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Leitura Espiritual
Temas actuais do cristianismo |
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pergunta:
Tive
oportunidade, Monsenhor, de ouvir as respostas às perguntas que lhe fazia um
público de mais de 2000 pessoas, reunidas há ano e meio, em Pamplona.
Nessa
altura insistia na necessidade de que os católicos se comportem como cidadãos
livres e responsáveis e “de que não vivam de ser católicos”.
Que
importância e que projecção dá a esta ideia?
resposta:
Sempre
me incomodou a atitude daqueles que fazem de chamar-se católicos uma profissão
ou daqueles que querem negar o princípio da liberdade responsável, sobre o qual
assenta toda a moral cristã.
O
espírito da Obra e dos seus sócios é servir a Igreja e todas as criaturas sem
se servir da Igreja.
Gosto
de que o católico traga Cristo, não no nome, mas na conduta, dando real
testemunho de vida cristã.
Repugna-me
o clericalismo e compreendo que, ao lado de um anticlericalismo mau, exista um
anticlericalismo bom, que procede do amor ao sacerdócio, que se opõe a que o
simples fiel ou o sacerdote se sirvam de uma missão sagrada para fins terrenos.
Mas
não pense que com isto me declaro contra quem quer que seja. Não existe na
nossa Obra nenhuma preocupação exclusivista, mas somente o desejo de colaborar
com todos os que trabalham para Cristo e com todos os que, cristãos ou não,
fazem da sua vida uma esplêndida realidade de serviço.
De
resto, o que importa não é tanto a projecção que tenho dado a estas ideias,
especialmente desde 1928, mas a que lhe dá o Magistério da Igreja.
Há
pouco tempo, o Concílio - com uma emoção, para este pobre sacerdote, que é
difícil de explicar - lembrava a todos os cristãos, na Constituição Dogmática
Lumen gentium, que devem sentir-se plenamente cidadãos da cidade terrena,
participando em todas as actividades humanas com competência profissional e com
amor a todos os homens, procurando a perfeição cristã, à qual são chamados pelo
simples facto de terem recebido o baptismo.
Fim da entrevista realizada por
Jacques-Guillemé-Brûlon, publicada em Le Figaro (Paris) em 16 de Maio de 1966.
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pergunta:
Poderia
dizer se, ou até que ponto, tem o Opus Dei em Espanha uma orientação económica
ou política?
Em
caso afirmativo, poderia defini-la?
resposta:
O
Opus Dei não tem nenhuma orientação económica ou política, nem em Espanha nem
em nenhum outro sítio.
É
certo que, movidos pela doutrina de Cristo, os seus sócios defendem sempre a
liberdade pessoal, o direito que todos os homens têm a viver e a TRABALHAR, a
ser protegidos durante a doença e na velhice, a constituir um lar e a trazer
filhos ao mundo, a educar esses filhos de acordo com o talento de cada um e a
receber um tratamento digno de homens e de cidadãos.
Mas
a Obra não lhes propõe nenhum caminho concreto no campo económico, político ou
cultural.
Cada
um dos seus membros tem plena liberdade para pensar e actuar nessas matérias
como melhor lhe parecer.
Em
tudo aquilo que é temporal, os sócios da Obra são libérrimos: cabem no Opus Dei
pessoas de todas as tendências políticas, culturais, sociais e económicas que a
consciência cristã possa admitir.
Eu
nunca falo de política.
A
minha missão como sacerdote é exclusivamente espiritual.
Além
disso, mesmo que alguma vez exprimisse uma opinião em assuntos temporais, os
sócios da Obra não teriam nenhuma obrigação de a seguir.
Nunca
os directores da Obra podem impor um critério político ou profissional aos
outros membros.
Se
algum vez um sócio do Opus Dei tentasse fazê-lo, ou servir-se dos outros sócios
para fins humanos, seria expulso sem contemplações porque os outros se
revoltariam legitimamente.
Nunca
perguntei, nem perguntarei, a nenhum sócio da Obra de que partido é ou que
doutrina política defende, porque isso me parece um atentado à sua legítima liberdade.
E
fazem o mesmo os directores da Obra em todo o mundo.
Sei
contudo que entre os sócios da Obra - em Espanha como em qualquer outro país -
há de facto grande variedade de opiniões, e nada tenho a dizer em contrário.
Respeito-as
todas, como respeitarei qualquer opção temporal tomada por um homem que se
esforça por actuar segundo a sua consciência.
Esse
pluralismo não constitui um problema para a Obra.
Pelo
contrário, é uma manifestação de bom espírito, que patenteia a legítima
liberdade de cada um.
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pergunta:
É
um mito, uma meia-verdade ou uma realidade que o Opus Dei se converteu, em
Espanha, num potentado político e económico, através das posições que os seus
membros ocupam no mundo da política e da economia?
resposta:
É
simplesmente um erro.
A
maioria dos membros da Obra são pessoas de condição social mediana ou mesmo
modesta: operários, empregados de escritório, trabalhadores do campo,
empregadas domésticas, professores, etc. Há também alguns - muito menos - que
exercem a sua profissão no mundo da política e da economia.
Tanto
uns como outros actuam a título exclusivamente pessoal, com plena autonomia, e
respondem pessoalmente pelas suas actuações.
Os
fins do Opus Dei são exclusivamente espirituais.
A
todos os seus sócios, exerçam ou não uma especial influência social, só lhes
pede que lutem por viver uma vida plenamente cristã: não lhes dá nenhuma
orientação sobre o modo de realizar o seu TRABALHO; não tenta coordenar as suas
actividades; não se serve dos cargos que possam ocupar.
A
Obra poderia comparar-se a um clube desportivo ou a uma associação de fins
beneficentes, no sentido de que nada tem a ver com as actividades políticas ou
económicas que os seus sócios possam exercer.
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pergunta:
Se,
como pretendem os seus sócios, o Opus Dei é simplesmente uma associação
religiosa, em que cada indivíduo é livre de seguir as suas opiniões, como
explica a convicção, muito espalhada, de que o Opus Dei é uma organização
monolítica, com posições bem definidas em assuntos temporais?
resposta:
Não
me parece que esta opinião esteja realmente muito difundida. Bastantes dos
órgãos mais qualificados da imprensa internacional reconheceram já o pluralismo
dos sócios da Obra.
Houve
de facto algumas pessoas que defenderam a opinião errónea a que se refere.
É
possível que alguns, por diversos motivos, tenham difundido tal ideia, mesmo
sabendo que não corresponde à realidade.
Penso
que, em muitos outros casos, isso se pode atribuir à falta de conhecimento,
ocasionado talvez por deficiência de informação: não estando bem informadas,
não é de estranhar que as pessoas que não têm suficiente interesse por entrarem
em contacto pessoal com o Opus Dei e por se informarem bem, atribuam à Obra,
como tal, as opiniões de alguns sócios.
O
que é certo é que ninguém medianamente informado sobre os assuntos espanhóis
pode desconhecer a realidade do pluralismo existente entre os sócios da Obra.
Você
mesmo poderia citar com certeza muitos exemplos.
Outro
factor pode ser o preconceito subconsciente de pessoas que têm mentalidade de
partido único, no campo político ou no espiritual. Para quem tem esta
mentalidade e pretende que todos opinem do mesmo modo que ele, é difícil
acreditar que haja quem seja capaz de respeitar a liberdade dos outros.
Atribuem
assim à Obra o carácter monolítico que têm os seus próprios grupos.
Entrevista
realizada por Tad Szulc, correspondente do New York Times, em 7 de Outubro de
1966.
(cont)