04/09/2014

Evang., Coment. Leit. Espiritual (Enc. Divino Afflante Spiritu)

Tempo comum XXVI Semana

São Francisco de Assis

Evangelho: Lc 10, 17-24

17 Os setenta e dois voltaram alegres, dizendo: «Senhor, até os demónios se nos submetem em virtude do Teu nome». 18 Ele disse-lhes: «Eu via Satanás cair do céu como um raio. 19 Eis que vos dei poder de caminhar sobre serpentes e escorpiões, e de vencer toda a força do inimigo, e nada vos fará dano. 20 Contudo não vos alegreis porque os espíritos maus vos estão sujeitos, mas alegrai-vos porque os vossos nomes estão escritos nos céus». 21 Naquela mesma hora Jesus exultou de alegria no Espírito Santo, e disse: «Graças Te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos prudentes, e as revelaste aos simples. Assim é, ó Pai, porque assim foi do Teu agrado. 22 Todas as coisas Me foram entregues por Meu Pai; e ninguém sabe quem é o Filho, senão o Pai, nem quem é o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar». 23 Depois, tendo-Se voltado para os discípulos, disse: «Felizes os olhos que vêem o que vós vedes. 24 Porque Eu vos afirmo que muitos profetas e reis desejaram ver o que vós vedes e não o viram, ouvir o que vós ouvis e não o ouviram».

Comentário:

Uma vez mais, Jesus Cristo esclarece: A única forma de conhecer Deus, de “chegar”’ ao Seu conhecimento é através dele próprio.
Parece muito lógico – para usar terminologia humana – se «todas as coisas Lhe foram entregues – Ele, então, é o único caminho para a salvação eterna ou, seja, para a contemplação eterna da Face de Deus.

(ama, comentário sobre Lc 10, 17-24, 2013.10.05) 

Leitura espiritual


Documentos do Magistério

CARTA ENCÍCLICA
DIVINO AFFLANTE SPIRITU (*)
DO SUMO PONTÍFICE PAPA PIO XII
AOS VENERÁVEIS IRMÃOS
PATRIARCAS, PRIMAZES, ARCEBISPOS E BISPOS
E OUTROS ORDINÁRIOS DO LUGAR
EM PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
COMO A TODO O CLERO E FIÉIS DE CRISTO
DO ORBE CATÓLICO SOBRE OS ESTUDOS BÍBLICOS

10. É, porém, justo e grato reconhecer que os notáveis progressos feitos pela ciência e uso das Sagradas Escrituras entre os católicos se devem não somente a essas disposições, prescrições e exortações de nossos predecessores, mas também ao concurso e colaboração de todos os que, com pronto acatamento, consagraram as suas fadigas tanto a meditar, investigar e escrever, como a ensinar, pregar, traduzir e propagar os Livros Santos.
Com efeito, das escolas superiores de Teologia e Sagrada Escritura e, principalmente, de nosso Pontifício Instituto Bíblico têm saído já e saem muitos cultores das divinas Escrituras, que animados de ardente amor dos Livros santos infundem o mesmo amor na juventude eclesiástica e lhe comunicam diligentemente a doutrina que aprenderam.
Não poucos têm feito e fazem progredir as ciências bíblicas, nomeadamente com seus escritos, quer publicando edições críticas do sagrado texto, explicando-o, ilustrando-o, traduzindo-o, em vulgar, quer propondo-o à devota leitura e meditação dos fiéis, quer finalmente aprendendo e cultivando as ciências profanas que servem à inteligência da Escritura.
Essas e outras obras que cada dia mais se vão propagando e desenvolvendo, quais são, por exemplo, as reuniões, congressos, semanas de estudos bíblicos, bibliotecas, associações para a meditação dos evangelhos, fazem-nos conceber certas esperanças de que para o futuro a veneração, uso e ciência das sagradas Escrituras progredirão cada vez mais para o bem das almas, contanto que todos com firmeza, entusiasmo e confiança se atenham ao método de estudos bíblicos traçados por Leão XIII, por seus sucessores declarado e aperfeiçoado, e por nós confirmado e acrescido, método que é o único seguro e comprovado pela experiência, nem se deixem desanimar pelas dificuldades, que, como sucede nas coisas humanas, nunca hão de faltar nesta tão grande obra.


SEGUNDA PARTE

CRITÉRIOS HERMENÊUTICOS PARA O ESTUDO DA SAGRADA ESCRITURA HOJE

1. Estado atual dos estudos bíblicos

11. Nesses cinquenta anos as condições dos estudos bíblicos e ciências auxiliares, não há quem o não veja, mudaram consideravelmente. Assim, para não falar de outras coisas, quando nosso predecessor publicou a Encíclica Providentissimus Deus, apenas um ou outro lugar da Palestina se tinha começado a explorar com escavações orientadas nesse sentido.
Agora tais explorações têm-se multiplicado enormemente e fazem-se com métodos mais rigorosos e arte aperfeiçoada pela experiência, de modo que os resultados são muito mais abundantes e certos. Quanta luz se tire de tais investigações para compreender melhor e mais perfeitamente os Livros santos, sabem-nos os doutos, sabem-no todos os que se dão a este gênero de estudos.
Aumentam o valor destas explorações os monumentos escritos por vezes encontrados, que ajudam muito a conhecer as línguas, a literatura, a história, os costumes, os cultos daqueles antiquíssimos povos. Nem é menor a importância da investigação e descoberta dos papiros, tão frequente em nossos dias, e que tanto tem contribuído para melhor conhecimento das letras e instituições públicas e particulares, especialmente do tempo de nosso divino Salvador.
Encontraram-se ainda e publicaram-se, conforme as exigências da crítica, antigos manuscritos dos Livros santos, a exegese dos Padres da Igreja foi mais larga e profundamente estudada, inúmeros exemplos vieram a ilustrar o modo de falar, de narrar e de escrever dos antigos.
Tudo isso que, não sem providência especial de Deus, conseguiu a nossa época, convida e aconselha aos intérpretes das sagradas Escrituras a aproveitar diligentemente tanta luz para perscrutar mais a fundo os divinos Oráculos, ilustrá-los com maior clareza, expô-los com maior precisão.
Vemos, com suma complacência da nossa alma, que os intérpretes têm correspondido e continuam a corresponder com louvável zelo a este convite, é este um fruto, e não dos últimos nem dos menores, da encíclica Providentissimus Deus, com a qual o nosso predecessor, como presságio desta nova primavera de estudos bíblicos, chamou os exegetas católicos ao trabalho e lhes traçou o caminho e métodos de trabalhar.
Ora, que o trabalho não só continue constantemente, mas frutifique e se aperfeiçoe cada vez mais é o que nós também desejamos conseguir com esta encíclica, na qual nos propomos sobretudo mostrar a todos o que falta ainda por fazer e qual o espírito com que o exegeta católico de hoje deve aplicar-se a um múnus tão grande e tão excelso, e infundir novo animo e novos estímulos aos operários que estrenuamente trabalham na vinha do Senhor.

2. Uso dos textos originais

Estudo das línguas bíblicas

12. Ao intérprete católico que se aplica a entender e expor as Sagradas Escrituras, já os Padres da Igreja - e sobretudo Agostinho - recomendaram vivamente o estudo das línguas antigas e o recurso aos textos originais. (22)
Todavia as condições dos estudos naqueles tempos eram tais que só poucos, e ainda assim imperfeitamente, conheciam a língua.
Na Idade Média, quando mais florescia a teologia escolástica, tinha decaído tanto também o conhecimento do grego entre os ocidentais, que até os maiores doutores daquele tempo, ao explicarem os Livros santos, deviam basear-se unicamente na tradução latina da Vulgata. Ao contrário em nossos dias não só a língua grega, que com a Renascença ressurgiu por assim dizer à nova vida, é familiar a quase todos os literatos e cultores da antiguidade, mas também a hebraica e as outras línguas orientais são largamente conhecidas dos eruditos.
Além disso são hoje tantos os meios para aprender aquelas línguas que o intérprete da Escritura, que, descurando-as, fecha a si mesmo o acesso aos textos originais, não podendo evitar a imputação de inconsideração e indolência.
Dever do exegeta é aproveitar com a máxima atenção e veneração ainda as mais pequenas minudências provenientes da pena do hagiógrafo sob a inspiração do Divino Espírito, a fim de penetrar a fundo e plenamente o seu pensamento.
Por isso trabalhe por adquirir uma perícia cada vez maior das línguas bíblicas e também dos outros idiomas orientais e apoie a sua interpretação com todos os recursos subministrados por toda espécie de filologia.
Foi o que S. Jerónimo se esforçou por conseguir, quanto o consentiam os conhecimentos daquela época, e o mesmo procuraram, com indefesso estudo e fruto mais que ordinários, os grandes exegetas dos séculos XVI e XVII, se bem que fosse então, menor do que hoje, a ciência linguística.
Deve, pois, com o mesmo método explicar-se o texto original, o qual pelo facto mesmo de ter sido escrito pelo Autor sagrado, tem maior autoridade e peso que qualquer tradução antiga ou moderna por óptima que seja, e isso poderá obter-se mais fácil e proveitosamente, se ao conhecimento das línguas se unir uma sólida perícia da arte crítica aplicada ao mesmo texto.

Importância da crítica textual

13. Quanta seja a importância desta crítica, bem o dá a entender Santo Agostinho, quando entre as normas que inculca ao estudioso dos Livros Santos, põe em primeiro lugar o cuidado de procurar um texto correcto.
"A emendar os códices, diz aquele preclaríssimo doutor da Igreja, deve antes de mais nada atender a sagacidade pelos que desejam conhecer as divinas Escrituras, para que os não emendados cedam o lugar aos emendados". (23)
Hoje em dia esta arte que sói chamar-se crítica textual e nas edições de autores profanos se emprega com grande louvor e fruto, com toda a razão se aplica também aos Livros Santos, precisamente pela reverência devida à palavra de Deus.
De facto o seu fim é reconstruir com toda a possível perfeição o texto sagrado, expurgá-lo das alterações nele introduzidas por culpa dos copistas, mudando-o das glossas e lacunas, transposições e repetições de palavras, e de toda espécie de erros que costumam infiltrar-se na transmissão plurissecular de obras manuscritas.
Nem quase é preciso advertir que essa crítica, que alguns decénios atrás muitos empregaram de modo completamente arbitrário, tanto que muitas vezes parecia não pretenderem outra coisa senão introduzir no texto sagrado as suas opiniões preconcebidas, hoje chegou a tal consistência e segurança de regras, que se tornou um magnífico instrumento para a edição da divina palavra em forma mais exacta e mais pura, e é fácil descobrir qualquer abuso que dela se faça.
Nem é necessário lembrar aqui - pois é coisa conhecida e manifesta a quantos estudam a Sagrada Escritura - quanto apreço fez sempre a Igreja, desde os primeiros séculos até aos nossos tempos, dos estudos críticos.
Portanto hoje que esta arte atingiu tão grande perfeição, é um dever de honra, bem que não sempre fácil, para os especialistas em Sagrada Escritura, procurar por todos os meios que quanto antes se preparem edições católicas dos Livros santos e das antigas traduções, feitas segundo estas normas, de modo que com uma reverência suma para com o texto sagrado unam uma exacta observância de todas as leis da crítica.
E saibam bem todos que este longo trabalho não só é necessário para bem compreender os escritos divinamente inspirados, mas é imperiosamente exigido pela piedade com que nos devemos mostrar sumamente agradecidos a amorosíssima Providência de Deus que do trono da sua majestade nos mandou esses livros como cartas do Pai celeste aos próprios filhos.

Texto original e autenticidade da vulgata

14. Nem vá alguém pensar que o sobredito uso dos textos originais, feito segundo as regras da crítica, é contrário a quanto o concílio de Trento sabiamente decretou a respeito da Vulgata latina. (24)
É um facto, atestado pelos documentos, que os presidentes do concílio receberam o encargo, por eles fielmente cumprido, de pedir ao sumo pontífice em nome do mesmo Concílio que mandasse corrigir o melhor possível, primeiro a edição latina, depois também a grega e a hebraica, e as publicasse para proveito da santa Igreja de Deus. (25)
A esse desejo, se então pelas dificuldades dos tempos e outros obstáculos não se pode dar plena satisfação, actualmente com a colaboração de doutos católicos pode dar-se, e confiamos que se dará execução mais vasta e perfeita.
Quanto à Vulgata, se o concílio Tridentino ordenou que ela fosse a tradução latina que todos usassem como autêntica, primeiro, este decreto, como todos sabem, é só para a Igreja latina, e para o uso público da Escritura, depois, em nada diminui a autoridade e valor dos textos originais.
De facto não se tratava então dos textos originais, mas das traduções latinas que naquele tempo corriam, entre as quais o concílio justamente decretou se preferisse a que "pelo longo uso de tantos séculos na mesma Igreja estava já de facto aprovada".
Portanto esta autoridade proeminente ou autenticidade da Vulgata decretou-a o concílio não principalmente por motivos de crítica, mas antes pelo uso legítimo que dela se fez na Igreja durante tantos séculos, uso que prova ela estar, no sentido em que a entendeu e entende a Igreja, completamente isenta de erros no que toca a fé e aos costumes, de modo que, como a mesma Igreja atesta e confirma, se pode nas disputas, prelecções e pregação alegar seguramente e sem perigo de errar, por isso esta autenticidade propriamente não se chama "crítica" mas "jurídica".
Nem a autoridade da Vulgata em matéria de doutrina impede, - antes nos nossos dias quase exige - que a mesma doutrina se prove e confirme também com os textos originais, e que se recorra aos mesmos textos para encontrar e explicar cada vez melhor o verdadeiro sentido das Sagradas Escrituras.
Antes, o decreto Tridentino nem sequer proíbe que, para uso e proveito dos fiéis e para facilitar a inteligência da divina palavra, se façam traduções em línguas vulgares, e precisamente dos textos originais, como sabemos terem-se já feito, e muito bem, em várias partes, com aprovação da autoridade eclesiástica.

(Revisão da versão portuguesa por ama)

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Notas:

(*) Em 30 de setembro de 1943, por motivo do cinqüentenário da encíclica "Providentissimus Deus", o Santo Padre Pio XII publicou a seguinte encíclica sobre os estudos bíblicos. Por sua extensão, e pela admirável clareza com que expõe as normas que devem ser observadas no uso da Sagrada Escritura, o importante documento adquire o alcance de uma verdadeira Carta Magna em matéria de estudos e apostolado bíblicos.
(22) Cf. s. Jerónimo, Praef. in IV Evang. ad Damasum, PL 29, 526-527, s. Agostinho, De doctr. christ. II 16, PL 34, 42-43.
(23) De doct. christ., II. 21, PL 34, 46.
(24) Decr. de editione et usu Sacrorum Librorum, Conc.Trid. ed. Soc. Goerres, t. V p. 91s.
(25) Ibid. t. X, p. 471, cf. t. V pp. 29, 59, 65, t. X, p. 446s.




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