22/04/2011

Diálogos apostólicos

Diálogos





Sim, é verdade! A filiação divina é uma realidade concreta.

Foi Cristo quem o afirmou e, Ele, que é a Verdade, não pode dizer senão a verdade.















ama , 2011.04.22

TEXTOS DE SÃO JOSEMARIA ESCRIVÁ




“Ninguém dá o que não tem”

Convence-te: o teu apostolado consiste em difundir bondade, luz, entusiasmo, generosidade, espírito de sacrifício, constância no trabalho, profundidade no estudo, amplitude na entrega, actualização, obediência absoluta e alegre à Igreja, caridade perfeita... Mas ninguém dá o que não tem. (Sulco, 927)


Não o esqueças: convencemos tanto melhor quanto mais convencidos estivermos. (Sulco, 929)

"Não se acende a luz para a pormos debaixo de um alqueire, mas sobre um candeeiro, a fim de que ilumine todos os da casa; assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de maneira que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos Céus".

E, no final da sua passagem pela Terra, ordena: "euntes docete", ide e ensinai. Quer que a sua luz brilhe na conduta e nas palavras dos seus discípulos. Nas tuas também. (Sulco, 930)

Que essa ideia do catolicismo é velha e, portanto, inaceitável?... Mais antigo é o Sol, e não perdeu a sua luz; mais arcaica é a água, e ainda tira a sede e refresca! (Sulco, 937)

Alguns não sabem nada de Deus..., porque não lhes falaram d'Ele em termos compreensíveis. (Sulco, 941)

Acredita em mim: normalmente, o apostolado, a catequese, tem de ser capilar: um a um. Cada crente com o seu companheiro mais próximo.

A nós, filhos de Deus, interessam-nos todas as almas, porque nos interessa cada uma delas. (Sulco, 943)






© Gabinete de Informação do Opus Dei na Internet

Confidências de alguém - 9

Confidências de Alguém

Nota de AMA: 
Estas “confidências” têm, obviamente, um autor, que não se revela; foram feitas em tempo indeterminado, por isso não se lhes atribui a data. O estilo discursivo revela, obviamente, que se tratam de meditações escritas ao correr da pena. A sua publicação deve-se a ter considerado que, nelas se encontram muitas situações e ocorrências que fazem parte do quotidiano que, qualquer um, pode viver.



SEXTA FEIRA SANTA


São 13H30 desta tarde e estou aqui com o meu pensamento e o meu coração voltados para Vós, meu Deus.
Acompanho, ou tento acompanhar os Passos Dolorosos da Tua Paixão há cerca de dois mil anos atrás.
Por esta altura, naquela distante data, deveria estar a ocorrer o Teu julgamento por Pilatos.
Julgamento… como se esta palavra pudesse de algum modo representar aquilo que ocorreu.
Um julgamento é um acto sério de avaliação e confronto entre os actos praticados por alguém e as normas correntes da sociedade. Aquilo que comummente se designa por comportamento cívico. Este, o julgamento humano porque, o julgamento verdadeiro, o julgamento de Deus ou feito por Deus sobre os actos dos homens, esse tem a ver com a justiça infinita.
O julgamento dos homens é só isso mesmo, uma interpretação dos actos de um homem feita por outros homens.
Mas nem disto se tratou, evidentemente, no Teu caso, meu Jesus. Tu não foste julgado. Não foi apresentada nenhuma prova, nenhuma evidência de qualquer maldade ou acto menos digno praticado por Ti.
Não passou tudo de uma farsa, uma cabala montada pelos Teus inimigos que, não podendo vencer-te nem pela razão nem pelas palavras, encontraram a única forma que, no seu entender, poderia acabar de uma vez com tudo e derrotar-te.
Aconteceu precisamente o contrário. Quando foste condenado, ou melhor, quando Pilatos Te entregou aos teus inimigos, uma nova era começou efectivamente para a humanidade. Nada continuaria igual ao que fora até então.
Os homens passariam a ter novas relações porque referenciadas a Ti mesmo, à Tua Vida, aos Teus ensinamentos.
Estas referências, que qualquer homem tem, são determinantes do seu comportamento e, quer queiram quer não, estão sempre presentes. Mesmo aqueles que Te negam, que dizem que não existes, que nunca exististe, estão referenciados a Ti.

Não podiam os Teus inimigos saber nada disto. O seu coração só albergava o ódio e o medo.
O ódio, - porque bem no fundo dos corações, sabiam da verdade e reconheciam-na nas Tuas palavras - e, sobretudo, nas Tuas demonstrações da sua falsidade e aproveitamento da religiosidade quase fanática de um povo.
O medo, porque se reconhecessem publicamente a Tua doutrina de amor, acabariam para sempre os seus privilégios e a sua preponderância e domínio sobre o mesmo povo.
O Sumo-sacerdote tinha dito muito claramente que era preferível morrer um só homem que perecer uma nação inteira.

Porquê?

Porque ele sabia, ou pelo menos pressentia, que a nova doutrina, os novos princípios de amor entre os homens, iriam revolucionar todo o mundo e a sociedade de então que era regida pela força bruta, pelas armas, pelo interesse e pelo desrespeito dos homens pelo seu semelhante.
Isto seria o bastante, como efectivamente foi, para alterar todo o comportamento da sociedade e subverter os princípios e as regras porque se regia. E isto não convinha aos Príncipes dos Sacerdotes. Quando tal acontecesse, a importância do seu papel como condutores do povo, o seu poder de intervenção ficariam reduzidos a nada ou, quando muito, apenas a uma mera influência espiritual e religiosa.
Toda a sua postura assentava numa política de domínio do povo, numa estrutura de classes em que os direitos não eram iguais para todos, onde, por exemplo, só uma classe deveria ter acesso à cultura que pudesse interpretar as escrituras e textos sagrados, que tivesse o privilégio de instituir as leis e regras de conduta de todo um povo.
Assim personalizavam em si todo o poder ou representação político-religiosa do povo de Israel. Não poderiam admitir nunca que este papel fosse subvertido ou pura e simplesmente reduzido.
Foi então assim desta forma hipócrita e pouco séria que Te propuseram a julgamento.
Mas, além do mais, apenas uma sentença lhes interessava: A Tua condenação à morte na Cruz.
A Tua morte, que era ponto assente, tinha de ser de tal forma exemplar, publicitada pela sua infâmia e pelo desprezo e repulsa que provocasse, que atingisse os efeitos que pretendiam de Te desacreditar definitivamente e originar um tal repúdio por parte dos Teus fiéis e simpatizantes que se tornasse impossível a continuidade da Tua doutrina através de um qualquer seguidor mais fiel.
Todas aquelas farsas, as chacotas, os insultos e, até mesmo, os golpes da flagelação ou as dores excruciantes da coroa de espinhos, nada disto Te deve ter doído mais que aquela atitude dos Teus inimigos. Tu próprio dirás mais tarde no Gólgota «Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem» e referias-te aos Teus algozes, àqueles que Te martirizaram e crucificaram.
Mas aqueles outros sabiam muito bem o que faziam. Tinham calculado e previsto e disposto as coisas de forma a conseguirem exactamente o que sucedeu.
Não tinham querido reconhecer o que sabiam e tinham percebido pelas evidências. Não eram casmurros, ou falhos de inteligência, pelo contrário, seriam até dos mais letrados e inteligentes homens daquela época em Israel. Basta ver a forma como manipularam um orgulhoso Pôncio Pilatos.
A sua dureza de coração para contigo, manso e humilde de coração, a sua mão pesada na administração dos preceitos religiosos, para contigo, cujo jugo é leve e a carga suave, a Ti meu Senhor, isto doeu-te mais que tudo o resto.

Porque Tu tinhas vindo a este mundo, cerca de trinta anos antes, exactamente por causa deste povo, um povo escolhido desde o princípio dos tempos e, também, por causa daqueles homens que deveriam ter sido exactamente os que deveriam ter aberto as portas e apregoado aos quatro cantos de Israel a Nova Era, a chegada do Messias prometido, arrastando assim todo o povo para o caminho da salvação eterna, esses, tinham sido precisamente os que tinham querido fechar hermeticamente as portas da salvação ao povo escolhido.
Não há dúvida nenhuma sobre isto, eles próprios o afirmaram a Pilatos dizendo que não tinham poderes para Te condenar à morte. Quer dizer, a condenação à morte e à morte de cruz, gritando: «Crucifige eum!» [i] Foi feita por eles. Pilatos não fez mais que fazer-lhes a vontade.
Tudo isto, Senhor, porque Tu quiseste, porque tinhas resolvido desde o princípio dos tempos entregares-te aos Teus inimigos para sofrer o que houvesse que sofrer, inclusive, essa morte ignominiosa, para restaurar as relações entre Deus Pai e a humanidade. No fundo, cumpria-se a Tua vontade também, como Deus.

Mistérios dos mistérios, pela união hipostática, a Tua humanidade unida à Tua Divindade, Tu és uma vítima consciente do Teu sacrifício.
Enquanto a Tua Humanidade se sujeita à Vontade de Deus, sabendo Este como tudo vai acontecer e o que depois se seguirá, enquanto Deus esperas e anseias por alguma modificação de última hora, um arrependimento, uma mudança de atitude, sabe-se lá, uma conversão ou, até, talvez uma alteração do plano divino de salvação: «Pai, se puderes afasta de mim este cálice». [ii]

O que mais Te dói, meu Senhor, é saberes que isso não vai acontecer e, talvez pior ainda, muitas coisas iguais irão acontecer pelos tempos fora. Muitos homens voltarão a ofender-te, a cuspir-te e também a crucificar-te. E Tu, sendo Deus, nada podes fazer para impedir que este conhecimento doloroso Te ocorra nestes momentos pavorosos de dor e martírio. Porque, justo como és, desejaste sempre para o homem criado por Ti, uma liberdade total mesmo em relação a Ti.
E dói-te ainda muito mais saberes que ao julgá-los, no julgamento definitivo, terás que condenar muitos privando-os da venturosa eternidade que preparaste para os homens, todos, desde sempre.

Nada dói mais que a dor provocada pelo espírito, aquilo que nos amarga o coração e que nos esmaga por dentro.

Sim, sem dúvida as dores físicas que tens suportado, estão muito aquém das dores morais que Te amarguram e que já Te fizeram suar sangue no Monte das Oliveiras.
Como sabes tão bem como somos todos os homens, como nos conheces até ao mais ínfimo detalhe, sabes que não podemos deter-nos por mais que breves instantes na consideração do nosso amor por Deus. A nossa inconstância, filha das nossas debilidades e fraquezas, traz-nos amarrados a uma espécie de torvelinho de desejos, prazeres, necessidades, ambições, critérios, opiniões, dúvidas que constantemente nos afastam do que deveria ser o nosso objectivo: A salvação da nossa alma.
Por isso, num acto de amor sem paralelo e que só se justifica por seres Deus, também quiseste deixar-nos ontem, Quinta-feira Santa, esse Sacramento extraordinário pelo qual podemos receber-te todos os dias da nossa vida terrena.
Alguns dizem que não é bem assim que apenas deixas-te um acto ou uma fórmula para Te recordar, ou que não passaria de um simples sortilégio ou acto de perpetuação. Porque vêm com olhos humanos uma coisa que foi feita por Deus e só pode ser vista com olhos divinos.
Tu, enquanto Homem, não podias instituir este Sacramento. Era-te vedado transubstanciar o pão e o vinho no Teu Corpo e Sangue mas, enquanto Deus, e foi como Deus que o fizeste, esse maravilhoso acto de bondade era-te perfeitamente possível.
Por isso, tal como os Príncipes dos Sacerdotes também esses se recusam a ver o que os olhos não podem ver e que só a alma pode efectivamente reconhecer.

Sexta-feira Santa!

Santa porque santificada por Ti, com o Teu sangue, a Tua angústia, o Teu sofrimento, o Teu amor.

Possa eu, meu Senhor, viver esta Sexta Feira como um verdadeiro filho Teu. Afastar-me de vez desses Príncipes dos sacerdotes que constantemente me segredam ao ouvido as suas razões sem razão.

Possa eu, meu Senhor, passar este dia sem chorar por Ti, tal como mandaste: «Não choreis por Mim, chorai antes por vós e vossos filhos» [iii], mas chorar, contritamente por mim, pelas minhas faltas, chorar também pelas faltas de todos os homens.

Possa eu, meu Senhor, arrimar o meu ombro, como o Cireneu, à Tua Cruz aliviando por pouco que seja o seu peso esmagador.

Possa eu, meu Senhor, levar a minha própria cruz sem me queixar, sem lutar com ela, num esforço para me libertar mas, olhando para Ti, levá-la, embora esforçado e custosamente, bem erguida ao alto.

Possa eu, meu Senhor, ter bem presente, todos os dias, esta Sexta-feira Santa.



[i] cfr. Jo. 19, 15
[ii] cfr. Lc. 22, 42
[iii] cfr. Lc. 23, 28

ORAÇÃO E MÚSICA

 Requiem de Mozart - Lacrimosa - Karl Böhm - Filarmónica de Viena



Pensamentos inspirados

À procura de Deus



Se amamos não tememos, porque se tememos, não amamos verdadeiramente.


jma, 2011.04.22

Sobre a família 29

O direito dos pais à educação dos filhos (II)
continuação 
Basta pensar, por exemplo, na importância de combater o analfabetismo para melhorar a justiça social, para entender que o Estado tem poderes, funções e direitos indeclináveis em matéria de promoção e difusão da educação, a que todo o homem tem um direito inalienável [i].

Isto justifica, como concreta exigência do bem comum, que o ordenamento estatal estabeleça certos níveis de ensino cujo aproveitamento eficaz pode legitimamente condicionar o acesso a determinadas carreiras universitárias ou a outros tipos de actividades profissionais.

Neste contexto, pode colocar-se o problema das competências dos pais e as do Estado serem discordantes ou incompatíveis ou, pelo contrário, poderem chegar a ser complementares. Em todo o caso, pode perguntar-se: como se relacionam entre si? Até onde pode o Estado legislar sem ultrapassar o direito dos pais, ou quando poderá intervir para garantir os direitos das crianças frente aos seus pais?

J.A. Araña e C.J. Errázuriz
© 2011, Gabinete de Informação do Opus Dei na Internet


[i] Cfr. João Paulo II,  Alocução à UNESCO, 2-VI-1980; Congregação para a Doutrina da Fé, Instrução Libertatis conscientia, n. 92.

Meditação para Sexta-Feira Santa

São 13H30 desta tarde e eu estou aqui com o meu pensamento e o meu coração voltados para Vós, meu Deus.
Acompanho, ou tento acompanhar, os Passos Dolorosos da Tua Paixão há mais de dois mil anos atrás.
Por esta altura, naquela distante data, deveria estar a ocorrer o Teu julgamento por Pilatos.
Julgamento… como se esta palavra pudesse de algum modo representar aquilo que ocorreu.
Um julgamento é um acto sério de avaliação e confronto entre os actos praticados por alguém e as normas correntes da sociedade. Aquilo que comummente se designa por comportamento cívico. Este, o julgamento humano porque, o julgamento verdadeiro, o julgamento de Deus, ou feito por Deus sobre os actos dos homens, esse tem a ver com a Justiça Infinita.
O julgamento dos homens é só isso mesmo, uma interpretação dos actos de alguém feita por outros homens.
Mas nem disto se tratou, evidentemente, no Teu caso, meu Jesus. Tu não foste julgado. Não foi apresentada nenhuma prova, nenhuma evidência de qualquer maldade ou acto menos digno praticado por Ti.
Não passou tudo de uma farsa, uma cabala montada pelos Teus inimigos que, não podendo vencer-te nem pela razão nem pelas palavras, encontraram a única forma que, no seu entender, poderia acabar de uma vez com tudo e derrotar-te.


Aconteceu precisamente o contrário.


Quando foste condenado, ou melhor, quando Pilatos Te entregou aos teus inimigos, uma nova era começou efectivamente para a humanidade.
Nada continuaria igual ao que fora até então.
Os homens passariam a ter novas relações porque referenciadas a Ti mesmo, à Tua Vida, aos Teus Ensinamentos.
Estas referências, que qualquer homem pode ter, são determinantes do seu comportamento e, quer queiram quer não, estão sempre presentes. Mesmo aqueles que Te negam, que dizem que não existes, que nunca exististe, estão referenciados a Ti.
Não podiam os Teus inimigos saber nada disto. O seu coração só albergava o ódio e o medo.
Ódio, porque, bem no fundo do coração, conheciam a verdade e reconheciam-na nas Tuas palavras e, sobretudo, nas Tuas demonstrações da sua falsidade e aproveitamento da religiosidade quase fanática de um povo.
Medo, porque se reconhecessem publicamente a Tua doutrina de amor, acabariam para sempre os seus privilégios e a sua preponderância e domínio sobre o mesmo povo.
O Sumo-sacerdote tinha dito muito claramente que era preferível morrer um só homem que perecer uma nação inteira.


Porquê?


Porque ele sabia, ou pelo menos desconfiava, que a nova doutrina, os novos princípios de amor entre os homens, iriam revolucionar todo o mundo e a sociedade de então que era regida pela força bruta, pelas armas, pelo interesse e pelo desrespeito dos homens pelo seu semelhante.
Isto seria o bastante, como efectivamente foi, para alterar todo o comportamento da sociedade e subverter os princípios e as regras porque se regia. E isto não convinha aos Príncipes dos Sacerdotes. Quando tal acontecesse, a importância do seu papel como condutores do povo, o seu poder de intervenção ficariam reduzidos a nada ou, quando muito, apenas a uma mera influência espiritual e religiosa.
Toda a sua postura assentava numa política de domínio do povo, numa estrutura de classes em que os direitos não eram iguais para todos, onde, por exemplo, só uma classe deveria ter acesso à cultura que pudesse interpretar as escrituras e textos sagrados, que pudesse instituir as leis e regras de conduta de todo um povo.
Assim personalizavam em si todo o poder ou representação política do povo de Israel. Não poderiam admitir nunca que este papel fosse subvertido ou pura e simplesmente reduzido.
Foi então, desta forma hipócrita e pouco séria, que Te propuseram a julgamento.
Mas, alem do mais, apenas uma sentença lhes interessava: A Tua condenação à morte na Cruz.
A Tua morte, que era ponto assente, tinha de ser de tal forma exemplar publicitada pela sua infâmia, pelo desprezo e repulsa que provocasse para que atingisse os efeitos que pretendiam de Te desacreditar definitivamente e originar um tal repúdio por parte dos Teus seguidores fiéis e simpatizantes que se tornasse impossível a continuidade da Tua doutrina através de um qualquer mais fiel.


Todas aquelas farsas as chacotas, os insultos e, até mesmo, os golpes da flagelação ou as dores excruciantes da coroa de espinhos, nada Te deve ter doído mais que aquela atitude dos Teus inimigos.
Tu próprio dirás mais tarde no Gólgota “Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” e referias-te aos Teus algozes àqueles que Te martirizaram e crucificaram.
Mas, aqueles outros, sabiam muito bem o que faziam. Tinham calculado, previsto e disposto as coisas de forma a conseguirem exactamente o que sucedeu.
Não tinham querido reconhecer o que sabiam e tinham percebido pelas evidências. Não eram casmurros, ou falhos de inteligência, pelo contrário, seriam até dos mais letrados e inteligentes homens daquela época em Israel. Basta ver a forma como manipularam um orgulhoso Poncio Pilatos.
A sua dureza de coração, para contigo, manso e humilde de coração, a sua mão pesada na administração dos preceitos religiosos, para contigo, cujo jugo é leve e a carga suave, a Ti meu Senhor, isto doeu-te mais que tudo o resto.
Porque Tu tinhas vindo a este mundo, cerca de trinta anos antes, exactamente por causa deste povo, um povo escolhido desde o princípio dos tempos e por causa daqueles homens que deveriam ter sido exactamente os que deveriam ter aberto as portas e apregoado aos quatro cantos de Israel a Nova Era, a chegada do Messias prometido, arrastando assim todo o povo para o caminho da salvação eterna, esses, tinham sido precisamente os que tinham querido fechar hermeticamente as portas da salvação ao povo eleito.
Não há dúvida nenhuma sobre isto, eles próprios o afirmaram a Pilatos dizendo que não tinham poderes para Te condenar à morte. Quer dizer, a condenação à morte e à morte de cruz, gritando: «Crucifige eum!» foi feita por eles. Pilatos não fez mais que fazer-lhes a vontade.


Tudo isto, Senhor, porque Tu quiseste, porque tinhas resolvido desde o princípio dos tempos entregar-te aos Teus inimigos para sofrer o que houvesse que sofrer, inclusive, essa morte ignominiosa, para restaurar as relações entre Deus Pai e a humanidade.
No fundo, cumpria-se a Tua vontade também, como Deus.
Mistério dos mistérios, pela união hipostática, a Tua humanidade unida à Tua Divindade, Tu és uma vítima consciente do Teu sacrifício. Enquanto a Tua Humanidade se sujeita à Vontade de Deus, sabendo como tudo vai acontecer e o que depois se seguirá, enquanto Homem esperas e anseias por alguma modificação de última hora, um arrependimento, uma mudança de atitude, sabe-se lá, uma conversão ou, até, talvez uma alteração do plano divino de salvação: “Pai, se puderes afasta de mim este cálice”.


O que mais Te dói, meu Senhor, é saberes que nada disto vai acontecer e, talvez pior ainda, muitas coisas iguais irão acontecer pelos tempos fora. Muitos homens voltarão a ofender-te, a cuspir-te e também a crucificar-te. E Tu, sendo Deus, nada fazes para impedir que este conhecimento doloroso Te ocorra nestes momentos pavorosos de dor e martírio. Porque, justo como és, desejaste sempre para o homem criado por Ti, uma liberdade total mesmo em relação a Ti.
E dói-te ainda muito mais saberes que, ao julgá-los no julgamento definitivo, terás que condenar muitos privando-os da venturosa eternidade que preparaste para os homens, todos, desde sempre.


Nada dói mais que a dor provocada pelo espírito, aquilo que nos esmaga  o coração e que nos amarga por dentro.


Sim, sem dúvida as dores físicas que tens suportado, estão muito aquém das dores morais que Te amarguram e que já Te fizeram suar sangue no Monte das Oliveiras.
Como sabes tão bem como somos todos os homens, como nos conheces até ao mais ínfimo detalhe, sabes que não podemos deter-nos por mais que breves instantes na consideração do nosso amor por Deus. A nossa inconstância, filha das nossas debilidades e fraquezas, traz-nos amarrados a uma espécie de torvelinho de desejos, prazeres, necessidades, ambições, critérios, opiniões, dúvidas que constantemente nos afastam do que deveria ser o nosso objectivo: A salvação da nossa alma.
Por isso, num acto de amor sem paralelo e que só se justifica por seres Deus, também quiseste deixar-nos ontem, Quinta Feira Santa, esse Sacramento extraordinário pelo qual podemos receber-te todos os dias da nossa vida terrena.
Alguns dizem que não é bem assim que apenas nos deixas-te um acto ou uma fórmula para recordar, o que não passaria de um simples sortilégio ou acto de perpetuação. Porque vêm com olhos humanos algo que foi feito por Deus e só pode ser enxergado e compreendido com olhos puros.


Tu, enquanto Homem, não podias instituir este Sacramento. Era-te vedado transubstanciar o pão e o vinho no Teu Corpo e Sangue mas, enquanto Deus, e foi como Deus que o fizeste, esse maravilhoso acto de bondade era-te perfeitamente possível.
Por isso, tal como os Príncipes dos Sacerdotes, também esses se recusam a “ver” o que os olhos não podem ver e que só a alma pode efectivamente reconhecer.

Sexta-Feira Santa!


Santa porque santificada por Ti, com o Teu Sangue, a Tua Angústia, o Teu Sofrimento, o Teu Amor.


Possa eu, meu Senhor, viver esta Sexta-Feira como um verdadeiro filho Teu. Afastar-me de vez desses Príncipes dos Sacerdotes que constantemente me segredam ao ouvido as suas razões sem razão.


Possa eu, meu Senhor, passar este dia sem chorar por Ti, tal como mandaste: “Não choreis por Mim, chorai antes por vós e vossos filhos”, mas chorar, contritamente por mim, pelas minhas faltas, chorar também pelas faltas de todos os homens.


Possa eu, meu Senhor, arrimar o meu ombro, como o Cireneu, à Tua Cruz aliviando por pouco que seja o seu peso esmagador.


Possa eu, meu Senhor, levar a minha própria cruz sem me queixar, sem lutar com ela, num esforço para me libertar mas, olhando para Ti, levá-la, embora esforçado e custosamente, bem erguida ao alto.


Possa eu, meu Senhor, ter bem presente, todos os dias, esta Sexta Feira Santa.

(ama, Porto, meditação, 1992.06.17)