ACTOS
DOS APÓSTOLOS
II.
EXPANSÃO DA IGREJA FORA DE JERUSALÉM
7 Discurso de Estêvão –
1
Depois, o Sumo Sacerdote perguntou-lhe: «Isso é verdade?» 2 Ele respondeu: «Irmãos
e pais, escutai! O Deus da glória apareceu a nosso pai Abraão, quando ele
estava na Mesopotâmia, antes de se ter estabelecido em Haran, 3 e disse-lhe:
'Deixa a tua terra e a tua parentela e vai para a terra que te hei-de mostrar.'
4 Abandonou, então, o país dos caldeus, e foi estabelecer-se em Haran. Daí, após
a morte do pai, Deus fê-lo emigrar para esta terra que habitais agora. 5 Não
lhe deu aí propriedade alguma, nem mesmo um palmo de terra, mas prometeu-lhe a
posse dela, a ele e, depois, à sua descendência, embora não tivesse sequer um
filho. 6 E Deus afirmou-lhe que a sua descendência habitaria em terra estranha,
que a reduziriam à escravidão e que seria maltratada, durante quatrocentos
anos. 7 'Mas o povo de quem forem escravos, hei-de Eu julgá-lo, disse Deus.
Depois disso, hão-de sair e prestar-me culto neste lugar.' 8 Em seguida,
deu-lhe a aliança da circuncisão. Foi assim que Abraão gerou Isaac e o
circuncidou, ao oitavo dia. E Isaac fez o mesmo a Jacob, e Jacob aos doze
patriarcas. 9 Os patriarcas, invejosos de José, venderam-no, a fim de ser
levado para o Egipto. Mas Deus estava com ele: 10 livrou-o de todas as provas e
deu-lhe graça e sabedoria diante do faraó, rei do Egipto, que o nomeou
governador desse país e de toda a sua casa. 11 Veio depois a fome sobre todo o
Egipto e sobre Canaã. A angústia era grande e os nossos pais não encontravam
nada para comer. 12 Ouvindo dizer que no Egipto havia trigo, Jacob mandou lá os
nossos pais, uma primeira vez. 13 À segunda vez, José deu-se a conhecer a seus
irmãos e sua origem foi revelada ao Faraó. 14 José mandou então buscar seu pai
Jacob e toda a sua parentela, composta de setenta e cinco pessoas. 15 Jacob
desceu ao Egipto e lá morreu, assim como os nossos pais. 16 Os seus corpos
foram trasladados para Siquém e depositados no sepulcro que Abraão adquirira,
por uma importância em prata, aos filhos de Emor, em Siquém. 17 Enquanto se
aproximava o tempo em que deveria realizar-se a promessa feita por Deus a
Abraão, o povo cresceu e multiplicou-se no Egipto, 18 até que subiu ao trono do
Egipto um novo rei, que não tinha conhecimento de José. 19 Usando de astúcia
para com a nossa raça, esse rei perseguiu os nossos pais, até ao ponto de os
fazer expor os recém-nascidos, para os privar da vida. 20 Nessa altura nasceu
Moisés, que era agradável aos olhos de Deus. Foi criado durante três meses em
casa de seu pai. 21Depois, tendo sido exposto, a filha do Faraó recolheu-o e
criou-o como seu próprio filho. 22 Moisés foi iniciado em toda a ciência dos
egípcios, e era poderoso em palavras e obras. 23Quando completou os quarenta
anos, veio-lhe ao espírito a ideia de visitar seus irmãos, os filhos de Israel.
24 Ao ver um deles maltratado, tomou a sua defesa e vingou o oprimido, matando
o egípcio. 25 Pensava que os seus irmãos compreenderiam ser Deus quem, por sua
mão, lhes trazia a liberdade, mas não o compreenderam. 26 No dia seguinte,
apareceu a dois deles que lutavam, e pretendeu reconciliá-los, dizendo: 'Sendo
irmãos, porque vos agredis um ao outro?' 27 Então, aquele que agredia o
companheiro repeliu-o, dizendo: 'Quem te nomeou nosso chefe e nosso juiz. 28 Queres
matar-me como ontem mataste o egípcio?' 29 A essas palavras, Moisés fugiu e foi
residir, como estrangeiro, para a terra de Madian, onde teve dois filhos. 30 Ao
fim de quarenta anos, apareceu-lhe um Anjo no deserto do monte Sinai, na chama
de uma sarça ardente. 31 Perante essa aparição, Moisés ficou estupefacto e,
aproximando-se para observar melhor, fez-se ouvir a voz do Senhor: 32 'Eu sou o
Deus de teus pais, o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob.' A tremer, Moisés não
ousava erguer os olhos. 33 Então, o Senhor disse-lhe: 'Tira as sandálias dos
pés, porque o lugar em que te encontras é uma terra santa. 34 Eu vi a angústia
do meu povo no Egipto, ouvi os seus gemidos e desci para o libertar. E, agora,
vem cá, pois vou mandar-te ao Egipto.' 35 Este Moisés, que eles renegaram,
dizendo: 'Quem te nomeou chefe e juiz', é este que foi enviado por Deus como
chefe e libertador pela mão do anjo que lhe apareceu na sarça. 36 Foi ele que
os fez sair do Egipto, realizando prodígios e milagres na terra do Egipto, no
Mar Vermelho e no deserto, durante quarenta anos. 37 Foi ele, Moisés, quem
disse aos filhos de Israel: 'Deus fará surgir um profeta como eu, entre os
vossos irmãos.' 38 Foi ele que, durante a assembleia no deserto, esteve entre o
Anjo, que lhe falava no monte Sinai, e os nossos pais; foi ele que recebeu as
palavras de vida, para no-las transmitir. 39 Foi a ele que os nossos pais se
recusaram a obedecer, antes o repeliram, voltando em seus corações ao Egipto 40
e dizendo a Aarão: 'Faz-nos deuses que marchem à nossa frente, pois desse
Moisés que nos fez sair do Egipto, não sabemos o que foi feito dele.' 41 E,
nesses dias, construíram um bezerro, ofereceram um sacrifício ao ídolo e
festejaram alegremente a obra das suas próprias mãos. 42 Deus, então,
afastou-se deles e entregou-os ao culto do exército celeste, como está escrito
no Livro dos Profetas: 'Oferecestes-me, porventura, vítimas e sacrifícios durante
quarenta anos, no deserto, ó Casa de Israel? 43 Vós transportastes a tenda de
Moloc e a estrela do deus Refan, imagens que fizestes para as adorar! Por isso,
exilar-vos-ei para além da Babilónia.' 44 Os nossos pais tinham no deserto a
tenda do testemunho, como ordenara aquele que disse a Moisés que a construísse
de harmonia com o modelo por ele visto. 45 Foi precisamente essa tenda que os
nossos pais receberam e introduziram, sob o comando de Josué, no território
conquistado aos povos que Deus expulsou na sua frente, e assim se manteve até
aos dias de David. 46 Este achou graça diante de Deus e pediu para edificar uma
habitação ao Deus de Jacob. 47 Foi, porém, Salomão quem lhe construiu uma casa.
48 Mas o Altíssimo não habita em casas erguidas pela mão do homem, como diz o
profeta: 49 'O Céu é o meu trono e a Terra, estrado dos meus pés. Que casa me
haveis de construir, diz o Senhor, e qual será o lugar do meu repouso? 50 Não
foi a minha mão que fez todas as coisas?' 51 Homens de cerviz dura,
incircuncisos de coração e de ouvidos, sempre vos opondes ao Espírito Santo;
como foram os vossos pais, assim sois vós também. 52 Qual foi o profeta que os
vossos pais não tenham perseguido? Mataram os que predisseram a vinda do Justo,
a quem traístes e assassinastes, 53 vós, que recebestes a Lei pelo ministério
dos anjos, mas não a guardastes!»
Martírio de Estêvão –
54
Ao ouvirem tais palavras, encheram-se intimamente de raiva e rangeram os dentes
contra Estêvão. 55 Mas este, cheio do Espírito Santo e de olhos fixos no Céu,
viu a glória de Deus e Jesus de pé, à direita de Deus. 56 «Olhai, disse ele, eu
vejo o Céu aberto e o Filho do Homem de pé, à direita de Deus.» 57 Eles, então,
soltaram um grande grito e taparam os ouvidos; depois, à uma, atiraram-se a ele
58 e, arrastando-o para fora da cidade, começaram a apedrejá-lo. As testemunhas
depuseram as capas aos pés de um jovem chamado Saulo. 59 E, enquanto o
apedrejavam, Estêvão orava, dizendo: «Senhor Jesus, recebe o meu espírito.» 60 Depois,
posto de joelhos, bradou com voz forte: «Senhor, não lhes atribuas este pecado.»
Dito isto, adormeceu.
"Christus
vivit": Exortação Apostólica aos Jovens
Capítulo
I
O
QUE A PALAVRA DE DEUS DIZ SOBRE OS JOVENS?
No
Novo Testamento
12.
Conta uma parábola de Jesus (cf. Lc 15, 11-33) que o filho «mais jovem» quis
partir da casa paterna para um país distante (cf. 15, 12-13).
Mas,
os seus sonhos de autonomia transformaram-se em libertinagem e devassidão (cf.
15, 13), e provou a dureza da solidão e da pobreza (cf. 15, 14-16). Todavia,
foi capaz de reconsiderar e começar de novo (cf. 15, 17-19): decidiu
levantar-se (cf. 15, 20).
É
típico do coração jovem estar disposto a mudar, ser capaz de levantar-se e
deixar-se instruir pela vida.
Como
não acompanhar o filho nesta nova tentativa?
Mas
o irmão mais velho já tinha o coração envelhecido e deixou-se possuir pela
ganância, o egoísmo e a inveja (cf. 15, 28-30).
Jesus
louva mais o jovem pecador que retoma o bom caminho do que aquele que se julga
fiel, mas não vive o espírito do amor e da misericórdia.
13.
Jesus, o eternamente jovem, quer dar-nos um coração sempre jovem. Assim no-lo
pede a Palavra de Deus: «Purificai-vos do velho fermento, para serdes uma nova
massa» (1 Cor 5, 7).
Ao
mesmo tempo convida-nos a despojar-nos do «homem velho» para nos revestirmos do
«homem novo» (Col 3, 9.10), do homem jovem[1].
E,
quando quer explicar o que é revestir-se desta juventude que «não cessa de se
renovar» (3, 10), diz que significa ter «sentimentos de misericórdia, de
bondade, de humildade, de mansidão, de paciência, suportando-vos uns aos outros
e perdoando-vos mutuamente, se alguém tiver razão de queixa contra outro» (3,
12-13).
Isto
significa que a verdadeira juventude é ter um coração capaz de amar. Pelo contrário,
aquilo que envelhece a alma é tudo o que nos separa dos outros. Por isso mesmo
conclui: «Acima de tudo isto, revesti-vos do amor, que é o laço da perfeição»
(3, 14).
14.
Notemos que Jesus não gostava que os adultos olhassem com desprezo para os mais
jovens ou os mantivessem, despoticamente, ao seu serviço. Pelo contrário,
pedia: «O que for maior entre vós seja como o menor» (Lc 22, 26).
Para
Ele, a idade não estabelecia privilégios; e o facto de alguém ter menos anos
não significava que valesse menos ou tivesse menor dignidade.
15.
A Palavra de Deus diz que os jovens devem ser tratados «como irmãos» (1 Tm 5,
1), e recomenda aos pais: «Não irriteis os vossos filhos, para que não caiam em
desânimo» (Col 3, 21).
Um
jovem não pode estar desanimado; é próprio dele sonhar coisas grandes, buscar
horizontes amplos, ousar mais, ter vontade de conquistar o mundo, ser capaz de
aceitar propostas desafiadoras e desejar contribuir com o melhor de si mesmo
para construir algo superior. Por isso, insisto com os jovens para não deixarem
que lhes roubem a esperança, repetindo a cada um: «Ninguém escarneça da tua
juventude» (1 Tm 4, 12).
16.
Ao mesmo tempo, porém, recomenda-se aos jovens: «Sede submissos aos anciãos» (1
Ped 5, 5).
A
Bíblia convida sempre a um respeito profundo pelos idosos, porque abrigam um
tesouro de experiência, experimentaram os êxitos e os fracassos, as alegrias e
as grandes tribulações da vida, as esperanças e as desilusões, e, no silêncio
do seu coração, guardam tantas histórias que nos podem ajudar a não errar nem
enganar-nos com falsas miragens. A palavra dum idoso sábio convida a respeitar
certos limites e a saber-se dominar a tempo: «Exorta igualmente os jovens a
serem moderados» (Tit 2, 6).
Não
é bom cair no culto da juventude, nem numa postura juvenil que despreze os
outros pelos seus anos ou porque são de outro tempo. Jesus dizia que a pessoa
sábia é capaz de tirar do seu tesouro coisas novas e velhas (cf. Mt 13, 52).
Um
jovem sábio abre-se ao futuro, mas permanece capaz de valorizar algo da
experiência dos outros.
17.
No Evangelho de Marcos, aparece uma pessoa que, ao ouvir Jesus recordar-lhe os
mandamentos, exclama: «Tenho cumprido tudo isso desde a minha juventude» (10,
20). Já o dizia o Salmo: «Tu és a minha esperança, ó Senhor Deus, e a minha
confiança desde a juventude. (...) Instruíste-me, ó Deus, desde a minha
juventude e até hoje anunciei sempre as tuas maravilhas» (71/70, 5.17).
Nunca
nos arrependeremos de gastar a própria juventude a fazer o bem, abrindo o
coração ao Senhor e vivendo contracorrente. De tudo isto, nada nos tira a
juventude, antes fortalece-a e renova-a: «É [o Senhor] quem (…) te rejuvenesce
como a águia» (Sal 103/102, 5).
Por
isso, Santo Agostinho lamentava-se: «Tarde Vos amei, ó beleza tão antiga e tão
nova! Tarde Vos amei!»[2]
Mas
aquele homem rico, que fora fiel a Deus na sua juventude, deixou que os anos
lhe roubassem os sonhos, preferindo ficar agarrado aos seus bens (cf. Mc 10,
22).
18.
Entretanto, na passagem paralela do Evangelho de Mateus, aparece um jovem (cf.
Mt 19, 20.22) que se aproxima de Jesus desejoso de mais (cf. 19, 20), com
aquele espírito aberto típico dos jovens, que busca novos horizontes e grandes
desafios. Na realidade, o seu espírito já não era assim tão jovem, porque se
apegara às riquezas e comodidades. Com a boca, dizia querer algo mais, mas,
quando Jesus lhe pede para ser generoso e distribuir os seus bens, deu-se conta
de que não era capaz de desprender-se do que possuía. «Ao ouvir isto, o jovem
retirou-se contristado» (19, 22). Renunciara à sua juventude.
19.
O Evangelho fala-nos também de algumas jovens prudentes que estavam prontas e
vigilantes, enquanto outras viviam distraídas e adormentadas (cf. Mt 25, 1-13).
Com efeito, é possível transcorrer a própria juventude distraído, planando à superfície
da vida, dormindo, incapaz de cultivar relações profundas e entrar no coração da
vida; deste modo, porém, prepara-se um futuro pobre, sem substância. Ou, pelo
contrário, pode gastar-se a juventude cultivando coisas nobres e grandes e,
assim, preparar um futuro cheio de vida e riqueza interior.
20.
Se perdeste o vigor interior, os sonhos, o entusiasmo, a esperança e a
generosidade, diante de ti está Jesus, como parou diante do filho morto da
viúva, e o Senhor, com todo o seu poder de Ressuscitado, exorta-te: «Jovem, Eu
te ordeno: Levanta-te!» (Lc 7, 14).
21.
Há, sem dúvida, muitos outros textos da Palavra de Deus que nos podem iluminar
acerca desta fase da vida. Analisaremos alguns deles nos próximos capítulos.
Capítulo
II
JESUS
CRISTO SEMPRE JOVEM
22.
Jesus é «jovem entre os jovens, para ser o exemplo dos jovens e consagrá-los ao
Senhor»[3].
Por
isso, o Sínodo disse que «a juventude é um período original e estimulante da
vida, que o próprio Jesus viveu, santificando-a»[4].
Que
nos refere o Evangelho sobre a juventude de Jesus?
A
juventude de Jesus
23.
O Senhor «entregou o seu espírito» (Mt 27, 50) numa cruz, quando tinha pouco
mais de 30 anos de idade (cf. Lc 3, 23). É importante tomar consciência de que
Jesus foi um jovem. Deu a sua vida numa fase que hoje se define como a dum
jovem adulto. Em plena juventude, começou a sua missão pública e, assim,
brilhou «uma grande luz» (Mt 4, 16), sobretudo quando levou até ao extremo o
dom da sua vida. Este final não foi improvisado, mas teve uma preciosa preparação
em toda a sua juventude, em cada um dos seus momentos, porque «tudo, na vida de
Jesus, é sinal do seu mistério»[5] e «toda a vida de Cristo é mistério de
redenção»[6].
24.
O Evangelho não fala da meninice de Jesus, mas conta-nos alguns factos da sua adolescência
e juventude. Mateus coloca este período da juventude do Senhor entre dois episódios:
o regresso da sua família a Nazaré, depois do tempo de exílio, e o seu baptismo
no Jordão, onde começou a sua missão pública. As últimas imagens de Jesus menino
são a dum pequeno refugiado no Egipto (cf. Mt 2, 14-15) e, depois, a dum
repatriado em Nazaré (cf. Mt 2, 19-23). As primeiras imagens de Jesus, jovem
adulto, são as que no-Lo apresentam na multidão ao pé do rio Jordão, para ser
baptizado pelo primo João Baptista, como qualquer um do seu povo (cf. Mt 3,
13-17).
25.
Aquele baptismo não era como o nosso, que nos introduz na vida da graça, mas
foi uma consagração antes de começar a grande missão da sua vida. O Evangelho
diz que o seu baptismo foi motivo de júbilo e comprazimento do Pai: «Tu és o
meu Filho muito amado» (Lc 3, 22). Imediatamente Jesus apareceu cheio do
Espírito Santo e foi levado pelo Espírito ao deserto. Assim, estava pronto para
ir pregar e fazer prodígios, libertar e curar (cf. Lc 4, 1-14). Cada jovem,
quando se sente chamado a cumprir uma missão nesta terra, é convidado a reconhecer
dentro de si as mesmas palavras que Deus Pai dissera a Jesus: «Tu és o meu
filho muito amado».
26.
No intervalo entre estes dois episódios, aparece um que mostra Jesus em plena
adolescência: quando regressou para Nazaré com seus pais, depois que estes O
perderam e reencontraram no Templo (cf. Lc 2, 41-51). Em Nazaré, diz o texto
que Jesus «era-lhes submisso» (Lc 2, 51), pois não tinha rejeitado a sua
família. Então Lucas acrescenta que «Jesus crescia em sabedoria, em estatura e
em graça diante de Deus e dos homens» (2, 52). Por outras palavras, estava-Se
preparando e, naquele período, ia aprofundando a sua relação com o Pai e com os
outros. São João Paulo II explicou que não crescia apenas fisicamente, mas
«houve em Jesus também um crescimento espiritual», porque «a plenitude de graça
em Jesus era relativa à idade: havia sempre plenitude, mas uma plenitude
crescente com o crescer da idade»[7].
27.
Com base nestes dados evangélicos, podemos afirmar que Jesus, na sua fase
juvenil, foi-Se «formando», foi-Se preparando para realizar o projecto que o
Pai tinha. A sua adolescência e juventude orientaram-n'O para esta missão
suprema.
28.
Na adolescência e juventude, a sua relação com o Pai era a do Filho muito
amado; atraído pelo Pai, crescia ocupando-Se das coisas d’Ele: «Não sabíeis que
devia estar em casa de meu Pai?» (Lc 2, 49).
Mas
não devemos pensar que Jesus fosse um adolescente solitário ou um jovem fechado
em si mesmo. A sua relação com as pessoas era a dum jovem que compartilhava a
vida inteira duma família bem integrada na aldeia. Aprendera o ofício do pai e,
depois, substituiu-o como carpinteiro. Por isso no Evangelho, uma vez, é
chamado «o filho do carpinteiro» (Mt 13, 55) e, outra, simplesmente «o
carpinteiro» (Mc 6, 3).
Este
detalhe mostra que era um rapaz da aldeia como os outros, relacionando-Se com
toda a normalidade. Ninguém O considerava um jovem estranho ou separado dos
outros. Por isso mesmo, quando Jesus começou a pregar, as pessoas não sabiam
explicar donde Lhe vinha aquela sabedoria: «Não é este o filho de José?» (Lc 4,
22).
29.
A verdade é que «Jesus também não cresceu numa relação fechada e exclusiva com
Maria e José, mas de bom grado movia-Se na família alargada, onde encontrava os
parentes e os amigos»[8].
Assim
se compreende que, ao regressar da peregrinação a Jerusalém, os pais estivessem
tranquilos pensando que aquele adolescente de doze anos (cf. Lc 2, 42) Se movia
livremente entre as pessoas a ponto de não O verem durante um dia inteiro:
«pensando que Ele Se encontrava na caravana, fizeram um dia de viagem» (Lc 2,
44).
Com
certeza - supunham eles -, Jesus estaria lá indo e vindo entre os demais,
brincando com os da sua idade, ouvindo as histórias dos adultos e
compartilhando as alegrias e tristezas da caravana. Para expressar a «caravana»
de peregrinos, Lucas usou o termo grego synodía, que indica precisamente esta
«comunidade em caminho», na qual se integrou a sagrada Família. Graças à
confiança que n’Ele depositam seus pais, Jesus move-Se livremente e aprende a
caminhar com todos os outros.
Franciscus
(Revisão
da versão portuguesa por AMA)
[1]
O mesmo termo grego que significa «novo», é usado para dizer «jovem».
[2] Confissões, X,
27: PL 32, 795.
[3] Documento Final
da XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (27/X/2018), 60. A partir
de agora, este documento será citado com a sigla DF. É possível consultá-lo no
site Vaticano do Sínodo dos Bispos: http://www.vatican.va/
[4] Santo Ireneu,
Contra as heresias, II, 22, 4: PG 7, 784.
[5] Catecismo da
Igreja Católica, 515
[6] Ibid., 517.
[7] Catequese
(Audiência Geral de 27 de Junho de 1990), 2.3: Insegnamenti13,1 (1990),
1680-1681.
[8] Francisco, Exort.
ap. pós-sinodal Amoris laetitia (19 de Março de 2016), 182: AAS 108 (2016),
384.