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Leitura Espiritual
Temas actuais do cristianismo |
18 (cont)
De
onde procede, pois, a influência do Opus Dei?
A
resposta é a simples consideração desta realidade sociológica: à nossa
Associação pertencem pessoas de todas as condições sociais, profissões, idades
e estados de vida; homens e mulheres, clérigos e leigos, velhos e jovens,
solteiros e casados, universitários, operários, camponeses, empregados, pessoas
que exercem profissões liberais ou que trabalham em instituições oficiais, etc.
Já
pensou no poder de irradiação cristã que uma gama tão ampla e tão variada de
pessoas representa, sobretudo se andam pelas dezenas de milhar e estão animadas
de um mesmo espírito apostólico: santificar a sua profissão ou ofício - em
qualquer ambiente social em que actuem - santificar-se nesse trabalho e
santificar com esse trabalho?
A
estes trabalhos apostólicos pessoais deve juntar-se o das nossas obras
corporativas de apostolado: Residências de estudantes, Casas de convívio e
retiros, a Universidade de Navarra, Centros de formação para operários e
camponeses, Escolas técnicas, Colégios, Escolas de formação para a mulher, etc.
Estas
obras têm sido e são indubitavelmente focos de irradiação do espírito cristão.
Promovidas
por leigos, dirigidas como um trabalho profissional por cidadãos leigos, iguais
aos seus companheiros que exercem a mesma tarefa ou ocupação, e abertas a
pessoas de todas as classes e condições, têm sensibilizado amplos estratos da
sociedade sobre a necessidade de dar uma resposta cristã às questões que o
exercício das suas profissões ou empregos lhes levanta.
Tudo
isto é que dá relevo e transcendência social ao Opus Dei.
Não,
portanto, o facto de alguns dos seus membros ocuparem cargos de influência
humana - coisa que não nos interessa absolutamente nada, e se deixa portanto
sujeito à livre decisão e responsabilidade de cada um - mas o facto de todos, e
a bondade de Deus faz com que sejam muitos, realizarem trabalhos - desde os
mais humildes - divinamente influentes.
E
isto é lógico: quem pode pensar que a influência da Igreja nos Estados Unidos
começou no dia em que foi eleito presidente o católico John Kennedy?
19
p:
Por
vezes, ao falar da realidade do Opus Dei, tem afirmado que é uma
“desorganização organizada”.
Poderia
explicar aos nossos leitores a significado desta expressão?
r:
Quero
dizer que damos uma importância primária e fundamental à espontaneidade
apostólica da pessoa, à sua iniciativa livre e responsável guiada pela acção do
Espírito; e não a estruturas orgânicas, mandatos, tácticas e planos impostos de
cima, como actos de governo.
Existe
um mínimo de organização, evidentemente, com um governo central, que actua
sempre colegialmente e tem a sua sede em Roma, e governos regionais, também
colegiais, cada um presidido por um Conselheiro [i].
Mas
toda a actividade desses organismos se dirige fundamentalmente a um fim:
proporcionar aos sócios a assistência espiritual necessária para a sua vida de
piedade, e uma adequada formação espiritual, doutrinal-religiosa e humana.
Depois:
patos à água!
Quer
dizer: cristãos a santificarem todos os caminhos dos homens, que todos guardam
o aroma da passagem de Deus.
Ao
chegar a esse limite, a esse momento, a Associação como tal terminou a sua
tarefa - aquela, precisamente, para a qual os sócios do Opus Dei se associam -
e já não tem que fazer, não pode nem deve fazer mais nenhuma indicação.
Começa
então a livre e responsável acção de cada sócio.
Cada
um, com espontaneidade apostólica, agindo com completa liberdade pessoal e
formando autonomamente a sua consciência perante as decisões concretas que
tenha de tomar, busca a perfeição cristã e procura dar testemunho cristão no
seu próprio ambiente, santificando o trabalho profissional, intelectual ou
manual.
Naturalmente,
ao tomar cada um autonomamente essas decisões na sua vida secular, nas
realidades temporais em que actua, dão-se com frequência opções, critérios e
actuações diversas: dá-se, numa palavra, essa bendita desorganização, esse
justo e necessário pluralismo, que é uma característica essencial do bom
espírito do Opus Dei, e que a mim me pareceu sempre ser a única maneira recta e
ordenada de conceber o apostolado dos leigos.
Dir-lhe-ei
mais: essa desorganização organizada aparece inclusivamente nas próprias obras
apostólicas corporativas que o Opus Dei realiza, com o desejo de contribuir
também, enquanto associação, para resolver cristãmente problemas que afectam as
comunidades humanas dos diversos países.
Essas
actividades e iniciativas da Associação são sempre de carácter directamente
apostólico: obras educativas, assistenciais ou de beneficência.
Mas,
como o nosso espírito é precisamente estimular que as iniciativas surjam a
partir da base, e como as circunstâncias, necessidades e possibilidades de cada
nação ou grupo social são peculiares e ordinariamente diversas entre si, o
governo central da Obra deixa aos governos regionais - que gozam de autonomia
praticamente total - a responsabilidade de decidir, promover e organizar
aquelas actividades apostólicas concretas que julgarem mais convenientes: desde
um centro universitário ou uma residência de estudantes, até um dispensário ou
uma escola agrícola para camponeses.
Como
resultado lógico, aparece um mosaico multicolor e variado de actividades: um
mosaico organizadamente desorganizado.
20
p:
De
acordo com o que nos acaba de referir, de que maneira considera que a realidade
eclesial do Opus Dei se insere na acção pastoral de toda a igreja?
E
no Ecumenismo?
R:
Parece-me
conveniente um esclarecimento prévio: o Opus Dei não é nem pode ser considerado
uma realidade ligada ao processo evolutivo do estado de perfeição na Igreja,
não é uma forma moderna ou aggiornata
desse estado.
Com
efeito, nem a concepção teológica do status
perfecfionís - que São Tomás, Suárez e outros autores plasmaram
decisivamente na doutrina - nem as diversas concretizações jurídicas que se
deram ou se podem dar a esse conceito teológico, se relacionam com a
espiritualidade e o fim apostólico que Deus quis para a nossa Associação. Basta
considerar - porque seria longa uma exposição doutrinal completa - que ao Opus
Dei não interessam votos, nem promessas, nem qualquer forma de consagração para
os seus sócios, além da consagração que já todos receberam no Baptismo.
A
nossa Associação não pretende de nenhum modo que os seus sócios mudem de
estado, que deixem de ser simples fiéis iguais aos outros, para adquirir o
peculiar status perfectionis.
Pelo
contrário, o que deseja e procura é que cada um faça apostolado e se santifique
no seu próprio estado, no mesmo lugar e condição que tem na Igreja e na
sociedade civil.
Não
tiramos ninguém do seu lugar, nem afastamos ninguém do seu trabalho ou dos seus
nobres compromissos de ordem temporal.
A
realidade social, a espiritualidade e a acção do Opus Dei inserem-se, pois, num
manancial da vida da Igreja muito diferente: concretamente, no processo
teológico e vital que está a conduzir o laicado à plena assunção das suas
responsabilidades eclesiais, ao seu modo próprio de participar na missão de
Cristo e da sua Igreja.
Este
tem sido, e continua a ser, nos quase quarenta anos de existência da Obra, o
anseio constante - sereno, mas firme - com que Deus quis encaminhar, na minha
alma e nas dos meus filhos, o desejo de O servir.
Que
contribuição oferece o Opus Dei a este processo?
Talvez
não seja este o momento histórico mais adequado para proceder a uma valoração
global deste tipo.
Apesar
de se tratar de problemas de que o Concílio Vaticano II muito se ocupou - com
quanta alegria da minha alma! - e apesar de muitos conceitos e situações
referentes à vida e missão do laicado terem recebido já do Magistério
suficiente confirmação e luz, há no entanto um considerável núcleo de questões
que constituem ainda, para a generalidade da doutrina, verdadeiros
problemas-limite da teologia.
A
nós, dentro do espírito que Deus deu ao Opus Dei e que procuramos viver com
fidelidade - apesar das nossas imperfeições pessoais -, parece-nos já
divinamente resolvida a maior parte desses problemas discutidos, mas não
pretendemos apresentar essas soluções como as únicas possíveis.
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Há
também aspectos do mesmo processo de desenvolvimento eclesiológico, que
representam magníficas aquisições doutrinais - para as quais quis Deus
indubitavelmente que contribuísse, em parte talvez não pequena, o testemunho do
espírito e da vida do Opus Dei, juntamente com outras contribuições valiosas de
iniciativas e associações apostólicas não menos beneméritas.
Mas
são aquisições doutrinais e talvez passe ainda bastante tempo até chegarem a
encarnar-se realmente na vida total do Povo de Deus.
Aliás,
nas suas perguntas anteriores já recordou alguns desses aspectos: o
desenvolvimento de uma autêntica espiritualidade laical; a compreensão da
peculiar função eclesial - não eclesiástica ou oficial - própria do leigo; a
distinção dos direitos e dos deveres que o leigo tem enquanto leigo; as
relações Hierarquia-laicado; a igualdade de dignidade e a complementaridade das
funções do homem e da mulher na Igreja; a necessidade de conseguir uma ordenada
opinião pública no Povo de Deus, etc.
Tudo
isto constitui evidentemente uma realidade muito fluida e nem sempre isenta de
paradoxos.
Uma
mesma coisa, que dita há quarenta anos escandalizava quase todos, ou todos,
hoje a quase ninguém causa estranheza, embora, na verdade, sejam ainda muito
poucos os que a compreendem a fundo e a vivem ordenadamente.
Entrevista realizada por Pedro
Rodríguez, publicada em Palabra (Madrid), Outubro de 1967
(cont)
[i]
Recordamos
o que ficou dito na Apresentação deste livro sobre algumas respostas,
referentes a aspectos jurídicos e organizativos, que eram exactas e precisas na
altura, quando o Opus Dei não tinha ainda recebido a configuração jurídica
desejada pelo seu Fundador. Hoje é necessário completá-las com a breve
explicação que demos na Apresentação.