25/03/2020

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Evangelho e comentário


TEMPO DE QUARESMA

Anunciação do Senhor

Evangelho: Lc 1, 26-38

Naquele tempo, o Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma Virgem desposada com um homem chamado José, que era descendente de David. O nome da Virgem era Maria. Tendo entrado onde ela estava, disse o Anjo: «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo». Ela ficou perturbada com estas palavras e pensava que saudação seria aquela. Disse-lhe o Anjo: «Não temas, Maria, porque encontraste graça diante de Deus. Conceberás e darás à luz um Filho, a quem porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo. O Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai David; reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu reinado não terá fim». Maria disse ao Anjo: «Como será isto, se eu não conheço homem?». O Anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus. E a tua parenta Isabel concebeu também um filho na sua velhice e este é o sexto mês daquela a quem chamavam estéril; porque a Deus nada é impossível». Maria disse então: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra».

Comentário:

Com este acontecimento extraordinário, que São Lucas nos relata com os detalhes que deverá ter ouvido da própria Santíssima Virgem, começa, verdadeiramente, a História da Salvação da Humanidade.

Sentimos um misterioso clima de grandiosa simplicidade – se assim se pode dizer – em que se envolvem uma jovem rapariga e um Enviado de Deus, num diálogo intenso, de perguntas e respostas, de estranheza e segurança, de incompreensão e acatamento.

Nada falta! Tudo é completo, grandioso e simples ao mesmo tempo como é sempre o momento em que a Vontade de Deus é aceite e, naturalmente, se cumpre.

Virgem e Mãe! Mãe sempre Virgem!
A Nossa Senhora! A nossa Mãe!

«Dum steteris in conspecto Domine, loquaris pro nos bona[i]

(AMA, comentário sobre, Lc 1, 26-38, 07.07.2014)



[i] Quando estiveres na presença de Deus, diz-lhe bem de nós!

Orações: Obediência


Quero, Senhor, ser obediente às Tuas indicações que me chegam de tão diversos modos. Tenho a certeza, absoluta, que só assim serei feliz.

Docere me facere voluntatem tuam quia Deus meus es tu!

Este, quero que seja o meu lema diário, constante. Ajuda-me, Senhor, a concretizá-lo, minha Mãe, Maria Santíssima, São José meu Pai e Senhor, Anjo da Minha Guarda tomai-me pela mão para que não me desvie do meu caminho.

(AMA, orações pessoais)

Temas para reflectir e meditar


Formação humana e cristã

Sobre a oração 11

Oração de acção de graças 2

Somos Filhos de Deus que É Nosso Criador, Senhor e Pai Extremoso.

Não é verdade que é de “bom filho” ser bem-agradecido?

(AMA, 2019)

Leitura espiritual

Fulton Sheen
Pensamentos para a vida diária 

Felicidade 1

Capítulo I

A felicidade consistirá na Riqueza?

A felicidade é a ambição de todo o ser humano. A busca da felicidade é uma prova da nossa imperfeição.
É, como disse Pascal: «A felicidade é o objectivo de todos os homens sem excepção sejam quais forem os meios que empreguem, todos têm em vista a mesma aspiração.»

Embora procuremos a felicidade através de outros seres humanos, a verdade é que a consideramos um bem exclusivamente nosso.

O facto de nos sentirmos felizes quando obtemos algo que desejámos, ou de nos sentirmos felizes com a privação do que ambicionámos, prova que a felicidade está ligada aos objectivos dos nossos desejos ou intentos.

Por essa razão, no fundo da actividade de cada ser humano há sempre prazer e alegria ou tristeza e dor, exactamente como no fim de toda a vida humana está o céu ou o inferno.

A felicidade consistirá na abundância das riquezas?

Há, realmente, várias vantagens em ser rico. Heródoto afirmava que a fortuna permitia ao homem satisfazer as suas paixões.

E, no entanto, as riquezas não podem constituir felicidade, porquanto representam apenas uma forma de a alcançar e não são parte essencial do nosso ser. Deus Nosso Senhor exprimiu isto mesmo quando disse: «a vida de uma pessoa não depende da abundância dos seus bens».[1]
Se colocarmos uma moeda à frente dos olhos, deixaremos de ver o Sol. A falta de bens materiais não é fatalmente a causa da infelicidade. Há mais divórcios e mais miséria íntima entre os ricos que entre os pobres: «O freio de ouro não torna melhor o cavalo».

A abundância de riquezas tem a particularidade de tornar os homens mais ambiciosos. É como disse Jefferson: «Ainda não vi que a honestidade dos homens aumentasse com a sua fortuna».
Seja qual for a riqueza que possua, o homem abastado detesta perder o que tem, exactamente como detestaria que lhe arrancassem um só cabelo, muito embora tivesse uma cabeleira abundante.
Este espírito de cobiça endurece a alma e suscitou este aviso de Deus Nosso Senhor: É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do que um rico entrar no Reino do Céu.».[2]

Há um paradoxo peculiar ao homem rico: quanto mais ambicioso for, mais pobre se sente, porque deseja sempre algo mais.
As almas consagradas, que fizeram voto de pobreza, são mais ricas que todos os ricos, pois que, não ambicionando coisa alguma, na realidade tudo possuem.

Em qualquer caso, como é louco todo aquele que faz consistir a felicidade naquilo que algum dia há-de deixar!

Se as riquezas são de facto nossas, porque é que não as levamos connosco?
As únicas coisas que levaremos connosco na hora da nossa morte serão as mesmas que conservaríamos após um naufrágio.

Shakespeare disse «Se tu és rico, és pobre, pois à semelhança do burro que leva sobre o lombo pesadas barras de ouro, também tu vergas ao peso das tuas riquezas, mas ao cabo de breve jornada, a morte despojar-te-á da carga»

No dia derradeiro, os parentes e amigos, reunidos em volta do leito de morte do homem rico, perguntam: ‘quanto deixou?’ pois onde houver um testamento há, quase sempre, litígio.
Quanto aos Anjos, esses, perguntarão: ‘que bens que trará com ele?’.

«A propriedade de um homem muito abastado produziu uma excelente colheita, e ele, preocupado, dizia para consigo: «O campo dum homem rico tinha produzido excelente colheita. Ele pensou consigo: ‘Que hei-de fazer, pois não tenho onde guardar a minha colheita? Vou fazer assim: Deitarei abaixo os meus celeiros para construir outros maiores, onde guardarei todo o meu trigo e os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: Minha alma tens muitos bens em depósito para longos anos. Descansa, come, bebe, regala-te’. Mas Deus respondeu-lhe: ‘Insensato! Esta noite terás de entregar a tua alma. O que preparaste, para quem será?’ Assim acontece a quem acumula para si, em vez de se tornar rico aos olhos de Deus».[3]

Capítulo II

Felicidade 2

A felicidade consistirá na glória, na fama e nas honras?


Reputação e honrarias são provas de superioridade e de importância, mas, não constituem felicidade.
Encarar honrarias como objectivo de vida é tornar a nossa felicidade dependente dos outros, quando a felicidade deve ser algo que ninguém possa arrebatar-nos.
Além disso, se as horas são o ideal da vida, então a desonra é o único pecado.

Os homens dos nossos dias não procuram a honra baseada na virtude, mas sim na reputação, que é, avaliada mais em extensão do que em profundidade.
Reputação é apenas popularidade e desvanece-se como a brisa. É preciso gozá-la enquanto sopra. Podemos compará-la a uma bola que os homens impelem enquanto rola, e deixam de o fazer quando pára.

A grandeza de uma época avalia-se pelos homens que no seu decorrer desfrutaram renome e fama.
A mocidade dos nossos tempos não corre perigo à conta do seu amor aos prazeres, mas sim pelo culto que presta aos falsos heróis.
Muitos homens afamados da nossa época serão evocados no próximo século como testemunho da inferioridade mental do século XX.

Todo o que desfrute consideração do mundo, se for de facto sincero consigo próprio, sabe que não é completamente merecedor desse conceito.
O mundo fala de nós, ora para dizer coisas demasiado boas para serem verdadeiras, ou demasiado más para que possa dar-se-lhes crédito.

Charles Lamb [4] diz, a propósito: «Há muitos que me consideram um homem bom. Quão facilmente se adquire essa fama! Sei coisas a meu respeito que fariam com que os meus amigos fugissem como de uma praga!».

São Filipe de Néri, ao ver um condenado caminhar para o cadafalso, exclamou: «Aquele poderia ser Filipe de Néri, se não fosse a graça de Deus!».

Quão instável é a felicidade baseada na consideração dos homens!
Quantos se elevam às alturas como foguetões, para se despenharem no solo como simples destroços!
O aplauso é fácil e contagioso. Basta que dois ou três comecem a bater palmas, para que a assistência em peso os imite.

É como disse Shakespeare: «A glória assemelha-se a um círculo na água, que não cessa de se alargar, mais e mais, até que, à força de se largar, acaba por se desvanecer.»[5]

O indivíduo verdadeiramente feliz não se importa realmente com aquilo que os homens possam pensar a seu respeito., pois que a verdadeira glória reside no julgamento de Deus e não do julgamento dos homens.

São Paulo disse: «Pouco importa ser julgado pelo tribunal dos homens».[6]

As reputações mais duradouras são aquelas que se firmam após a morte, quando o falso brilho dos ouropéis da vanglória se extinguiu.
A glória Lincoln foi póstuma.
A glória de Cristo veio a pós a Sua crucifixão.

É d’Ele que nos vem este aviso: «Ai daquele de quem todos os homens dizem bem!»[7].

As palavras mais veementes que saíram dos lábios divinos foram aquelas que Jesus pronunciou contra os conquistadores da popularidade, que procuravam a todo o custo ver o seu nome apregoado nas praças públicas, tal como os seus semelhantes dos nossos dias o querem ver impresso nos jornais.

«Tudo quanto fazem é com o fim de se tornarem notados pelos homens. É com essa intenção que exibem sentimentos religiosos, cobiçam os lugares de honra nos banquetes e nas sinagogas e as saudações na praça pública»[8].

Fulton J. Sheen, Thoughts for dayly living, (tradução por AMA)


Nota: Todas as notas de rodapé são da responsabilidade de AMA
[1] Cfr. Lc 12, 13-21
[2] Cfr. Mt 19, 24
[3] Cfr. Lc 12, 13-21
[4] Charles Lamb foi um escritor e literato inglês, mais conhecido por seu Essays of Elia e o livro infantil Contos de Shakespeare, que ele produziu com sua irmã, Mary Lamb.
[5] Henrique VI – Parte 1 - Acto I – Cena II: Joana
[6] 1 Cor. Iv, 3.
[7] Cfr. Mt 23, 5 e ss.
[8] Ibid

Espera-se heroísmo do cristão

Quantos, que se deixariam cravar numa Cruz, perante o olhar atónito de milhares de espectadores, não sabem sofrer cristãmente as alfinetadas de cada dia! – Pensa então no que será mais heróico. (Caminho, 204).

Hoje, como ontem, espera-se heroísmo do cristão. Heroísmo em grandes contendas, se é preciso. Heroísmo – e será o normal – nas pequenas escaramuças de cada dia. Quando se luta continuamente, com Amor e deste modo que parece insignificante, o Senhor está sempre ao lado dos seus filhos, como pastor amoroso: Eu mesmo apascentarei as minhas ovelhas e as farei repousar, diz o Senhor Deus. Irei procurar as que se tinham perdido, farei voltar as que andavam desgarradas, porei ligaduras às que tinham algum membro quebrado e fortalecerei as que estavam fracas... E as minhas ovelhas habitarão no seu país sem temor; e elas saberão que eu sou o Senhor, quando eu tiver quebrado as cadeias do seu jugo, e as tiver arrancado das mãos daqueles que as dominavam.
Apelo para a sua misericórdia, para a sua compaixão, a fim de que não olhe para os nossos pecados, mas para os méritos de Cristo e de sua Santa Mãe, e que é também nossa Mãe, para os do Patriarca S. José, que Lhe serviu de Pai, para os Santos.
O cristão pode viver com a segurança de que, se quiser lutar, Deus o acolherá na sua mão direita, como se lê na Missa desta festa. Jesus, que entra em Jerusalém montado num pobre burrico, Rei da paz, é quem diz: o, reino dos céus alcança-se com violência, e os violentos arrebatam-no. Essa força não se manifesta na violência contra os outros; é fortaleza para combater as próprias debilidades e misérias, valentia para não mascarar as nossas infidelidades, audácia para confessar a fé, mesmo quando o ambiente é contrário. (Cristo que passa, 82)

ANUNCIAÇÃO


Vida de Maria (V)


O diálogo mais importante da história teve lugar no interior de uma casa pobre de Nazaré. Os seus protagonistas são o próprio Deus, que se serve do ministério de um Arcanjo e uma Virgem chamada Maria, da casa de David, desposada com um artesão de nome José.

Muito provavelmente Maria encontrava-se recolhida em oração, talvez meditando alguma passagem da Sagrada Escritura referente à salvação prometida pelo Senhor. É assim que a mostra a arte cristã, que se inspirou nessa cena para compor as melhores representações da Virgem. Ou talvez estivesse ocupada nos trabalhos da casa e, nesse caso, também se encontraria absorvida em oração: tudo n’Ela era ocasião e motivo para manter um diálogo constante com Deus.

— Salve, ó cheia de graça, o Senhor é contigo (Lc 1, 28).

Ao ouvir estas palavras, Maria perturbou-se e discorria pensativa que saudação seria esta (Lc 1, 29). Fica confusa, não tanto pela aparição do anjo, mas pelas suas palavras. Sobressaltada, questiona-se sobre o motivo de tais louvores. Perturba-se porque, na sua humildade, sente-se pouca coisa. Boa conhecedora da Escritura, dá-se imediatamente conta de que o mensageiro celestial lhe está a transmitir uma mensagem inaudita. Quem é Ela para merecer esses elogios? O que é que fez na sua breve existência? Certamente deseja servir a Deus com todo o seu coração e com toda a sua alma; mas vê-se muito longe daquelas façanhas que valeram louvores a Débora, a Judite, a Ester, mulheres muito exaltadas na Bíblia. No entanto, compreende que a embaixada divina é para Ela. Ave, gratia plena!

"NÃO HÁ NA SUA RESPOSTA A MÍNIMA SOMBRA DE DÚVIDA OU DE INCREDULIDADE; SIM, DESDE A SUA MAIS TENRA INFÂNCIA, SÓ ANSIAVA POR CUMPRIR A VONTADE DIVINA!"

Neste primeiro momento, Gabriel dirige-se a Maria dando-lhe um nome — a cheia de graça — que explica a profunda perturbação de Nossa Senhora. São Lucas utiliza um verbo que, em língua grega, indica que a Virgem de Nazaré estava completamente transformada, santificada pela graça de Deus. Como posteriormente definiria a Igreja, isto tinha ocorrido no primeiro momento da sua concepção, em consideração da missão que havia de cumprir: ser Mãe de Deus na Sua natureza humana, permanecendo ao mesmo tempo Virgem.

O Arcanjo apercebe-se do sobressalto da Senhora e, para a tranquilizar, dirige-se a Ela chamando-a — agora sim — pelo seu próprio nome e explicando-lhe as razões dessa saudação excepcional.

— Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus; eis que conceberás no teu ventre e darás à luz um filho, a Quem porás o nome de Jesus. Será grande e será chamado Filho do Altíssimo e o Senhor Deus Lhe dará o trono de Seu pai David; reinará sobre a casa de Jacob eternamente e o Seu reino não terá fim (Lc 1, 30-33).

"NÃO SE LIMITA A UM GENÉRICO DAR LICENÇA, MAS PRONUNCIA UM SIM — FIAT! — NO QUAL ENVOLVE TODA A SUA ALMA E TODO O SEU CORAÇÃO".

Maria, que conhece bem as profecias messiânicas e as meditou muitas vezes, compreende que será a Mãe do Messias. Não há na sua resposta a mínima sombra de dúvida ou de incredulidade; sim, desde a sua mais tenra infância, só ansiava por cumprir a Vontade divina! Mas deseja saber como se realizará esse prodígio, pois, inspirada pelo Espírito Santo, tinha decidido entregar-se a Deus em virgindade de coração, de corpo e de mente.

São Gabriel comunica-lhe então o modo diviníssimo em que maternidade e virgindade se conciliarão no seu seio.

— O Espírito Santo descerá sobre ti e o poder do Altíssimo te cobrirá com a Sua sombra; por isso mesmo o Santo que há-de nascer de ti será chamado Filho de Deus. Eis que também Isabel, tua parenta, concebeu um filho na sua velhice; e este é o sexto mês da que se dizia estéril, porque a Deus nada é impossível (Lc 1, 35-37):

O anjo cala-se. Um grande silêncio se apodera do céu e da terra, enquanto Maria medita no seu coração a resposta que vai dar ao mensageiro divino. Tudo depende dos lábios desta Virgem: a Encarnação do Filho de Deus, a salvação da humanidade inteira.

Maria não demora. E, ao responder ao convite do Céu, fá-lo com toda a energia da sua vontade. Não se limita a um genérico dar licença, mas pronuncia um sim — fiat! — no qual envolve toda a sua alma e todo o seu coração, aderindo plenamente à Vontade de Deus: Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra (Lc 1, 38).

E o Verbo se fez carne e habitou entre nós (Jo 1, 14). Ao contemplar uma vez mais este mistério da humildade de Deus e a humildade da criatura, irrompemos numa exclamação de gratidão que gostaríamos que não terminasse nunca: «Ó Mãe, Mãe! com essa tua palavra — "fiat" — tornaste-nos irmãos de Deus e herdeiros da Sua glória. — Bendita sejas!» (Caminho, n. 512).

J.A. Loarte
A Anunciação é o momento em que Nossa Senhora conhece com clareza a vocação a que Deus a tinha destinado desde sempre. Quando o Arcanjo a tranquiliza e lhe diz «não temas, Maria», está a ajudá-la a superar esse temor inicial que, ordinariamente, se apresenta em toda a vocação divina. O facto de que isto tenha acontecido à Santíssima Virgem indica-nos que não há nisso nem sequer imperfeição: é uma reacção natural diante da grandeza do sobrenatural.
Imperfeição seria não o superar, ou não nos deixarmos aconselhar por aqueles que, como São Gabriel e Nossa Senhora podem ajudar-nos. [i]
«Salve!»: Literalmente o texto grego diz: alegra-te! É claro que se trata de uma alegria totalmente singular pela notícia que Lhe vai comunicar a seguir. «Cheia de graça»: O Arcanjo manifesta a dignidade e a honra de Maria com esta saudação desusada. Os Padres e Doutores da Igreja «ensinaram que com esta singular e solene saudação, jamais ouvida, se manifestava que a Mãe de Deus era assento de todas as graças divinas e que estava adornada de todos os carismas do Espírito Santo», pelo que «jamais esteve sujeita a maldição», isto é, esteve imune de todo o pecado. Estas palavras do arcanjo constituem um dos textos em que se revela o dogma da Imaculada Conceição de Maria (cfr Ineffabilis Deus; Credo do Povo de Deus, n. O 14), «0 Senhor está contigo»: Estas palavras não têm um mero sentido deprecatório (o Senhor esteja contigo), mas afirmativo (o Senhor está contigo), e em relação muito estreita com a Encarnação. Santo Agostinho glosa a frase «o Senhor está contigo» pondo na boca do arcanjo estas pala­vras: «Mais que comigo, Ele está no teu coração, forma-Se no teu ventre, enche a tua alma, está no teu seio»> (Sermo de Nativitate Domini, 4).
Alguns importantes manuscritos gregos e versões antigas acrescentam no fim: «Bendita tu entre as mulheres»: Deus exaltá-La-ia assim sobre todas as mulheres. Mais excelente que Sara, Ana, Débora, Raquel, Judite, etc., pelo facto de que só Ela tem a suprema dignidade de ter sido escolhida para ser Mãe de Deus. [ii]
A Anunciação a Maria e a Encarnação do Verbo é o facto mais maravilhoso, o mistério mais entranhável das relações de Deus com os homens e o acontecimento mais transcen­dente da História da humanidade. Que Deus Se faça Homem e para sempre! Até onde chegou a bondade, a misericórdia e o amor de Deus por nós, por todos nós! E, não obstante, no dia em que a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade assu­miu a débil natureza humana das entranhas puríssimas de Maria Santíssima, nada extraordinário acontecia, aparentemente, sobre a face da terra.
Com grande simplicidade narra São Lucas o magno acontecimento. Com quanta atenção, reverência e amor temos de ler estas palavras do Evangelho, rezar piedosa mente o Angelus cada dia, seguindo a divulgada devoção cristã, e contemplar o primeiro mistério gozoso do santo Rosário. [iii]                        
Virgo fidelis, Virgem fiel. Que significa esta fidelidade de Maria? Quais são as dimensões da fidelidade? A primeira dimensão chama-se busca. Maria foi fiel, antes de mais, quando com amor se pôs a buscar o sentido profundo do desígnio de Deus n'Ela e para o mundo. Quomodo fiet? Como acontecerá isto?,  perguntava Ela ao anjo da Anunciação (...). Não haverá fidelidade se não houver na raiz esta ardente, paciente e generosa busca (...).
«A segunda dimensão da fidelidade chama-se acolhimento, aceitação. O Quomodo fiet transforma-se, nos lábios de Maria, em um fiat. Que se faça, estou pronta, aceito: este é o momento crucial da fidelidade, momento em que o homem percebe que jamais compreenderá totalmente o como: que há no desígnio de Deus mais zonas de mistério que de evidência; que, por mais que faça, jamais conseguirá captar tudo (...).
Coerência é a terceira dimensão da fidelidade. Viver de acordo com o que se crê. Ajustar a própria vida ao objecto da própria adesão. Aceitar incompreensões, perseguições antes que permitir rupturas entre o que se vive e o que se crê: esta é a coerência (...)
Mas toda a fidelidade deve passar pela prova mais exigente: a da duração. Por isso a quarta dimensão da fidelidade é a constância. É fácil de ser coerente por um dia uns dias. Difícil e importante é ser coerente toda a vida. É fácil ser coerente na hora da exaltação, difícil sê-lo na hora da tribulação. E só pode chamar-se fidelidade a uma coerência que dura ao longo de toda a vida. O fiat de Maria na Anunciação encontra a sua plenitude no fiat silencioso que repete aos pés da cruz.[iv]
***
Salve, ó cheia de graça ! [vi]          
Foi com estas palavras que, Gabriel, o Anjo do Senhor se dirigiu a ti, Maria de Nazaré.
Tão longe estarias tu deste acontecimento.
Decerto que, desde pequenina, a oração constante, a simplicidade nos pensamentos e nos actos, sem a mais leve mancha de malícia ou impudor, deverias sentir Deus muito próximo, ao alcance da tua voz.
Certamente que sim, pois acreditavas firmemente que Ele te ouvia sempre e em cada momento.
Mas a tua modéstia, a tua simplicidade, a tua total e humilde submissão a teu Senhor, ao teu Deus, não permitiriam nunca que essa possibilidade te ocorresse sequer.
O Senhor Todo Poderoso, o Criador do Céu e da Terra e de tudo quanto existe, enviar a Nazaré, à tua casa humilde e simples, um Anjo Seu, para te saudar! Que coisa mais extraordinária.
Sabias que Deus não era um ser longínquo e distante, inacessível aos homens. Constantemente tinha intervindo junto do povo eleito para comunicar a Sua Vontade, os Seus desígnios.
Mas, os Seus interlocutores tinham sido sempre grandes personagens da História Humana: Abraão, Moisés, David, os Profetas.
E tu, pobre e humilde menina recebias do Senhor uma graça semelhante!?
Logo no início o salve do Mensageiro te perturba. Salve, isto é, alegra-te.
Mas, mais: Oh! cheia de graça!
Que saudação estranha e desusada que manifesta uma dignidade e honra que julgas não merecer.
Alegra-te Filha... de Jerusalém... o Senhor está no meio de ti.[vii]
Estes altíssimos louvores ferem o teu espírito humilde e, por isso a estas palavras, ela perturbou-se e ficou a pensar que saudação seria aquela. [viii]
Mas, Gabriel, é um Anjo do Senhor, e apercebe-se a tua confusão, talvez, o teu natural temor. E sossega-te:
Não tenhas receio, Maria, pois achaste graça diante de Deus. Hás-de conceber e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo; dar-Lhe-á o Senhor Deus o trono de Seu pai David, reinará eternamente na casa de Jacob e o seu reinado não terá fim. [ix]
Conhecias bem pelas Escrituras que lias e meditavas, o que significava esta saudação e portanto, quando Gabriel evoca estas prerrogativas, entendeste claramente que te era anunciado que irias ser a Mãe do Messias Salvador.
Mas há ainda no teu espirito esclarecido, não obstante a tua juventude, uma dúvida séria: Como poderias tu, virgem humilde, teres sido escolhida para Mãe de Jesus Salvador pelo próprio Deus a quem tinhas dedicado a tua virgindade?!
E, não obstante a tua humildade de jovem simples não deixas de interrogar:
Como será isso, se eu não conheço homem?! [x]
Ah!... mas o Anjo tranquiliza-te: Virá sobre ti o Espírito Santo, e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a Sua sombra. [xi]
Esta resposta corresponde também ao que nas Escrituras se revelava sobre o aparecimento do Messias.
Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um filho a quem será dado o nome de Emanuel, que quer dizer Deus connosco. [xii]
Não tinhas mais dúvidas por isso nada mais perguntaste. Não quiseste saber como, quando, porquê.
Nada, nada absolutamente te interessava averiguar porque:
Heis aqui a escrava do Senhor: seja-me feito segundo a tua palavra! [xiii]
Assim, tal qual, tu, Senhora, a quem acabava de anunciado seres eleita por Deus a maior, a mais sublime de entre as mulheres da Terra, assim, com esta simplicidade que fere pela sua inteira singeleza, assim, tu defines um coração puro, uma alma de Deus, uma total entrega ao Senhor.[xiv]
Oh! Mãe, Mãe! com essa tua palavra - «fiat» - tornaste-nos irmãos de Deus e herdeiros da Sua glória. - Bendita sejas! [xv]
Em Maria, nada existe da atitude das virgens néscias, que obedecem, sim, mas como insensatas. Nossa Senhora ouve com atenção o que Deus quer, pondera aquilo que não entende, pergunta o que não sabe. Imediatamente a seguir, entrega-se sem reservas ao cumprimento da Vontade divina: heis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a Vossa palavra. Vedes esta maravilha? [xvi]
Uma vez conhecido o desígnio divino, Nossa Senhora entrega-se à Vontade de Deus com obediência pronta e sem reservas.
Dá-se conta da desproporção entre o que vai ser - Mãe de Deus - e o que é - uma mulher -. Não obstante, Deus o quer e nada é impossível para Ele, e por isto ninguém é capaz de por dificuldades ao desígnio divino. Daí que, juntando-se em Maria a humildade e a obediência, pronunciará o sim ao chamamento de Deus com essa resposta perfeita: «Heis a escrava do Senhor, seja-me feito segundo a Tua palavra». [xvii]
Por isso Deus te escolheu.
A Mãe do Salvador, do Deus feito homem, perfeito homem, que haveria de morrer na Cruz para salvar todos os homens, num sacrifício cruento, completo, total, não poderia senão expressar a aceitação pronta e total da Vontade Divina.
Faça-se a Tua Vontade de uma forma total e completa.
Não para meu bem, não para minha glória, não para beneficio de quem quer que seja, não... só e unicamente porque é a Tua Vontade Senhor; o resto não me interessa...
E, no entanto esta jovem era já a Mãe do Salvador, escolhida desde o principio dos tempos.
Poderei eu, algum dia, alguma vez, do fundo do coração, manifestar tal sentimento?
Decerto que não.
Quantas vezes que me proponho a aceitar a Vontade de Deus, mas reservando no meu no meu íntimo, que ela esteja de acordo com a minha vontade. Que se satisfaçam os meus desejos, que obtenha o que quero que o Senhor, actue assim, como uma espécie de Deus privado, ao meu serviço.
Heis aqui  a escrava do Senhor: seja-me feito segundo a tua palavra! [xviii]
Ah! Senhora minha, que maravilha a tua resposta, que espantosa a tua entrega.
Ajuda-me, querida Mãe, a dizer a cada momento sim ao Senhor.
Instila no meu coração de filho, porque és minha Mãe, esses sentimentos puros e humildes, esse desprendimento das coisas, essa disponibilidade permanente para ouvir e, ouvindo, dizer que sim aos desejos do Senhor.
Desejo tanto ser honesto comigo mesmo para poder ser honesto para com os outros e para com Deus. Não me mentir, não me enganar, não me esconder atrás de falsas coisas, defeitos ou virtudes, para me esquivar constantemente ao que me é pedido.
E a Tua Vontade, o Teu mandato, claríssimo é que eu seja santo [xix]
Não um dia, não qualquer dia, agora - nunc coepi - pois pode ser que o amanhã me falte. [xx]
"Ave Cheia de Graça, o Senhor está contigo". [xxi]
Assim te falou o Anjo do Senhor.
Ave minha Mãe Santíssima.
Ave, minha querida Mãe que estás no Céu, digo-te eu,  com a esperança, que é certeza, que me ouves e atenderás as minhas suplicas.
Como tu, também eu quero dizer “fiat”, faça-se, cumpra-se a justíssima e amabilíssima Vontade de Deus sobre todas as coisas. [xxii]
Monstra te esse mater [xxiii], mostra que és mãe , ajuda-me e guia-me todos os dias da minha vida para que eu seja um bom filho.

(AMA, Anunciação, 2010)



[i] Bíblia Sagrada anotada pela Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra, comentário a Lc 1, 30
[ii] Bíblia Sagrada anotada pela Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra, comentário a Lc 1, 28
[iii] Bíblia Sagrada anotada pela Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra, comentário a Lc 1, 26-38
[iv] João Paulo II, Homilia na Missa na Catedral México, 26.01.1979
[v] AMA, sobre a Anunciação, 2000
[vi] Lc 1, 28
[vii] So 3, 14. 17a
[viii] Lc 1, 29
[ix] Lc 1, 30,33
[x]  Lc 1, 34
[xi] Lc 1, 35
[xii] Is 7, 14.
[xiii] Lc 1, 38
[xiv] Na antiguidade, quando está plenamente vigente a escravatura, é onde se deve avaliar a força e o sentido desta expressão de Maria. O escravo não tinha outra vontade nem outro querer que o do seu amo. Vive para o seu dono e está de modo permanente ao seu serviço, sem horas fixas de dedicação e sem condições. Assim a Virgem, assim cada cristão que queira seguir Cristo. (Francisco Fernandez Carvajal, Vida de Jesus, Barbosa & Xavier, Lda - Artes Gráficas, pg. 45)
[xv] S. Josemaría Escrivá, Caminho, nr 512
[xvi] S. Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, nr 173
[xvii] Bíblia Sagrada, anotada pela Fac. de Teologia da Univ. de Navarra, Comentário Lc 1,38
[xviii]  Lc 1, 38
[xix] Pois n'Ele elegeu-nos antes da criação do mundo para que fôssemos santos Ef 1, 4-6
[xx] cfr. Beato Josemaría, Caminho, nrs 251 a 254
[xxi] Lc 1, 28
[xxii] cfr. S. Josemaría Escrivá, Forja 769
[xxiii] cfr. Paulo VI, Discurso em Fátima, 13.05.19