Tempo Comum II Semana
Evangelho: Mc 2 18-22
18 Os discípulos
de João e os fariseus estavam a jejuar. Foram ter com Jesus, e disseram-Lhe:
«Porque jejuam os discípulos de João e os fariseus, e os Teus discípulos não
jejuam?». 19 Jesus respondeu-lhes: «Podem porventura jejuar os
companheiros do esposo, enquanto o esposo está com eles? Enquanto têm consigo o
esposo não podem jejuar. 20 Mas virão dias em que lhes será tirado o
esposo e, então, nesses dias, jejuarão. 21 Ninguém cose um remendo
de pano novo num vestido velho; pois o remendo novo arranca parte do velho, e o
rasgão torna-se maior. 22 Ninguém deita vinho novo em odres velhos;
de contrário, o vinho fará arrebentar os odres, e perder-se-á o vinho e os
odres; mas, para vinho novo, odres novos».
Comentário:
Tal como no tempo de Jesus Cristo, também
hoje em dia existem disposições das autoridades eclesiásticas, no nosso caso,
da Igreja Católica, sobre “tempos especiais” em que é recomendado o jejum
físico como uma medida de sacrifício ou mortificação a ter em conta. É o caso
da Quaresma.
De facto, este Tempo Litúrgico, é
especialmente adequado a uma postura cristã de acordo com o momento que se
vive, o que a liturgia propõe como temas de meditação e exame.
Sim, é um tempo de exame, de
reconvenção e… de conversão.
Para tal o corpo tem de estar disposto
a seguir o que a alma insinua, numa unidade de vida que corresponda a uma
verdadeira visão cristã do comportamento que devemos ter.
O jejum, sendo uma privação do corpo –
sempre com conta, peso e medida – ahjuda sobremaneira a essas disposições
interiores.
(ama, Comentário sobre Mc 2, 8-22, 2014.01.20)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Temas actuais do
cristianismo [i]
De
onde procede, pois, a influência do Opus Dei? A resposta é a simples
consideração desta realidade sociológica: à nossa Associação pertencem pessoas
de todas as condições sociais, profissões, idades e estados de vida; homens e
mulheres, clérigos e leigos, velhos e jovens, solteiros e casados, universitários,
operários, camponeses, empregados, pessoas que exercem profissões liberais ou
que trabalham em instituições oficiais, etc. Já pensou no poder de irradiação
cristã que uma gama tão ampla e tão variada de pessoas representa, sobretudo se
andam pelas dezenas de milhar e estão animadas de um mesmo espírito apostólico:
santificar a sua profissão ou ofício - em qualquer ambiente social em que
actuem - santificar-se nesse trabalho e santificar com esse trabalho?
A
estes trabalhos apostólicos pessoais deve juntar-se o das nossas obras
corporativas de apostolado: Residências de estudantes, Casas de convívio e
retiros, a Universidade de Navarra, Centros de formação para operários e
camponeses, Escolas técnicas, Colégios, Escolas de formação para a mulher, etc.
Estas obras têm sido e são indubitavelmente focos de irradiação do espírito
cristão. Promovidas por leigos, dirigidas como um trabalho profissional por
cidadãos leigos, iguais aos seus companheiros que exercem a mesma tarefa ou ocupação,
e abertas a pessoas de todas as classes e condições, têm sensibilizado amplos
estratos da sociedade sobre a necessidade de dar uma resposta cristã às
questões que o exercício das suas profissões ou empregos lhes levanta.
Tudo
isto é que dá relevo e transcendência social ao Opus Dei. Não, portanto, o
facto de alguns dos seus membros ocuparem cargos de influência humana - coisa
que não nos interessa absolutamente nada, e se deixa portanto sujeito à livre
decisão e responsabilidade de cada um - mas o facto de todos, e a bondade de
Deus faz com que sejam muitos, realizarem trabalhos - desde os mais humildes -
divinamente influentes.
E
isto é lógico: quem pode pensar que a influência da Igreja nos Estados Unidos
começou no dia em que foi eleito presidente o católico John Kennedy?
19
Por
vezes, ao falar da realidade do Opus Dei, tem afirmado que é uma
“desorganização organizada”. Poderia explicar aos nossos leitores a significado
desta expressão?
Quero
dizer que damos uma importância primária e fundamental à espontaneidade
apostólica da pessoa, à sua iniciativa livre e responsável guiada pela acção do
Espírito; e não a estruturas orgânicas, mandatos, tácticas e planos impostos de
cima, como actos de governo.
Existe
um mínimo de organização, evidentemente, com um governo central, que actua
sempre colegialmente e tem a sua sede em Roma, e governos regionais, também
colegiais, cada um presidido por um Conselheiro [*]. Mas toda a actividade
desses organismos se dirige fundamentalmente a um fim: proporcionar aos sócios
a assistência espiritual necessária para a sua vida de piedade, e uma adequada
formação espiritual, doutrinal-religiosa e humana. Depois: patos à água! Quer
dizer: cristãos a santificarem todos os caminhos dos homens, que todos guardam
o aroma da passagem de Deus.
Ao
chegar a esse limite, a esse momento, a Associação como tal terminou a sua
tarefa - aquela, precisamente, para a qual os sócios do Opus Dei se associam -
e já não tem que fazer, não pode nem deve fazer mais nenhuma indicação. Começa
então a livre e responsável acção de cada sócio. Cada um, com espontaneidade
apostólica, agindo com completa liberdade pessoal e formando autonomamente a
sua consciência perante as decisões concretas que tenha de tomar, busca a
perfeição cristã e procura dar testemunho cristão no seu próprio ambiente,
santificando o trabalho profissional, intelectual ou manual. Naturalmente, ao
tomar cada um autonomamente essas decisões na sua vida secular, nas realidades
temporais em que actua, dão-se com frequência opções, critérios e actuações
diversas: dá-se, numa palavra, essa bendita desorganização, esse justo e
necessário pluralismo, que é uma característica essencial do bom espírito do
Opus Dei, e que a mim me pareceu sempre ser a única maneira recta e ordenada de
conceber o apostolado dos leigos.
Dir-lhe-ei
mais: essa desorganização organizada aparece inclusivamente nas próprias obras
apostólicas corporativas que o Opus Dei realiza, com o desejo de contribuir
também, enquanto associação, para resolver cristãmente problemas que afectam as
comunidades humanas dos diversos países. Essas actividades e iniciativas da Associação
são sempre de carácter directamente apostólico: obras educativas, assistenciais
ou de beneficência. Mas, como o nosso espírito é precisamente estimular que as
iniciativas surjam a partir da base, e como as circunstâncias, necessidades e
possibilidades de cada nação ou grupo social são peculiares e ordinariamente
diversas entre si, o governo central da Obra deixa aos governos regionais - que
gozam de autonomia praticamente total - a responsabilidade de decidir, promover
e organizar aquelas actividades apostólicas concretas que julgarem mais
convenientes: desde um centro universitário ou uma residência de estudantes,
até um dispensário ou uma escola agrícola para camponeses. Como resultado
lógico, aparece um mosaico multicolor e variado de actividades: um mosaico
organizadamente desorganizado.
[*]
Recordamos o que ficou dito na Apresentação deste livro sobre algumas
respostas, referentes a aspectos jurídicos e organizativos, que eram exactas e
precisas na altura, quando o Opus Dei não tinha ainda recebido a configuração
jurídica desejada pelo seu Fundador. Hoje é necessário completá-las com a breve
explicação que demos na Apresentação.
20
De
acordo com o que nos acaba de referir, de que maneira considera que a realidade
eclesial do Opus Dei se insere na acção pastoral de toda a igreja? E no
Ecumenismo?
Parece-me
conveniente um esclarecimento prévio: o Opus Dei não é nem pode ser considerado
uma realidade ligada ao processo evolutivo do estado de perfeição na Igreja,
não é uma forma moderna ou aggiornata desse estado. Com efeito, nem a concepção
teológica do status perfecfionís - que São Tomás, Suárez e outros autores plasmaram
decisivamente na doutrina - nem as diversas concretizações jurídicas que se
deram ou se podem dar a esse conceito teológico, se relacionam com a
espiritualidade e o fim apostólico que Deus quis para a nossa Associação. Basta
considerar - porque seria longa uma exposição doutrinal completa - que ao Opus
Dei não interessam votos, nem promessas, nem qualquer forma de consagração para
os seus sócios, além da consagração que já todos receberam no Baptismo. A nossa
Associação não pretende de nenhum modo que os seus sócios mudem de estado, que
deixem de ser simples fiéis iguais aos outros, para adquirir o peculiar status
perfectionis. Pelo contrário, o que deseja e procura é que cada um faça
apostolado e se santifique no seu próprio estado, no mesmo lugar e condição que
tem na Igreja e na sociedade civil. Não tiramos ninguém do seu lugar, nem afastamos
ninguém do seu trabalho ou dos seus nobres compromissos de ordem temporal.
A
realidade social, a espiritualidade e a acção do Opus Dei inserem-se, pois, num
manancial da vida da Igreja muito diferente: concretamente, no processo
teológico e vital que está a conduzir o laicado à plena assunção das suas
responsabilidades eclesiais, ao seu modo próprio de participar na missão de
Cristo e da sua Igreja. Este tem sido, e continua a ser, nos quase quarenta
anos de existência da Obra, o anseio constante - sereno, mas firme - com que
Deus quis encaminhar, na minha alma e nas dos meus filhos, o desejo de O
servir.
Que
contribuição oferece o Opus Dei a este processo? Talvez não seja este o momento
histórico mais adequado para proceder a uma valoração global deste tipo. Apesar
de se tratar de problemas de que o Concílio Vaticano II muito se ocupou - com
quanta alegria da minha alma! - e apesar de muitos conceitos e situações
referentes à vida e missão do laicado terem recebido já do Magistério
suficiente confirmação e luz, há no entanto um considerável núcleo de questões
que constituem ainda, para a generalidade da doutrina, verdadeiros problemas-limite
da teologia. A nós, dentro do espírito que Deus deu ao Opus Dei e que
procuramos viver com fidelidade - apesar das nossas imperfeições pessoais -,
parece-nos já divinamente resolvida a maior parte desses problemas discutidos,
mas não pretendemos apresentar essas soluções como as únicas possíveis.
21
Há
também aspectos do mesmo processo de desenvolvimento eclesiológico, que
representam magníficas aquisições doutrinais - para as quais quis Deus
indubitavelmente que contribuísse, em parte talvez não pequena, o testemunho do
espírito e da vida do Opus Dei, juntamente com outras contribuições valiosas de
iniciativas e associações apostólicas não menos beneméritas. Mas são aquisições
doutrinais e talvez passe ainda bastante tempo até chegarem a encarnar-se
realmente na vida total do Povo de Deus. Aliás, nas suas perguntas anteriores
já recordou alguns desses aspectos: o desenvolvimento de uma autêntica
espiritualidade laical; a compreensão da peculiar função eclesial - não
eclesiástica ou oficial - própria do leigo; a distinção dos direitos e dos
deveres que o leigo tem enquanto leigo; as relações Hierarquia-laicado; a
igualdade de dignidade e a complementaridade das funções do homem e da mulher
na Igreja; a necessidade de conseguir uma ordenada opinião pública no Povo de
Deus, etc.
Tudo
isto constitui evidentemente uma realidade muito fluida e nem sempre isenta de
paradoxos. Uma mesma coisa, que dita há quarenta anos escandalizava quase
todos, ou todos, hoje a quase ninguém causa estranheza, embora, na verdade,
sejam ainda muito poucos os que a compreendem a fundo e a vivem ordenadamente.
Explicar-me-ei
melhor com um exemplo. Em 1932, comentando, num documento dirigido aos meus
filhos do Opus Dei, alguns dos aspectos e consequências da dignidade e
responsabilidade peculiares que o Baptismo confere às pessoas, escrevi: “impõe-se
repelir o preconceito de que os fiéis correntes não podem fazer mais do que
ajudar o clero, em apostolados eclesiásticos. O apostolado dos seculares não
tem de ser sempre uma simples participação no apostolado hierárquico:
compete-lhes o dever de fazer apostolado. E isto não é porque recebam uma
missão canónica, mas por serem parte da Igreja; essa missão... realizam-na
através da profissão, do ofício, da família, dos colegas, dos amigos”.
Hoje,
depois dos ensinamentos solenes do Vaticano II, ninguém na Igreja porá em
dúvida a ortodoxia desta doutrina. Mas, quantos abandonaram realmente a sua
concepção única do apostolado dos leigos como um trabalho pastoral organizado
de cima para baixo? Quantos, superando a anterior concepção monolítica do
apostolado laical, compreendem que ele possa e inclusivamente deva também
existir sem necessidade de rígidas estruturas centralizadas, missões canónicas
e mandatos hierárquicos? Quantos, que qualificam o laicado de longa manus
Ecclesiae, não estarão a confundir ao mesmo tempo o conceito de Igreja-Povo de
Deus com o conceito mais limitado de Hierarquia? Ou ainda, quantos leigos
entendem devidamente que só em delicada comunhão com a Hierarquia têm direito a
reivindicar o seu âmbito legítimo de autonomia apostólica?
Poder-se-iam
formular considerações semelhantes em relação a outros problemas, porque é
realmente muito, muitíssimo, o que está ainda por conseguir, tanto na
necessária exposição doutrinal, como na educação das consciências e na própria
reforma da legislação eclesiástica. Peço muito ao Senhor - a oração sempre foi
a minha grande arma - que o Espírito Santo assista ao seu Povo, e especialmente
à Hierarquia, na realização destas tarefas. E peço-Lhe também que continue a
servir-Se do Opus Dei, para que possamos contribuir e ajudar, em tudo o que
estiver ao nosso alcance, neste difícil mas maravilhoso processo de
desenvolvimento e crescimento da Igreja.
22
Como
se insere o Opus Dei no Ecumenismo? - perguntava-me também. Já contei, no ano
passado, a um jornalista francês - e sei que encontrou eco, inclusivamente, em
publicações de irmãos separados - o que uma vez disse ao Santo Padre João
XXIII, movido pelo encanto afável e paterno do seu trato: “Santo Padre, na
nossa Obra, todos os homens, católicos ou não, encontraram sempre um ambiente
acolhedor: não aprendi o ecumenismo de Vossa Santidade”. Ele riu-se emocionado,
porque sabia que, já desde 1950, a Santa Sé tinha autorizado o Opus Dei a
receber como associados Cooperadores os não católicos e até os não cristãos.
São
muitos, efectivamente - e entre eles contam-se pastores e até bispos das suas
respectivas confissões -, os irmãos separados que se sentem atraídos pelo
espírito do Opus Dei e colaboram nos nossos apostolados. E são cada vez mais
frequentes - à medida que os contactos se intensificam - as manifestações de
simpatia e de cordial entendimento, resultantes de os sócios do Opus Dei
centrarem a sua espiritualidade no simples propósito de viver com sentido de
responsabilidade os compromissos e exigências baptismais do cristão. O desejo
de procurar a plenitude da vida cristã e de fazer apostolado, procurando a
santificação do trabalho profissional; a vida imersa nas realidades seculares,
respeitando a sua própria autonomia, mas tratando-as com espírito e amor de almas
contemplativas; a primazia que na organização dos nossos trabalhos concedemos à
pessoa, à acção do Espírito nas almas, ao respeito da dignidade e da liberdade
que provêm da filiação divina do cristão; a defesa contra a concepção
monolítica e institucionalista do apostolado dos leigos, da legítima capacidade
de iniciativa, adentro do necessário respeito pelo bem comum: estes e outros
aspectos mais, do nosso modo de ser e trabalhar, são pontos de fácil encontro,
onde os irmãos separados descobrem - feita vida, experimentada pelos anos - uma
boa parte dos princípios doutrinários em que eles e nós, os católicos, pomos
fundamentadas esperanças ecuménicas.
23
Mudando
de tema, gostaríamos de saber o que pensa em relação ao actual momento da
Igreja. Concretamente, como o qualificaria? Que papel julga poderem ter, neste
momento, as tendências que de modo geral têm sido chamadas “progressistas” e
“integristas”?
A
meu ver, o actual momento da Igreja poderia qualificar-se de positivo, e, ao
mesmo tempo, de delicado, como todas as crises de crescimento. Positivo, sem
dúvida, porque as riquezas doutrinais do Concílio Vaticano II colocaram a
Igreja inteira - todo o Povo sacerdotal de Deus - perante uma nova etapa,
sumamente esperançosa, de renovada fidelidade ao propósito divino da salvação
que se lhe confiou. Momento delicado também, porque as conclusões teológicas a
que se chegou não são de carácter - passe a expressão - abstracto ou teórico:
trata-se de uma teologia sumamente viva, quer dizer, com imediatas e directas
aplicações de ordem pastoral, ascética e disciplinar, que chegam ao mais íntimo
da vida interna e externa da comunidade cristã - liturgia, estruturas orgânicas
da Hierarquia, formas apostólicas, Magistério, diálogo com o mundo, ecumenismo,
etc. - e, portanto, também da vida cristã e da própria consciência dos fiéis.
Uma
e outra destas realidades trazem respectivamente à nossa alma, por um lado, o
optimismo cristão - a jubilosa certeza de que o Espírito Santo fará frutificar
abundantemente a doutrina com que enriqueceu a Esposa de Cristo - e, ao mesmo
tempo, a prudência por parte de quem investiga ou governa, porque,
especialmente agora, a falta de serenidade ou de ponderação no estudo dos
problemas poderia ocasionar um dano imenso.
Quanto
às tendências a que chama integristas e progressistas na sua pergunta,
torna-se-me difícil dar opinião sobre o papel que podem desempenhar neste
momento, porque, desde sempre, repeli a conveniência e inclusivamente a
possibilidade de se poderem fazer catalogações ou simplificações deste tipo.
Essa divisão - que às vezes é levada a extremos de verdadeiro paroxismo, ou se
procura perpetuar, como se os teólogos e os fiéis em geral estivessem
destinados a uma contínua orientação bipolar - parece-me que obedece, no fundo,
ao convencimento de que o progresso doutrinal e vital do Povo de Deus terá de
ser resultante de uma perpétua tensão dialéctica. Eu, pelo contrário, prefiro
acreditar - com toda a minha alma - na acção do Espírito Santo, que sopra onde
quer e em quem quer.
(cont)
[i] Entrevista
realizada por Pedro Rodríguez, publicada em Palabra (Madrid), Outubro de 1967