Tempo comum XXI Semana
Evangelho: Mt 23, 13-22
13 «Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que fechais aos homens o
Reino dos Céus, pois nem vós entrais, nem deixais que entrem os que quereriam
entrar. 14 Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que devorais
as casas das viúvas a pretexto de longas orações! Por isto sereis julgados mais
severamente. 15 Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que
correis o mar e a terra para fazerdes um prosélito e, depois de o terdes feito,
o tornais filho do inferno duas vezes pior do que vós. 16 «Ai de
vós, guias cegos, que dizeis: “Se alguém jurar pelo templo, isso não é nada,
mas o que jurar pelo ouro do templo, fica obrigado!”. 17 Insensatos
e cegos! Pois que é mais, o ouro ou o templo, que santifica o ouro? 18
E dizeis também: “Se alguém jurar pelo altar, isso não é nada, mas quem jurar
pela oferenda que está sobre ele, fica obrigado”. 19 Cegos! Qual é
mais: a oferta ou o altar que santifica a oferta? 20 Aquele, pois,
que jura pelo altar, jura por ele e por tudo o que está sobre ele, 21
e quem jura pelo templo, jura por ele e por Aquele que habita nele, 22
e quem jura pelo céu, jura pelo trono de Deus e por Aquele que está sentado
sobre ele.
Comentário:
Para
um cristão, jurar, não faz nenhum sentido já que deve ser conhecido por pessoa
de palavra, em quem se pode acreditar sem reservas.
Por
isso mesmo, deve estar preparado – sempre! – com conhecimento aprofundado da
Doutrina para não ser nem apanhado em falso nem transmitir a outros algo que
não seja correcto.
Estudar
a Doutrina da Igreja é, pois, um dever, uma obrigação e uma grande necessidade.
Mais…
deve ser constante!
(AMA, Comentário sobre Mt 23, 13-22, 2013.08.26)
Leitura espiritual
Magistério
CONGREGAÇÃO
PARA A DOUTRINA DA FÉ
NOTIFICAÇÃO
SOBRE O LIVRO
«IGREJA:
CARISMA E PODER.
ENSAIOS
DE ECLESIOLOGIA MILITANTE»
DE
FREI LEONARDO BOFF, O.F.M.
INTRODUÇÃO
No dia 12 de Fevereiro de
1982, Frei Leonardo Boff, OFM, tomou a iniciativa de enviar à Congregação para
a Doutrina da Fé a resposta que deu à Comissão arquidiocesana para a Doutrina
da Fé do Rio de Janeiro, que criticara o seu livro «Igreja: Carisma e Poder»
(Editora Vozes - Petrópolis, RJ, Brasil, 1981). Declarava que aquela crítica
continha graves erros de leitura e de interpretação.
A Congregação, após ter
estudado o livro nos seus aspectos doutrinais e pastorais, expôs ao Autor, numa
carta de 15 de Maio de 1984, algumas reservas, convidando-o a aceitá-las e
oferecendo-lhe, ao mesmo tempo, a possibilidade de um diálogo de
esclarecimento. Tendo porém em vista a repercussão que o livro estava tendo
entre os fiéis, a Congregação informou L. Boff de que, em qualquer hipótese, a
carta seria publicada, levando eventualmente em consideração a posição que ele
viesse a tomar por ocasião do diálogo.
No dia 7 de Setembro de
1984, L. Boff foi recebido pelo Cardeal Prefeito da Congregação, acompanhado
pelo Mons. Jorge Mejía, na qualidade de Secretário. Foram objecto do colóquio
alguns problemas eclesiológicos surgidos da leitura do livro «Igreja: Carisma e
Poder» e assinalados na carta de 15 de Maio de 1984. A conversa, que se
desenvolveu num clima fraterno, proporcionou ao Autor ocasião de expor seus
esclarecimentos pessoais, que ele quis também entregar por escrito. Tudo isto
foi explicado num comunicado final publicado e redigido de comum acordo com L.
Boff. Concluído o diálogo, foram recebidos pelo Cardeal Prefeito, em outra
sala, os Eminentíssimos Cardeais Aloísio Lorscheider e Paulo Evaristo Arns, que
se encontravam em Roma para esta oportunidade.
A Congregação examinou,
seguindo a praxe que lhe é própria, os esclarecimentos orais e escritos
fornecidos por L. Boff e, embora tomando nota das boas intenções e das
repetidas declarações de fidelidade à Igreja e ao Magistério por ele expressas,
sentiu-se contudo no dever de salientar que as reservas levantadas acerca do conteúdo
do livro e assinaladas na carta, não poderiam, na sua substância, considerar-se
superadas. Julga pois necessário, assim como estava previsto, agora publicar,
nas suas partes essenciais, o conteúdo doutrinal da mencionada carta.
PREMISSA
DOUTRINAL
A eclesiologia do livro
«Igreja: Carisma e Poder» propõe-se ir ao encontro dos problemas da América
Latina e, em particular do Brasil, com uma colectânea de estudos e perspectivas
(cf. p. 13). Tal intenção exige, de um lado, uma atenção séria e aprofundada às
situações concretas, às quais o livro se refere e, por outro lado, — para realmente
corresponder ao seu objectivo — a preocupação de inserir-se na grande tarefa da
Igreja universal, no sentido de interpretar, desenvolver e aplicar, sob a
inspiração do Espírito Santo, a herança comum do único Evangelho, entregue, uma
vez para sempre, pelo Senhor à nossa fidelidade. Deste modo a única fé do
Evangelho cria e edifica, ao longo dos séculos, a Igreja católica, que
permanece una na diversidade dos tempos e na diferença das situações próprias
às múltiplas Igrejas particulares. A Igreja universal realiza-se e vive nas
Igrejas particulares e estas são Igreja exactamente enquanto continuam a ser,
num determinado tempo e lugar, expressão e atualização da Igreja universal.
Deste modo, com o crescimento e o progresso das Igrejas particulares cresce e
progride a Igreja universal; ao passo que, debilitando-se a unidade, diminuiria
e decairia também a Igreja particular. Por isso o verdadeiro discurso teológico
não pode jamais contentar-se em apenas interpretar e animar a realidade de uma
Igreja particular, mas deve, ao contrário, procurar aprofundar os conteúdos do
depósito sagrado da palavra de Deus, depósito confiado à Igreja e
autenticamente interpretado pelo Magistério. A praxis e as experiências que
sempre têm origem numa determinada e limitada situação histórica, ajudam o
teólogo e o obrigam a tornar o Evangelho acessível ao seu tempo. A praxis,
contudo, não substitui, nem produz a verdade, mas está a serviço da verdade,
que nos foi entregue pelo Senhor. O teólogo é, pois, chamado a decifrar a
linguagem das diversas situações — os sinais dos tempos — e a abrir esta linguagem
à inteligência da fé (cf. Enc. Redemptor hominis, n. 19). Examinadas à luz dos
critérios de um autêntico método teológico — aqui apenas brevemente assinalados
— certas opções do livro de L. Boff manifestam-se insustentáveis. Sem pretender
analisá-las todas, colocam-se em evidência apenas as opções eclesiológicas que
parecem decisivas, ou seja: a estrutura da Igreja, a concepção do dogma, o
exercício do poder sagrado e o profetismo.
A
ESTRUTURA DA IGREJA
L. Boff coloca-se, segundo
as suas próprias palavras, dentro de uma orientação, na qual se afirma «que a
igreja como instituição não estava nas cogitações do Jesus histórico, mas que
ela surgiu como evolução posterior à ressurreição, particularmente com o
processo progressivo de desescatologização» (p. 123). Consequentemente, a
hierarquia é para ele «um resultado» da «férrea necessidade de se
institucionalizar», «uma mundanização», no «estilo romano e feudal» (p. 71).
Daí deriva a necessidade de uma «mutação permanente da Igreja» (p. 109); hoje
deve emergir uma «Igreja nova» (p. 107, passim), que será «uma nova encarnação
das instituições eclesiais na sociedade, cujo poder será pura função de
serviço» (p. 108).
Na lógica destas
afirmações explica-se também a sua interpretação acerca das relações entre
catolicismo e protestantismo: «Parece-nos que o cristianismo romano
(catolicismo) se distingue por afirmar corajosamente a identidade sacramental e
o cristianismo protestante por uma afirmação destemida da não-identidade» (p.
132; cf. pp, 126 ss., 140).
Dentro desta visão, ambas
as confissões constituiriam mediações incompletas, pertencentes a um processo
dialético de afirmação e de negação. Nesta dialéctica «se mostra o que seja o
cristianismo. Que é o cristianismo? Não sabemos. Somente sabemos aquilo que se
mostrar no processo histórico» (p. 131).
Para justificar esta
concepção relativizante da Igreja — que se encontra na base das críticas
radicais dirigidas contra a estrutura hierárquica da Igreja católica — L. Boff
apela para a Constituição Lumen gentium (n. 8) do Concílio Vaticano II. Da
famosa expressão do Concílio «Haec Ecclesia (se. única Christi Ecclesia)...
subsistit in Ecclesia catholica», ele extrai uma tese exactamente contrária à
significação autêntica do texto conciliar, quando afirma: de facto, «esta (isto
é, a única Igreja de Cristo) pode subsistir também em outras Igrejas cristãs»
(p. 125). O Concílio tinha, porém, escolhido a palavra «subsistit» exatamente
para esclarecer que há uma única «subsistência» da verdadeira Igreja, enquanto
fora de sua estrutura visível existem somente «elementa Ecclesiae», que — por
serem elementos da mesma Igreja — tendem e conduzem em direção à Igreja
católica (LG 8). O Decreto sobre o ecumenismo exprime a mesma doutrina (UR
3-4), que foi novamente reafirmada pela Declaração Mysterium Ecclesiae, n. 1
(AAS LXV [1973], pp. 396-398).
A subversão do significado
do texto conciliar sobre a subsistência da Igreja está na base do relativismo
eclesilógico de L. Boff, supra delineado, no qual se desenvolve e se explicita
um profundo desentendimento daquilo que a fé católica professa a respeito da
Igreja de Deus no mundo.
DOGMA
E REVELAÇÃO
A mesma lógica
relativizante encontra-se na concepção da doutrina e do dogma expressa por L.
Boff. O Autor critica, de modo muito severo, «a compreensão doutrinária da
revelação» (p. 73). É verdade que L. Boff distingue entre dogmatismo e dogma
(cf. p. 139), admitindo o segundo e rejeitando o primeiro. Todavia, segundo
ele, o dogma, na sua formulação, é válido somente «para um determinado tempo e
circunstâncias» (pp. 127-128). «Num segundo momento do mesmo processo dialético
o texto deve poder ser ultrapassado para dar lugar a outro texto do hoje da fé»
(p. 128). O relativismo que resulta de semelhantes afirmações torna-se
explícito quando L. Boff fala de posições doutrinárias contraditórias entre si,
contidas no Novo Testamento (cf. p. 128). Consequentemente «a atitude
verdadeiramente católica» seria de «estar fundamentalmente aberto a todas as
direções» (p. 128). Na perspectiva de L. Boff a autêntica concepção católica do
dogma cai sob o veredito do «dogmatismo»: «Enquanto perdurar este tipo de
compreensão dogmática e doutrinária da revelação e da salvação de Jesus Cristo
dever-se-á contar irretorquivelmente com a repressão da liberdade de pensamento
divergente dentro da Igreja» (pp. 74-75).
A este propósito convém
ressaltar que o contrário do relativismo não é o verbalismo ou o imobilismo. O
conteúdo último da revelação é o próprio Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, que
nos convida à comunhão com Ele; todas as palavras referem-se à Palavra, ou —
como diz São João da Cruz: «... a su Hijo ... todo nos habló junto y de una vez
en esta sola Palabra y no tiene más que hablar» (Subida del Monte Carmelo, II,
22, 3). Mas nas palavras, sempre analógicas e limitadas, da Escritura e da fé
autêntica da Igreja, baseada na Escritura, exprime-se, de modo digno de fé, a
verdade acerca de Deus e acerca do homem. A constante necessidade de
interpretar a linguagem do passado, longe de sacrificar esta verdade, torna-a,
antes, acessível e desenvolve a riqueza dos textos autênticos. Avançando,
guiada pelo Senhor, que é o caminho e a verdade (Jo 14, 16), a Igreja, que ensina
e que crê, está convencida de que a verdade expressa pelas palavras de fé não
só não oprime o homem, mas o liberta (Jo 8, 32) e é o único instrumento de
verdadeira comunhão entre os homens de diversas classes e opiniões, enquanto
uma concepção dialética e relativizante o expõe a um decisionismo arbitrário.
No passado, esta
Congregação teve ocasião de mostrar que o sentido das fórmulas dogmáticas
permanece sempre verdadeiro e coerente, determinado e irreformável, embora
possa ser ulteriormente esclarecido e melhor compreendido (cf. Mysterium
Ecclesiae, n. 5: AAS LXV [1973], pp. 403-404).
Para continuar na sua
função de sal da terra, que nunca perde o seu sabor, o «depositum fedei » deve
ser fielmente conservado na sua pureza, sem deslizar no sentido de um processo
dialético da história e em direção ao primado da praxis.
O
EXERCÍCIO DO PODER SAGRADO
Uma «grave patologia» de
que, segundo L. Boff, a Igreja romana deveria livrar-se, é provocada pelo
exercício hegemónico do poder sagrado que, além de torná-la uma sociedade
assimétrica, teria também sido deformado em si mesmo.
Dando por certo que o eixo
organizador de uma sociedade coincide com o modo específico de produção que lhe
é próprio, e aplicando este princípio à Igreja, L. Boff afirma que houve um
processo histórico de expropriação dos meios de produção religiosa por parte do
clero em prejuízo do povo cristão que, em consequência, teria sido privado de
sua capacidade de decidir, de ensinar etc. (cf. pp. 75, 215 ss., 238-239). Além
disso, após ter sofrido esta expropriação, o poder sagrado teria também sido
gravemente deformado, vindo a cair deste modo nos mesmos defeitos do poder
profano em termos de dominação, centralização, triunfalismo (cf. pp. 98, 85, 91
ss.). Para remediar estes inconvenientes, propõe-se um novo modelo de Igreja,
no qual o poder seria concebido sem privilégios teológicos, como puro serviço
articulado de acordo com as necessidades da comunidade (cf. pp. 207, 108).
Não se pode empobrecer a
realidade dos sacramentos e da palavra de Deus enquadrando-a no esquema da
«produção e consumo», reduzindo deste modo a comunhão da fé a um mero fenómeno
sociológico. Os sacramentos não são «material simbólico», a sua administração
não é produção, a sua recepção não é consumo. Os sacramento são dom de Deus.
Ninguém os «produz». Todos recebemos por eles a graça de Deus, os sinais do
eterno amor. Tudo isto está além de toda produção, além de todo fazer e
fabricar humano. A única medida que corresponde à grandeza do dom é a máxima
fidelidade à vontade do Senhor, de acordo com a qual todos seremos julgados —
sacerdotes e leigos — sendo todos «servos inúteis» (Lc 17, 10). Existe sempre,
decerto, o perigo de abusos; põe-se sempre o problema de como garantir o acesso
de todos os fiéis à plena participação na vida da Igreja e na sua fonte, isto
é, na vida da Senhor. Mas interpretar a realidade dos sacramentos, da
hierarquia, da palavra e de toda a vida da Igreja em termos de produção e de
consumo, de monopólio, expropriação, conflito com o bloco hegemónico, ruptura e
ocasião para um modo assimétrico de produção, equivale a subverter a realidade
religiosa. Ao contrário de ajudar na solução dos verdadeiros problemas, este
procedimento leva, antes, à destruição do sentido autêntico dos sacramentos e
da palavra da fé.
O
PROFETISMO NA IGREJA
O livro «Igreja: Carisma e
Poder» denuncia a hierarquia e as instituições da Igreja (cf. pp. 65-66, 88,
239-240). Como explicação e justificação para semelhante atitude reivindica o
papel dos carismas e, em particular, do profetismo (cf. pp. 237-240, 246, 247).
A hierarquia teria a simples função de «coordenar», de «propiciar a unidade, a
harmonia entre os vários serviços», de «manter a circularidade e impedir as
divisões e sobreposições», descartando pois desta função « a subordinação
imediata de todos aos hierarcas » (cf. p. 248).
Não há dúvida de que todo
o povo de Deus participa do múnus profético de Cristo (cf. LG 12); Cristo
cumpre o seu múnus profético não só por meio da hierarquia, mas também por meio
dos leigos (cf. ib. 35). Mas é igualmente claro que a denúncia profética na
Igreja, para ser legítima, deve permanecer sempre a serviço, para a edificação
da própria Igreja. Esta não só deve aceitar a hierarquia e as instituições, mas
deve também colaborar positivamente para a consolidação da sua comunhão
interna; além disso, pertence à hierarquia o critério supremo para julgar não
só o exercício bem orientado da denúncia profética, como também a sua
autenticidade (cf. LG 12).
CONCLUSÃO
Ao tornar público o que
acima ficou exposto, a Congregação sente-se na obrigação de declarar, outrossim,
que as opções aqui analisadas de Frei Leonardo Boff são de tal natureza que
põem em perigo a sã doutrina da fé, que esta mesma Congregação tem o dever de
promover e tutelar.
O Sumo Pontífice João
Paulo II, no decorrer de uma Audiência concedida ao Cardeal Prefeito que
subscreve este documento, aprovou a presente Notificação, deliberada em reunião
ordinária da Congregação para a Doutrina da Fé, e ordenou que a mesma fosse
publicada.
Roma, Sede da Congregação
para a Doutrina da Fé, 11 de Março de 1985.
Joseph Card. Ratzinger
Prefeito
+ Alberto Bovone
Arcebispo tit. de Cesarea
de Numidia
Secretário