Apercebi-me
que Jesus ia iniciar um dos Seus discursos porque fez um sinal com as mãos como
que a mandar que se suspendessem as perguntas dos inúmeros circunstantes que se
atabalhoavam na sua ânsia de obter respostas aos seus problemas. Começou por
dizer: «Quem quiser ganhar a vida tem de perdê-la...».
Todos,
incluindo-me a mim, ficam perplexos. Que quer isto dizer!?!
Claro
que a "explicação" veio logo a seguir. Nessa explicação Jesus
deixou bem claro que a vida a que Se referia era a Vida Eterna. Prosseguindo no
Seu discurso muitos, eu, compreendemos que a vida terrena não passa de como que
uma passagem, longa ou não, para a verdadeira Vida, a Eterna, mas, mais que uma
passagem é, deve ser, uma preparação necessária e absolutamente essencial para
essa Vida.
Ao
imprimir em nós, seres humanos, a Sua Imagem e Semelhança, logo quando da nossa
concepção no seio materno, recebemos essa herança: Criados para a Eternidade.
Tenho
frequentes debates interiores sobre a Eternidade. Compreendo que sendo algo tão
extraordinário e de alguma forma misterioso me será muito difícil assimilar
mas, sendo como é uma realidade, sinto que devo esforçar-me o quanto for
possível para me aproximar dessa compreensão. Jesus Cristo revelou muitas
coisas sobre a Vida Eterna, escusando-Se falar sobre outras que iriam além do
que eu poderia entender. Ao falar da Eternidade, a Vida Eterna, tenho sempre
subjacente que falo do Reino do Céu. Creio, sinceramente, que Esta é, como
dizer, a mais, vivida, já que os outros que vivem essa Vida no castigo
eterno serão apenas os que conscientemente escolheram essa opção. Esta
afirmação que faço baseia-se nas próprias palavras de Jesus Cristo que disse «todas
as ofensas serão perdoadas excepto as feitas ao Espírito Santo», o que quer
dizer, tal como entendo, que é o homem quem se condena a si mesmo; nem é
admissível outra ilacção porque Deus não condena o homem, condena o pecado.
Então, poder-se-á dizer que os "habitantes" do Reino do Céu são
em número muito maior, inexcedívelmente maior que os que
"habitam" o inferno? Não temo afirmar que estou absolutamente
convicto que sim! Ninguém, em seu juízo lúcido e coerente, pode desejar para si
próprio algo mau.
A
este propósito refiro o que se passou - é histórico e está documentado - com um
dos mais brilhantes pensadores dos nossos tempos: Voltaire. (Afirmar tal não
significa estar de acordo com as ideias que expressou, mas tão só reconhecer a
sua poderosa inteligência).
Nas
vascas da agonia, Voltaire pediu a Condorcet, seu fiel amigo e amirador, que
chamasse um Sacerdote para lhe administrar a Extrema Unção (o que agora
chamamos Unção dos Doentes). Condorcet ficou espantado: 'Tu pedes-me uma coisa
dessas depois de toda a tua vida teres negado haver o que fosse para além da
morte?!?’ Voltaire respondeu: 'É verdade, toda a minha vida neguei haver o
que fosse depois da morte, mas... e se HÁ!? Condorcet "rendeu-se" a
este último argumento do seu amigo e foi buscar o Padre Lubac que administrou a
Voltaire o Sacramento que desejava. Concluo que Voltaire agiu como deve fazer
qualquer pessoa... na dúvida, optar pelo que íntimamente parece ser o mais
certo e seguro. Portanto, julgo que posso afirmar que Voltaire está gozando o
Reino de Deus.
Aflige-me
pensar em tantos que se julgam possuidores da verdade absoluta que assenta
apenas no que podem constatar, ver ou sentir e põem de lado, liminarmente
qualquer preocupação que vá além disso. No fim e ao cabo são pessoas cujo único
interesse é o EU, o centro e o universo, o resto que me rodeia, só me interessa
na medida em que me for conveniente e útil. Bom... nestes casos, o EU acaba,
extingue-se definitivamente com a morte e... não resta nada, não fica nada...
e, questiono-me... o que será desses?
Naturalmente
a minha humanidade leva-me a imaginar a Vida Eterna como um lugar, um local
onde estão quantos a morte levou. Mas... não deve ser exactamente assim porque
o que morre é o corpo, a alma vive para sempre, assim sendo, considerando que a
alma é espírito, não ocupa nem lugar nem espaço a conclusão a que chego é que a
Vida Eterna não é um espaço nem um local mas um "estado". Sendo
assim, e não tendo como ultrapassar a minha compreensão humana, sou conduzido a
pensar que a Vida Eterna pode muito bem ser a que já vivo... olho para o Céu,
claro, porque o Céu é a expressão humana de elevação suprema, mas, uma vez mais
o Céu pode muito bem estar aqui, onde vivo e não noutro lugar etéreo qualquer.
O Céu, o Reino dos Céus, está no «meio de vós» foi Cristo Quem o afirmou
e, portanto, parece-me que a minha ilacção está correcta. É claro que esta
"conclusão" me leva a pensar que tenho de viver a minha vida como que
de facto estivesse no Céu, o que quer dizer, já que no Céu só habitam santos,
que tenho, custe o que custar, ser Santo. Confesso que numa primeira reacção me
assusta esta conclusão: ser Santo!
Medito
e considero o que conheço da vida de muitos Santos. A maior parte foram pessoas
simples com defeitos e debilidades, orgulho pessoal, intransigente apreciação
dos outros, quedas frequentes. A santidade atingiram-na porque venceram essas
debilidades e limitações com o esforço contínuo, a oração permanente. Ler as
histórias dos Santos é muito útil para qualquer cristão porque lhe dará uma
certeza... qualquer um, eu, posso ser Santo.
Eu
leio inúmeras vezes e, até vejo documentários, filmes sobre São Filipe de Néri.
Digo sem rebuço que me apaixona este homem cuja simplicidade de comportamento
raia, por vezes, a patetice. Sim… São Filipe de Néri preferia ser tido como
tonto e irrealista do que alguém pudesse pensar que era portador de graças ou
virtudes especiais. Na agitação tremenda que a Igreja vivia naquele tempo o
Santo de Néri encarava as ordens ou instruções dos que as podiam dar, com
seriedade e humildade mas nunca deixava de levantar os olhos ao Céu pedindo luz
e sabedoria para fazer a Vontade de Deus.
A
verdadeira humildade não estará tanto em aceitar, sem mais, o que nos exige
quem o pode exigir, mas em realmente fazer o que se deve fazer. Não se trata de
questionar ou pôr em causa mas de aferir se está de acordo com a Amabilissima e
Justíssima Vontade de Deus.
A
santidade pessoal é algo que devo procurar atingir enquanto tenho tempo, ou
seja enquanto vivo, depois já não será possível. A questão resume-se, tenho a
certeza, em tentar fazer, cumprir em tudo a Vontade de Deus. Este É, conforme
Jesus deu claramente a entender o único caminho, a verdadeira solução. Se Deus
meu Senhor e Criador me fez pessoa foi para que fosse Santo, à Sua Imagem e
Semelhança, e, portanto, tenho a certeza absoluta que me dará os meios para o
conseguir.Senhor... faz-me santo nem que seja à força... repito constantemente
confiante esta exclamação de Santa Teresa de Ávila. Ela tinha uma intimidade
com Cristo que ultrapassa quanto posso imaginar. Uma vez, numa viagem a caminho
de uma localidade onde iria fundar um Convento - mais um dos muitos que fundou
- a carruagem onde seguia ficou imobilizada no meio de um curso de água... nem
para trás nem para diante. Naquela aflição, com água pelos joelhos, a Santa
terá exclamado: 'Senhor... que mal Te fiz?', e, Jesus respondeu: 'Teresa...
assim trato os meus amigos'; Teresa não "se ficou": 'Ah! Senhor...
por isso tens tão poucos'!
Este
diálogo que revela uma intimidade singular, leva-me a concluir que, sem pôr em
causa a Vontade de Deus, Lhe devo perguntar o porquê do que Ele consente que me
aconteça e que eu julgue que, talvez, seja como que estranho, inapropriado. Se,
como sinceramente creio, obtiver uma resposta, desejo do fundo da minha alma
que seja a mesma que Ele deu a Teresa: 'Assim trato os Meus amigos'. Ser amigo
de Jesus! Que coisa! Que maravilha! Um Amigo que deu a vida por mim!!! Quando
me detenho a pensar nisto sou levado a dizer: Jesus é meu Amigo!Sendo eu o que
sou...
A
amizade é um tema muito versado, desde sempre, nos escritos de autores cristãos
(que são os que me interessa considerar) que refere muitas vezes que ficaram
devedores a amigos por terem encontrado o caminho que os levou à vida
verdadeira e no final, ao seu encontro com Deus. Nenhum se refere a si
próprio como santo mas atribui a outro(s) o ter encontrado o caminho que na
verdade procurava. A amizade, verdadeira, autêntica vai muito além do
fazer o bem que possa fazer ao meu amigo, significa que tenho de estar presente
SEMPRE tanto na alegria como nos momentos menos agradáveis, só assim serei um
verdadeiro amigo. Estar sempre disponível e atento aos sinais que me possam
levar a entender que, ele, precisa de mim mas talvez não queira
"abrir-se", incomodar-me.
Muitas
pessoas carregam fardos insuportáveis porque ou têm pudor, vergonha de os
partilhar com os amigos. Com prudência e respeito pela sua intimidade devo ir
ter com ele e levá-lo a compreender que estou à sua disposição para o que for.
Ah! Que satisfação tão grande quando vemos o sorriso o ar de alívio quando
depois de ter "despejado" o que o consumia, o nosso amigo nos diz:
Obrigado!
Pessoalmente
tenho por norma rezar todos os dias pelos meus amigos; acho que faço bem porque
penso que os meus amigos me "pagam na mesma moeda". Com esta
conclusão fica-me uma certeza: quantos mais amigos tiver mais rezarão por mim.
Por uma especial graça, que não mereço, tenho muitos amigos "destes"
que me falam "só para saber como estás... precisas de alguma coisa...'.
Eu, como tenho muito que fazer, frequentemente esqueço essa demonstração de
amizade. Reconheço a "estupidez" da minha conduta. E se, um dia, um
ou vários, decidir: 'Não falo mais a este fulano... nem me atende o
telefone...'o que será de mim sem esses telefonemas que expressam uma amizade?
Ficarei para aqui imóvel na minha "importância" sem nada nem ninguém!
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