São
João – Apóstolo e Evangelista
Evangelho: Jo 20 2-8
Aquele que entra pela porta é pastor
das ovelhas. 3 A este o porteiro abre e as ovelhas ouvem a sua voz, ele as
chama pelo seu nome e as tira para fora. 4 Quando as tirou para fora, vai à
frente delas e as ovelhas seguem-no, porque conhecem a sua voz. 5 Mas não
seguem o estranho, antes fogem dele, porque não conhecem a voz dos estranhos».
6 Jesus disse-lhes esta alegoria, mas eles não compreenderam o que lhes dizia.
7 Tornou, pois, Jesus a dizer-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo que Eu sou
a porta das ovelhas. 8 Todos os que vieram antes de Mim são ladrões e
salteadores; mas as ovelhas não os ouviram.
Comentário:
Com
Cristo a vida humana alcança a sua plenitude.
Isto
compreende-se porque, Ele, é o Senhor da vida e só a pode querer, como Ele
próprio diz, em plenitude.
A
plenitude da vida humana é, pois, o próprio Jesus Cristo que, sendo Deus, é
completo, pleno.
Vivendo
unido a Cristo o homem alcança a plenitude que a própria união confere.
(ama, comentário sobre Jo 10, 1-10,
2012.04.30)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 183 a 190
183
Com o coração todo
entregue
Devo
recordar-vos que não encontrareis a felicidade fora das vossas obrigações
cristãs. Se as abandonardes, ficar-vos-á um enorme remorso e sereis uns pobres
infelizes. Então até mesmo as coisas mais correntes, que são lícitas e trazem
um bocadinho de felicidade, se podem tornar amargas como fel, azedas como o
vinagre, repugnantes como o rosalgar.
Peçamos
a Jesus, cada um de vós e eu também: Senhor! Eu proponho-me lutar e sei que Tu
não perdes batalhas.
E
compreendo que, se alguma vez as perco, é porque me afastei de Ti! Leva-me pela
tua mão e não Te fies de mim! Não me soltes!
Pensareis:
mas eu sou tão feliz, Padre! Eu amo Jesus Cristo e, ainda que seja de barro,
desejo chegar à santidade com a ajuda de Deus e da sua Mãe Santíssima! Não o
duvido. Apenas te previno com estas exortações para o caso de se te apresentar
alguma dificuldade.
Tenho
também de te repetir que a existência do cristão - a tua e a minha - é de Amor.
Este nosso coração nasceu para amar e, quando não se lhe dá um afecto puro,
limpo e nobre, vinga-se e enche-se de miséria. O verdadeiro amor de Deus, que
pode traduzir-se por viver uma vida bem limpa, está tão longe da sensualidade
como da insensibilidade e tão longe de qualquer sentimentalismo como da
ausência de coração ou da sua dureza.
É
uma pena não ter coração. Os que nunca aprenderam a amar com ternura são uns
infelizes. Nós, os cristãos, estamos apaixonados pelo amor: o Senhor não nos
quer secos, insensíveis, como matéria inerte. Quer-nos impregnados do seu
carinho! Aquele que, por Deus, renunciou a um amor humano, não é um solteirão,
como aquela pessoa triste, infeliz, que anda sempre de asa murcha, por ter
desprezado a generosidade de amar limpamente.
184
Amor humano e castidade
Para
manter intimidade com o meu Senhor, já vo-lo contei muita vez, utilizei também
- não me importo que se saiba - as canções populares que se referem, quase
sempre, ao amor. Delicio-me a ouvi-las! O Senhor escolheu-me a mim e a alguns
de vós para que fôssemos totalmente seus e transformássemos em divino o amor
nobre das cantigas humanas. É o que o Espírito Santo faz no Cântico dos Cânticos.
É o que fizeram os místicos de todos os tempos.
Escutai
estes versos da Santa de Ávila: Se quereis que esteja descansado / quero, por
amor, descansar; / Se me mandais trabalhar, / quero morrer trabalhando. /
Dizei: onde, como e quando? / Dizei, dizei, doce Amor: / Como quereis de mim
dispor?.
Ou
aquela canção de S. João da Cruz que começa de um modo encantador: Sofrendo,
só, um pequeno pastor, / Alheio ao prazer, sem contentamento, / Na sua pastora
tem o pensamento / E o peito sangra-lhe em penas de amor.
Quando
é limpo, o amor humano merece-me um imenso respeito, uma enorme veneração. Não
haveríamos nós de estimar o carinho nobre e santo dos nossos pais, ao qual
devemos uma grande parte da nossa amizade com Deus? Eu abençoo esse amor com as
duas mãos e sempre que me perguntaram porquê com as duas mãos, respondi
imediatamente: porque não tenho quatro!
Bendito
seja o amor humano! Mas a mim, o Senhor pediu-me mais. A própria teologia
católica o afirma: entregar-se exclusivamente a Jesus, por amor do Reino dos
Céus e, por Jesus, a todos os homens, é mais sublime do que o amor matrimonial.
Isto não tira que o matrimónio seja um sacramento e sacramentum magnum.
Seja
como for, cada um deve esforçar-se por viver delicadamente a castidade, no seu
lugar respectivo e com a vocação que Deus lhe infundiu na alma - solteiro,
casado, viúvo, sacerdote. A razão é que a castidade é virtude para todos e a
todos exige luta, delicadeza, esmero, rijeza, essa finura que só se compreende,
quando nos colocamos junto do Coração apaixonado de Cristo na Cruz. Não vos
preocupeis se a tentação vos espreita: uma coisa é sentir, outra é consentir. A
tentação pode afastar-se facilmente com a ajuda de Deus. O que não convém, de
modo algum, é dialogar com ela.
185
Meios para vencer
Vejamos
com que recursos é que, nós, cristãos, podemos contar para vencer nesta luta
por guardar a castidade, não como anjos, mas como mulheres e homens sãos,
fortes, normais! Venero os anjos com toda a minha alma e une-me uma grande
devoção a esse exército de Deus, mas não gosto de os comparar connosco, porque
a sua natureza é diferente e qualquer equiparação seria uma desordem.
Generalizou-se
em muitos ambientes um clima de sensualidade que, ajudado pela confusão
doutrinal, leva muita gente a justificar ou, pelo menos, a mostrar a tolerância
mais indiferente para com todo o género de costumes licenciosos.
Devemos
ser o mais limpos possível em relação ao corpo, mas sem medo, porque o sexo, é
algo santo e nobre - participação no poder criador de Deus-, foi feito para o
matrimónio. Assim, limpos e sem medo, dareis com a vossa conduta o testemunho
da viabilidade e da formosura da santa pureza.
Antes
de mais, empenhemo-nos em afinar a consciência, aprofundando o que for preciso,
até ficarmos com a segurança de termos adquirido uma boa formação, distinguindo
bem entre consciência delicada, que é uma graça de Deus, e consciência
escrupulosa que é outra coisa.
Cuidai
com esmero da castidade e também das virtudes que a acompanham e a
salvaguardam: a modéstia e o pudor. Não olheis com ligeireza as normas, tão
eficazes, que nos ajudam a conservarmo-nos dignos do olhar de Deus: a guarda
atenta dos sentidos e do coração; a valentia de ser cobarde para fugir das
tentações; a frequência dos sacramentos, especialmente da Confissão
sacramental; a sinceridade total na direcção espiritual pessoal; a dor, a
contrição e a reparação depois das faltas. E tudo isto ungido com uma terna
devoção a Nossa Senhora, de modo que ela nos obtenha de Deus o dom de uma vida
limpa e santa.
186
Se,
por desgraça, se cai, é preciso levantar-se imediatamente. Com a ajuda de Deus,
que não nos faltará se usarmos os meios adequados, chegaremos, o mais depressa
possível, ao arrependimento, à sinceridade humilde, à reparação, para que a
derrota momentânea redunde numa grande vitória de Jesus Cristo.
Habituai-vos
também a travar a luta longe das muralhas principais da fortaleza. Não podemos
andar a fazer equilíbrios nas fronteiras do mal; temos de evitar com firmeza o
voluntário in causa. Temos de afastar a mais pequena falta de amor, temos de
fomentar as ânsias de apostolado cristão, contínuo e fecundo, que necessita da
santa pureza como alicerce, sendo esta, aliás, um dos seus frutos mais
característicos. Devemos, além disso, encher o tempo com trabalho intenso e
responsável, procurando a presença de Deus, porque nunca nos podemos esquecer
que fomos comprados por alto preço e que somos templos do Espírito Santo.
Que
outros conselhos vos hei-de eu sugerir, senão os que sempre foram utilizados
pelos cristãos que pretendiam, de verdade, seguir Cristo? Trata-se, afinal, dos
mesmos que empregaram os primeiros a escutarem o apelo de Jesus: o encontro
assíduo com o Senhor na Eucaristia, a invocação filial da Santíssima Virgem, a
humildade, a temperança, a mortificação dos sentidos - porque não convém olhar
o que não é lícito desejar, advertia S. Gregório Magno - e a penitência.
Dir-me-eis
que, ao fim e ao cabo, tudo isto é uma síntese da vida cristã. Na verdade, não
seria correcto separar a pureza, que é amor, da essência da nossa fé, que é a
caridade, ou seja, um renovado apaixonar-se por Deus que nos criou, nos redimiu
e que nos estende continuamente a sua mão, ainda que muitas vezes não nos apercebamos
disso. Deus não nos pode abandonar. Sião dizia: Yavé abandonou-me e o Senhor
esqueceu-se de mim. Pode a mulher esquecer-se do fruto do seu ventre, não se
compadecer do fruto das suas entranhas? Pois, ainda que ela se esquecesse, Eu
não te esqueceria. Não vos causam estas palavras uma enorme alegria?
187
Digo
frequentemente que são três as coisas que nos dão alegria na terra e nos
alcançam a felicidade eterna do Céu: a fidelidade firme, dedicada, alegre e
indiscutida à fé, à vocação que cada um recebeu e à pureza. Quem ficar agarrado
às silvas do caminho - isto é, à sensualidade, à soberba...-, há-de ficar por
sua própria vontade; se não rectificar, será um desgraçado, porque virou as
costas ao Amor de Cristo.
Volto
a afirmar que todos temos misérias. Isso, porém, não é razão para nos
afastarmos do Amor de Deus. É, sim, estímulo para nos acolhermos a esse Amor,
para nos acolhermos à protecção da bondade divina, como os antigos guerreiros
se metiam dentro da sua armadura. Esse ecce ego, quia vocasti me, conta comigo
porque me chamaste, é a nossa defesa. Não devemos fugir de Deus quando descobrimos
as nossas fraquezas, mas devemos combatê-las, precisamente porque Deus confia
em nós.
188
Como
é que conseguiremos superar estas coisas mesquinhas? Insisto neste ponto,
porque ele se reveste de importância capital: com humildade e sinceridade na
direcção espiritual e no sacramento da Penitência. Ide aos que vos dirigem
espiritualmente, com o coração aberto. Não o fecheis porque, se se mete o
demónio mudo pelo meio, depois é difícil lançá-lo fora.
Perdoai-me
a insistência, mas julgo imprescindível que fique gravado a fogo nas vossas
inteligências que a humildade e a sua consequência imediata a sinceridade, se
ligam com os outros meios de luta e fundamentam a eficácia da vitória. Se a
tentação de esconder alguma coisa se infiltra na alma, deita tudo a perder; se,
pelo contrário, é vencida imediatamente, tudo corre bem, somos felizes e a vida
caminha rectamente. Sejamos sempre selvaticamente sinceros, embora com modos
prudentemente educados.
Quero
dizer-vos com toda a clareza que me preocupa muito mais a soberba do que o
coração e a carne. Sede humildes! Sempre que estiverdes convencidos de que
tendes toda a razão, é porque não tendes nenhuma. Ide à direcção espiritual com
a alma aberta. Não a fecheis, porque então intromete-se o demónio mudo e é
muito difícil expulsá-lo.
Lembrai-vos
do pobre endemoninhado que os discípulos não conseguiram libertar. Só o Senhor
o pôde fazer com oração e jejum. Naquela altura o Mestre realizou três
milagres. O primeiro foi fazê-lo ouvir, porque quando o demónio mudo nos
domina, a alma fica surda; o segundo foi fazê-lo falar; e o terceiro foi
expulsar o diabo.
189
Começai
por contar o que não quereríeis que se soubesse. Abaixo o demónio mudo! De uma
coisa de nada, dando-lhe voltas e mais voltas, faz-se uma grande bola como com
a neve, e acaba-se por ficar fechado lá dentro. Porquê?... Abri a alma!
Asseguro-vos a felicidade, que é fidelidade à vocação cristã, se fordes sinceros.
A clareza e a simplicidade são disposições absolutamente indispensáveis.
Abramos pois, de par em par a nossa alma, de modo que o sol de Deus possa
entrar e com ele a caridade do Amor.
Para
se afastar da sinceridade total nem sempre é preciso má intenção; às vezes,
basta um erro de consciência. Há pessoas que formaram (isto é, deformaram) de
tal modo a consciência que o seu mutismo, a sua falta de simplicidade lhes
parece bom; até pensam que é bom calar. Acontece que às vezes até receberam uma
boa preparação e conhecem as coisas de Deus e talvez, por isso, se convençam de
que é conveniente calar. Enganam-se, porém, porque a sinceridade é sempre
necessária e não cabem desculpas, ainda que pareçam boas.
Acabamos
esta conversa, na qual tu e eu fizemos a nossa oração com o Nosso Pai,
pedindo-lhe a graça de viver essa afirmação gozosa, que é a virtude cristã da
castidade.
Pedimo-la
por intercessão de Santa Maria, que é a pureza imaculada. Recorramos a Ela,
tota pulchra, seguindo um conselho que eu dava, há muitos anos, àqueles que se
sentiam intranquilos no seu empenho diário por ser humildes, limpos, sinceros,
alegres e generosos: Todos os pecados da tua vida parecem ter-se posto de pé. -
Não desanimes. - Pelo contrário, chama por tua Mãe, Santa Maria, com fé e
abandono de criança. Ela trará o sossego à tua alma.
190
Ouve-se
às vezes dizer que actualmente os milagres são menos frequentes. Não se dará
antes o caso de serem menos as almas que vivem vida de fé? Deus não pode faltar
à sua promessa: Pede-me e eu te darei as nações em herança. Os teus domínios
irão até aos confins da terra. O nosso Deus é a Verdade, o fundamento de tudo o
que existe: nada se cumpre sem o seu querer omnipotente.
Como
era no princípio, agora e sempre. O Senhor não muda, não precisa de se mover
para alcançar coisas que não possua. Ele é todo o movimento, toda a beleza e
toda a grandeza. Hoje como outrora. Passarão os céus como o fumo e a terra
envelhecerá como um vestido, mas a minha salvação durará pela eternidade e a minha
justiça durará para sempre.
Deus
estabeleceu em Jesus Cristo uma nova e eterna aliança com os homens. Pôs a sua
omnipotência ao serviço da nossa salvação. Quando as criaturas desconfiam,
quando vacilam por falta de fé, ouvimos novamente Isaías anunciar em nome do
Senhor: Será que o meu braço tenha ficado mais curto para vos salvar ou que já
não tenha força para vos libertar? Só com a minha ameaça, seco o mar e
transformo os rios num deserto, até perecerem os seus peixes por falta de água
e morrerem de sede os seus viventes. Eu revisto os céus com um manto de sombra
e cubro-os com um saco de luto.
(cont)