01/03/2014

Evangelho do dia e comentário

Tempo comum VII Semana


Leitura espiritual para Mar 01

Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemariaCaminho 116)

Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.

Evangelho: Lc 2, 21-40

21 Depois que se completaram os oito dias para ser circuncidado o Menino, deram-Lhe o nome de Jesus, como Lhe tinha chamado o anjo, antes que fosse concebido no ventre materno. 22 Depois que se completaram os dias da purificação de Maria, segundo a Lei de Moisés, levaram-n'O a Jerusalém para O apresentar ao Senhor 23 segundo o que está escrito na Lei do Senhor: “Todo o varão primogénito será consagrado ao Senhor”, 24 e para oferecerem em sacrifício, conforme o que também está escrito na Lei do Senhor: “Um par de rolas ou dois pombinhos”. 25 Havia então em Jerusalém um homem chamado Simeão. Este homem era justo e piedoso; esperava a consolação de Israel, e o Espírito Santo estava nele. 26 Tinha-lhe sido revelado pelo Espírito Santo que não veria a morte sem ver primeiro o Cristo do Senhor. 27 Foi ao templo conduzido pelo Espírito. E, levando os pais o Menino Jesus, para cumprirem as prescrições usuais da Lei a Seu respeito, 28 ele tomou-O nos braços e louvou a Deus, dizendo: 29 «Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz segundo a Tua palavra; 30 porque os meus olhos viram a Tua salvação, 31 que preparaste em favor de todos os povos; 32 luz para iluminar as nações, e glória de Israel, Teu povo». 33 O Seu pai e a Sua mãe estavam admirados das coisas que d'Ele se diziam. 34 Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe: «Eis que este Menino está posto para ruína e ressurreição de muitos em Israel e para ser sinal de contradição. 35 E uma espada trespassará a tua alma. Assim se descobrirão os pensamentos escondidos nos corações de muitos». 36 Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era de idade muito avançada. Tinha vivido sete anos com o seu marido, após o seu tempo de donzela, 37 e tinha permanecido viúva até aos oitenta e quatro anos, e não se afastava do templo, servindo a Deus noite e dia com jejuns e orações. 38 Ela também, vindo nesta mesma ocasião, louvava a Deus e falava de Jesus a todos os de Jerusalém que esperavam a redenção. 39 Depois que cumpriram tudo, segundo o que mandava a Lei do Senhor, voltaram para a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. 40 O Menino crescia e fortificava-Se, cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava com Ele.


EXORTAÇÃO APOSTÓLICA
EVANGELII GAUDIUM
DO SANTO PADRE FRANCISCO
AO EPISCOPADO, AO CLERO ÀS PESSOAS CONSAGRADAS E AOS FIÉIS LEIGOS
SOBRE
O ANÚNCIO DO EVANGELHO NO MUNDO ACTUAL


Capítulo I

A TRANSFORMAÇÃO MISSIONÁRIA DA IGREJA

1. A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria. Quero, com esta Exortação, dirigir-me aos fiéis cristãos a fim de os convidar para uma nova etapa evangelizadora marcada por esta alegria e indicar caminhos para o percurso da Igreja nos próximos anos.

I. Alegria que se renova e comunica

2. O grande risco do mundo actual, com sua múltipla e avassaladora oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada. Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros, já não entram os pobres, já não se ouve a voz de Deus, já não se goza da doce alegria do seu amor, nem fervilha o entusiasmo de fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes. Muitos caem nele, transformando-se em pessoas ressentidas, queixosas, sem vida. Esta não é a escolha duma vida digna e plena, este não é o desígnio que Deus tem para nós, esta não é a vida no Espírito que jorra do coração de Cristo ressuscitado.

3. Convido todo o cristão, em qualquer lugar e situação que se encontre, a renovar hoje mesmo o seu encontro pessoal com Jesus Cristo ou, pelo menos, a tomar a decisão de se deixar encontrar por Ele, de O procurar dia a dia sem cessar. Não há motivo para alguém poder pensar que este convite não lhe diz respeito, já que «da alegria trazida pelo Senhor ninguém é excluído» 1. Quem arrisca, o Senhor não o desilude; e, quando alguém dá um pequeno passo em direcção a Jesus, descobre que Ele já aguardava de braços abertos a sua chegada. Este é o momento para dizer a Jesus Cristo: «Senhor, deixei-me enganar, de mil maneiras fugi do vosso amor, mas aqui estou novamente para renovar a minha aliança convosco. Preciso de Vós. Resgatai-me de novo, Senhor; aceitai-me mais uma vez nos vossos braços redentores». Como nos faz bem voltar para Ele, quando nos perdemos! Insisto uma vez mais: Deus nunca Se cansa de perdoar, somos nós que nos cansamos de pedir a sua misericórdia. Aquele que nos convidou a perdoar «setenta vezes sete» (Mt 18, 22) dá-nos o exemplo: Ele perdoa setenta vezes sete. Volta uma vez e outra a carregar-nos aos seus ombros. Ninguém nos pode tirar a dignidade que este amor infinito e inabalável nos confere. Ele permite-nos levantar a cabeça e recomeçar, com uma ternura que nunca nos defrauda e sempre nos pode restituir a alegria. Não fujamos da ressurreição de Jesus; nunca nos demos por mortos, suceda o que suceder. Que nada possa mais do que a sua vida que nos impele para diante!

4. Os livros do Antigo Testamento preanunciaram a alegria da salvação, que havia de tornar-se superabundante nos tempos messiânicos. O profeta Isaías dirige-se ao Messias esperado, saudando-O com regozijo: «Multiplicaste a alegria, aumentaste o júbilo» (9, 2). E anima os habitantes de Sião a recebê-Lo com cânticos: «Exultai de alegria!» (12, 6). A quem já O avistara no horizonte, o profeta convida-o a tornar-se mensageiro para os outros: «Sobe a um alto monte, arauto de Sião! Grita com voz forte, arauto de Jerusalém» (40, 9). A criação inteira participa nesta alegria da salvação: «Cantai, ó céus! Exulta de alegria, ó terra! Rompei em exclamações, ó montes! Na verdade, o Senhor consola o seu povo e se compadece dos desamparados» (49, 13).

Zacarias, vendo o dia do Senhor, convida a vitoriar o Rei  que chega «humilde, montado num jumento»: «Exulta de alegria, filha de Sião! Solta gritos de júbilo, filha de Jerusalém! Eis que o teu rei vem a ti. Ele é justo e vitorioso» (9, 9). Mas o convite mais tocante talvez seja o do profeta Sofonias, que nos mostra o próprio Deus como um centro irradiante de festa e de alegria, que quer comunicar ao seu povo este júbilo salvífico. Enche-me de vida reler este texto: «O Senhor, teu Deus, está no meio de ti como poderoso salvador! Ele exulta de alegria por tua causa, pelo seu amor te renovará. Ele dança e grita de alegria por tua causa» (3, 17).

É a alegria que se vive no meio das pequenas coisas da vida quotidiana, como resposta ao amoroso convite de Deus nosso Pai: «Meu filho, se tens com quê, trata-te bem (...). Não te prives da felicidade presente» (Sir 14, 11.14). Quanta ternura paterna se vislumbra por detrás destas palavras!

5. O Evangelho, onde resplandece gloriosa a Cruz de Cristo, convida insistentemente à alegria. Apenas alguns exemplos: «Alegra-te» é a saudação do anjo a Maria (Lc 1, 28). A visita de Maria a Isabel faz com que João salte de alegria no ventre de sua mãe (cf. Lc 1, 41). No seu cântico, Maria proclama: «O meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador» (Lc 1, 47). E, quando Jesus começa o seu ministério, João exclama: «Esta é a minha alegria! E tornou-se completa!» (Jo 3, 29). O próprio Jesus «estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo» (Lc 10, 21). A sua mensagem é fonte de alegria: «Manifestei-vos estas coisas, para que esteja em vós a minha alegria, e a vossa alegria seja completa» (Jo 15, 11). A nossa alegria cristã brota da fonte do seu coração transbordante. Ele promete aos seus discípulos: «Vós haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há-de converter-se em alegria» (Jo 16, 20). E insiste: «Eu hei-de ver-vos de novo! Então, o vosso coração há-de alegrar-se e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria» (Jo 16, 22). Depois, ao verem-No ressuscitado, «encheram-se de alegria» (Jo 20, 20). O livro dos Actos dos Apóstolos conta que, na primitiva comunidade, «tomavam o alimento com alegria» (2, 46). Por onde passaram os discípulos, «houve grande alegria» (8, 8); e eles, no meio da perseguição, «estavam cheios de alegria» (13, 52). Um eunuco, recém-baptizado, «seguiu o seu caminho cheio de alegria» (8, 39); e o carcereiro «entregou-se, com a família, à alegria de ter acreditado em Deus» (16, 34). Porque não havemos de entrar, também nós, nesta torrente de alegria?

6. Há cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa. Reconheço, porém, que a alegria não se vive da mesma maneira em todas as etapas e circunstâncias da vida, por vezes muito duras. Adapta-se e transforma-se, mas sempre permanece pelo menos como um feixe de luz que nasce da certeza pessoal de, não obstante o contrário, sermos infinitamente amados. Compreendo as pessoas que se vergam à tristeza por causa das graves dificuldades que têm de suportar, mas aos poucos é preciso permitir que a alegria da fé comece a despertar, como uma secreta mas firme confiança, mesmo no meio das piores angústias: «A paz foi desterrada da minha alma, já nem sei o que é a felicidade (…). Isto, porém, guardo no meu coração; por isso, mantenho a esperança. É que a misericórdia do Senhor não acaba, não se esgota a sua compaixão. Cada manhã ela se renova; é grande a tua fidelidade. (...) Bom é esperar em silêncio a salvação do Senhor» (Lm 3, 17.21-23.26).

7. A tentação apresenta-se, frequentemente, sob forma de desculpas e queixas, como se tivesse de haver inúmeras condições para ser possível a alegria. Habitualmente isto acontece, porque «a sociedade técnica teve a possibilidade de multiplicar as ocasiões de prazer; no entanto ela encontra dificuldades grandes no engendrar também a alegria». 2 Posso dizer que as alegrias mais belas e espontâneas, que vi ao longo da minha vida, são as alegrias de pessoas muito pobres que têm pouco a que se agarrar. Recordo também a alegria genuína daqueles que, mesmo no meio de grandes compromissos profissionais, souberam conservar um coração crente, generoso e simples. De várias maneiras, estas alegrias bebem na fonte do amor maior, que é o de Deus, a nós manifestado em Jesus Cristo. Não me cansarei de repetir estas palavras de Bento XVI que nos levam ao centro do Evangelho: «Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo». 3

8. Somente graças a este encontro – ou reencontro – com o amor de Deus, que se converte em amizade feliz, é que somos resgatados da nossa consciência isolada e da auto-referencialidade. Chegamos a ser plenamente humanos, quando somos mais do que humanos, quando permitimos a Deus que nos conduza para além de nós mesmos a fim de alcançarmos o nosso ser mais verdadeiro. Aqui está a fonte da acção evangelizadora. Porque, se alguém acolheu este amor que lhe devolve o sentido da vida, como é que pode conter o desejo de o comunicar aos outros?

II. A doce e reconfortante alegria de evangelizar

9. O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de beleza procura, por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos outros. E, uma vez comunicado, o bem radica-se e desenvolve-se. Por isso, quem deseja viver com dignidade e em plenitude, não tem outro caminho senão reconhecer o outro e buscar o seu bem. Assim, não nos deveriam surpreender frases de São Paulo como estas: «O amor de Cristo nos absorve completamente» (2 Cor 5, 14); «ai de mim, se eu não evangelizar!» (1 Cor 9, 16).

10. A proposta é viver a um nível superior, mas não com menor intensidade: «Na doação, a vida se fortalece; e se enfraquece no comodismo e no isolamento. De facto, os que mais desfrutam da vida são os que deixam a segurança da margem e se apaixonam pela missão de comunicar a vida aos demais» 4. Quando a Igreja faz apelo ao compromisso evangelizador, não faz mais do que indicar aos cristãos o verdadeiro dinamismo da realização pessoal: «Aqui descobrimos outra profunda lei da realidade: “A vida se alcança e amadurece à medida que é entregue para dar vida aos outros”. Isto é, definitivamente, a missão» 5. Consequentemente, um evangelizador não deveria ter constantemente uma cara de funeral. Recuperemos e aumentemos o fervor de espírito, «a suave e reconfortante alegria de evangelizar, mesmo quando for preciso semear com lágrimas! (...) E que o mundo do nosso tempo, que procura ora na angústia ora com esperança, possa receber a Boa Nova dos lábios, não de evangelizadores tristes e descoroçoados, impacientes ou ansiosos, mas sim de ministros do Evangelho cuja vida irradie fervor, pois foram quem recebeu primeiro em si a alegria de Cristo» 6.

Uma eterna novidade

11. Um anúncio renovado proporciona aos crentes, mesmo tíbios ou não praticantes, uma nova alegria na fé e uma fecundidade evangelizadora. Na realidade, o seu centro e a sua essência são sempre o mesmo: o Deus que manifestou o seu amor imenso em Cristo morto e ressuscitado. Ele torna os seus fiéis sempre novos; ainda que sejam idosos, «renovam as suas forças. Têm asas como a águia, correm sem se cansar, marcham sem desfalecer» (Is 40, 31). Cristo é a «Boa Nova de valor eterno» (Ap 14, 6), sendo «o mesmo ontem, hoje e pelos séculos» (Heb 13, 8), mas a sua riqueza e a sua beleza são inesgotáveis. Ele é sempre jovem, e fonte de constante novidade. A Igreja não cessa de se maravilhar com a «profundidade de riqueza, de sabedoria e de ciência de Deus» (Rm 11, 33). São João da Cruz dizia: «Esta espessura de sabedoria e ciência de Deus é tão profunda e imensa, que, por mais que a alma saiba dela, sempre pode penetrá-la mais profundamente». 7 Ou ainda, como afirmava Santo Ireneu: «Na sua vinda, Cristo trouxe consigo toda a novidade». 8 Com a sua novidade, Ele pode sempre renovar a nossa vida e a nossa comunidade, e a proposta cristã, ainda que atravesse períodos obscuros e fraquezas eclesiais, nunca envelhece. Jesus Cristo pode romper também os esquemas enfadonhos em que pretendemos aprisioná-Lo, e surpreende-nos com a sua constante criatividade divina. Sempre que procuramos voltar à fonte e recuperar o frescor original do Evangelho, despontam novas estradas, métodos criativos, outras formas de expressão, sinais mais eloquentes, palavras cheias de renovado significado para o mundo actual. Na realidade, toda a acção evangelizadora autêntica é sempre «nova».

12. Embora esta missão nos exija uma entrega generosa, seria um erro considerá-la como uma heróica tarefa pessoal, dado que ela é, primariamente e acima de tudo o que possamos sondar e compreender, obra de Deus. Jesus é «o primeiro e o maior evangelizador». 9 Em qualquer forma de evangelização, o primado é sempre de Deus, que quis chamar-nos para cooperar com Ele e impelir-nos com a força do seu Espírito. A verdadeira novidade é aquela que o próprio Deus misteriosamente quer produzir, aquela que Ele inspira, aquela que Ele provoca, aquela que Ele orienta e acompanha de mil e uma maneiras. Em toda a vida da Igreja, deve-se sempre manifestar que a iniciativa pertence a Deus, «porque Ele nos amou primeiro» (1 Jo 4, 19) e é «só Deus que faz crescer» (1 Cor 3, 7). Esta convicção permite-nos manter a alegria no meio duma tarefa tão exigente e desafiadora que ocupa inteiramente a nossa vida. Pede-nos tudo, mas ao mesmo tempo dá-nos tudo.

13. E também não deveremos entender a novidade desta missão como um desenraizamento, como um esquecimento da história viva que nos acolhe e impele para diante. A memória é uma dimensão da nossa fé, que, por analogia com a memória de Israel, poderíamos chamar «deuteronómica». Jesus deixa-nos a Eucaristia como memória quotidiana da Igreja, que nos introduz cada vez mais na Páscoa (cf. Lc 22, 19). A alegria evangelizadora refulge sempre sobre o horizonte da memória agradecida: é uma graça que precisamos de pedir. Os Apóstolos nunca mais esqueceram o momento em que Jesus lhes tocou o coração: «Eram as quatro horas da tarde» (Jo 1, 39). A memória faz-nos presente, juntamente com Jesus, uma verdadeira «nuvem de testemunhas» (Heb 12, 1). De entre elas, distinguem-se algumas pessoas que incidiram de maneira especial para fazer germinar a nossa alegria crente: «Recordai-vos dos vossos guias, que vos pregaram a palavra de Deus» (Heb 13, 7). Às vezes, trata-se de pessoas simples e próximas de nós, que nos iniciaram na vida da fé: «Trago à memória a tua fé sem fingimento, que se encontrava já na tua avó Lóide e na tua mãe Eunice» (2 Tm 1, 5). O crente é, fundamentalmente, «uma pessoa que faz memória».

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Notas:
1 Paulo VI, Exort. ap. Gaudete in Domino (9 de Maio de 1975), 22: AAS 67 (1975), 297.
2 Ibid., 8: o. c., 292.
3 Carta enc. Deus caritas est (25 de Dezembro de 2005), 1: AAS 98 (2006), 217.
4V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, Documento de Aparecida (29 de Junho de 2007), 360.
5 Ibid., 360.
6 Paulo VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8 de Dezembro de 1975), 80: AAS 68 (1976), 75.
7 Cântico espiritual, 36, 10.
8 Adversus haereses, IV, 34, 1: PG 7, 1083: «Omnem novitatem attulit, semetipsum afferens».
9 Paulo VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8 de Dezembro de 1975), 7: AAS 68 (1976), 9.


Tratado dos vícios e pecados 26

Questão 74: Do sujeito dos pecados.

Em seguida devemos tratar do sujeito dos vícios ou dos pecados. E sobre esta questão discutem-se dez artigos:
Art. 1 ― Se a vontade pode ser sujeito do pecado.
Art. 2 ― Se só a vontade é sujeito do pecado.
Art. 3 ― Se na sensualidade pode haver pecado.
Art. 4 ― Se na sensualidade pode haver pecado mortal.
Art. 5 ― Se o pecado pode existir na razão.
Art. 6 ― Se o pecado da deleitação morosa reside na razão.
Art. 7 ― Se o pecado do consentimento no acto reside na razão superior.
Art. 8 ― Se o consentimento na deleitação é pecado mortal.
Art. 9 ― Se na razão superior, enquanto directiva das potências inferiores, i. é, enquanto consente no acto do pecado, pode haver pecado venial.
Art. 10 – Se na razão superior, como tal, i. é, enquanto contempla as razões eternas, pode haver pecado venial.

Art. 1 ― Se a vontade pode ser sujeito do pecado.

O primeiro discute-se assim. ― Parece que a vontade não pode ser sujeito do pecado.

1. ― Pois, como diz Dionísio, o mal é contrário à vontade e à intenção 1. Ora, o pecado constitui um mal. Logo, não pode existir na vontade.

2. Demais. ― A vontade busca o bem ou a aparência dele. Ora, querendo o bem, não peca, e o querer o bem aparente, que não é verdadeiramente bem, pertence a uma deficiência, antes, da virtude apreensiva, que da vontade. Logo, nesta o pecado de nenhum modo existe.

3. Demais. ― Não se pode identificar o sujeito e a causa eficiente do pecado, porque a causa eficiente e a material não têm a mesma incidência, como diz Aristóteles 2. Ora, a vontade é causa eficiente do pecado, pois, no dizer de Agostinho, a primeira causa do pecado é a vontade 3. Logo, esta não é sujeito do mesmo.

Mas, em contrário, diz Agostinho, que, pela vontade, pecamos e vivemos retamente 4.

Como já dissemos (q. 21, a. 1, q. 71, a. 1, 6), o pecado é um acto. Ora, há actos transitivos para a matéria exterior, como queimar e cortar. E a matéria e o sujeito desses é aquilo sobre o que recai a acção, assim, o Filósofo diz, que o movimento é o acto do móvel, procedente do motor 5. Outros actos porém não são transeuntes para a matéria exterior, mas permanecem no agente, como desejar e conhecer, e esses são todos actos morais, quer sejam de virtudes, quer de pecados. Donde e necessariamente, o sujeito próprio do acto pecaminoso é a potência, que é princípio do mesmo. Ora, como é próprio dos actos morais o serem voluntários, segundo já estabelecemos (q. 1, a. 1, q. 18, a. 6, 9), resulta que a vontade, princípio dos actos voluntários, bons ou maus, que são os pecados, é princípio destes. Donde se conclui, que o pecado está na vontade como no sujeito.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Diz-se que o mal é contrário à vontade, porque esta não tende para ele, como tal. Mas como há males que são bens aparentes, a vontade deseja às vezes algum mal, e deste modo há mal nela.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Se a deficiência da faculdade apreensiva de nenhum modo dependesse da vontade, seguir-se-ia a não existência do pecado, nem nesta nem naquela, como é o caso dos que laboram em ignorância invencível. Donde se conclui que também a deficiência da faculdade apreensiva, dependente da vontade, contribui para o pecado.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― A objecção colhe no atinente às causas eficientes, cujas acções, transitivas para a matéria exterior, não se movem a si mesmas, mas a outros móveis. Ora, o contrário dá-se com a vontade. Logo, a objecção não procede.

Revisão da tradução portuguesa por ama

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Notas:
1. De div. nom. (lect. XXII).
2. II Physic. (lect. XI).
3. De duabus animabus (c. X, XI).
4. Lib. I Retract., cap. IX.
5. III Physic., lect. IV.






Reflectindo 8


Cruz


Nesta tarde de Sábado, dei por mim num diálogo aceso, impulsivo.
Um diálogo comigo mesmo!

Estranha coisa!


Parece-me uma perda de tempo, porque, na verdade, não se trata de um diálogo no verdadeiro sentido do termo mas de um monólogo.

Desta discussão será difícil surgir um vencedor. Que um prevaleça sobre o outro parece-me quase impossível já que conheço em detalhe os argumentos de cada uma das partes.

Pensando um pouco melhor… resolvi continuar.

Perda de tempo?

Não… talvez conseguisse arranjar algo que justificasse este envolvimento em coisa tão singular.
Argumentei muito com a vida, as incidências do dia-a-dia, daquilo que acontece contra todas as previsões, as dificuldades, os problemas, os entusiasmos e sonhos caídos por terra, a conclusão, por vezes triste, de uma condição humana nada agradável.
Não entendo como é possível este ‘encarniçamento’ divino contra mim.

O que é que Deus pretende?

Levar-me ao limite das minhas forças, da minha compreensão, da minha capacidade de aceitar?

Porque, na verdade, parece-me que é isto que tem acontecido e, pior, parece-me que é isto que vai continuar a acontecer só que, piorando e muito as coisas.
É possível Deus ter-se enganado a meu respeito, achar que eu sou capaz, que aguento, que “convenho” realmente aos Seus planos, sejam eles quais forem?
Que qualidades terá encontrado – qualidades que eu não descubro – para Se ‘arriscar’ em tal aventura?
Dei comigo a pensar na vida e na morte e, chego à conclusão que tenho mais medo da vida que da morte.
Aliás, da morte não tenho medo nenhum e, até, penso nela com frequência, não a desejando mas… quase. Seria coisa cómoda, como disse S. Josemaria e, isso, é o suficiente para que Deus a não queira, ainda, para mim.

Começo a desenhar o percurso de há mais ou menos doze anos para cá e descubro, atónito, como que um plano muito bem delineado para me levar onde estou agora.

As promessas que não foram cumpridas por parte de pessoas em quem acreditei cegamente, as expectativas goradas dia após dia, mês após mês, os enganos, embustes, adiamentos o fazer de conta.

E… eu? O que fiz? Sou uma vítima pura e simples?

Claro que sou uma vítima mas de mim próprio. Não ter visto a realidade da vida, querer ser alguém que nunca poderia ser, a vaidade, o orgulho, o protagonismo sempre desejado, o atordoamento com fortunas passageiras, o malbaratar a vida, as oportunidades, os ensejos.
“Atiro” sempre para os lados quando o alvo está aqui, neste metro e oitenta e tal de carne e ossos que por vezes se esquece que é bastante mais que isso: Uma imagem, concreta, real, verdadeira do Deus Criador e Senhor de todas as coisas!

Fui e sou, ‘o carpinteiro da minha cruz’. [1]

De facto, não precisei de ajuda de ninguém, fiz tudo sozinho com aplicação e esmero tais que, agora, nada mais me resta que pedir a Deus que a leve por mim que, eu, não posso!

(ama, 2008.01.18) [2]





[1] cf. s. filipe de néri, Máximas.
[2] refª  Mt 11, 28-30

Dispostos a uma nova rectificação


Os teus parentes, os teus colegas, os teus amigos, vão notando a diferença, e reparam que a tua mudança não é uma mudança passageira; que já não és o mesmo. Não te preocupes. Para a frente! Cumpre o "vivit vero in me Christus" – agora é Cristo quem vive em ti! (Sulco, 424)

Qui habitat in adiutorio Altissimi in protectione Dei coeli commorabitur – Habitar sob a protecção de Deus, viver com Deus: eis a arriscada segurança do cristão. É necessário convencermo-nos de que Deus nos ouve, de que está sempre solícito por nós, e assim se encherá de paz o nosso coração. Mas viver com Deus é indubitavelmente correr um risco, porque o Senhor não Se contenta compartilhando; quer tudo. E aproximar-se d'Ele um pouco mais significa estar disposto a uma nova rectificação, a escutar mais atentamente as suas inspirações, os santos desejos que faz brotar na nossa alma, e a pô-los em prática.
Desde a nossa primeira decisão consciente de viver integralmente a doutrina de Cristo, é certo que avançámos muito pelo caminho da fidelidade à sua Palavra. Mas não é verdade que restam ainda tantas coisas por fazer? Não é verdade que resta, sobretudo, tanta soberba? É precisa, sem dúvida, uma outra mudança, uma lealdade maior, uma humildade mais profunda, de modo, que, diminuindo o nosso egoísmo, cresça em nós Cristo, pois illum oportet crescere, me autem minui, é preciso que Ele cresça e que eu diminua.

Não é possível deixar-se ficar imóvel. É necessário avançar para a meta que S. Paulo apontava: não sou eu quem vive; é Cristo que vive em mim. A ambição é alta e nobilíssima: a identificação com Cristo, a santidade. Mas não há outro caminho, se se deseja ser coerente com a vida divina que, pelo Baptismo, Deus fez nascer nas nossas almas. O avanço é o progresso na santidade; o retrocesso é negar-se ao desenvolvimento normal da vida cristã. Porque o fogo do amor de Deus precisa de ser alimentado, de aumentar todos os dias arreigando-se na alma; e o fogo mantém-se vivo queimando novas coisas. Por isso, se não aumenta, está a caminho de se extinguir. (Cristo que Passa, 58)

Pequena agenda do cristão

Temas para meditar 29


Esperança

Dentre as virtudes que deixam um sulco 

mais profundo no espírito humano, que 

influem mais notoriamente sobre a vida e 

a actuação dos homens, destaca-se a 

virtude cristã, teologal, da esperança.



(SALVATORE CANALS, Ascética Meditada, Éfeso, nr.53)