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Leitura Espiritual
Amigos de Deus |
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Recordo-vos que, se formos sinceros, se nos
mostrarmos tal como somos, se nos endeusarmos com humildade, não com soberba,
vós e eu manter-nos-emos sempre seguros em qualquer ambiente.
Poderemos
falar sempre de vitórias e chamar-nos-emos vencedores, com essas íntimas
vitórias do amor de Deus que nos trazem a serenidade, a felicidade da alma, a
compreensão.
A humildade animar-nos-á a levar a cabo
grandes trabalhos, com a condição de não perdermos de vista a consciência da
nossa pequenez e de ir aumentando, um pouco mais cada dia, a convicção da nossa
pobre indigência.
Admite
sem vacilares que és um servidor obrigado a fazer um grande número de serviços.
Não
te pavoneies por seres chamado filho de Deus - reconheçamos a graça, mas não
esqueçamos a nossa natureza-; não te envaideças, se serviste bem, porque
cumpriste o que tinhas a fazer.
O
sol efectua a sua tarefa, a lua obedece; os anjos desempenham o seu papel.
O
instrumento escolhido pelo Senhor para os gentios, diz: eu não mereço o nome de Apóstolo, porque persegui a Igreja de Deus (1 Cor XV, 9)...
Por
isso, não procuremos nós ser louvados por nós mesmos, por méritos nossos, aliás
sempre mesquinhos.
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Humildade
e alegria
Livra-me de tudo o que há de mau e perverso
no homem.
De novo o texto da Missa nos fala do bom
endeusamento: faz ressaltar diante dos nossos olhos o mau barro de que somos
feitos, com todas as suas malvadas inclinações.
E
depois suplica emittte lucem tuam,
envia a tua luz e a tua verdade, que me guiaram e trouxeram ao teu monte santo.
Não
me importo de vos contar que me emocionei ao recitar estas palavras do Gradual.
Como é que nos temos de comportar para
adquirir esse eudeusamento bom?
No evangelho, lemos que Jesus não queria ir à
Judeia, porque os judeus o queriam matar.
Ele,
que com um desejo da sua vontade poderia eliminar os seus inimigos, empregava
também os meios humanos.
Ele,
que era Deus e a quem bastava uma decisão sua para mudar as circunstâncias,
deixou-nos uma lição encantadora: não foi à Judeia. Disseram-lhe, pois, seus
parentes: Sai daqui e vai para a Judeia,
a fim de que também os teus discípulos vejam as obras que fazes. Queriam
que Ele desse espectáculo.
Vedes?
Vedes
o que é uma lição de endeusamento bom e de endeusamento mau?
Endeusamento bom: esperem em Ti - canta o
Ofertório - todos os que conhecem o teu nome, Senhor, porque nunca abandonas os
que Te procuram.
E
vem o regozijo deste barro cheio de gatos, porque não se esqueceu das orações
dos pobres, dos humildes.
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Não deis o mínimo crédito aos que apresentam
a virtude da humildade como um amesquinhamento humano ou como uma condenação
perpétua à tristeza.
Sentir-se
barro, recomposto com gatos, é fonte contínua de alegria; significa
reconhecer-se pouca coisa diante de Deus: criança, filho.
E
haverá maior alegria do que a daquele que, sabendo-se pobre e débil, se sabe
também filho de Deus?
Porque
é que nós, homens, nos entristecemos?
Porque
a vida na terra, não se passa como nós, pessoalmente, esperávamos e porque
surgem obstáculos que impedem ou dificultam a satisfação do que pretendemos.
Nada
disto acontece quando a alma vive essa realidade sobrenatural da sua filiação
divina.
Se
Deus é por nós, quem será contra nós.
Que
estejam tristes os que se empenham em não se reconhecerem filhos de Deus, tenho
eu repetido sempre.
Para terminar, descobrimos na liturgia de
hoje duas petições que hão-de sair como setas, da nossa boca e do nosso
coração: concede-nos, Senhor todo-poderoso, que realizando sempre os divinos
mistérios mereçamos abeirar-nos dos dons celestiais.
E,
pedimos-Te, Senhor, que nos deixes servir-Te constantemente segundo a tua
vontade.
Servir,
servir, filhos meus, é o que é próprio de nós. Sermos criados de todos, para
que nos nossos dias o povo fiel aumente em mérito e número.
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Olhai para Maria.
Nunca
criatura alguma se entregou com mais humildade aos desígnios de Deus.
A
humildade da ancilla Domini, da
escrava do Senhor, é a razão que nos leva a invocá-la como causa nostrae laetitiae, causa da nossa
alegria.
Eva,
depois de pecar por querer, na sua loucura, igualar-se a Deus, escondia-se do
Senhor e envergonhava-se: estava triste.
Maria,
ao confessar-se escrava do Senhor, é feita Mãe do Verbo divino e enche-se de
alegria.
Que
este seu júbilo de boa Mãe se nos pegue a todos nós; que saiamos nisto a Ela -
a Santa Maria - e assim nos pareceremos mais com Cristo.
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Este início da Semana Santa, já tão próximo
do momento em que se consumou no Calvário a Redenção de toda a humanidade,
parece-me um tempo particularmente apropriado para tu e eu considerarmos por
que caminhos nos salvou Jesus, Nosso Senhor; para contemplarmos esse seu amor,
verdadeiramente inefável, por umas pobres criaturas formadas com barro da
terra.
Memento
homo, quia pulvis es, et in pulverem reverteris,
lembra-te, ó homem, que és pó e em pó te hás-de tornar, advertia-nos a Igreja,
Nossa Mãe, no início da Quaresma, a fim de nunca esquecermos que somos muito
pouca coisa, que um dia qualquer o nosso corpo - agora tão cheio de vida - se
desfará como a ligeira nuvem de pó que os nossos pés levantam ao caminhar;
dissipar-se-á como a névoa afugentada pelos raios do sol.
Exemplo
de Cristo
Mas, depois de recordar tão cruamente a nossa
insignificância pessoal, eu queria encarecer ante os vossos olhos outra
estupenda realidade: a magnificência divina que nos sustenta e nos endeusa.
Escutai as palavras do Apóstolo: Conheceis
a liberalidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, que sendo rico se fez pobre por
vós, a fim de que vós fôsseis ricos pela sua pobreza.
Reparai com calma no exemplo do Mestre e
compreendereis rapidamente que dispomos de tema abundante para meditar durante
toda a vida, para concretizar propósitos sinceros de maior generosidade.
Porque, não percais de vista esta meta que temos de alcançar, cada um de nós
deve identificar-se com Cristo, que - já o ouvistes - se fez pobre por ti, por
mim, e padeceu dando-nos exemplo para que sigamos os seus passos.
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Nunca perguntaste a ti próprio, movido por
uma santa curiosidade, de que modo levou Jesus a cabo este excesso de amor?
É,
de novo, São Paulo quem nos responde: tendo
a natureza de Deus (...), não
obstante, aniquilou-se a si mesmo tomando a forma de servo, tornando-se
semelhante aos homens e reduzido à condição de homem.
Meus
filhos pasmai agradecidos ante este mistério e aprendei: todo o poder, toda a
formosura, toda a majestade, toda a harmonia infinita de Deus, com as suas
grandes e incomensuráveis riquezas - todo um Deus - ficou escondido na
Humanidade de Cristo para nos servir.
O
Omnipotente apresenta-se decidido a ocultar por algum tempo a sua glória, para
facilitar o encontro redentor com as suas criaturas.
Escreve o evangelista S. João: ninguém jamais viu Deus; o Filho Unigénito
que está no seio do Pai é que o deu a conhecer, comparecendo ante o olhar
atónito dos homens: primeiro, como um recém-nascido, em Belém; depois, como um
menino igual aos outros; mais tarde, no Templo, como um adolescente,
inteligente e vivo; e, por fim, com aquela figura amável e atraente do Mestre
que movia os corações das multidões que o acompanhavam entusiasmadas.
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Bastam algumas provas do Amor de Deus que se
encarna para que a sua generosidade nos toque a alma, nos incendeie, nos mova
com suavidade a uma dor contrita pelo nosso comportamento, em tantas ocasiões
mesquinho e egoísta.
Jesus
não tem inconveniente em rebaixar-se, para nos elevar da miséria à dignidade de
filhos de Deus, de irmãos seus.
Pelo
contrário, tu e eu muitas vezes enchemo-nos nesciamente de orgulho pelos dons e
talentos recebidos, até ao ponto de os converter em pedestal para nos impormos
aos outros, como se o mérito de algumas acções, acabadas com relativa
perfeição, dependesse exclusivamente de nós: Que possuis tu que não tenhas
recebido de Deus? E se o recebeste, porque te glorias como se o não tivesses
recebido?
Ao considerar a entrega de Deus e o seu
aniquilamento - falo para que o meditemos, pensando cada um em si mesmo-, a
vanglória, a presunção do soberbo revela-se um pecado horrendo, precisamente
porque coloca a pessoa no extremo oposto ao modelo que Jesus nos assinalou com
a sua conduta.
Pensai nisto devagar: Ele humilhou-se, sendo
Deus.
O
homem, cheio do seu próprio eu, pretende enaltecer-se a todo o custo, sem
reconhecer que está feito de barro e barro de má qualidade.
(cont)