Cartas
de São Paulo
2.ª Tessalonicenses - 4
Os falsos mestres –
1
O Espírito diz abertamente que, nos últimos tempos, alguns hão-de apostatar da
fé, dando ouvidos a espíritos enganadores e a doutrinas diabólicas, 2 seduzidos
pela hipocrisia de mentirosos, cuja consciência foi marcada com ferro em brasa.
3 Proibirão o casamento e o uso de alimentos, que Deus criou para serem
consumidos em acção de graças, pelos que têm fé e conhecem a verdade. 4 Pois
tudo o que Deus criou é bom e nada deve ser rejeitado, quando tomado com acção
de graças. 5 Com efeito, tudo é santificado pela palavra de Deus e pela oração.
Modelo dos fiéis –
6
Expondo estas coisas aos irmãos, serás um bom servo de Cristo Jesus, alimentado
com as palavras da fé e da boa doutrina que tão diligentemente tens seguido. 7 Mas
rejeita as fábulas ímpias, coisa de comadres. Exercita-te na piedade. 8 O
exercício físico de pouco serve, mas a piedade é útil para tudo, pois tem a
promessa da vida presente e da futura. 9É
digna de fé e de toda a aceitação esta palavra. 10 Pois se nós trabalhamos e
lutamos, é porque pomos a nossa esperança no Deus vivo, que é o Salvador de
todos os homens, sobretudo dos que crêem. 11 Eis o que deves proclamar e
ensinar. 12 Ninguém escarneça da tua juventude; antes, sê modelo dos fiéis, na
palavra, na conduta, no amor, na fé, na castidade. 13 Enquanto aguardas a minha
chegada, aplica-te à leitura, à exortação, ao ensino. 14 Não descures o carisma
que está em ti, e que te foi dado através de uma profecia, com a imposição das
mãos dos presbíteros. 15 Toma a peito estas coisas e persevera nelas, a fim de
que o teu progresso seja manifesto a todos. 16 Cuida de ti mesmo e da doutrina,
persevera nestas coisas, porque, agindo assim, salvar-te-ás a ti mesmo e aos
que te ouvirem.
Amigos de Deus
239
Voltemos
os nossos olhos para Jesus Cristo, que É o nosso modelo, o espelho em que nos
devemos olhar.
Como
se comporta, mesmo exteriormente, nas grandes ocasiões? Que nos diz dEle o
Santo Evangelho?
Comove-me
essa disposição habitual de Cristo, que recorre ao Pai antes dos grandes
milagres e o Seu exemplo, ao retirar-Se quarenta dias e quarenta noites para o
deserto, antes de iniciar a Sua vida pública, para rezar.
É
muito importante - perdoai a minha insistência - observar os passos do Messias,
porque Ele veio mostrar-nos o caminho que nos leva ao Pai: Descobriremos, com Ele,
como se pode dar relevo sobrenatural às actividades aparentemente mais
pequenas; aprenderemos a viver cada instante com vibração de eternidade e
compreenderemos com maior profundidade que a criatura precisa desses tempos de
conversa íntima com Deus, para privar com Ele na Sua intimidade, para invocá-Lo,
para ouvi-Lo ou, simplesmente, para estar com Ele.
Há
já muitos anos, considerando este modo de proceder do meu Senhor, cheguei à
conclusão de que o apostolado, seja ele de que tipo for, consiste numa
superabundância da vida interior.
Por
isso me parece tão natural, e tão sobrenatural, essa passagem em que se relata
como Cristo decidiu escolher definitivamente os primeiros doze.
Conta
São Lucas que, antes, tinha passado toda a noite em oração. Vede-o também em
Betânia.
Quando
Se dispõe a ressuscitar Lázaro, depois de ter chorado pelo amigo, levanta os
olhos ao céu e exclama: «Pai, dou-te
graças porque me tens ouvido.»
Este
foi o seu ensinamento preciso: Se queremos ajudar os outros, se pretendemos
sinceramente animá-los a descobrir o autêntico sentido do seu destino na terra,
é preciso que nos fundamentemos na oração.
240
São
tantas as cenas em que Jesus Cristo fala com o Seu Pai, que se torna quase
impossível determo-nos em todas.
Mas
penso que não podemos deixar de considerar as horas, tão intensas, que
precederam a Sua Paixão e Morte, quando Se prepara para consumar o Sacrifício
que nos reconduzirá ao Amor Divino.
Na
intimidade do Cenáculo o Seu Coração transborda, dirige-Se suplicante ao Pai,
anuncia a vinda do Espírito Santo, anima os Seus a um contínuo fervor de
caridade e de fé.
Esse
fervoroso recolhimento do Redentor continua em Getsémani, quando Se apercebe de
que já está iminente a Paixão, com as humilhações e as dores que se aproximam,
essa Cruz dura, onde suspendem os malfeitores e que Ele desejou ardentemente.
«Pai,
se é do teu agrado, afasta de mim este cálice.»
E
logo a seguir: «não se faça, contudo, a
minha vontade, mas a tua.» Mais tarde, pregado ao madeiro, só, com os
braços estendidos num gesto de sacerdote eterno, continua a manter o mesmo
diálogo com o Seu Pai: «Nas Tuas mãos encomendo o meu espírito.»
241
Contemplemos
agora a Sua Mãe bendita, também nossa Mãe.
No
Calvário, junto ao patíbulo, reza.
Não
é uma atitude nova em Maria.
Assim
se conduziu sempre, cumprindo os seus deveres, ocupando-se do seu lar.
Enquanto
estava nas coisas da terra, permanecia pendente de Deus. Cristo, perfectus Deus, perfectus homo, quis que
também a Sua Mãe, a criatura mais excelsa, a cheia de graça, nos confirmasse
nesse afã de elevar sempre o olhar para o amor divino.
Recordai
a cena da Anunciação: Desce o arcanjo para comunicar a divina embaixada - a
mensagem de que seria Mãe de Deus - e encontra-a retirada em oração.
Maria
está totalmente recolhida no Senhor, quando São Gabriel a saúda: «Deus te salve, oh cheia de graça! O Senhor é
contigo».
Dias
depois, irrompe na alegria do Magnificat
- esse cântico mariano que nos transmitiu o Espírito Santo pela delicada
fidelidade de São Lucas - fruto da intimidade habitual da Virgem Santíssima com
Deus.
A
nossa Mãe meditou longamente as palavras das mulheres e dos homens santos do
Antigo Testamento, que esperavam o Salvador, e os acontecimentos de que foram
protagonistas.
Admirou
o cúmulo de prodígios e o excesso da misericórdia de Deus com o seu povo,
tantas vezes ingrato.
Ao
considerar esta ternura do Céu, incessantemente renovada, brota o afecto do seu
Coração imaculado: “a minha alma
glorifica o Senhor; e o meu espírito exulta em Deus, meu Salvador. Porque
lançou os olhos para a baixeza da sua escrava.”
Os
filhos desta boa Mãe, os primeiros cristãos, aprenderam com Ela, e nós também
podemos e devemos aprender.
242
Nos
Actos dos Apóstolos narra-se uma cena que me encanta, porque apresenta um
exemplo claro e sempre actual: perseveravam todos na doutrina dos Apóstolos, na
comum fracção do pão e na oração.
É
uma nota insistente no relato da vida dos primeiros seguidores de Cristo: “Todos, animados por um mesmo espírito,
perseveravam juntos em oração.”
E
quando Pedro é preso por pregar audazmente a verdade, decidem rezar: «Entretanto
a Igreja fazia sem cessar oração a Deus por ele.»
A
oração era então, como hoje, a única arma, o meio mais poderoso para vencer nas
batalhas da luta interior.
“Há
entre vós alguém que esteja triste? Que
se recolha em oração.”
E São
Paulo resume: “orai sem cessar, nunca vos
canseis de implorar.”
243
Como fazer oração
Como
fazer oração?
Atrevo-me
a assegurar, sem temor de me enganar, que há muitas, infinitas maneiras de
orar.
Mas
eu preferia para todos nós a autêntica oração dos filhos de Deus, não o
palavreado dos hipócritas que hão-de ouvir de Jesus: «nem todo o que me diz, Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus.»
“Os
que são movidos pela hipocrisia podem talvez conseguir o ruído da oração” - escrevia Santo Agostinho – “mas não a sua voz, porque aí falta vida e há
ausência de afã por cumprir a Vontade do Pai.”
Que
o nosso clamor - Senhor! - vá unido ao desejo eficaz de converter em realidade
essas moções interiores, que o Espírito Santo desperta na nossa alma.
Temos
de nos esforçar para que da nossa parte não fique nem sombra de hipocrisia.
O
primeiro requisito para desterrar esse mal que o Senhor condena duramente, é
procurar comportar-se com a disposição clara, habitual e actual de aversão ao
pecado.
Com
fortaleza, com sinceridade, temos de sentir - no coração e na cabeça - horror
ao pecado grave.
E
também há-de ser nossa a atitude, profundamente arreigada, de abominar o pecado
venial deliberado, essas claudicações que não nos privam da graça divina, mas
que debilitam as vias através das quais ela nos chega.
244
Nunca
me cansei e, com a graça de Deus, nunca me cansarei de falar de oração.
Por
volta de 1930, quando se aproximavam de mim, sacerdote jovem, pessoas de todas
as condições - universitários, operários, sãos e doentes, ricos e pobres,
sacerdotes e leigos - que procuravam acompanhar mais de perto o Senhor,
aconselhava-os sempre: Rezai. E se algum me respondia: "não sei sequer
como começar", recomendava-lhe que se pusesse na presença do Senhor e Lhe
manifestasse a sua inquietação, a sua dificuldade, com essa mesma queixa:
"Senhor, não sei!"
E
muitas vezes, naquelas humildes confidências, concretizava-se a intimidade com
Cristo, um convívio assíduo com Ele.
Passaram
muitos anos e não conheço outra receita.
Se
não te consideras preparado, recorre a Jesus como faziam os Seus discípulos: «ensina-nos
a rezar».
Comprovarás
como o Espírito Santo ajuda a nossa fraqueza, pois que, não sabendo sequer o
que havemos de pedir nas nossas orações, nem como é conveniente
expressarmo-nos, o mesmo Espírito Santo facilita as nossas súplicas com gemidos
inexplicáveis, que não podem contar-se porque não existem modos apropriados
para descrever a sua profundidade.
Que
firmeza deve produzir em nós a Palavra divina!
Não
inventei nada, quando - ao longo do meu ministério sacerdotal - repeti e repito
incansavelmente esse conselho.
Foi
recolhido da Escritura Santa, daí o aprendi: Senhor, não sei dirigir-me a Ti!
Senhor, ensina-nos a orar!
E
vem toda a assistência amorosa - luz, fogo, vento impetuoso - do Espírito
Santo, que ateia a chama e a torna capaz de provocar incêndios de amor.