CAPÍTULO V
O SUBLIME CONHECIMENTO DE CRISTO
1. O encontro pessoal com Cristo.
…/2
E eis como, de um encontro
pessoal, nascem de repente outros encontros pessoais; e quem conheceu Jesus
dá-O a conhecer aos outros.
Eis, em suma, como se
transmite a boa nova.
Um daqueles dois novos
discípulos era João e o outro era André, André foi logo dizer a seu irmão
Simão:
«’Encontrámos O Messias’ e
levou-o a Jesus. E Jesus, fixando mele o olhar disse-lhe: ‘Tu és Simão, filho
de João; serás chamado Cefas, que quer dizer Pedra’» [i].
Foi deste modo que nasceu
para a fé o próprio chefe dois Apóstolos: através do testemunho de alguém.
No dia seguinte sucede o
mesmo.
Jesus diz a Filipe:
Segue-me!
Filipe encontrou Natanael e
diz-lhe: «Encontrei Jesus, Aquele de quem falou Moisés» e, às objecções de
Natanael, responde Filipe repetindo as palavras de Jesus:
O cristianismo – como já
muitas vezes foi dito e com razão – não é primordialmente uma doutrina, mas sim
uma Pessoa, Jesus Cristo; consequentemente, o anúncio desta Pessoa e a relação
com Ela é a coisa mais importante, o começo de toda a verdadeira evangelização
e apropria condição da sua possibilidade.
Inverter esta ordem e
colocar as doutrinas e os preceitos do Evangelho antes da descoberta de Jesus,
seria como colocar num comboio, aas carruagens na frente da locomotiva que as
deve puxar.
A pessoa de Jesus é Quem
desbrava o caminho do coração para a aceitação de todo o resto.
Quem tomou conhecimento uma
vez com Jesus vivo, já não tem necessidade de ser puxado; é Ele mesmo que arde
de desejo de conhecer o Seu pensamento, a Sua vontade, a Sua Palavra.
Não é pela autoridade da
Igreja que se aceita Jesus, mas é pela autoridade de Jesus que se aceita e se
ama a Igreja.
A primeira coisa então que a
Igreja deve fazer não é apresentar-se a si mesma aos homens, mas sim,
apresentar Jesus Cristo.
A este respeito, existe um
sério problema pastoral.
Tem-se vindo a verificar,
proveniente dos mais variados quadrantes, o preocupante êxodo de numerosos
fieis católicos para outras confissões cristãs, geralmente protestantes.
Se se quiser examinar mais
de perto este fenómeno, nota-se que, em geral, esses fieis são atraídos por uma
pregação mais simples e imediata, a qual faz o seu aliciamento sobre a
aceitação de Jesus como Senhor e Salvador das suas vidas.
Normalmente não se trata das
maiores denominações protestantes, mas sim de pequenas Igrejas de renovação e
outras vezes também de grupos ou seitas que fazem o seu aliciamento com “a
segunda conversão”.
O fascínio da desta pregação
sobre as pessoas é notável, e não se pode dizer que se trata de um fascínio
superficial e efémero, porque muitas vezes muda mesmo a vida das pessoas.
As Igrejas que possuem
grande tradição dogmática e teológica e um grande aparato legislativo
encontram-se por vezes em situação desvantajosa devido à sua própria riqueza e
complexidade de doutrina, quando têm que enfrentar uma sociedade que, em grande
parte, perdeu a própria fé cristã e que necessita, por isso, de recomeçar de
novo, isto é, pela redescoberta de Jesus Cristo.
É como se faltasse ainda um
instrumento adequado para esta nova situação, que se está a passar em diversos
países cristãos.
Pelo nosso passado estamos
mais preparados para sermos pastores
do que para sermos pescadores de
homens, estamos mais preparados para apascentar as pessoas que permaneceram
fieis à Igreja, do que trazer para o rebanho mais pessoas ou de “repescar” as que se afastaram.
Isto de monstra a
necessidade urgente que temos de uma evangelização que, embora sendo católica,
isto é, aberta a toda a plenitude da verdade e da vida cristã, deve também ser
simples e essencial; isso obtém-se fazendo de Jesus Cristo o ponto inicial e
fulcral de todas as coisas, o pondo do qual sempre se parte e para o qual se
regressa sempre.
Esta insistência de um
encontro pessoal com Jesus Cristo, não é um sinal de subjectivismo ou de
sentimentalismo, mas sim a tradução, no plano espiritual e pastoral, de um
dogma central da nossa fé:
Que Jesus Cristo «é uma
pessoa».
Nesta meditação gostaria de
demonstrar como é que o dogma que proclama Cristo «ume Pessoa» não é só um
enunciado metafisico que já não interessa a ninguém, ou então que interessa só
a alguns teólogos, mas que, pelo contrário, é o próprio fundamento do anúncio
cristão e o segredo da sua força.
DE facto, o único modo para
se conhecer uma pessoa é o de entrer numa relação viva com ela.
A Igreja, nos Concílios,
resumiu o essencial da sua fé em Jesus Cristo em três afirmações:
Jesus Cristo é verdadeiro
homem;
Jesus Cristo é verdadeiro
Deus;
Jesus Cristo é uma só
Pessoa.
Trata-se de uma espécie de
triângulo dogmático, em que a humanidade e a divindade representam os dois
lados e em que a unidade da pessoa representa o vértice.
O que é também verdade
historicamente.
Primeiro, na luta contra a
heresia gnóstica foi assegurada a humanidade de Cristo.
Mais tarde, no séc. IV, na
luta contra o arianismo, foi assegurada a Sua divindade.
Finalmente, no séc. V, foi
assegurada a unidade da Sua pessoa.
(cont)
rainiero cantalamessa, Pregador da Casa Pontifícia.