Tempo comum XXVI Semana
São
Francisco de Assis
Evangelho: Lc 10, 17-24
17 Os setenta e dois
voltaram alegres, dizendo: «Senhor, até os demónios se nos submetem em virtude
do Teu nome». 18 Ele disse-lhes: «Eu via Satanás cair do céu como um
raio. 19 Eis que vos dei poder de caminhar sobre serpentes e
escorpiões, e de vencer toda a força do inimigo, e nada vos fará dano. 20
Contudo não vos alegreis porque os espíritos maus vos estão sujeitos, mas
alegrai-vos porque os vossos nomes estão escritos nos céus». 21
Naquela mesma hora Jesus exultou de alegria no Espírito Santo, e disse: «Graças
Te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos
sábios e aos prudentes, e as revelaste aos simples. Assim é, ó Pai, porque
assim foi do Teu agrado. 22 Todas as coisas Me foram entregues por
Meu Pai; e ninguém sabe quem é o Filho, senão o Pai, nem quem é o Pai, senão o
Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar». 23 Depois, tendo-Se
voltado para os discípulos, disse: «Felizes os olhos que vêem o que vós vedes. 24
Porque Eu vos afirmo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vós vedes e
não o viram, ouvir o que vós ouvis e não o ouviram».
Comentário:
Uma
vez mais, Jesus Cristo esclarece: A única forma de conhecer Deus, de “chegar”’
ao Seu conhecimento é através dele próprio.
Parece
muito lógico – para usar terminologia humana – se «todas as coisas Lhe foram
entregues – Ele, então, é o único caminho para a salvação eterna ou, seja, para
a contemplação eterna da Face de Deus.
(ama, comentário sobre Lc 10, 17-24, 2013.10.05)
Leitura espiritual
Documentos do Magistério
CARTA ENCÍCLICA
DIVINO
AFFLANTE SPIRITU (*)
DO SUMO PONTÍFICE PAPA PIO XII
AOS VENERÁVEIS IRMÃOS
PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS E BISPOS
E OUTROS ORDINÁRIOS DO LUGAR
EM PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
COMO A TODO O CLERO E FIÉIS DE CRISTO
DO ORBE CATÓLICO SOBRE OS ESTUDOS BÍBLICOS
10.
É, porém, justo e grato reconhecer que os notáveis progressos feitos pela
ciência e uso das Sagradas Escrituras entre os católicos se devem não somente a
essas disposições, prescrições e exortações de nossos predecessores, mas também
ao concurso e colaboração de todos os que, com pronto acatamento, consagraram
as suas fadigas tanto a meditar, investigar e escrever, como a ensinar, pregar,
traduzir e propagar os Livros Santos.
Com
efeito, das escolas superiores de Teologia e Sagrada Escritura e,
principalmente, de nosso Pontifício Instituto Bíblico têm saído já e saem
muitos cultores das divinas Escrituras, que animados de ardente amor dos Livros
santos infundem o mesmo amor na juventude eclesiástica e lhe comunicam
diligentemente a doutrina que aprenderam.
Não
poucos têm feito e fazem progredir as ciências bíblicas, nomeadamente com seus
escritos, quer publicando edições críticas do sagrado texto, explicando-o,
ilustrando-o, traduzindo-o, em vulgar, quer propondo-o à devota leitura e
meditação dos fiéis, quer finalmente aprendendo e cultivando as ciências
profanas que servem à inteligência da Escritura.
Essas
e outras obras que cada dia mais se vão propagando e desenvolvendo, quais são,
por exemplo, as reuniões, congressos, semanas de estudos bíblicos, bibliotecas,
associações para a meditação dos evangelhos, fazem-nos conceber certas
esperanças de que para o futuro a veneração, uso e ciência das sagradas
Escrituras progredirão cada vez mais para o bem das almas, contanto que todos
com firmeza, entusiasmo e confiança se atenham ao método de estudos bíblicos
traçados por Leão XIII, por seus sucessores declarado e aperfeiçoado, e por nós
confirmado e acrescido, método que é o único seguro e comprovado pela
experiência, nem se deixem desanimar pelas dificuldades, que, como sucede nas
coisas humanas, nunca hão de faltar nesta tão grande obra.
SEGUNDA PARTE
CRITÉRIOS HERMENÊUTICOS
PARA O ESTUDO DA SAGRADA ESCRITURA HOJE
1.
Estado atual dos estudos bíblicos
11.
Nesses cinquenta anos as condições dos estudos bíblicos e ciências auxiliares,
não há quem o não veja, mudaram consideravelmente. Assim, para não falar de
outras coisas, quando nosso predecessor publicou a Encíclica Providentissimus
Deus, apenas um ou outro lugar da Palestina se tinha começado a explorar com
escavações orientadas nesse sentido.
Agora
tais explorações têm-se multiplicado enormemente e fazem-se com métodos mais
rigorosos e arte aperfeiçoada pela experiência, de modo que os resultados são
muito mais abundantes e certos. Quanta luz se tire de tais investigações para
compreender melhor e mais perfeitamente os Livros santos, sabem-nos os doutos,
sabem-no todos os que se dão a este gênero de estudos.
Aumentam
o valor destas explorações os monumentos escritos por vezes encontrados, que
ajudam muito a conhecer as línguas, a literatura, a história, os costumes, os
cultos daqueles antiquíssimos povos. Nem é menor a importância da investigação
e descoberta dos papiros, tão frequente em nossos dias, e que tanto tem
contribuído para melhor conhecimento das letras e instituições públicas e
particulares, especialmente do tempo de nosso divino Salvador.
Encontraram-se
ainda e publicaram-se, conforme as exigências da crítica, antigos manuscritos
dos Livros santos, a exegese dos Padres da Igreja foi mais larga e
profundamente estudada, inúmeros exemplos vieram a ilustrar o modo de falar, de
narrar e de escrever dos antigos.
Tudo
isso que, não sem providência especial de Deus, conseguiu a nossa época,
convida e aconselha aos intérpretes das sagradas Escrituras a aproveitar
diligentemente tanta luz para perscrutar mais a fundo os divinos Oráculos,
ilustrá-los com maior clareza, expô-los com maior precisão.
Vemos,
com suma complacência da nossa alma, que os intérpretes têm correspondido e
continuam a corresponder com louvável zelo a este convite, é este um fruto, e
não dos últimos nem dos menores, da encíclica Providentissimus Deus, com a qual
o nosso predecessor, como presságio desta nova primavera de estudos bíblicos,
chamou os exegetas católicos ao trabalho e lhes traçou o caminho e métodos de
trabalhar.
Ora,
que o trabalho não só continue constantemente, mas frutifique e se aperfeiçoe
cada vez mais é o que nós também desejamos conseguir com esta encíclica, na
qual nos propomos sobretudo mostrar a todos o que falta ainda por fazer e qual
o espírito com que o exegeta católico de hoje deve aplicar-se a um múnus tão
grande e tão excelso, e infundir novo animo e novos estímulos aos operários que
estrenuamente trabalham na vinha do Senhor.
2.
Uso dos textos originais
Estudo
das línguas bíblicas
12.
Ao intérprete católico que se aplica a entender e expor as Sagradas Escrituras,
já os Padres da Igreja - e sobretudo Agostinho - recomendaram vivamente o
estudo das línguas antigas e o recurso aos textos originais. (22)
Todavia
as condições dos estudos naqueles tempos eram tais que só poucos, e ainda assim
imperfeitamente, conheciam a língua.
Na
Idade Média, quando mais florescia a teologia escolástica, tinha decaído tanto
também o conhecimento do grego entre os ocidentais, que até os maiores doutores
daquele tempo, ao explicarem os Livros santos, deviam basear-se unicamente na
tradução latina da Vulgata. Ao contrário em nossos dias não só a língua grega,
que com a Renascença ressurgiu por assim dizer à nova vida, é familiar a quase
todos os literatos e cultores da antiguidade, mas também a hebraica e as outras
línguas orientais são largamente conhecidas dos eruditos.
Além
disso são hoje tantos os meios para aprender aquelas línguas que o intérprete
da Escritura, que, descurando-as, fecha a si mesmo o acesso aos textos
originais, não podendo evitar a imputação de inconsideração e indolência.
Dever
do exegeta é aproveitar com a máxima atenção e veneração ainda as mais pequenas
minudências provenientes da pena do hagiógrafo sob a inspiração do Divino
Espírito, a fim de penetrar a fundo e plenamente o seu pensamento.
Por
isso trabalhe por adquirir uma perícia cada vez maior das línguas bíblicas e
também dos outros idiomas orientais e apoie a sua interpretação com todos os
recursos subministrados por toda espécie de filologia.
Foi
o que S. Jerónimo se esforçou por conseguir, quanto o consentiam os
conhecimentos daquela época, e o mesmo procuraram, com indefesso estudo e fruto
mais que ordinários, os grandes exegetas dos séculos XVI e XVII, se bem que
fosse então, menor do que hoje, a ciência linguística.
Deve,
pois, com o mesmo método explicar-se o texto original, o qual pelo facto mesmo
de ter sido escrito pelo Autor sagrado, tem maior autoridade e peso que
qualquer tradução antiga ou moderna por óptima que seja, e isso poderá obter-se
mais fácil e proveitosamente, se ao conhecimento das línguas se unir uma sólida
perícia da arte crítica aplicada ao mesmo texto.
Importância
da crítica textual
13.
Quanta seja a importância desta crítica, bem o dá a entender Santo Agostinho,
quando entre as normas que inculca ao estudioso dos Livros Santos, põe em
primeiro lugar o cuidado de procurar um texto correcto.
"A
emendar os códices, diz aquele preclaríssimo doutor da Igreja, deve antes de
mais nada atender a sagacidade pelos que desejam conhecer as divinas
Escrituras, para que os não emendados cedam o lugar aos emendados". (23)
Hoje
em dia esta arte que sói chamar-se crítica textual e nas edições de autores
profanos se emprega com grande louvor e fruto, com toda a razão se aplica
também aos Livros Santos, precisamente pela reverência devida à palavra de
Deus.
De
facto o seu fim é reconstruir com toda a possível perfeição o texto sagrado,
expurgá-lo das alterações nele introduzidas por culpa dos copistas, mudando-o
das glossas e lacunas, transposições e repetições de palavras, e de toda
espécie de erros que costumam infiltrar-se na transmissão plurissecular de
obras manuscritas.
Nem
quase é preciso advertir que essa crítica, que alguns decénios atrás muitos
empregaram de modo completamente arbitrário, tanto que muitas vezes parecia não
pretenderem outra coisa senão introduzir no texto sagrado as suas opiniões
preconcebidas, hoje chegou a tal consistência e segurança de regras, que se tornou
um magnífico instrumento para a edição da divina palavra em forma mais exacta e
mais pura, e é fácil descobrir qualquer abuso que dela se faça.
Nem
é necessário lembrar aqui - pois é coisa conhecida e manifesta a quantos
estudam a Sagrada Escritura - quanto apreço fez sempre a Igreja, desde os
primeiros séculos até aos nossos tempos, dos estudos críticos.
Portanto
hoje que esta arte atingiu tão grande perfeição, é um dever de honra, bem que
não sempre fácil, para os especialistas em Sagrada Escritura, procurar por
todos os meios que quanto antes se preparem edições católicas dos Livros santos
e das antigas traduções, feitas segundo estas normas, de modo que com uma
reverência suma para com o texto sagrado unam uma exacta observância de todas as
leis da crítica.
E
saibam bem todos que este longo trabalho não só é necessário para bem
compreender os escritos divinamente inspirados, mas é imperiosamente exigido
pela piedade com que nos devemos mostrar sumamente agradecidos a amorosíssima
Providência de Deus que do trono da sua majestade nos mandou esses livros como
cartas do Pai celeste aos próprios filhos.
Texto
original e autenticidade da vulgata
14.
Nem vá alguém pensar que o sobredito uso dos textos originais, feito segundo as
regras da crítica, é contrário a quanto o concílio de Trento sabiamente
decretou a respeito da Vulgata latina. (24)
É
um facto, atestado pelos documentos, que os presidentes do concílio receberam o
encargo, por eles fielmente cumprido, de pedir ao sumo pontífice em nome do
mesmo Concílio que mandasse corrigir o melhor possível, primeiro a edição
latina, depois também a grega e a hebraica, e as publicasse para proveito da
santa Igreja de Deus. (25)
A
esse desejo, se então pelas dificuldades dos tempos e outros obstáculos não se
pode dar plena satisfação, actualmente com a colaboração de doutos católicos
pode dar-se, e confiamos que se dará execução mais vasta e perfeita.
Quanto
à Vulgata, se o concílio Tridentino ordenou que ela fosse a tradução latina que
todos usassem como autêntica, primeiro, este decreto, como todos sabem, é só
para a Igreja latina, e para o uso público da Escritura, depois, em nada
diminui a autoridade e valor dos textos originais.
De
facto não se tratava então dos textos originais, mas das traduções latinas que
naquele tempo corriam, entre as quais o concílio justamente decretou se
preferisse a que "pelo longo uso de tantos séculos na mesma Igreja estava
já de facto aprovada".
Portanto
esta autoridade proeminente ou autenticidade da Vulgata decretou-a o concílio
não principalmente por motivos de crítica, mas antes pelo uso legítimo que dela
se fez na Igreja durante tantos séculos, uso que prova ela estar, no sentido em
que a entendeu e entende a Igreja, completamente isenta de erros no que toca a
fé e aos costumes, de modo que, como a mesma Igreja atesta e confirma, se pode
nas disputas, prelecções e pregação alegar seguramente e sem perigo de errar,
por isso esta autenticidade propriamente não se chama "crítica" mas
"jurídica".
Nem
a autoridade da Vulgata em matéria de doutrina impede, - antes nos nossos dias
quase exige - que a mesma doutrina se prove e confirme também com os textos
originais, e que se recorra aos mesmos textos para encontrar e explicar cada
vez melhor o verdadeiro sentido das Sagradas Escrituras.
Antes,
o decreto Tridentino nem sequer proíbe que, para uso e proveito dos fiéis e
para facilitar a inteligência da divina palavra, se façam traduções em línguas
vulgares, e precisamente dos textos originais, como sabemos terem-se já feito,
e muito bem, em várias partes, com aprovação da autoridade eclesiástica.
(Revisão
da versão portuguesa por ama)
___________________________________________
Notas:
(*)
Em 30 de setembro de 1943, por motivo do cinqüentenário da encíclica
"Providentissimus Deus", o Santo Padre Pio XII publicou a seguinte
encíclica sobre os estudos bíblicos. Por sua extensão, e pela admirável clareza
com que expõe as normas que devem ser observadas no uso da Sagrada Escritura, o
importante documento adquire o alcance de uma verdadeira Carta Magna em matéria
de estudos e apostolado bíblicos.
(22)
Cf. s. Jerónimo, Praef. in IV Evang. ad Damasum, PL 29, 526-527, s. Agostinho,
De doctr. christ. II 16, PL 34, 42-43.
(23)
De doct. christ., II. 21, PL 34, 46.
(24)
Decr. de editione et usu Sacrorum Librorum, Conc.Trid. ed. Soc. Goerres, t. V
p. 91s.
(25)
Ibid. t. X, p. 471, cf. t. V pp. 29, 59, 65, t. X, p. 446s.