, meu
amigo íntimo, com quem me unia um amigável trato..."[lxxi]
Amigo, ainda que tu não
me queiras, Eu sim, Amigo, porque fazes isto, a que vieste?[lxxii]
Não consigo imaginar a
reacção de Judas a estas palavras de Jesus.
Não caiu de joelhos
chorando convulsivamente?
Não empalideceu o seu
semblante com a vergonha do acto praticado?
As palavras que Jesus
lhe dirige não são nem de repulsa ou, sequer irritação, mas de surpresa dorida
e profundamente angustiada.
Aquele a quem, apesar de
tudo, chamava amigo, com quem compartilhara a Sua intimidade, feria-O mais
duramente que os insultos soezes que iria suportar, que os açoites com que O
iriam flagelar, que a lança que Lhe haveria de trespassar o peito porque, todos
esses golpes que sofreria na Sua carne, nada eram comparados com esta dor que
este “amigo” Lhe infligia no Seu Coração Amantíssimo.
Porque os outros, eram
soldados, gente anónima, alguns simples conhecidos mas, este…não! Este era Seu
Amigo!
Um beijo!
Uma expressão de
carinho, um acto de amor, uma manifestação de terna intimidade converte-se,
assim em algo pérfido, repugnante, inqualificável.
Olho para o Crucifixo e
não posso deixar de o cobrir de beijos!
Sinto dentro de mim um
desejo irreprimível de o apertar contra o meu peito para que sintas o bater
amoroso do meu coração angustiado.
Ah! Meu Senhor!
Nesta meditação, já
tentei exprimir o meu amor por Ti mas, agora, neste momento deixa-me ficar
assim, tentando sossegar o meu espírito sem me deixar dominar pela tristeza que
me sobe na garganta a querer sufocar-me.
Lágrimas?
Sim, Senhor, são
lágrimas que me correm dos olhos porque não consigo reprimi-las.
Minha Mãe, Maria
Santíssima, ajuda-me neste momento a serenar o meu espírito para que possa
continuar a meditar neste final de dia santo, a fazer companhia de AMIGO ao teu
Divino Filho.
Então a coorte, e o
tribuno, e os servos dos judeus prenderam a Jesus e manietaram-no.[lxxiii]
Como um malfeitor, Jesus
é manietado como se fosse necessário obstar a qualquer reacção violenta que pudesse
ter.
Ele, o Homem de Paz,
Pacífico por natureza sujeita-Se a este primeiro acto de violência gratuita.
A partir do momento em
que Se levantou do local onde tão intensamente orara, mais particularmente
quando aceitara o cumprimento cabal da Vontade do Pai, já não È Ele, Jesus,
Quem reage mas o Filho que Se submete totalmente à Vontade do Pai.
Eu, que sou um
desgraçado cheio de “vontades” próprias sobre aquilo que julgo ser o que mais
me convém, rebelo-me constantemente quando percebo que essas “vontades” diferem
e estão opostas à Vontade de Deus.
E, esta rebelião mais
não é que o resultado de um amor deficiente, pequeno, preconceituoso.
Admito que não gosto de
sofrer – quem gostará – mas, se sofro, é porque não entendo que o sofrimento
que o Senhor permite que sinta é para meu bem e que, a seu tempo, se converterá
em gozo inexcedível.
Sei perfeitamente que
Ele nunca permitirá o que for superior ás minhas forças suportar mas, mesmo
assim, vou-me queixando e lamentando como se tivesse razão para tal.
E, na verdade, não tenho
razão nenhuma já que tenho de ter bem presente que Jesus ao permitir que sofra
me dá uma honra extraordinária: Consentir que participe na Sua Paixão, no Seu
sofrimento que, de certa forma, me una mais a Ele.
Consciente destas
verdades, continuo a segui-Lo nesta noite Santa que ainda está longe de
terminar.
Em tropel, aos
encontrões desabridos, puxando pela corda que O cinge, arrastam Jesus pelo
caminho.
Dos onze
discípulos que estavam com ele só Pedro e João seguem o triste cortejo.
Judas, terminada a sua
horrenda tarefa correra a receber a paga da sua perfídia.
Os outros o que terão
feito?
Aturdidos e confusos
talvez corram a esconder-se nalgum local seguro ou, lembrados da Mãe de Jesus,
terão ido a sua casa procurar conforto e direcção.
Quero crer que
sim. No seu íntimo procurariam a Senhora em quem confiam como em mais ninguém.
Em Caná ela dissera para
fazerem quanto o Filho lhes dissesse mas, neste momento, neste transe, Jesus
não lhes dissera nada a respeito do que fazer, que atitude tomar.
O sucedido
momentos atrás quando Pedro feriu o guarda que prendia Jesus cortando-lhe uma
orelha, a “resposta” de Jesus fora de compaixão pelo soldado curando o
ferimento e, a Pedro, mandara que colocasse a espada na bainha.
Ainda referiria que não
queria nenhuma reacção violenta pois, se a desejasse, teria à
sua disposição de Legiões de Anjos para O defenderem.
Estes pensamentos que
vão comunicando uns aos outros conseguem, apesar de tudo, trazer-lhes alguma
tranquilidade recuperar a confiança.
Jesus, não tinham
dúvidas, aceitara a prisão e estava disposto a receber os vexames e violências
que se seguiram.
Aos poucos começam a
compreender o que Ele antes lhes tinha dito sobre o Filho do Homem ser entregue
aos Seus inimigos e, depois de sofrer muito ser morto por eles.
Compreendiam que aquelas
palavras que então lhes tinha parecido, talvez, figurativas, se estavam a
tornar realidade!
Jesus perante o Sinédrio
13 E levaram-no primeiro
a Anás, porque era sogro de Caifás, o Sumo Sacerdote naquele ano. 14 Caifás era
quem tinha dado aos judeus este conselho: ‘Convém que morra um só homem pelo
povo’. 15 Entretanto, Simão Pedro e outro discípulo foram seguindo Jesus. Esse
outro discípulo era conhecido do Sumo Sacerdote e pôde entrar no seu palácio ao
mesmo tempo que Jesus. 16 Mas Pedro ficou à porta, de fora. Saiu, então, o
outro discípulo que era conhecido do Sumo Sacerdote, falou com a porteira e
levou Pedro para dentro. (…) 18 Lá dentro estavam os servos e os guardas, de
pé, aquecendo-se à volta de um braseiro que tinham acendido, porque fazia frio.
Pedro ficou no meio deles, aquecendo-se também. 19 Então, o Sumo Sacerdote
interrogou Jesus acerca dos seus discípulos e da sua doutrina. 20 Jesus
respondeu-lhe: «Eu tenho falado abertamente ao mundo; sempre ensinei na
sinagoga e no templo, onde todos os judeus se reúnem, e não disse nada em
segredo. 21 Porque me interrogas? Interroga os que ouviram o que Eu lhes disse.
Eles bem sabem do que Eu lhes falei.» 22 Quando Jesus disse isto, um dos
guardas ali presente deu-lhe uma bofetada, dizendo: «É assim que respondes ao
Sumo Sacerdote?» 23 Jesus replicou: «Se falei mal, mostra onde está o mal; mas,
se falei bem, porque me bates?»[lxxiv]
Não vou meditar sobre
esta passagem do Evangelho de São João. Confesso que o faço conscientemente e
por cobardia.
Sim… cobardia!
Não quero deixar-me
arrastar por sentimentos e considerações sobre algo que me repugna profundamente.
Este pseudo-julgamento é
um acto tão vil, aberrante e sem um minímo de credibilidade que, conhecendo-me,
tenho receio de me deixar arrastar por sentimentos de repulsa e desejos de
julgar, eu próprio, os acontecimentos.
Procuro, antes, dizer a
Jesus de todo o coração:
Senhor, eu, estou
conTigo, não posso mais que admirar a Tua postura íntegra, serena de Inocente.
Vou deter-me, antes, em
algo tão marcante e extraordinariamente humano que me faz considerar três
aspectos:
A debilidade humana,
a humildade, o perdão.
Refiro-me à negação
de Pedro
«Tendo acendido
uma fogueira no meio do pátio, sentaram-se e Pedro sentou-se no meio deles.
Ora, uma criada, ao vê-lo sentado ao lume, fitando-o, disse: «Este também
estava com Ele.» Mas Pedro negou-o, dizendo: «Não o conheço, mulher.» Pouco
depois, disse outro, ao vê-lo: «Tu também és dos tais.» Mas Pedro disse:
«Homem, não sou.» Cerca de uma hora mais tarde, um outro afirmou com
insistência: «Com certeza este estava com Ele; além disso, é galileu.» Pedro
respondeu: «Homem, não sei o que dizes.» E, no mesmo instante, estando ele
ainda a falar, cantou um galo. 61 Voltando-se, o Senhor fixou os olhos em
Pedro; e Pedro recordou-se da palavra do Senhor, quando lhe disse: «Hoje, antes
de o galo cantar, irás negar-me três vezes.» E, vindo para fora, chorou
amargamente.[lxxv]
Pedro segue de longe o
tropel de gente que conduz o Senhor. Enquanto em casa do Sumo-Sacerdote
se desenvolve o primeiro juízo contra o Jesus vai ter lugar a cena mais triste
da vida do Apóstolo.
Os Evangelistas
descrevem-no com vivacidade.
Pedro está assustado e
inquieto.Pedro diz por três vezes que não conhece Jesus, que não é dos Seus
seguidores.
Continua a amar o
Senhor, mas isto não basta: tem obrigação apesar do risco evidente, de assumir
a sua posição de discípulo; por isso a sua negação constitui um grave
pecado.
Não se pode negar nem
dissimular a própria fé, a condição de seguidor de Cristo, de cristão.
Depois do canto do galo
cruzam-se os olhares de Jesus e de Pedro.
O Apóstolo comove-se: o
gesto de Jesus, silencioso e cheio de ternura é eloquente. Pedro compreende a
gravidade do seu pecado, e o cumprimento da profecia do Senhor relativa à sua
traição.
Saindo para fora «chorou
amargamente».
Estas lágrimas são a
reacção lógica dos corações nobres, movidos pela graça de Deus.
É a dor de amor, a
contrição do coração, que, quando é sincera, leva consigo o firme propósito de
pôr por obra quanto for necessário para apagar o pecado.[lxxvi]
O olhar de Jesus!
Um olhar humano e divino, o olhar humano
de Deus.
Um olhar que arrasta, convence, atrai,
chama.
Mas também é o olhar de tédio quando mira
Herodes; de cólera quando expulsa os vendilhões do Templo; de repreensão quando
encara os acusadores da adúltera.
Um olhar que põe a nu os defeitos e erros,
que acusa, que repudia, que afasta.
Jesus fala com o olhar em todas as
situações: rindo contentes com a alegria do filho regressado à casa paterna,
deixando correr as lágrimas pelo amigo morto há já três dias, toldado com a
névoa da tristeza na Última Ceia, olhar de aflição e pavor em Getsémani.
Os Seus seguidores mais próximos, não
podem esquecer o olhar de Jesus.
Mais que as Suas palavras ou os Seus
gestos – mesmo os de maior significado – o Seu olhar ficou-lhes gravado no
coração desde o primeiro momento em que os encarou, um a um, chamando-os à Sua
intimidade, ao Seu círculo mais próximo de confidentes e amigos.
No meu círculo de confidentes e amigos –
onde levo a cabo o meu “apostolado de amizade e confidência” – conhecem-me pelo
meu olhar franco, aberto, claro, bem-disposto?
O meu olhar inspira confiança?
Transmite tranquilidade?
Perguntas que devo colocar-me cada dia.
Os olhos são o espelho da alma, costuma
dizer-se, e, que preocupação devo ter que, de facto, o
sejam!
Com os mesmos olhos com que contemplo,
embevecido, a Hóstia Santa que o Sacerdote me mostra na hora de comungar,
poderei contemplar imagens impuras ou impróprias?
Os olhos que se perdem na vastidão do
infinito Amor de Deus poderão ser os mesmos que se deixam absorver pela
passageira e fugaz imagem do prazer do momento?
Podem, sim, sei que podem!
Sou humano, fraco, débil, volúvel.
Que remédio terei, senão pedir,
constantemente, à minha Mãe do Céu que proteja o meu olhar, que guie o meu
olhar?
Que poderei mais senão implorar que me
ajude a guardar a vista como um bem precioso e caríssimo que não quero
desperdiçar?
Que mais desejar que manter o olhar de
criança, límpido, puro, franco e aberto?
Olho para Ti, olhos nos olhos, e digo-te
que Te amo e, não tenho medo que não acredites.
Sei que o vês nos meus olhos.
Quero guardar para Ti, - só para Ti – o
meu olhar.
Se possível fosse, ter estes olhos com que
agora Te contemplo, bem guardados num cofre donde só os retiraria para Te
contemplar.
Outros olhos, para o dia-a-dia, seriam
“reforçados” com lentes especiais que só me permitissem ver o que pode ser
visto.
Ou, se preferires, Senhor, ser cego para
tudo quanto não sejas Tu.
A Tua Face que quero contemplar[lxxvii] tão cedo quanto Tu
mo permitires, há-de iluminar os meus olhos com a mesma luz do Céu, aquela luz
onde se movem os anjos e os santos que Te contemplam.
Olhos só para Ti, Senhor, só para Ti, para
mais nada os quero a não ser… a não ser…, para ver as maravilhas que Tu criaste
e, por elas, dar-Te graças continuamente.
O lógico é que, quem tem olhos… veja.
Não precise, para ver, mais que luz,
claridade e, aqui, bate o ponto: como é possível ver no escuro?
Como pode descortinar-se o que seja,
permanecendo na comodidade - e cobardia - do ensimesmamento, da clausura em si
mesmo, recusando-se sistematicamente a tomar conhecimento do que a Igreja
legisla, o Papa esclarece, Jesus Cristo adverte?
Ninguém pode dizer que não sabe se não
quer ver, se recusa, pelo menos, tomar conhecimento.
Olhar e reparar!
São duas atitudes
diferentes.
Olhar pode ser um acto
automático que não tem que ser nem mau nem bom.
Faz parte da nossa
condição humana, dos nossos sentidos, da forma como percorremos a vida de todos
os dias.
Reparar é diferente.
É deter o olhar em algo
que me desperta a curiosidade e pretendo avaliar – ou ver mais detidamente – os
pormenores, os detalhes.
E isto pode ser mau
porque, de certa forma alia-se o reparar à curiosidade e, esta, é sempre má.
Trata-se, pois, de
guardar a vista e não se pense que é fácil porque não é.
Constantemente,
sou confrontado com autênticas “agressões visuais” e há que ter a prontidão de
seguir em frente e deixar o assunto.
A vista é a porta da
alma!
«Então, Anás mandou-o manietado ao Sumo Sacerdote Caifás. De Caifás, levaram Jesus à sede do governador romano. Era de manhã cedo e eles não entraram no edifício para não se contaminarem e poderem celebrar a Páscoa. Pilatos veio ter com eles cá fora e perguntou-lhes: «Que acusações apresentais contra este homem?» Responderam-lhe: «Se Ele não fosse um malfeitor, não to entregaríamos.» Retorquiu-lhes Pilatos: «Tomai-o vós e julgai-o segundo a vossa Lei.» «Não nos é permitido dar a morte a ninguém», disseram-lhe os judeus, em cumprimento do que Jesus tinha dito, quando explicou de que espécie de morte havia de morrer. Pilatos entrou de novo no edifício da sede, chamou Jesus e perguntou-lhe: «Tu és rei dos judeus?» Respondeu-lhe Jesus: «Tu perguntas isso por ti mesmo, ou porque outros to disseram de mim?» Pilatos replicou: «Serei eu, porventura, judeu? A tua gente e os sumos sacerdotes é que te entregaram a mim! Que fizeste?» Jesus respondeu: «A minha realeza não é deste mundo; se a minha realeza fosse deste mundo, os meus guardas teriam lutado para que Eu não fosse entregue às autoridades judaicas; portanto, o meu reino não é de cá.» Disse-lhe Pilatos: «Logo, Tu és rei!» Respondeu-lhe Jesus: «É como dizes: Eu sou rei! Para isto nasci, para isto vim ao mundo: para dar testemunho da Verdade. Todo aquele que vive da Verdade escuta a minha voz.» Pilatos replicou-lhe: «Que é a verdade?» Dito isto, foi ter de novo com os judeus e disse-lhes: «Não vejo nele nenhum crime. Mas é costume eu libertar-vos um preso na Páscoa. Quereis que vos solte o rei dos judeus?» 40 Eles puseram-se de novo a gritar, dizendo: «Esse não, mas sim Barrabás!» Ora Barrabás era um salteador.
Pilatos tomou então
Jesus e mandou-O flagelar. Depois, os soldados, tecendo uma coroa de espinhos,
puseram-Lha sobre a cabeça e revestiram-n'O com um manto de púrpura.
Aproximavam-se d'Ele e diziam-Lhe: «Salve, rei dos judeus!», e davam-Lhe
bofetadas. Saiu Pilatos ainda outra vez fora e disse-lhes: «Eis que vo-l'O
trago fora, para que conheçais que não encontro n'Ele crime algum». Saiu, pois,
Jesus, trazendo a coroa de espinhos e o manto de púrpura. Pilatos disse-lhes:
«Eis aqui o Homem!». Então os príncipes dos sacerdotes e os guardas, quando O
viram, gritaram: «Crucifica-O, crucifica-O!». Pilatos disse-lhes: «Tomai-O e
crucificai-O, porque eu não encontro n'Ele motivo algum de condenação». Os
judeus responderam-lhe: «Nós temos uma Lei e, segundo essa Lei, deve morrer,
porque Se fez Filho de Deus». Pilatos, tendo ouvido estas palavras, temeu ainda
mais. Entrou novamente no Pretório e disse a Jesus: «Donde és Tu?». Mas Jesus
não lhe deu resposta. Então Pilatos disse-Lhe: «Não me falas? Não sabes que
tenho poder para Te soltar e também para Te crucificar?». Jesus respondeu: «Tu
não terias poder algum sobre Mim, se não te fosse dado do alto. Por isso, quem
Me entregou a ti tem maior pecado». Desde este momento, Pilatos
procurava soltá-l'O. Porém, os judeus gritavam: «Se soltas Este, não és amigo
de César!, porque todo aquele que se faz rei, declara-se contra César».
Pilatos, tendo ouvido estas palavras, conduziu Jesus para fora e sentou-se no
seu tribunal, no lugar chamado Litóstrotos, em hebraico Gábata. Era o dia da
Preparação da Páscoa, cerca da hora sexta. Pilatos disse aos judeus: «Eis o
vosso rei!». Mas eles gritaram: «Tira-O, tira-O, crucifica-O!». Pilatos
disse-lhes: «Hei-de crucificar o vosso rei?». Os pontífices responderam: «Não
temos outro rei senão César». Então entregou-Lho para que fosse crucificado.
Tomaram, pois, Jesus que, carregando com a Sua cruz, saiu para o lugar chamado
Calvário, em hebraico Gólgota, onde O crucificaram, e com Ele outros dois, um
de cada lado, e Jesus no meio. Pilatos redigiu um título, que mandou colocar
sobre a cruz. Nele estava escrito: «Jesus Nazareno, Rei dos Judeus». Muitos
judeus leram este título, porque o lugar onde foi crucificado ficava perto da
cidade. Estava redigido em hebraico, em latim e em grego. Os pontífices dos
judeus diziam, porém, a Pilatos: «Não escrevas: Rei dos Judeus, mas: Este homem
disse: Eu sou o Rei dos Judeus». Pilatos respondeu: «O que escrevi, está
escrito!». Os soldados, depois de terem crucificado Jesus, tomaram as Suas
vestes e fizeram delas quatro partes, uma para cada soldado. Tomaram também a
túnica. A túnica não tinha costura, era toda tecida de alto a baixo. Disseram
entre si: Não a rasguemos, mas lancemos sortes sobre ela, para ver a quem
tocará; para que se cumprisse deste modo a Escritura, que diz: “Repartiram
entre si as Minhas vestes e lançaram sortes sobre a Minha túnica”. “Os soldados
assim fizeram. Estavam, de pé, junto à cruz de Jesus, Sua mãe, a
irmã de Sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus,
vendo Sua mãe e, junto dela, o discípulo que amava, disse a Sua mãe: «Mulher,
eis o teu filho». Depois disse ao discípulo: «Eis a tua mãe». E, desde aquela
hora, o discípulo recebeu-a na sua casa. Em seguida, sabendo Jesus que tudo
estava consumado, para se cumprir a Escritura, disse: «Tenho sede». Havia ali
um vaso cheio de vinagre. Então, os soldados, ensopando no vinagre uma esponja
e atando-a a uma cana de hissopo, chegaram-Lha à boca. Jesus, tendo tomado o
vinagre, disse: «Tudo está consumado!». Depois, inclinando a cabeça, entregou o
espírito. Os judeus, visto que era o dia da Preparação, para que os corpos não
ficassem na cruz no sábado, porque aquele dia de sábado era de grande
solenidade, pediram a Pilatos que lhes fossem quebradas as pernas e fossem
retirados. Foram, pois, os soldados e quebraram as pernas ao primeiro e ao
outro com quem Ele havia sido crucificado. Mas, quando chegaram a Jesus, vendo
que já estava morto, não Lhe quebraram as pernas, mas um dos soldados
trespassou-Lhe o lado com uma lança e imediatamente saiu sangue e água. Quem
foi testemunha deste facto o atesta, e o seu testemunho é digno de fé e ele
sabe que diz a verdade, para que também vós acrediteis. 36 Porque estas coisas
sucederam para que se cumprisse a Escritura: “Não Lhe quebrarão osso algum”.E
também diz outro passo da Escritura: “Hão-de olhar para Aquele a quem
trespassaram”. Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus,
ainda que oculto por medo dos judeus, pediu a Pilatos que lhe deixasse levar o
corpo de Jesus. Pilatos permitiu-o. Foi, pois, e tomou o corpo de Jesus.
Nicodemos, aquele que tinha ido anteriormente de noite ter com Jesus, foi
também, levando uma composição de quase cem libras de mirra e aloés. Tomaram o
corpo de Jesus e envolveram-n'O em lençóis com perfumes, segundo a maneira de
sepultar usada entre os judeus. Ora, no lugar em que Jesus foi crucificado,
havia um horto e no horto um sepulcro novo, em que ninguém tinha ainda sido
sepultado. Por ser o dia da Preparação dos judeus e o sepulcro estar
perto, depositaram ali Jesus.
****
Termina aqui a minha meditação sobre os acontecimentos
de Quinta-Feira Santa.
Confesso a minha dificuldade em manter o espírito
sereno embora a emoção e as lágrimas, tomassem por várias vezes conta de
mim.
Fiz o possível por não me deixar dominar pela repulsa
contra os que martirizaram e deram a morte ao meu Salvador lembrando-me que Ele
pediu o perdão do Pai «porque não sabiam o que faziam».
Sinto-me feliz, triste e alegre ao mesmo tempo porque
sei que Cristo Se sujeitou voluntariamente a todos estes indizíveis sofrimentos
e humilhações por mim, para me tornar Seu Irmão, para merecer por mim a Vida
Eterna.
Senhor, que eu saiba aproveitar todo o tempo que
entenderes conceder-me para viver neste mundo para Te louvar e servir. Amen.
(AMA), Quinta-Feira Santa, 2021
[i] Cfr. Jo Capts 13 a 18
[ii] Cfr. Mc XIV, 12-16
[iii] Lc 22, 14
[iv] Cfr. 1 Cor 11, 20
[v] Cfr. Lu 22, 23
[vi] Cfr. Fil. 2, 7
[vii] Cfr. Lc 22,15
[viii] Cfr. Jo 13,34
[ix] Cfr. Mc 14,18-19
[x] Cfr. Jo . 14, 1; 16, 17; etc.
[xi] Cfr. Jo. 16, 20, ss.
[xii] Cfr. Is 8, 10;. Lc 24,
29;. Mt 28., 20; Sacrosanctum Concilium, 10
[xiii] Cfr. Lc 24,31-32
[xiv] Cfr. Jo 13,34-35
[xv] Jo 13,33
[xvi] Jo 13, 36
[xvii] Cfr. Mt 26, 21
[xviii] Mc 14, 30
[xix] Lc 22, 61
[xx] Mt 26, 75
[xxi] Jo 21, 15 e segs
[xxii] Cfr. Mt 16, 18
[xxiii] Lc 22, 31-32
[xxiv] Jo 13,21
[xxv] Ibid.
[xxvi] Jo 13, 30
[xxvii] In Jo. Tract. 62;PL 35,
1803
[xxviii] Mc 14, 21
[xxix] 1 Cor. 4, 1
[xxx] cf. Col. 1, 24
[xxxi] Jo 14, 5-6
[xxxii] Cf. Io . 17, 22
[xxxiii] cf. 1 Cor.10, 17
[xxxiv] Cfr. Homilia de São Paulo VI, na
Santa Missa “Cena Domini”.Quinta-Feira Santa,08, Abril, 1971, © Copyright -
Libreria Editrice Vaticana
[xxxv] Lc 22, 12
[xxxvi] Cfr.Lc
XXII, 24-30
[xxxvii] Cfr.
Javier Echevarria, Getsemani, Planeta, 3ª Ed. Pg. 157
[xxxviii] Cfr. Mt XXVI, 21-25
[xxxix] São Josemaria, Sulco 618
[xl] Cfr. Jo 14, 27
[xli] Cfr. 14, 30
[xlii] Cfr. Jo XIII, 1-20
[xliii] Cfr. Jo XIV, 1-31
[xliv] Cfr. Jo XV, 1 - 27
[xlv] Jo XVI, 1-31
[xlvi] Jo XVII, 1- 26
[xlvii] Cfr. Lc 22, 19-20
[xlviii] De SS. Eucharistia, cap. 1
[xlix] São Paulo VI, Encíclica
Mysterium Fidei
[l] Oração do Anjo de Portugal na sua
primeira aparição aos Pastorinhos de Fátima
[li] AMA, 2009, (Com
autorização eclesiástica.=
[lii] Cfr. Mc 14, 31-35
[liii] Cfr. Mc 14, 26
[liv] Cfr Mc 14,32-42; Lc 22,39-46
[lv] Cfr Lc 22, 44
[lvi] Cfr. Mc 14, 36
[lvii] Cfr. M. Montenegro, Via
Crucis, Palabra, 6ª Ed., Madrid, 1971, nr. 48
[lviii] Cfr. Javier Echevarria, Getsemani,
Planeta, 3ª Ed. Cap. I, 10
[lix] Cfr. Mc 14,43-50; Lc 22,47-53; Jo
18,3-12
[lx] Cfr. Jo XVIII, 3-12
[lxi] Cfr. Mt IX, 4
[lxii] Cfr, Lc 15, 17
[lxiii] Cfr, Lc 15, 18
[lxiv] Cfr, Lc 15, 20
[lxv] Cfr. Lc15, 20
[lxvi] Cfr, Lc 15, 18
[lxvii] Cfr. Lc 15, 22-23
[lxviii] Cfr. Lc15, 24
[lxix] Lc 22, 48
[lxx] Mt 26, 50
[lxxi] Cfr. Sal 54, 13
[lxxii] Cfr. Luís
De la Palma, La Passión del Señor, pg. 59-60
[lxxiii] Cfr. Jo
[lxxiv] Cfr Jo 18, 13-16, 17-73
[lxxv] Cfr. Lc 22, 55-62
[lxxvi] Cfr. Bíblia Sagrada, Univ Navarra,
coment. Lc 22, 55-62
[lxxvii] Vultuum requiram!