São Josemaria Escrivá
CRISTO QUE PASSA
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Essa autenticidade do amor requer
fidelidade e rectidão em todas as relações matrimoniais. Deus, comenta S. Tomás
de Aquino, uniu às diversas funções da vida humana um prazer, uma satisfação;
esse prazer e essa satisfação são, por conseguinte, bons.
Mas se o homem, invertendo a ordem
das coisas, busca essa emoção como valor último, desprezando o bem e o fim a
que deve estar ligada e ordenada, perverte-a e desnaturaliza-a, convertendo-a
em pecado ou em ocasião de pecado.
A castidade - não a simples
continência, mas a afirmação decidida de uma vontade enamorada - é uma virtude
que mantém a juventude do amor em qualquer estádio da vida.
Existe uma castidade dos que sentem
despertar neles o desenvolvimento da puberdade, uma castidade dos que se
preparam para se casarem, uma castidade dos que Deus chama ao celibato, uma
castidade dos que foram escolhidos por Deus para viverem no matrimónio.
Como não recordar aqui as palavras
fortes e claras que a Vulgata conserva, da recomendação que o Arcanjo Rafael
fez a Tobias antes de desposar Sara?
O Anjo admoestou-o deste modo: Escuta-me e mostrar-te-ei quem são aqueles
contra quem o Demónio pode prevalecer. São os que abraçam o matrimónio de tal
modo que excluem Deus de si e da sua mente e se deixam arrastar pela paixão
como o cavalo e o mulo que carecem de entendimento. Sobre esses, o Diabo tem
poder.
Não há amor claro, franco e alegre
no matrimónio, se não se vive essa virtude da castidade, que respeita o
mistério da sexualidade e o ordena à fecundidade à entrega.
Nunca falei de impureza e evitei
sempre descer a casuísticas mórbidas e sem sentido; mas de castidade e de
pureza, da afirmação jubilosa do amor, falei muitíssimas vezes e devo continuar
a falar.
Pelo que respeita à castidade
conjugal, asseguro aos esposos que não devem ter medo de manifestar o seu
carinho; pelo contrário, essa inclinação é a base da sua vida familiar.
O que o Senhor lhes pede é que se
respeitem mutuamente e que sejam mutuamente leais, que actuem com delicadeza,
com naturalidade, com modéstia.
Dir-lhes-ei também que as relações
conjugais são dignas quando são prova de verdadeiro amor e, portanto, estão
abertas à fecundidade, aos filhos.
Secar as fontes da vida é um crime
contra os dons que Deus concedeu à humanidade e uma manifestação de que é o
egoísmo e não o amor, o que inspira a conduta.
Então tudo se turva, porque os
cônjuges acabam por se olharem como cúmplices; e produzem-se entre eles
dissensões que, continuando nessa linha, são quase sempre insanáveis.
Quando a castidade conjugal está
presente no amor, a vida matrimonial é expressão de uma conduta autêntica,
marido e mulher compreendem-se e sentem-se unidos; quando o bem divino da
sexualidade se perverte, destrói-se a intimidade e marido e mulher já não podem
olhar-se nobremente, cara a cara.
Os esposos devem edificar a sua
convivência sobre um carinho sincero e puro, e sobre a alegria de ter trazido ao
mundo os filhos que Deus lhes tenha dado a possibilidade de ter, sabendo, se
for necessário, renunciar a comodidades pessoais e tendo fé na Providência
divina. Formar uma família numerosa, se tal for a vontade de Deus, é uma
garantia de felicidade e de eficácia, embora afirmem outra coisa os defensores
de um triste hedonismo.
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Não vos esqueçais de que, em certas
ocasiões, não é possível evitar as zangas entre os esposos.
Nunca discutais diante dos vossos
filhos; fá-los-eis sofrer e eles tomarão o partido de uma das partes,
contribuindo talvez para aumentar inconscientemente a vossa desunião.
Todavia, discutir, desde que não
seja muito frequentemente, é também uma manifestação de amor, quase uma
necessidade.
A ocasião, não o motivo, costuma ser
o cansaço do marido, esgotado pelo seu trabalho profissional; a fadiga - oxalá
não seja o aborrecimento - da mulher que teve de aturar os filhos e o serviço
ou lutar com o seu próprio carácter, às vezes pouco firme; embora vós, as
mulheres, sejais mais firmes que os homens se vos decidis a isso.
Evitai a soberba, que é o maior
inimigo da vossa vida conjugal: nas vossas pequenas zangas, nenhum dos dois tem
razão.
O que estiver mais sereno deve dizer
uma palavra que guarde o mau humor até mais tarde. E mais tarde - a sós -
discuti, que depois fareis as pazes.
Vós, mulheres, pensai que talvez vos
descuideis um pouco no arranjo pessoal; recordai o provérbio que a mulher
composta tira o homem de outra porta: é sempre actual o dever de aparecerdes
amáveis como quando éreis noivas, dever de justiça porque pertenceis ao vosso
marido; e ele também não se deve esquecer de que é vosso e de que tem a
obrigação de ser, durante toda a vida, afectuoso como um noivo.
Mau sinal, se sorrirdes com ironia
ao lerdes este parágrafo; seria uma demonstração evidente de que o afecto
familiar se tinha convertido em gélida indiferença.
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Lares luminosos e alegres
Não se pode falar do matrimónio sem
pensar ao mesmo tempo na família, que é o fruto e a continuação daquilo que se
inicia com o matrimónio.
Uma família compõe-se, não apenas do
marido e da mulher, mas também dos filhos e, num grau maior ou menor, dos avós,
dos outros parentes, das empregadas domésticas.
A todos eles há-de chegar o calor
íntimo, do qual depende o ambiente familiar.
É certo que há casais a quem o
Senhor não concede filhos; é sinal de que, nesse caso lhes pede que continuem a
amar-se com igual amor e que dediquem as suas energias - se puderem - a
serviços e tarefas em benefício de outras almas.
O normal, porém, é que um casal
tenha descendência.
Para estes esposos, a primeira
preocupação têm de ser os seus filhos. A paternidade e a maternidade não
terminam com o nascimento; essa participação no poder de Deus, que é a
faculdade de gerar, há-de prolongar-se na cooperação com o Espírito Santo, para
que culmine com a formação de autênticos homens cristãos e autênticas mulheres
cristãs.
Os pais são os principais educadores
dos seus filhos, tanto no aspecto humano como no sobrenatural, e hão-de sentir
a responsabilidade dessa missão, que exige deles compreensão, prudência, saber
ensinar e, sobretudo, saber amar; e devem preocupar-se por dar bom exemplo.
A imposição autoritária e violenta
não é caminho acertado para a educação.
O ideal para os pais é chegarem a
ser amigos dos filhos; amigos a quem se confiam as inquietações, a quem se
consulta sobre os problemas, de quem se espera uma ajuda eficaz e amável.
É necessário que os pais arranjem
tempo para estar com os filhos e falar com eles.
Os filhos são o que há de mais
importante; mais importante do que os negócios, do que o trabalho, do que o
descanso.
Nessas conversas, convém escutá-los
com atenção, esforçar-se por compreendê-los, saber reconhecer a parte de
verdade - ou a verdade inteira - que possa haver em algumas das suas rebeldias.
E, ao mesmo tempo, apoiar as suas
aspirações, ensiná-los a ponderar as coisas e a raciocinar; não lhes impor uma
conduta, mas mostrar-lhes os motivos, sobrenaturais e humanos, que a
aconselham.
Numa palavra, respeitar a sua
liberdade, já que não há verdadeira educação sem responsabilidade pessoal, nem
responsabilidade sem liberdade.
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Os pais educam fundamentalmente com
a conduta.
O que os filhos e as filhas procuram
no seu pai ou na sua mãe, não são apenas conhecimentos mais amplos do que os
seus ou conselhos mais ou menos acertados, mas algo de maior importância: um
testemunho do valor e do sentido da vida, encarnados numa existência concreta e
confirmados nas diversas circunstâncias e situações que se sucedem ao longo dos
anos.
Se eu tivesse de dar um conselho aos
pais, dar-lhes-ia sobretudo este: que os vossos filhos vejam (não tenhais
ilusões: desde crianças, vêem tudo e julgam-no) que procurais viver de acordo
com a vossa fé, que Deus não está só nos vossos lábios, que está nas vossas
obras; que vos esforçais por serdes sinceros e leias, que vos amais e os amais
a eles realmente.
Assim é que contribuireis melhor
para fazer deles homens e mulheres íntegros, capazes de enfrentar com espírito
aberto as situações que a vida lhes depare, de servir os seus concidadãos e de
contribuir para a solução dos grandes problemas da humanidade, levando o
testemunho de Cristo aonde mais tarde venham a encontrar-se na sociedade.
(cont)