01/10/2015

Desculpar a todos

Só serás bom, se souberes ver as coisas boas e as virtudes dos outros. Por isso, quando tiveres de corrigir, fá-lo com caridade, no momento oportuno, sem humilhar... e com intenção de aprender e de melhorar tu próprio, naquilo que corriges. (Forja, 455)

Uma das suas primeiras manifestações concretiza-se em iniciar a alma nos caminhos da humildade. Quando sinceramente nos consideramos nada; quando compreendemos que, se não tivéssemos o auxílio divino, a mais débil e fraca das criaturas seria melhor do que nós; quando nos vemos capazes de todos os erros e de todos os horrores; quando nos reconhecemos pecadores, embora lutemos com empenho por nos afastarmos de tantas infidelidades, como havemos de pensar mal dos outros? Como se poderá alimentar no coração o fanatismo, a intolerância, o orgulho?
A humildade leva-nos pela mão a tratar o próximo da melhor forma: compreender a todos, conviver com todos, desculpar a todos; não criar divisões nem barreiras; comportarmo-nos – sempre! – como instrumentos de unidade. Não é em vão que existe no fundo do homem uma forte aspiração à paz, à união com os seus semelhantes e ao respeito mútuo pelos direitos da pessoa, de modo que tal aspiração se transforme em fraternidade. Isto reflecte uma nota característica do que há de mais valioso na condição humana: se todos somos filhos de Deus, a fraternidade nem se reduz a uma figura de retórica, nem consiste num ideal ilusório, pois surge como meta difícil, mas real.
(…) Na oração, com a ajuda da graça, a soberba pode transformar-se em humildade. E brota da alma a verdadeira alegria, mesmo quando ainda notamos o barro nas asas, o lodo da pobre miséria, que vai secando. Depois, com a mortificação, cairá esse barro e poderemos voar muito alto, porque nos será favorável o vento da misericórdia de Deus. (Amigos de Deus, nn. 233. 249)



Evangelho, comentário, L. espiritual


Tempo comum XXVI Semana

Santa Teresinha do Menino Jeus

Evangelho: Lc 10, 1-12

1 Depois disto, o Senhor escolheu outros setenta e dois, e mandou-os dois a dois à Sua frente por todas as cidades e lugares onde havia de ir. 2 Disse-lhes: «Grande é na verdade a messe, mas os operários poucos. Rogai, pois, ao dono da messe que mande operários para a Sua messe. 3 Ide; eis que Eu vos envio como cordeiros entre lobos. 4 Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado, e não saudeis ninguém pelo caminho. 5 Na casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz seja nesta casa. 6 Se ali houver algum filho da paz, repousará sobre ele a vossa paz; senão, tornará para vós. 7 Permanecei na mesma casa, comendo e bebendo do que tiverem, porque o operário é digno da sua recompensa. Não andeis de casa em casa. 8 Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei o que vos puserem diante; 9 curai os enfermos que nela houver, e dizei-lhes: Está próximo de vós o reino de Deus. 10 Mas, em qualquer cidade em que entrardes e não vos receberem, saindo para as praças, dizei: 11 Até o pó da vossa cidade, que se nos pegou aos pés, sacudimos contra vós; não obstante isto, sabei que o reino de Deus está próximo. 12 Digo-vos que, naquele dia, haverá menos rigor para Sodoma que para essa cidade.

Comentário:

O Senhor não esconde aos seus discípulos uma das grandes dificuldades que terão de enfrentar na sua tarefa de expandir o Reino de Deus por toda a terra: a falta de pessoas que se dediquem a esse trabalho.
Será sempre, ao longo dos tempos um problema para a Igreja.

De, facto, as vocações serão sempre escassas para o ingente trabalho que se apresenta.

Pedir-lhe a Ele que é o Senhor da messe trabalhadores dedicados e santos é obrigação de todo o baptizado.

(ama comentário sobre LC 10 1-9, Malta, 2015.01.26)

Leitura espiritual



São Josemaria Escrivá


Amar a Igreja

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O fim da Igreja

São Paulo, no primeiro capítulo da Epístola aos Efésios, afirma que o mistério de Deus, anunciado por Cristo, se realiza na Igreja.
Deus Pai pôs debaixo dos pés de Cristo todas as coisas, e constituiu-O cabeça de toda a Igreja, que é o Seu corpo e o complemento d'Aquele que cumpre tudo em todos.
O mistério de Deus é, uma vez chegada a plenitude dos tempos, restaurar em Cristo todas as coisas, assim as que há no céu, como as que há na terra.

Um mistério insondável, de pura gratuitidade de amor: porque Ele mesmo nos escolheu antes da criação do mundo, por amor, para sermos santos e imaculados diante d'Ele.
O amor de Deus não tem limites: o próprio São Paulo anuncia que o Nosso Salvador quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade.

Este, e não outro, é o fim da Igreja: a salvação das almas, uma a uma.
Para isso o Pai enviou o Filho, e Eu envio-vos também a vós.
Daí o mandato de dar a conhecer a doutrina e de baptizar, para que, pela graça, a Santíssima Trindade habite na alma: foi-Me dado todo o poder no Céu e na terra.
Ide, pois, ensinai todas as gentes, baptizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, ensinando-as a observar todas as coisas que vos mandei; e eis que Eu estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos.

São as palavras simples e sublimes do final do Evangelho de S. Mateus: aí se assinala a obrigação de pregar as verdades de fé, a urgência da vida sacramental, a promessa da contínua assistência de Cristo à Sua Igreja.
Não se é fiel a Nosso Senhor se se passa por cima destas realidades sobrenaturais: a instrução na fé e na moral cristãs, a prática dos sacramentos.
Com este mandato Cristo funda a Sua Igreja.
Tudo o resto é secundário.

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Na Igreja está a nossa salvação

Não podemos esquecer que a Igreja é muito mais do que um caminho de salvação: é o único caminho.
Ora isto não foi inventado pelos homens, mas foi Cristo quem assim dispôs: o que crer e for baptizado, será salvo; o que, porém, não crer, será condenado.
Por isso se afirma que a Igreja é necessária, com necessidade de meio, para nos salvarmos.
Já no século II Orígenes escrevia: se alguém quer salvar-se, venha a esta casa, para que possa consegui-lo... que ninguém se engane a si mesmo: fora desta casa, isto é, fora da Igreja, ninguém se salva. E S. Cipriano: se alguém tivesse escapado (do dilúvio) fora da arca de Noé, então poderíamos admitir que quem abandona a Igreja pode escapar da condenação.

Extra Ecclesiam, nulla salus.
É o aviso contínuo dos Padres: fora da Igreja católica pode encontrar-se tudo - admite Santo Agostinho - menos a salvação.
Pode ter-se honra, pode haver Sacramentos, pode cantar-se o "aleluia", pode responder-se "ámen", pode defender-se o Evangelho, pode ter-se fé no Pai, no Filho e no Espírito Santo e, inclusivamente, até pregá-la.
Mas nunca, se não for na Igreja católica, pode encontrar-se a salvação.

No entanto, como se lamentava Pio XII há pouco mais de vinte anos, alguns reduzem a uma fórmula vã a necessidade de pertencer à Igreja verdadeira para alcançar a salvação eterna.
Este dogma de fé integra a base da actividade corredentora da Igreja, é o fundamento da grave responsabilidade apostólica dos cristãos. Entre os mandatos expressos de Cristo determina-se categoricamente o de nos incorporarmos no Seu Corpo Místico pelo Baptismo.
E o nosso Salvador não só promulgou o mandamento de que todos entrassem na Igreja, mas estabeleceu também que a Igreja fosse meio de salvação, sem a qual ninguém pode chegar ao reino da glória celestial.

É de fé que quem não pertence à Igreja não se salva; e que quem se não baptiza não ingressa na Igreja.
A justificação, depois da promulgação do Evangelho, não pode verificar-se sem o lavacro da regeneração ou o seu desejo, estabelece o Concilio de Trento.

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É esta uma contínua exigência da Igreja que se - por um lado - introduz na nossa alma o aguilhão do zelo apostólico, por outro, manifesta também claramente a misericórdia infinita de Deus para com as criaturas.

S. Tomás explica assim:
O Sacramento do baptismo pode faltar de dois modos. Em primeiro lugar, quando não se recebeu nem de facto, nem de desejo. É o caso de quem não se baptizou nem quer baptizar-se.
Esta atitude, nos que têm uso da razão, implica desprezo pelo Sacramento.
E, em consequência, aqueles a quem falta desta forma o baptismo, não podem entrar no reino dos céus: já que não se incorporam a Cristo nem sacramentalmente nem espiritualmente e unicamente d'Ele é que procede a salvação.
Em segundo lugar, pode também faltar o Sacramento do baptismo a uma pessoa, mas não o seu desejo, como no caso daquele que, embora se deseje baptizar, é surpreendido pela morte antes de receber o Sacramento.
A quem isto suceder, pode salvar-se sem o baptismo actual e só com o desejo do Sacramento.
Este desejo procede da fé que age pela caridade, através da qual Deus, que não ligou o seu poder aos Sacramentos visíveis, santifica interiormente o homem.

Apesar de ser completamente gratuita e de não se dever a ninguém por título algum - e menos ainda depois do pecado-, Deus Nosso Senhor não recusa a ninguém a felicidade eterna e sobrenatural: a Sua generosidade é infinita.
É coisa notória que aqueles que sofrem de ignorância invencível acerca da nossa santíssima religião, quando guardam cuidadosamente a lei natural e os seus preceitos, esculpidos por Deus nos corações de todos, e estão dispostos a obedecer a Deus e levam uma vida honesta e recta, podem alcançar a eterna, por intermédio da acção operante da luz divina e da graça.
Só Deus sabe o que se passa no coração de cada homem, e Ele não trata as almas em massa, mas uma a uma.
Não corresponde a ninguém nesta terra julgar sobre a salvação ou condenação eternas num caso concreto.

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Mas não esqueçamos que a consciência pode deformar-se de modo culpável, endurecer-se no pecado e resistir à acção salvadora de Deus.
Daí, a necessidade de pregar a doutrina de Cristo, as verdades de fé e as normas morais; e daí também a necessidade dos Sacramentos, todos instituídos por Jesus Cristo como causas instrumentais da Sua graça e remédio para as misérias consequentes ao nosso estado de natureza caída.
Daí se deduz também que convém recorrer frequentemente à Penitência e à Comunhão Eucarística.

Fica, portanto, bem concretizada a tremenda responsabilidade de todos na Igreja e especialmente dos pastores com estes conselhos de S. Paulo:
Conjuro-te diante de Deus e de Jesus Cristo que há-de julgar os vivos e os mortos, pela Sua vinda e pelo Seu reino: prega a palavra de Deus, insiste a tempo e fora de tempo, repreende, suplica, admoesta com toda a paciência e doutrina. Porque virá tempo em que os homens não suportarão a sã doutrina, mas multiplicarão para si mestres conforme os seus desejos, levados pelo prurido de ouvir doutrinas acomodadas às suas paixões. E afastarão os ouvidos da verdade e os aplicarão às fábulas.

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Tempo de provação

Eu não saberia dizer quantas vezes se cumpriram estas palavras proféticas do Apóstolo. Mas só um cego deixaria de ver como actualmente se estão a verificar quase à letra.
Rejeita-se a doutrina dos mandamentos da Lei de Deus e da Igreja, tergiversa-se sobre o conteúdo das bem-aventuranças dando-lhe um significado político-social: e quem se esforça por ser humilde, manso e limpo de coração, é tratado como um ignorante ou um atávico defensor de coisas passadas.
Não se suporta o jugo da castidade e inventam-se mil maneiras de ludibriar os preceitos divinos de Cristo.

Há um sintoma que os engloba todos: a tentativa de desviar os fins sobrenaturais da Igreja.
Por justiça, alguns já não entendem a vida de santidade, mas uma luta política determinada, mais ou menos tingida de marxismo, que é inconciliável com a fé cristã.
Por libertação, não admitem a batalha pessoal para fugir do pecado, mas uma tarefa humana, que pode ser nobre e justa em si mesma, mas que carece de sentido para o cristão quando implica a desvirtuação da única coisa necessária, a salvação eterna das almas, uma a uma.

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Com uma cegueira originada pelo afastamento de Deus - este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim-, fabrica-se uma imagem da Igreja que não tem a menor relação com a que Cristo fundou.
Até o Santo Sacramento do Altar - a renovação do Sacrifício do Calvário - é profanado, ou reduzido a um mero símbolo daquilo a que chamam a comunhão dos homens entre si.
Que seria das almas, se Nosso Senhor não se tivesse entregado por nós até à última gota do Seu precioso Sangue!
Como é possível que se despreze esse milagre perpétuo da presença real de Cristo no Sacrário?
Ficou para que vivamos intimamente com Ele, para que O adoremos, para que nos decidamos a seguir as suas pegadas, como penhor da glória futura.

Estes tempos são tempos de provação e temos de pedir a Nosso Senhor, com um clamor que não cesse, que os abrevie, que olhe com misericórdia para a Sua Igreja e conceda novamente luz sobrenatural às almas dos pastores e às de todos os fiéis.
Não há motivo algum que leve a Igreja a empenhar-se em agradar aos homens, porque nunca os homens - nem sós, nem em comunidade - darão a salvação eterna: quem salva é Deus.

(cont)