Oração
Tenho tanto que agradecer que me perco como um pateta.
Procuro belas palavras em vez de abrir o coração de par em par e entregar-To
assim para que vejas como vibra. As minhas filhas que se desdobram em atenções
e cuidados, os meus netos que me enchem a alma de ternura e tanta gente que se
preocupa comigo, reza por mim, me telefona, me convida, enfim... que posso
dizer mais. A verdade é que nada me falta, tenho quanto preciso inclusive paz
económica. Merecimento, sei, que não tenho absolutamente nenhum e que tudo devo
à bondade do Senhor para com este pobre homem. Minha Mãe Imaculada ajuda-me a
ser agradecido!
O que me acontece não é obra do acaso.
O acaso não existe.
Seja o que for que acontece na minha vida tem uma
causa e é esta que deve precupar-me em descobrir.
MEDITAÇÃO
Santíssima
Virgem
Alegrias e Gozo
Anunciação do Anjo a Nossa Senhora
Salve,
ó cheia de graça! Foi com estas palavras que, Gabriel, o Anjo do Senhor se dirigiu
a ti, Maria de Nazaré. Tão longe estarias tu deste acontecimento. Decerto que,
desde pequenina, a oração constante, a simplicidade nos pensamentos e nos
actos, sem a mais leve mancha de malícia ou impudor, deverias sentir Deus muito
próximo, ao alcance da tua voz. Certamente que sim, pois acreditavas firmemente
que Ele te ouvia sempre e em cada momento. Mas a tua modéstia, a tua
simplicidade, a tua total e humilde submissão a teu Senhor, ao teu Deus, não
permitiriam nunca que essa possibilidade te ocorresse sequer. O Senhor Todo
Poderoso, o Criador do Céu e da Terra e de tudo quanto existe, enviar a Nazaré,
à tua casa humilde e simples, um Anjo Seu para te saudar! Que coisa mais
extraordinária. Sabias que Deus não era um Ser longínquo e distante, inacessível
aos homens. Constantemente tinha intervindo junto do povo eleito para comunicar
a Sua Vontade, os Seus desígnios. Mas, os Seus interlocutores tinham sido
sempre grandes personagens da História Humana: Abraão, Moisés, David, os
Profetas. E tu, pobre e humilde menina, recebias do Senhor uma graça
semelhante!? Logo no início o salve do Mensageiro te perturba. Salve, isto é,
alegra-te. Mas, mais: Oh! Cheia de graça!
Que saudação estranha e desusada que manifesta uma dignidade e honra que julgas
não merecer. Alegra-te Filha... de Jerusalém... o Senhor está no meio de ti.
Estes altíssimos louvores ferem o teu espírito humilde e, por isso a estas
palavras, ela perturbou-se e ficou a pensar que saudação seria aquela.
Mas, Gabriel é um Anjo do Senhor, e apercebe-se a tua confusão, talvez, o teu
natural temor. E sossega-te: Não tenhas receio, Maria. Conhecias bem
pelas Escrituras que lias e meditavas, o que significava esta saudação e
portanto, quando Gabriel evoca estas prerrogativas, entendeste claramente que
te era anunciado que irias ser a Mãe do Messias Salvador. Mas há ainda no teu
espírito esclarecido, não obstante a tua juventude, uma dúvida séria: Como
poderias tu, virgem humilde, teres sido escolhida para Mãe de Jesus Salvador
pelo próprio Deus a quem tinhas dedicado a tua virgindade?! E, não obstante a
tua humildade de jovem simples não deixas de interrogar: Como será isso, se
eu não conheço homem?! Ah! ... mas o Anjo tranquiliza-te: Virá sobre ti
o Espírito Santo, e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a Sua sombra.
Esta resposta corresponde também ao que nas Escrituras se revelava sobre o
aparecimento do Messias. «Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um filho a
quem será dado o nome de Emanuel, que quer dizer Deus connosco.» Não tinhas
mais dúvidas por isso nada mais perguntaste. Não quiseste saber como, quando,
porquê. Nada, nada absolutamente te interessava averiguar porque: «Heis aqui a escrava do Senhor: seja-me feito
segundo a tua palavra!» Assim, tal qual, tu, Senhora, a quem acabava de anunciado
seres eleita por Deus a maior, a mais sublime de entre as mulheres da Terra,
assim, com esta simplicidade que fere pela sua inteira singeleza, assim, tu
defines um coração puro, uma alma de Deus, uma total entrega ao Senhor. Por
isso Deus te escolheu. A Mãe do Salvador, do Deus feito homem, perfeito homem,
que haveria de morrer na Cruz para salvar todos os homens, num sacrifício
cruento, completo, total, não poderia senão expressar a aceitação pronta e
total da Vontade Divina. Faça-se a Tua Vontade de uma forma total e completa.
Não para meu bem, não para minha glória, não para benefício de quem quer que
seja, não... só e unicamente porque é a Tua Vontade Senhor; o resto não me
interessa... E, no entanto esta jovem era já a Mãe do Salvador, escolhida desde
o princípio dos tempos. Poderei eu, algum dia, alguma vez, do fundo do coração,
manifestar tal sentimento? Decerto que não. Quantas vezes que me proponho
aceitar a Vontade de Deus, mas reservando no meu íntimo, que ela esteja de
acordo com a minha vontade. Que se satisfaçam os meus desejos, que obtenha o
que quero do Senhor, que actue assim, como uma espécie de Deus privado, ao meu
serviço. Ah! Senhora minha, que maravilha a tua resposta, que espantosa a tua
entrega. Ajuda-me, querida Mãe, a dizer a cada momento sim ao Senhor. Instila
no meu coração de filho, porque és minha Mãe, esses sentimentos puros e
humildes, esse desprendimento das coisas, essa disponibilidade permanente para
ouvir e, ouvindo, dizer que sim aos desejos do Senhor. Desejo tanto ser honesto
comigo mesmo para poder ser honesto para com os outros e para com Deus. Não me
mentir, não me enganar, não me esconder atrás de falsas coisas, defeitos ou
virtudes, para me esquivar constantemente ao que me é pedido. E a Tua Vontade,
o Teu mandato, claríssimo é que eu seja santo. Não um dia, não qualquer dia,
agora - «nunc coepi - pois pode ser
que o amanhã me falte.» «Ave Cheia de
Graça, o Senhor está contigo.» Assim te falou o Anjo do Senhor. Ave minha
Mãe Santíssima. Ave, minha querida Mãe que estás no Céu, digo-te eu, com a
esperança, que é certeza, que me ouves e atenderás as minhas súplicas. Como tu,
também eu quero dizer “fiat”,
faça-se, «cumpra-se a justíssima e amabilíssima Vontade de Deus sobre todas as
coisas.» «Monstra te esse mater,
mostra que és mãe, ajuda-me e guia-me todos os dias da minha vida para que eu
seja um bom filho, sob o teumanto protector eu me abrigo certo que aí estarei a
salvo de todos os males e das torpezas que sou capaz.
Estava
próxima a hora de nasceres, Senhor, e como não havia lugar na hospedaria,
Tua Mãe santíssima, decerto preocupada, mas serenamente confiante, levou-te
ainda no seu seio para uma gruta que servia de estábulo. E aí nasceste Senhor.
O meu Deus, o meu Senhor, o meu Salvador! «Como
não havia lugar na hospedaria...»
Porque
não haveria lugar? Por a cidade estar cheia de forasteiros que ali iam
recensear-se? Por não aparentarem, aquela jovem mulher e o seu marido, posses
ou posição social? Sim, com um simples burrico por transporte, uma pequena
trouxa de magros pertences, não o seriam por certo. Talvez fosse por estas duas
principais razões, talvez. É um facto que a cidade estaria cheia de gente. Mas
então, Maria e José foram tão imprudentes que não esperaram uns dias até que Tu
nascesses para então fazerem a viagem!? Não procuraram assegurar estadia em
casa de algum parente ou conhecido! Não, não terão feito nada disto.
Provavelmente porque não podiam, as comunicações eram difíceis e, depois,
porque se tratava de duas criaturas de extrema simplicidade. Não era seu hábito
programar a vida, medir os passos, organizar em detalhe as coisas futuras. Com
uma confiança ilimitada na providência de Deus, sabiam perfeitamente que
haverias de nascer quando e onde quisesses, Senhor, e que haverias de prover
todas as necessidades que ocorressem. Mas não havia, de facto, lugar na
hospedaria? Não seria possível descobrir um pequeno recanto, uma água-furtada,
um esconso onde a jovem mãe pudesse, com recato e algum conforto, dar à luz o
seu Filho!? Quantas vezes, Senhor, eu não tive lugar para Ti? Quantas vezes!
Sempre cheio de coisas, de preocupações, ambições, desejos, devaneios, ouvi eu,
entendi eu que eras Tu ali, à porta do meu coração, pedindo um bocadinho, um
pequeno espaço, para poderes nascer! Quantas vezes quiseste nascer dentro de
mim e, eu, pobre de mim, não deixei, não quis! Ah! Senhor, eu sei que não sou
digno, mas uma simples palavra Tua e este pobre coração cheio de mazelas e
pecados, ficará radioso de brancura e Tu poderás, ainda que por momentos,
nascer dentro d'Ele. Bate, Senhor, com força à minha porta, eu abrir-te-ei e
deixar-te-ei entrar e aqui farás o teu Presépio. Não desejo outra coisa,
Senhor, senão sentir-Te dentro de mim, irradiando a Tua Paz e o Teu calor de
amor. Oh! Minha mãe, Maria Santíssima, descansa aqui um pouco, deixa-me por
momentos o teu Filho que eu O embalarei com o meu amor, a minha dedicação
inteira, a minha devoção profunda. Podes tu, José meu Pai e Senhor, confiar-me
o teu excelente Filho adoptivo, eu tomarei boa conta d'Ele, embora fique
estático e estarrecido por tamanha ventura e tão grande honra. Sei muito bem
que não sou digno, mas a minha alma anseia que assim seja.
Apresentação
de Jesus no Templo
Com
a humildade simples de sempre, foste, Senhora, cumprir a Lei: Passados os dias
estabelecidos depois do nascimento, a jovem Mãe tem de purificar-se no Templo e
levar O Recém Nascido para ser circuncidado. Pelo filho devem fazer uma oferta
para sustento do Templo, como nem tu nem José têm posses oferecerão um casal de
pombas ou rolas brancas. E tu, Senhora, foste purificar-te ao Templo! Tu, sem
mancha de pecado, sem qualquer defeito que pudesse macular a brancura do teu
coração e a limpidez da tua alma, não hesitaste um segundo em cumprir o que
estava escrito que os filhos da Casa de Israel fizessem! Quantas vezes eu não
pensei que estava dispensado de rezar mais, de me humilhar, de me declarar
disponível para o Senhor; quantas vezes não pensei comigo mesmo que sou melhor
que estes, porque eu faço, eu penso, eu desejo muito mais e melhor! Tudo porque
o meu coração tem uma carapaça que turva a sua limpidez. A minha alma cheia de
equimoses de pecados antigos e recentes; feridas e lanhos de defeitos que não
consigo rebater nem ultrapassar. Não consigo porque não dedico a essa luta um
esforço humilde, continuado e perseverante que me leve a estar sempre pronto
para a luta contra a minha falta de carácter. Toda a tua vida, Senhora minha, é
uma lição de humildade simples e serena. Não fazes nada de extraordinário, não
dás nas vistas, não sobressais no meio das outras mulheres e, no entanto,
cumpres com alegria e simplicidade todas as prescrições da Lei como se tuas
obrigações fossem. E nisto está o teu segredo, Maria: Cumprir o que Deus manda,
sem discutir, sem argumentar, a tempo e horas, quando e como deve ser feito.
Esta singela disponibilidade cumpridora dos deveres é sem dúvida, a
característica mais extraordinária da Mãe do meu Senhor e minha Mãe. Não a
vemos nunca em êxtase em frente das multidões, sentada numa cadeira especial,
ou nos primeiros lugares das assembleias. Não. Uma mulher simples, em que as
coisas, os actos e as palavras não são estudados ou arquitectados de acordo e
com conveniências ou objectivos. Apenas uma serena certeza: Obedecer com
prontidão e total disponibilidade. E, no entanto, esta mulher é a Mãe de Deus!
Que lugar mais alto, que maior honra, que pergaminho, que nome ilustre pode
comparar-se: A Mãe de Deus! Ah
Senhora minha, conseguiste com a tua serena calma, impor ao mundo um nome doce e
vigoroso ao mesmo tempo que se nos coloca na boca com amoroso deleite, ou com
esperançada angústia? Nos nossos lábios um último grito, um último apelo, dos
aflitos, dos que sofrem, dos que, em último recurso, para ti apelam. Dos que,
acabrunhados pela dor buscam lenitivo. Dos que, esmagados pela alegria te
agradecem. Dos que, como eu, doidos de amor apenas pronunciam o teu nome
lentamente, deixando-o ecoar por todo o seu ser até ao mais profundo do seu
coração. Obedecer. Obedecer prontamente, sem hesitações ou desvios. Não dai a
pouco, ou mais logo quando houver mais tempo, mais sossego, melhor luz… todas
as mil desculpas que invento para adiar o que tem de ser feito já. Obedecer! É
isto, Senhora, que procuro. É isto, Senhora, que quero: Obedecer. Para isso,
bem o sei, preciso expurgar de mim todos os invólucros que me cingem, as
preocupações com coisas pequenas, as cobardias constantes, as faltas de
atenção, as interrupções, os devaneios. Para isto é preciso estar pronto. Só
tu, Senhora minha, podes ajudar-me a conseguir este estado de alma. Só tu podes
ajudar-me a eliminar tudo aquilo que tenho a mais e que tanto é, que não me
deixa ver o essencial, o que realmente vale a pena. A ti recorro, Mãe
Santíssima, para que me conduzas pela mão ao Templo da Purificação, onde eu,
com os olhos finalmente libertos de escamas e o coração nu, de fora do peito,
veja com toda a clareza a Vontade de Deus meu Senhor. Tenho a certeza que serei
também purificado e o fogo interior que se me acende no peito, incendiará todo
o meu ser, purificando-me assim de todas as minhas faltas.
Jesus perdido e achado no Templo
A
primeira prova! A primeira dor! Como o teu coração amantíssimo de Mãe estaria
angustiado e compungido com a ausência do teu Filho! E a demora em encontrá-lo?
Ao teu espírito deveriam acorrer as palavras de Simeão e, mesmo sabendo que Ele
tinha uma missão a cumprir, não deixavas de sentir aquele aperto no coração que
uma mãe sente quando um filho pequeno desaparece sem explicação e não consegue
encontrá-lo. Onde poderia estar? Eu, que ando por esta vida, tantas vezes, à
procura de Jesus que, por vezes, parece que Se afasta de mim para bem longe,
também me sinto triste angustiado. Porquê? Porque Te afastasTe Senhor de mim? E
mergulho dentro de mim mesmo, única forma séria de reflectir, e chego sempre à
triste conclusão que, não foste Tu quem Se afastou mas, sim, eu que me ausentei
da Tua presença. Tenho tantas coisas em que pensar; enormes preocupações que me
consomem por dentro; inúmeros desejos por satisfazer; caminhos que quero tanto
percorrer embora saiba que não interessam e não conduzem a nada que valha a
pena. E, depois, são estas coisas todas que possuo – que julgo possuir – e as
muitas outras que anseio vir a ter, que me mantêm agarrado ao meu lugar,
estático e imóvel enquanto, Tu, caminhas sempre, esperando que Te siga. Vou
ficando para trás, preso a tudo isto que não vale nada e para nada interessa e
vejo-Te esfumar no horizonte e, em vez de correr pressuroso atrás de Ti,
fico-me inerte e como que morto. Parece-me que Te oiço com as palavras de Tua
Mãe: «Filho, porque procedeste assim
connosco?» Porque Te deténs no caminho? Anda que, eu, estou á Tua espera! E
fico-me sem reposta, pois que Te hei-de eu dizer a não ser confessar a minha
fraqueza, a mostrar-Te humildemente o pouco que sou, a pedir-Te que esperes por
mim, que não Te afastes mais, que quero ir conTigo. Sou tão feliz porque me
ouves e deténs o passo e ficas, num gesto acolhedor, de amigo íntimo, à espera
que eu, finalmente, volte para o pé de Ti. É então que me dou conta da enorme
desventura que é a Tua ausência, o não Te ter presente bem ao pé de mim e, como
compreendo a Tua Mãe na sua procura ansiosa pelas ruas de Jerusalém durante
esses três dias de alvoroço. Digo-lhe, então, com o coração nas mãos: Minha
Mãe, não deixes que me afaste nunca do teu Filho, do nosso Jesus. Ensina-me a
procurá-Lo onde Ele deverá estar à minha espera, em vez de andar perdido
tentando encontrá-Lo onde Ele não pode estar. Leva-me pela tua mão – também sou
teu filho, um filho pequeno – ao encontro Dele para que, juntos, possamos
sossegar na Sua companhia.