Tempo comum XXIX Semana
Evangelho: Lc 12 35-38
35 «Estejam cingidos os
vossos rins e acesas as vossas lâmpadas. 36 Fazei como os homens que
esperam o seu senhor quando volta das núpcias, para que, quando vier e bater à
porta, logo lha abram. 37 Bem-aventurados aqueles servos, a quem o
senhor quando vier achar vigiando. Na verdade vos digo que se cingirá, os fará
pôr à sua mesa e, passando por entre eles, os servirá. 38 Se vier na
segunda vigília, ou na terceira, e assim os encontrar, bem-aventurados são
aqueles servos.
Comentário:
O que significa ter os
rins cingidos?
Sem dúvida que, a imagem,
se refere à prontidão necessária para iniciar uma viagem a qualquer momento.
Mas podemos ‘ir mais
longe’ e considerar que, este termo ‘cingir os rins’, significa também o
domínio do espírito sobre o corpo, a contenção dos ímpetos, o controlo sobre a
concupiscência nomeadamente a sensualidade.
Nos tempos que correm em
que parece que tudo é permitido e nada é mal ou reprovável, que a pureza e a
castidade são coisa obsoletas e do passado, convém ter presente que a pureza e
a castidade são sinónimo de fortaleza e não de fraqueza, de senhorio pessoal de
quem não se deixa arrastar e se mantém, ou se esforça seriamente, puro e casto
para ser digno de, em dia que não conhece e hora que não sabe, poder contemplar
a face de Cristo.
(ama, comentário sobre Lc 12, 35-38, Carvide, 2013.08.11)
Leitura espiritual
Documentos do Magistério
CARTA ENCÍCLICA
SUMMI PONTIFICATUS
DO SUMO PONTÍFICE
PAPA PIO XII
AOS VENERÁVEIS IRMÃOS PATRIARCAS, PRIMAZES,
ARCEBISPOS E BISPOS
E OUTROS ORDINÁRIOS DO LUGAR
EM PAZ E COMUNHÃO COM A SÉ APOSTÓLICA
SOBRE O OFÍCIO DO PONTIFICADO
II. O ESQUECIMENTO DA LEI
DA CARIDADE
Leis
morais supremas
52.
A concepção que atribui ao Estado uma autoridade ilimitada, veneráveis irmãos,
não é somente um erro pernicioso à vida interna das nações, à sua prosperidade
e ao maior incremento do seu bem-estar, mas prejudica também as relações entre
os povos, rompendo a unidade da sociedade supranacional, tirando a base e o
valor ao direito das gentes, abrindo caminho à violação dos direitos alheios e
tornando difícil o acordo para a convivência pacífica.
53.
Embora o gênero humano, por disposição de ordem natural estabelecida por Deus,
esteja dividido em grupos sociais, nações ou Estados, independentes uns dos
outros, no que respeita ao modo de organizar e dirigir a sua vida interna,
acha-se, contudo, ligado por recíprocos vínculos morais e jurídicos, numa
grande comunidade, organizada para o bem de todos os povos e regulada por leis
especiais que tutelam a sua unidade e promovem a sua prosperidade.
54.
Ora, não há quem não perceba que a autonomia absoluta do Estado põe-se em
aberto contraste com esta lei imanente e natural, ou melhor nega-a radicalmente,
deixando à mercê da vontade dos governantes a estabilidade das relações
internacionais e tirando a possibilidade de uma verdadeira união e fecunda
colaboração no que respeita ao interesse geral.
Porque,
veneráveis irmãos, para a existência de contratos harmónicos e duradouros e de relações frutuosas, é indispensável que os povos reconheçam e observem aqueles
princípios de direito natural internacional, que regulam o seu normal
funcionamento e desenvolvimento.
Tais
princípios exigem o respeito dos relativos direitos à independência, à vida e à
possibilidade de um desenvolvimento progressivo no caminho da civilização;
exigem, além disso, a fidelidade aos pactos estipulados e ratificados segundo
as normas do direito das gentes.
55.
Não há dúvida que o pressuposto indispensável de toda a convivência pacífica
entre os povos e a alma das relações jurídicas, em vigor entre eles, é a mútua
confiança, a previsão e persuasão da recíproca fidelidade à palavra dada, a
certeza de que tanto de uma parte como de outra existe a convicção de que
"é preferível a sabedoria às armas guerreiras" (Ecl 9, 18) e que se
está disposto a discutir e a não recorrer à força ou a ameaça da força quando
surgissem tardanças, impedimentos, alterações e contendas, coisas que podem ter
a sua origem não na má vontade, mas sim em circunstâncias que se modificaram ou
interesses que se contrastam.
56.
Mas, por outra parte, destacar o direito das gentes da âncora do direito
divino, para ligá-lo à vontade autónoma dos Estados, é o mesmo que destronar
esse direito e tirar-lhe os títulos mais nobres e válidos, para abandoná-lo à
infausta dinâmica do interesse privado e do egoísmo colectivo, no intuito de
fazer valer os próprios direitos desconhecendo ao mesmo tempos os dos outros.
Orgulhosas
ilusões
57.
E também verdade que, com o passar do tempo e a mudança substancial das
circunstâncias, não previstas e talvez nem sequer previsíveis no ato da
estipulação, um tratado ou algumas das suas cláusulas podem tornar-se ou
parecer injustas, não actualizáveis ou muito onerosas a uma das partes; é claro
que, se isso acontecesse, dever-se-ia proceder oportunamente a uma discussão
leal para modificar ou substituir o tratado.
Mas
considerar os pactos, por princípio, como efémeros e arrogar-se tacitamente a
faculdade de rescindir deles unilateralmente quando não convenham mais, seria o
mesmo que anular a confiança recíproca entre os Estados.
Mutilar-se-ia
assim a ordem natural, cavando-se ao mesmo tempo entre as nações lamentáveis
abismos de separação.
58.
Hoje, veneráveis irmãos, todos contemplam com terror o abismo a que levaram os
erros por nós caracterizados e as suas consequências práticas.
Ruíram por terra as orgulhosas ilusões de um
progresso indefinido; e os que ainda dormiassem seriam despertados, na trágica
época que atravessamos, com as palavras do profeta: "Ouvi, ó surdos, e
vede ó cegos" (Is 42,18).
O
que exteriormente parecia ordem, não era senão uma invasão perturbadora e
desbarato das normas de vida moral as quais, destacadas da majestade da lei
divina, haviam contaminado todos os campos da actividade humana.
Mas
deixemos o passado e lancemos os nossos olhares para o futuro que, segundo o
que prometem os poderosos deste mundo, apenas cessados os hodiernos e
sanguinolentos encontros, consistirá numa nova reorganização do mundo, fundada
na justiça e na prosperidade. Será verdadeiramente diferente tal futuro?
Será
sobretudo melhor? No fim desta guerra, serão os tratados de paz e a nova ordem
internacional animados de justiça e equidade para com todos? Serão animados
daquele espírito que liberta e pacifica, ou serão uma lamentável repetição dos
erros antigos e recentes? Coisa vã e demonstrada pela experiência, seria
esperar uma mudança radical exclusivamente do encontro bélico.
A
hora da vitória é sempre uma hora de um triunfo exterior por parte de quem a
consegue; mas é, ao mesmo tempo, a hora da tentação, na qual o anjo da justiça
luta com o demónio da violência.
O
coração do vencedor endurece-se muito facilmente; a moderação e uma clarividente
sabedoria deparam-se-lhe como fraqueza; a exaltação das paixões populares,
incitada pelos sacrifícios e sofrimentos suportados, vela muitas vezes os olhos
dos responsáveis e faz-lhes desprezar a voz admoestadora da humanidade e da
equidade, sobrepujada ou aniquilada pelo inumano: "ai dos vencidos!"
Resoluções e decisões nascidas em tais circunstâncias arriscam-se sempre a
serem injustas se bem cobertas com o manto da justiça.
Energias
renovadoras
59.
Não, veneráveis irmãos, a salvação dos povos não pode vir dos meios externos; a
espada que é capaz de impor condições de paz, não pode criar a paz.
As
energias que devem renovar a face da terra devem partir do interior, do
espírito. A nova organização do mundo, da vida nacional e internacional, quando
cessarem as amarguras e as cruéis lutas hodiernas, não deverá repousar mais na
areia movediça das normas mutáveis e efémeras, deixadas ao arbítrio do egoísmo
coletivo e individual.
Devem
elas antes erguer-se sobre sólida base, sobre a rocha inabalável do direito
natural e da revelação divina.
Dali
deverá o legislador humano atingir aquele espírito de equilíbrio, aquele
apurado senso de responsabilidade moral, sem o que é fácil desconhecer os
limites entre o legítimo uso e o abuso do poder. Tão-somente assim as suas
decisões poderão ter consistência interna, nobre dignidade e sanção religiosa,
e não ficarão à mercê do egoísmo e da paixão.
Porquanto,
se é verdade que os males sofridos hoje pela humanidade, procedem, em parte do
desequilíbrio económico e da luta dos interesses, no intuito de alcançar uma
distribuição mais équa dos bens que Deus concedeu ao homem como meios do seu
sustento e progresso, verdade é também que eles têm a sua raiz muito mais
profunda a tocar nas crenças religiosas e nas convicções morais, pervertidas
pelo progressivo afastamento dos povos da unidade de doutrina e de fé, de
costumes e de moral, promovida um dia pela obra indefesa e benéfica da Igreja.
A
reeducação da humanidade, para ter qualquer resultado positivo, deverá ser
sobretudo espiritual e religiosa; deverá, portanto, partir de Cristo, sua base
indispensável, deverá ser atuada pela justiça e coroada pela caridade.
A
tarefa materna da Igreja
60.
Realizar esta obra de regeneração, adaptando os seus meios às modificadas
condições dos tempos e às novas necessidades do gênero humano, eis a tarefa
essencial e materna da Igreja.
Agregação
do Evangelho, imposta pelo seu divino fundador, em que se inculca aos homens a
verdade, a justiça e a caridade, e o esforço para arraigar nas almas e nas
consciências os seus preceitos, eis também o trabalho mais nobre e frutuoso em
favor da paz.
A
grandiosidade de tal missão quase que esmorece os corações daqueles que fazem
parte da Igreja militante.
Mas
o empenhar-se para que seja difundido o reino de Deus, coisa que cada século
procurou realizar de vários modos, com diversos meios e não poucas e duras
lutas, é um dever imposto a todo aquele que a graça divina arrancou das garras
de Satanás e que com o baptismo elegeu cidadão daquele reino.
E
se o pertencer a esse reino, o viver segundo o seu espírito, o trabalhar pelo
seu incremento e o tornar acessíveis os seus bens também àquela porção da
humanidade que ainda dele não faz parte, equivale em nossos dias a dever
afrontar oposições vastas e tenazes e minuciosamente organizadas, isso a
ninguém dispensa da franca e corajosa procissão de fé, mas antes deve incitar a
ser firme na luta, também a custo dos maiores sacrifícios.
Quem
vive do espírito de Cristo não se deixa abater pelas dificuldades que lhe vêm
ao encontro, mas sente-se como que impelido a empregar todas as suas forças com
plena confiança em Deus; não se esquiva às estreitezas e necessidades da hora,
mas afronta as suas asperezas, pronto sempre a socorrer com aquele amor que não
poupa sacrifícios; é mais forte que a própria morte e não se deixa levar pelas
impetuosas águas da tribulação.
61.
Diariamente elevamos a Deus o nosso humilde e profundo agradecimento,
veneráveis irmãos, pelo íntimo conforto e celeste alegria que nos proporciona
observar em todas as partes do mundo católico sinais evidentes de um espírito
que afronta corajosamente os gigantescos encargos da época presente e que,
generosa e decididamente, tende a reunir em fecunda harmonia o primeiro e
essencial dever da própria santificação e a actividade apostólica para a
difusão sempre maior do reino de Cristo.
Do
movimento dos congressos eucarísticos promovidos com amorosa solicitude pelos
nossos predecessores, da colaboração dos leigos formados na Acção católica e da
profunda consciência da sua nobre missão, derivam fontes de graças e reservas
de forças, que dificilmente se poderiam estimar como merecem, tanto delas
necessitamos nos tempos actuais em que aumentam as ameaças, enquanto arde a
luta entre o cristianismo e o anticristianismo.
(cont)
(Revisão da versão portuguesa por ama)