Sábado depois da Páscoa
Evangelho:
Mc
16 9-15
9 Jesus,
tendo ressuscitado de manhã, no primeiro dia da semana, apareceu primeiramente
a Maria Madalena, da qual tinha expulsado sete demónios. 10 por ela,
não acreditaram. 12 Depois disto, mostrou-Se de outra forma a dois
deles, enquanto iam para a aldeia; 13 os quais foram anunciar aos
outros, que também a estes não deram crédito. 14 Finalmente,
apareceu aos onze, quando estavam à mesa, e censurou-lhes a sua incredulidade e
dureza de coração, por não terem dado crédito aos que O tinham visto
ressuscitado. 15 E disse-lhes: «Ide por todo o mundo, e
pregai o Evangelho a toda a criatura.
Comentário:
São Marcos escreve os
derradeiros versículos do “seu” Evangelho.
Com ênfase especial nas
relações dos apóstolos com Jesus Cristo segue com evidente cuidado as longas
conversas com Pedro não omitindo nem as fraquezas, dúvidas, negações e
abandonos que pautaram o seu relacionamento com o Senhor.
É bem evidente que a enorme
humildade do Príncipe dos Apóstolos e a rocha sobre a qual Jesus Cristo
edificou a Sua Igreja quis que a humanidade ficasse a saber de fonte fidedigna
que o cumprimento do mandato do Senhor não se fica a dever à capacidade de cada
um e nem mesmo à sua entrega devotada inteiramente à missão que lhes fora
confiada – quase todos deram a vida por ela – mas à especialíssima assistência
do Espírito Santo que os converteu em pilares indestrutíveis e inamovíveis da
Igreja.
(ama,
comentário sobre
Mc 16, 9-15, 2014.04.26)
Leitura espiritual
Ressurreição
“Na história do mundo,
somente uma vez encontramos o caso de que, diante da entrada de uma tumba, foi
colocada uma grande pedra e até guardas para evitar que um homem morto
ressuscitasse: foi o sepulcro de Cristo, na tarde da sexta-feira que chamamos
santa. Que espetáculo podia haver de mais ridículo do que aquele de soldados a
vigiar um cadáver? Puseram sentinelas para que o morto não pudesse andar, para
que o silencioso não falasse e para que o coração transpassado não voltasse a
palpitar. Diziam que ele estava morto. Sabiam que ele estava morto. Diziam que
ele não ressuscitaria. E, entretanto, vigiavam...”. [i]
É assombroso que os
inimigos de Cristo, no fundo, esperassem a ressurreição, mas os amigos dele
não! Os inimigos vigiavam o sepulcro; os amigos se escondiam, frustrados,
assustados, incrédulos.
Ninguém viu Cristo
ressuscitar. Os dois sinais da ressurreição foram o sepulcro vazio e as
aparições do Cristo ressuscitado em pessoa. Foi através desses sinais que os
próprios apóstolos começaram a acreditar na ressurreição, da qual duvidavam
seriamente.
O sepulcro vazio pode ter
duas explicações: ou alguém levou embora o cadáver, ou então Cristo
ressuscitou. O cadáver não foi roubado pelos inimigos de Cristo, pois, quando a
notícia da ressurreição se espalhou, a melhor maneira de desmascará-la teria
sido mostrar o cadáver. Se não mostraram, é porque não tinham. Os amigos de
Jesus também não o tinham, porque os apóstolos passaram a arriscar a vida para
pregar o nome de Cristo ressuscitado e, de fato, morreram mártires por causa da
sua fé em Cristo ressuscitado. Quem sofreria tanto e daria a própria vida por
uma mentira, sabendo que era mentira?
Os apóstolos são descritos
pelos evangelhos como homens sem esperança, abatidos e deprimidos. Jesus mesmo
os trata como “insensatos e lerdos” [ii]
gente que não esperava nada. Eram homens rudes, duros de coração.
Além disso, Cristo havia
sido condenado e executado como um "maldito segundo a lei". Esse
aparente fracasso humilhante de Jesus tinha deixado a fé dos apóstolos tão
abalada que, primeiro, eles se esconderam e, poucos dias depois, partiram para
a Galileia e voltaram à sua vida normal, como nos recordam as palavras dos
discípulos de Emaús.[iii]
Eles procuraram se esquecer de Cristo, tamanha era a sua incredulidade,
decepção e, talvez, vergonha por ter acreditado em um "charlatão".
Será que, mesmo se
quisessem mentir, eles teriam conseguido inventar e sustentar uma história como
a da ressurreição?
É muito pouco provável,
tanto por causa desse contexto de frustração quanto por causa da sua
simplicidade e rudeza intelectual.
E há outro factor ainda
mais relevante: uma ressurreição como a de Cristo era praticamente inimaginável
para um judeu daquela época.
A ideia de ressurreição
existia no judaísmo e já era mencionada pelo profeta Daniel,[iv]
mas o conceito era muito diferente: a ressurreição, para os judeus, só
aconteceria no fim dos tempos, quando Deus ressuscitaria todo o povo eleito de
uma só vez.
Seria muito estranho que
alguém concebesse naquela sociedade a ideia de uma ressurreição definitiva
dentro da história, seguida por um dia igual a todos os outros dias, como se
não tivesse acontecido absolutamente nada. A ressurreição tinha que ser
justamente o final da história, em um evento apoteótico.
Porquê inventar uma
história de ressurreição que não fazia sentido algum para um povo que já
duvidava antes mesmo de ouvir esse absurdo?
Para tornar ainda menos
provável que os apóstolos tenham arquitectado uma farsa, os relatos sobre o
Domingo da Ressurreição são cheios de detalhes confusos e sequências de factos
diferentes entre um evangelho e outro. Quem forjasse um relato desses ter-se-
se esforçado um pouco mais para que os detalhes pelo menos parecessem
coerentes.
Mas os apóstolos falavam
do que se lembravam e do que tinham sentido, atónitos, atordoados, sem se
preocupar em polir o depoimento. E, entre confusão e espanto, todas as fontes
dos evangelhos e do Novo Testamento apresentam o testemunho daqueles dois
sinais: o sepulcro vazio e as aparições de Jesus ressuscitado.
Se não mentiram, teriam
então os apóstolos sofrido de alucinações? Quando Jesus ressuscitado lhes
apareceu pela primeira vez, os apóstolos hesitaram muito em acreditar que fosse
ele. Aqueles homens grosseiros não eram dados a visões de tipo místico. Se não
tivessem visto o Cristo ressuscitado com seus próprios olhos e até tocado nele
com suas próprias mãos para reconhecê-lo, como fez Tomé, eles jamais teriam acreditado
na ressurreição.
Também não é provável que
eles tenham sido sugestionados a pensar ter visto Jesus.
Os evangelhos narram
várias aparições, em contextos diferentes, com testemunhas diversas.
As primeiras testemunhas
da ressurreição, aliás, foram mulheres: na sociedade judaica, o testemunho de
uma mulher valia pouco. Mesmo que elas tivessem sofrido uma alucinação,
dificilmente teriam recebido crédito ao contá-la. Pelo contrário: é mais
plausível que tivessem deixado os apóstolos ainda menos propensos a acreditar
em visões das quais não quisessem se certificar antes de reconhecer como reais.
Para falar das aparições
de Jesus ressuscitado, os relatos do Novo Testamento usam o verbo opthé
(“deixou-se ver”); na tradução grega dos Setenta, este era o verbo consagrado
para falar das aparições de Javé.
Esse termo não se refere a
uma visão como experiência subjectiva, mas à iniciativa de Deus que vem até os
seus: o ressuscitado é visto porque aparece, em vez de "parecer que
aparece" porque alguém esteja "tendo visões".
O Novo Testamento tem
outro termo, horama, para falar de visões interiores. Este termo nunca é
empregado para falar das aparições de Jesus. Mesmo Paulo, que teve visões e
êxtases, fala delas se desculpando,[v]
ao passo que, do encontro com Cristo no caminho de Damasco, ele fala sem se
desculpar.[vi]
Só por causa deste encontro é que Paulo explica que foi constituído apóstolo e
só por causa dele é que Paulo se apresenta como testemunha da ressurreição de
Cristo:[vii]
por ter visto.
A mudança de comportamento
dos apóstolos é tão grande depois de verem Jesus ressuscitado que eles se
tornam outros homens, corajosos e dispostos a não silenciar o que tinham visto
e ouvido, mesmo precisando ir contra toda a mentalidade da época (e contra a
mentalidade deles próprios).
Mais interessante ainda:
eles nem sabem explicar a ressurreição, pois simplesmente não a entendem.
Eles conseguem apenas
confessá-la, inclusive com o martírio.
A Igreja primitiva crê firmemente
na ressurreição de Jesus.
As primeiras comunidades
cristãs afirmam que Jesus ressuscitou dentre os mortos.
É um dado que encontramos
em inúmeros textos, a começar pelo Novo Testamento, que fala implícita e
indiretamente da morte e ressurreição de Jesus e também traz textos explícitos
e directos: Mc 8,31 (primeiro anúncio); Mc 9,9 (transfiguração); Mc 9, 30-32
(segundo anúncio); Mc 10,32 (terceiro anúncio); Mc 14,28 (anúncio da aparição).
O facto de uma fé tão
sólida e firme dos apóstolos, dos demais discípulos e de toda a comunidade
mártir do cristianismo primitivo é um indício forte de que essa fé tinha de se
basear num acontecimento real.
De qualquer maneira,
sempre houve, e continua havendo, muita gente que não crê na ressurreição de
Cristo.
E é compreensível, porque
há mesmo muitos obstáculos para se acreditar no sobrenatural, especialmente em
algo tão fantástico quanto a ressurreição dentre os mortos.
A nossa mentalidade é
materialista, pragmatista, hedonista, utilitarista, relativista, consumista.
O homem de hoje quer ficar
nos limites materiais e temporais, práticos e comprováveis, horizontalistas.
O secularismo espalha-se
por toda a parte.
O homem de hoje olha pouco
para cima e tende a pensar que tudo se acaba com a morte (embora também tenda a
sentir que existe algo depois dela...).
Não há nenhuma comprovação
científica inquestionável de que Cristo tenha ressuscitado.
É, em suma, uma questão de
fé.
Para quem crê, a fé e a
esperança na ressurreição é algo presente dentro do coração.
Sem a esperança da
ressurreição, a vida finita não tem sentido. Parece haver algo no íntimo do
ser, independentemente de crença, cultura ou religião, que afirma que a morte
não é a última palavra nem o fim de tudo.
É um anseio que parece
natural como parte da nossa essência humana que almeja a plenitude.
O homem, de facto, é um
ser aberto, que está sempre em processo de crescimento interior.
Na sua dinâmica, o futuro
faz parte do seu presente.
Será que esse futuro é
vazio, é um engano, uma ilusão?
Todas as civilizações
experimentaram o anseio de uma vida nova após a morte.
Só se consegue apagar este
sentimento e esta profunda convicção mediante pressões ideológicas e durante
pouco tempo.
O cristianismo procura
compreender esta realidade a partir da experiência de Jesus Cristo
ressuscitado, que confirma a esperança íntima que temos em nós e que mantém o
nosso coração no céu, mesmo com os pés bem firmes sobre a terra.
A esperança da
ressurreição, enfim, é o que dá sentido à perspectiva da morte que todos
sabemos, no fundo, que não pode ser o fim.
Fonte: aleteia
[i] fulton sheen, "Vida de Cristo".
[vi] cf. 1 Co 9,1; 15,8;
Gál 1,12ss