Advento II Semana
Evangelho: Mt 17 10-13
10
Os discípulos perguntaram-Lhe: «Porque dizem, pois, os escribas que Elias deve
vir primeiro?». 11 Ele respondeu-lhes: «Elias certamente há-de vir e
restabelecerá todas as coisas. 12 Digo-vos, porém, que Elias já
veio, e não o reconheceram, antes fizeram dele o que quiseram. Assim também o
Filho do Homem há-de padecer às suas mãos». 13 Então os discípulos
compreenderam que falava de João Baptista.
Comentário:
Quem é João e
quem é o Messias?
A pergunta tem razão de ser porque a ignorância que grassava no tempo de Jesus,
era enorme.
E hoje?
Sabemos, de
facto, Quem é Jesus Cristo?
Temos uma visão correcta apoiada no conhecimento das Escrituras, nomeadamente
dos Evangelhos?
Não temos, ao contrário, uma visão pessoal que nos convenha ao que pensamos,
sobretudo, praticamos?
A leitura diária, atenta e detalhada do Evangelho, é fundamental para que essa
imagem e conhecimento sejam os correctos.
(ama,
comentário sobre, Mt 17, 10-13, 2013.12.14)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 57 a 63
57
O trabalho, participação
do poder divino
Desde
o começo da sua criação que o homem teve de trabalhar. Não sou eu quem o
inventa. Basta abrir as primeiras páginas da Sagrada Bíblia para aí se ler que
Deus formou Adão com o barro da terra e criou para ele e para a sua
descendência este mundo tão formoso, ut operaretur et custodiret illum, com o
fim de o trabalhar e de o conservar, e isto antes mesmo de o pecado entrar na
humanidade e, como consequência dessa ofensa, a morte, as penas e as misérias.
Temos,
pois, de nos convencer de que o trabalho é uma realidade magnífica, que se nos
impõe como lei inexorável a que todos estamos submetidos, de uma ou de outra forma,
apesar de alguns pretenderem eximir-se a ela. Aprendei-o bem: esta obrigação
não surgiu como uma sequela do pecado original, nem se reduz a uma descoberta
dos tempos modernos. Trata-se de um meio necessário que Deus nos confia na
terra, alongando os nossos dias e tornando-nos partícipes do seu poder criador,
para que ganhemos o nosso sustento e, simultaneamente, recolhamos frutos para a
vida eterna: o homem nasce para trabalhar, como as aves para voar.
Talvez
me digais que já se passaram muitos séculos, que muito pouca gente pensa desta
maneira, que a maioria provavelmente se afana por motivos bem diversos: uns,
por dinheiro; outros, para manter a família; outros, na mira de conseguir uma
certa posição social, para desenvolver as suas capacidades, para satisfazer as
suas paixões desordenadas, para contribuir para o progresso social. E todos, em
geral, encaram as suas ocupações como uma necessidade de que não podem
evadir-se.
Perante
esta visão plana, egoísta, rasteira, tu e eu temos de recordar a nós mesmos e
de recordar aos outros que somos filhos de Deus, a quem o nosso Pai dirigiu um
convite idêntico ao daqueles personagens da parábola evangélica: filho, vai
trabalhar na minha vinha. Posso assegurar-vos que aprenderemos a terminar as
nossas tarefas com a maior perfeição humana e sobrenatural de que somos
capazes, se nos empenharmos em considerar assim diariamente as nossas
obrigações pessoais como ordem divina. É possível que nos rebelemos numa ou
noutra ocasião como o filho mais velho, que respondeu: não quero!. Saberemos,
contudo, reagir e, desde que nos arrependamos, dedicar-nos-emos mais
esforçadamente ao cumprimento do dever.
58
Se
a simples presença de uma pessoa de categoria, digna de consideração, é
suficiente para que se comportem melhor aqueles que estão à sua volta, como é
que a presença de Deus, constante, sentida em todos os recantos, conhecida
pelas nossas potências e amada gratamente, não nos torna sempre melhores em
todas as nossas palavras, acções e sentimentos? Se, efectivamente, a realidade
que consiste em Deus nos ver estivesse bem gravada nas nossas consciências e se
nos apercebêssemos de que todo o nosso trabalho, sem qualquer excepção, se
desenvolve na sua presença - porque nada escapa ao seu olhar - com que cuidado
terminaríamos as coisas ou como seriam diferentes as nossas reacções! Ora, este
é o segredo da santidade que prego há tantos anos: Deus chamou-nos a todos para
que o imitemos; e a vós e a mim para que, vivendo no meio do mundo - sendo
homens da rua - saibamos pôr Cristo Nosso Senhor no cume de todas as
actividades humanas honestas.
Deveis
agora compreender ainda melhor que, se algum de vós não amasse o trabalho que
lhe corresponde, se não se sentisse autenticamente comprometido em santificar
uma das nobres ocupações terrenas, se carecesse de uma vocação profissional,
nunca chegaria a penetrar na essência sobrenatural da doutrina que expõe este
sacerdote, porque lhe faltaria, precisamente, uma condição indispensável: a de
ser um trabalhador.
59
Aviso-vos,
sem qualquer presunção da minha parte, que noto rapidamente se estas minhas
palavras caem em saco roto ou passam ao lado daquele que me ouve. Deixai que
vos abra o meu coração, para que me ajudeis a dar graças a Deus. Quando, em
1928, vi o que o Senhor queria de mim, comecei imediatamente o trabalho.
Naqueles anos - obrigado, meu Deus, porque houve muito que sofrer e muito que
amar! - alguns tomaram-me por louco. Outros, alardeando compreensão,
chamavam-me sonhador, mas sonhador de sonhos impossíveis. Apesar dos pesares e
da minha própria miséria, continuei sem desanimar. Como aquilo não era meu,
foi-se abrindo caminho no meio das dificuldades e hoje é uma realidade
estendida por toda a terra, de polo a polo, que parece muito natural à maioria
das pessoas, porque o Senhor se encarregou de a fazer reconhecer como coisa
sua.
Dizia-vos
que, mal troco duas palavras com alguém, descubro logo se ele me compreende ou
não. Não me acontece como à galinha que está a chocar a ninhada e sob a qual
mão estranha coloca um ovo de pata. Passam-se os dias e só quando os pintainhos
partem a casca e vê passarinhar aquela espécie de bocadinho de lã, descobre
através do seu andar desajeitado - pata aqui, pata acolá - que esse não é um
dos seus e que jamais aprenderá a piar, por mais que se empenhe. Nunca
maltratei ninguém que me tenha voltado as costas, nem sequer quando me pagaram
com insolência os meus desejos de ajudar. Por isso, pelo ano de 1939, chamou-me
a atenção um letreiro que encontrei num edifício, onde me encontrava a dar um
retiro a universitários. Dizia assim: Cada caminhante siga o seu caminho. Era
um conselho digno de ser aproveitado.
60
Perdoai-me
esta divagação e, embora não nos tenhamos afastado do tema, voltemos ao seu fio
condutor. Convencei-vos de que a vocação profissional é parte essencial e
inseparável da nossa condição de cristãos. O Senhor quer que sejais santos no
lugar onde estais e no trabalho que haveis escolhido pelas razões que vos
aprouveram: pela minha parte, todos me parecem bons e nobres - desde que não se
oponham à lei divina - e capazes de ser elevados ao plano sobrenatural, isto é,
enxertados nessa corrente de Amor que define a vida de um filho de Deus.
Não
posso deixar de ficar um pouco desassossegado quando alguma pessoa, ao falar da
sua profissão, põe cara de vítima, afirma que lhe absorve não sei quantas horas
por dia e, na realidade, não desenvolve sequer metade do trabalho de muitos dos
seus companheiros que, ao fim e ao cabo, talvez só se esforcem por critérios
egoístas ou, pelo menos, meramente humanos. Todos nós, que estamos aqui, mantendo
um diálogo pessoal com Jesus, desempenhamos alguma ocupação bem precisa: de
médico, de advogado, de economista... Pensai um pouco nos vossos colegas que
sobressaem pelo seu prestígio profissional, pela sua honradez e pelo seu
serviço abnegado. Não dedicam muitas horas do dia - e até da noite - a essa
tarefa? Não teremos algo a aprender deles?
Enquanto
falo, também vou examinando a minha conduta e confesso-vos que, ao pôr essa pergunta
a mim mesmo, sinto um pouco de vergonha e o desejo imediato de pedir perdão a
Deus, pensando na minha resposta tão débil, tão afastada da missão que Deus nos
confiou no mundo. Cristo - escreve um Padre da Igreja - escolheu--nos para que
fôssemos como lâmpadas; para que nos convertêssemos em mestres dos demais; para
que actuássemos como fermento; para que vivêssemos como anjos entre os homens,
como adultos entre crianças, como espirituais entre gente somente racional;
para que fôssemos semente; para que produzíssemos fruto. Não seria necessário
abrir a boca, se a nossa vida resplandecesse desta maneira. Sobrariam as
palavras, se mostrássemos as obras. Não haveria um só pagão, se nós fôssemos
verdadeiramente cristãos.
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Valor exemplar da vida
profissional
Temos
de evitar o erro de considerar que o apostolado se reduz ao testemunho de
algumas práticas piedosas. Tu e eu somos cristãos, mas, ao mesmo tempo e sem
solução de continuidade, cidadãos e trabalhadores, com obrigações bem nítidas
que temos de cumprir exemplarmente, se deveras queremos santificar-nos. É Jesus
Cristo que nos estimula: Vós sois a luz do mundo. Não se pode ocultar uma
cidade situada sobre um monte. Nem se acende uma candeia para a colocar debaixo
do alqueire, mas sim sobre o candelabro, e assim alumia quantos estão em casa.
Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, a fim de que, vendo as
vossas boas obras, glorifiquem vosso Pai que está nos céus.
Seja
qual for, o trabalho profissional converte-se numa luz que ilumina os vossos
colegas e amigos. Por isso, costumo repetir aos que se incorporam no Opus Dei,
e a minha afirmação vale também para todos aqueles que me ouvis: que me importa
que me digam que fulano de tal é um bom filho meu - um bom cristão - mas um mau
sapateiro?! Se não se esforçar por aprender bem o seu ofício, ou por executar o
seu trabalho com esmero, não poderá santificá-lo nem oferecê-lo ao Senhor. Ora,
a santificação do trabalho ordinário constitui como que o fundamento da
verdadeira espiritualidade para aqueles que, como nós, estão decididos a viver
na intimidade de Deus, imersos nas realidades temporais.
62
Lutai
contra essa excessiva compreensão que cada um tem para consigo mesmo: sede
exigentes para vós próprios. Às vezes, pensamos demasiadamente na saúde e no
descanso, que aliás não deve faltar, precisamente porque é preciso voltar ao
trabalho com forças renovadas. Esse descanso, porém, escrevi-o há já tantos
anos, não é não fazer nada, mas distrairmo-nos em actividades que exigem menos
esforço.
Noutras
ocasiões, com falsas desculpas, somos excessivamente comodistas, esquecemo-nos
da bendita responsabilidade que pesa sobre os nossos ombros, conformamo-nos com
fazer o que é minimamente indispensável e deixamo-nos arrastar por razões sem
razão para nada fazermos, enquanto Satanás e os seus amigos não tiram férias.
Ouve e medita com atenção o que S. Paulo escrevia aos cristãos que eram
escravos; instava-os a obedecerem aos seus amos: não os sirvais como quem
trabalha somente porque é visto e para agradar aos homens, mas como servos de
Cristo que fazem a vontade de Deus com todo o coração e servi-os com amor,
sabendo que servis ao Senhor e não a homens. Que bom conselho para que o
sigamos tu e eu!
Peçamos
luz a Jesus Cristo Nosso Senhor e roguemos-lhe que nos ajude a descobrir, a
cada instante, o sentido divino que transforma a nossa vocação profissional no
gonzo sobre o qual assenta e gira a nossa chamada à santidade. Verificareis no
Evangelho que Jesus era conhecido como faber, filius Mariæ, o trabalhador, o
filho de Maria. Também nós, com orgulho santo, temos de demonstrar com factos
que somos trabalhadores, homens e mulheres de trabalho!
Porque
havemos de nos comportar sempre como enviados de Deus, devemos ter bem presente
que não o servimos com lealdade quando abandonamos a nossa tarefa, quando não
compartilhamos com os outros o empenho e a abnegação no cumprimento dos
compromissos profissionais ou quando nos possam classificar como inconstantes,
inconvenientes, frívolos, desordenados, preguiçosos e inúteis... Na verdade,
quem descuida essas obrigações aparentemente menos importantes, só com
dificuldade vencerá nas da vida interior que, certamente, são mais custosas.
Quem é fiel nas coisas pequenas, é fiel também nas grandes; e quem é injusto
nas pequenas coisas, é injusto também nas grandes.
63
Não
estou a falar de ideais imaginários. Atenho-me a uma realidade muito concreta,
de capital importância, capaz de modificar o ambiente mais pagão e mais hostil
às exigências divinas, como aconteceu na primeira época da era da nossa
salvação. Saboreai estas palavras de um autor anónimo desses tempos, o qual
resume assim a grandeza da nossa vocação: os cristãos são para o mundo o que a
alma é para o corpo. Vivem no mundo, mas não são mundanos, tal como a alma está
no corpo, mas não é corpórea. Habitam em todos os povoados, como a alma está em
todas as partes do corpo. Agem mediante a sua vida interior sem se fazerem
notar, como a alma mediante a sua essência... Vivem como peregrinos entre
coisas perecedoiras, na esperança da incorruptibilidade dos céus, como a alma
imortal vive agora numa tenda mortal. Multiplicam-se dia-a-dia sob o peso das
perseguições, como a alma se aformoseia pela mortificação... E não é lícito aos
cristãos abandonarem a sua missão no mundo, como não é permitido à alma
separar-se voluntariamente do corpo.
Por
esta razão, enganar-nos-íamos no caminho, se não déssemos importância às
ocupações temporais. Também aí vos espera o Senhor. Podeis ter a certeza de que
nós, homens, nos havemos de aproximar de Deus através das circunstâncias da
vida corrente, ordenadas ou permitidas pela Providência na sua sabedoria
infinita. Não atingiremos esse fim, se não nos esforçarmos por terminar bem a
nossa tarefa; se não perseverarmos no afã pelo trabalho começado com empenho
humano e sobrenatural; se não desempenharmos bem o nosso ofício como o melhor
e, se é possível - e penso que, se tu verdadeiramente quiseres, assim será -
melhor do que o melhor, porque usaremos todos os meios terrenos honrados e os
espirituais que forem necessários para oferecer a Nosso Senhor um trabalho
primoroso, acabado como uma peça de filigrana, perfeito.
(cont)