14/02/2015

Há-de urgir-te a caridade de Cristo

Tens necessidade de vida interior e de formação doutrinal. Exige-te! – Tu, cavalheiro cristão, mulher cristã, tens de ser sal da terra e luz do mundo, porque estás obrigado a dar exemplo com um santo descaramento. Há-de urgir-te a caridade de Cristo e, ao sentires-te e saberes-te outro Cristo a partir do momento em que lhe disseste que o seguias, não te separarás dos teus semelhantes – os teus parentes, os teus amigos, os teus colegas –, da mesma maneira que o sal não se separa do alimento que condimenta. A tua vida interior e a tua formação abrangem a piedade e o critério que deve ter um filho de Deus, para temperar tudo com a sua presença activa. Pede ao Senhor para seres sempre esse bom condimento na vida dos outros. (Forja, 450)


Um cristão não pode reduzir-se aos seus problemas pessoais, pois tem de viver face à Igreja universal, pensando na salvação de todas as almas.

Deste modo, até aquelas facetas que poderiam considerar-se mais íntimas e privadas – a preocupação pelo progresso interior – não são, na realidade, individuais, visto que a santificação forma uma só coisa com o apostolado. Havemos de esforçar-nos, na nossa vida interior e no desenvolvimento das virtudes cristãs, pensando no bem de toda a Igreja, dado que não poderíamos fazer o bem e dar a conhecer Cristo, se na nossa vida não se desse um esforço sincero por realizar os ensinamentos do Evangelho.

Impregnadas deste espírito, as nossas orações, ainda que comecem por temas e propósitos aparentemente pessoais, acabam sempre por ir ter ao serviço dos outros. E, se caminharmos pela mão da Virgem Santíssima, Ela fará com que nos sintamos irmãos de todos os homens, porque todos somos Filhos desse Deus de que Ela é filha, esposa e mãe.


Os problemas dos outros devem ser os nossos problemas. A fraternidade cristã deve estar bem no fundo da nossa alma, de tal modo que nenhuma pessoa nos seja indiferente. Maria, Mãe de Jesus, que O criou, O educou e O acompanhou durante a sua vida terrena e agora está junto d'Ele nos Céus, ajudar-nos-á a reconhecer Jesus em quem passa ao nosso lado, tornado presente para nós nas necessidades dos nossos irmãos, os homens. (Cristo que passa, 145)

Tratado do verbo encarnado 121

Questão 18: Da unidade de Cristo quanto a vontade

Art. 4 — Se em Cristo havia livre arbítrio.

O quarto discute-se assim. — Parece que em Cristo não havia livre arbítrio.

1. — Pois, diz Damasceno: Se quisermos falar com propriedade, a gnome (isto é, o juízo, o pensamento ou o raciocínio) e a proairesis (isto é, a eleição) não podemos atribuí-las a Deus. Ora, sobretudo em matéria de fé, devemos falar com propriedade de expressão. Logo, em Cristo não houve eleição. E por consequência, nem livre arbítrio, do qual a eleição é acto.

2. Demais. — Como diz o Filósofo, a eleição é o desejo do que já foi deliberado. Ora, parece que em Cristo não houve conselho, pois, não deliberamos sobre aquilo de que estamos certos, ora, Cristo tinha certeza de tudo. Logo, em Cristo não houve eleição. E portanto, nem livre arbítrio.

3. Demais. — O livre arbítrio não é determinado. Ora, a vontade de Cristo queria determinadamente o bem, pois, não podia pecar, como dissemos. Logo, em Cristo não houve livre arbítrio.

Mas, em contrário, a Escritura: Ele comerá manteiga e mel até que saiba rejeitar o mal e escolher o bem, o que é um acto de livre arbítrio. Logo, em Cristo houve livre arbítrio.

Como dissemos, havia em Cristo duplo acto de vontade. Um pelo qual a sua vontade era levada para um objecto como querido em si mesmo, e que tem a natureza de fim, outro, pelo qual a sua vontade queria um objecto conducente a outro, o que tem a natureza de meio. Ora, como diz o Filósofo, a eleição difere da vontade em que a vontade, propriamente falando, busca o fruir, ao passo que a eleição tem por objecto os meios. E assim, em sentido absoluto, a vontade é o mesmo que a vontade como natureza, ao passo que a eleição é o mesmo que a vontade como razão e é o próprio acto do livre arbítrio, como dissemos na Primeira Parte. Ora, como atribuindo a Cristo a vontade, enquanto razão, havemos necessariamente de admitir nele a eleição, e por consequência o livre arbítrio, do qual a eleição é um acto, conforme estabelecemos na Primeira Parte.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Damasceno exclui de Cristo a eleição, por entender que a denominação de eleição inclui a ideia de dúvida. Contudo, a dúvida não é necessária à eleição, pois, também Deus pode eleger, como se lê na Escritura: Elegeu-nos nele mesmo antes do estabelecimento do mundo, embora em Deus não haja nenhuma dúvida. Mas, a eleição inclui a dúvida, quando quem elege é por natureza sujeito à ignorância. E o mesmo devemos dizer do mais a que se refere a referida autoridade.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A eleição pressupõe o conselho, mas, não resulta do conselho, senão quando já determinado pelo juízo, pois, o que julgamos devemos praticar, depois da perquisição do conselho, isso escolhemos, como diz Aristóteles. Donde, se julgamos que revemos praticar um acto, sem ter precedido nenhuma dúvida e nenhuma perquisição, isso basta para a eleição. Donde é claro, que a dúvida ou a perquisição não se incluem, como tais, na eleição, mas só quando se trata de quem por natureza está sujeito à ignorância.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A vontade de Cristo, embora determinada para o bem, não está contudo determinada a um ou outro bem particular. E por isso, era próprio de Cristo eleger pelo livre arbítrio confirmado no bem, como se dá com os bem-aventurados.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


Temas para meditar - 365

Tristeza



A tristeza é uma evidente manifestação do amor-próprio que corta as pelas raízes a fé e o abandono.




(tadeus dajczer, Meditações sobre a Fé, Paulus, 4ª Ed., pg. 89) 

Pequena agenda do cristão

SÁBADO



(Coisas muito simples, curtas, objectivas)


Propósito:
Honrar a Santíssima Virgem.

A minha alma glorifica o Senhor e o meu espírito se alegra em Deus meu Salvador, porque pôs os olhos na humildade da Sua serva, de hoje em diante me chamarão bem-aventurada todas as gerações. O Todo-Poderoso fez em mim maravilhas, santo é o Seu nome. O Seu Amor se estende de geração em geração sobre os que O temem. Manifestou o poder do Seu braço, derrubou os poderosos do seu trono e exaltou os humildes, aos famintos encheu de bens e aos ricos despediu de mãos vazias. Acolheu a Israel Seu servo, lembrado da Sua misericórdia, como tinha prometido a Abraão e à sua descendência para sempre.

Lembrar-me:

Santíssima Virgem Mãe de Deus e minha Mãe.

Minha querida Mãe: Hoje queria oferecer-te um presente que te fosse agradável e que, de algum modo, significasse o amor e o carinho que sinto pela tua excelsa pessoa.
Não encontro, pobre de mim, nada mais que isto: O desejo profundo e sincero de me entregar nas tuas mãos de Mãe para que me leves a Teu Divino Filho Jesus. Sim, protegido pelo teu manto protector, guiado pela tua mão providencial, não me desviarei no caminho da salvação.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?

Ev. comentário, L esp. (Vida de Maria III)

Tempo Comum V Semana

Evangelho: Lc 10 1-9

1 Depois disto, o Senhor escolheu outros setenta e dois, e mandou-os dois a dois à Sua frente por todas as cidades e lugares onde havia de ir. 2 Disse-lhes: «Grande é na verdade a messe, mas os operários poucos. Rogai, pois, ao dono da messe que mande operários para a Sua messe. 3 Ide; eis que Eu vos envio como cordeiros entre lobos. 4 Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado, e não saudeis ninguém pelo caminho. 5 Na casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz seja nesta casa. 6 Se ali houver algum filho da paz, repousará sobre ele a vossa paz; senão, tornará para vós. 7 Permanecei na mesma casa, comendo e bebendo do que tiverem, porque o operário é digno da sua recompensa. Não andeis de casa em casa. 8 Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei o que vos puserem diante; 9 curai os enfermos que nela houver, e dizei-lhes: Está próximo de vós o reino de Deus.

Comentário

Cordeiros no meio de lobos! cheia de uma intenção de aviso e precaução o Senhor adverte uma realidade que se há-de verificar sempre ao longo dos tempos, nunca faltarão os que aparentando boa disposição apenas aguardam ensejo para fazer mal, perseguir e molestar, às vezes tirando a própria vida, aos enviados de Cristo que, afinal, somos todos os cristãos.

(ama, comentário sobre LC  10, 1-9, 2014.02.14)


Leitura espiritual


Santíssima Virgem

Vida de Maria (III

A VOZ DO MAGISTÉRIO

«A definição do dogma da Imaculada Conceição refere-se de modo directo unicamente ao primeiro instante da existência de Maria, a partir do qual ficou livre de toda a mancha da culpa original. O Magistério pontifício quis assim definir só a verdade que tinha sido objecto de controvérsias ao longo dos séculos: a preservação do pecado original, sem se preocupar em definir a santidade permanente da Virgem Mãe do Senhor».

«Essa verdade faz parte do senso comum do povo cristão, que defende que Maria, livre do pecado original, foi preservada também de todo o pecado actual e a santidade inicial foi-lhe concedida para preencher toda a sua existência».

«A Igreja reconheceu constantemente que Maria foi santa e livre de todo o pecado ou imperfeição moral. O Concílio de Trento expressa essa convicção afirmando que ninguém “pode na sua vida inteira evitar todos os pecados, mesmo os veniais, se não for por privilégio especial de Deus, como a Igreja ensina sobre a bem-aventurada Virgem" (DS 1573). Também o cristão transformado e renovado pela graça tem a possibilidade de pecar. Com efeito, a graça não preserva de todo o pecado no decurso completo da vida, salvo se, como afirma o Concílio de Trento, um privilégio especial assegurar essa imunidade do pecado. E foi isso o que aconteceu em Maria».

«O Concílio tridentino não quis definir este privilégio, mas declarou que a Igreja o afirma com vigor: tenet, quer dizer, mantém-no com firmeza. Trata-se de uma opção que, longe de incluir essa verdade entre as crenças piedosas ou as opiniões de devoção, confirma o seu carácter de doutrina sólida, bem presente na fé do povo de Deus. Por outro lado, essa convicção fundamenta-se na graça que o anjo atribui a Maria no momento da Anunciação. Ao chamá-la "cheia de graça" — kejaritoméne —, o anjo reconhece n’Ela a mulher dotada de uma perfeição permanente e de uma plenitude de santidade, sem sombra de culpa nem de imperfeição moral ou espiritual».

«O privilégio especial que Deus outorgou à Toda Santa leva-nos a admirar as maravilhas realizadas pela graça na sua vida. E recorda-nos também que Maria foi sempre toda do Senhor e que nenhuma imperfeição diminuiu a perfeita harmonia entre Ela e Deus».

«A sua vida terrena, portanto, caracterizou-se pelo desenvolvimento constante e sublime da fé, da esperança e da caridade. Por isso, Maria é para os crentes sinal luminoso da Misericórdia divina e guia seguro para as elevadas metas da perfeição evangélica e a santidade».

João Paulo II, Catequese mariana (Discurso na audiência geral, 19-VI-1996).

* * *

A VOZ DOS PADRES E ESCRITORES ANTIGOS

«Os meses iam-se passando para a menina. Ao fazer dois anos, disse Joaquim a Ana: “Levemo-la ao templo do Senhor para cumprir a promessa que Lhe fizemos, para que não a reclame e nossa oferenda se torne inaceitável a Seus olhos”. Ana respondeu: “Esperamos  até que complete três anos, para que a menina não tenha saudades de nós. Joaquim respondeu: “Esperaremos”».

Ao chegar aos três anos, disse Joaquim: “Chama as donzelas hebreias que não têm mancha e que cada uma leve uma lâmpada acesa e a acompanhem, para que a menina não olhe para trás e seu coração seja cativado por alguma coisa fora do templo de Deus. Assim fizeram, enquanto iam subindo para o templo de Deus. Lá recebeu-a o sacerdote, que abraçando-a, abençoou-a e exclamou: “O Senhor glorificou o teu nome diante de todas as gerações, e no final dos tempos, manifestará em ti sua redenção aos filhos de Israel”».

Fê-la sentar-se no terceiro degrau do altar. O Senhor derramou graças sobre a menina, que dançou cativando toda a casa de Israel.

«Os seus pais saíram do templo cheios de admiração e louvando a Deus porque a menina não tinha olhado para trás. Maria permaneceu no templo alimentando-se como uma pomba e recebendo alimento pelas mãos de um anjo».

Proto-evangelho de Santiago, VII-VIII (Escrito apócrifo do século II).

***

«Quando ultrapassou a idade da amamentação e fez três anos, os seus bem-aventurados pais levaram-na ao templo de Deus e consagraram-na como oferenda, de acordo com a promessa que tinham feito antes do seu nascimento. Conduziram-na com glória e honra, como era justo; precediam-na muitas virgens e acompanhavam-na com lâmpadas acesas, como tinha preanunciado um dia o rei profeta [David], antepassado da Virgem imaculada, dizendo: As suas jovens companheiras conduziram-na até ao rei, os seus amigos ofereceram-lha (Sal 44 [45] 15). O profeta tinha dito isto com antecedência, a propósito da apresentação no templo e das virgens que a precediam e a acompanhavam».

«No entanto, esta profecia não diz respeito somente àquelas virgens, mas refere-se também às almas virgens que seguiram os seus passos, almas a que o profeta chamou "seus amigos". Embora todos sejam inferiores a Ela na amizade e na semelhança, no entanto, por graça e bondade do seu Filho, o Senhor, as almas dos santos são chamadas " seus amigos "; por outro lado, o próprio Senhor e Criador do universo não considerou indigno chamar "irmãos" àqueles que lhe são gratos e o imitam. Na realidade, todas as almas dos justos que chegaram a ser "seus amigos" mediante o exercício da santidade, gozarão da sua ajuda e estarão espiritualmente unidas ao Senhor seu Filho e serão introduzidas Santo dos Santos celestial».

Vida de Maria, atribuída a São Máximo o Confessor (século VII)

* * *

A VOZ DOS SANTOS

«Não houve nem nunca haverá oferenda feita por uma criatura, nem maior nem mais perfeita do que a que fez Maria a Deus quando se apresentou no Templo para Lhe oferecer, não incenso nem cordeiros, nem moedas de ouro, mas a si própria de todo e por inteiro, em perfeito holocausto, consagrando-se como vítima perpétua em Sua honra. Compreendeu muito bem a voz do Senhor que a chamava a dedicar-se toda inteira ao Seu amor, com aquelas palavras: Levanta-te, apressa-te, amiga minha... e vem (Ct 2, 10). Por isso queria o seu Senhor que se dedicasse de todo a amá-Lo e a alegrá-Lo: Ouve, minha filha, olha, inclina o teu ouvido e esquece o teu povo e a casa paterna (Sal 44, 14). E Ela, nesse mesmo instante, seguiu a chamada de Deus».

«Por amor a esta menina privilegiada acelerou o Redentor a Sua vinda ao mundo. Precisamente porque não se julgava digna sequer de ser escrava da Mãe de Deus, foi a escolhida para ser essa mãe. Com o aroma das suas virtudes e com as suas poderosas orações atraiu ao seu seio virginal o Filho de Deus. Por isso o seu divino Esposo lhe chamou rola: Ouviu-se na nossa terra a voz da rola (Ct 2, 12); não só porque Ela, tal como a rola, sempre gostou da solidão, vivendo neste mundo como num deserto, mas porque como a rola que vai sempre gemendo pela campina, Maria suspirava sempre compadecendo-se das misérias do mundo perdido e pedindo a Deus que outorgasse a redenção para todos. Com muito mais fervor do que os profetas Ela repetia, quando estava no templo, as súplicas e suspiros deles para que mandasse o Redentor: Envia, Senhor, o Cordeiro dominador da terra (Is 15, 1). Céus, gotejai lá de cima; e as nuvens chovam o Justo (Is 45, 8). Oh se rasgásseis os céus e descêsseis! (Is 44, 1)».

«Numa palavra, Ela era o objecto das complacências de Deus, ao contemplar esta virgenzinha aspirando sempre à mais elevada perfeição como coluna de incenso rica pelo aroma de todas as virtudes, tal como a descreve o Espírito Santo: Quem é esta que vai subindo pelo deserto como uma coluna de fumo feita de mirra e de incenso e de toda a espécie de aromas? (Ct 3, 6). Na verdade, diz Sofronio, era esta donzela o jardim das delícias do Senhor onde se encontravam toda a espécie de flores e todos os aromas das virtudes. Por isso, afirma São João Crisóstomo, Deus escolheu Maria para Sua Mãe, porque não encontrou na terra uma virgem mais santa nem mais perfeita que Maria, nem lugar mais digno para habitar do que o seu seio sacrossanto. São Bernardo diz de modo semelhante: não houve na terra sítio mais digno do que o seio virginal. Santo Antonino afirma que a bem-aventurada Virgem, para ser escolhida e destinada à dignidade de Mãe de Deus, tinha que possuir uma perfeição tão grande e consumada que superasse totalmente a perfeição de todas as outras criaturas: a suprema perfeição da graça é estar preparada para conceber o Filho de Deus».

«Como a santa menina Maria se ofereceu a Deus no templo com prontidão e por inteiro, assim nós neste dia apresentemo-nos a Maria sem demora e sem reserva e roguemos-lhe que nos ofereça a Deus, que não nos recusará vendo que somos oferecidos pelas mãos daquela que foi o templo vivo do Espírito Santo, as delícias do seu Senhor e a escolhida como Mãe do Verbo eterno. E esperemos toda a espécie de bens desta excelsa e muito agradecida Senhora que recompensa com grande amor os obséquios que recebe dos seus devotos».

Santo Afonso Maria de Ligório (séc. XVII), As glórias de Maria, Parte II, Discurso III.

***

«Desde há quase trinta anos, Deus pôs no meu coração o anseio de fazer compreender às pessoas de qualquer estado, condição ou ofício, esta doutrina: a vida corrente pode ser santa e cheia de Deus; o Senhor chama-nos a santificar o trabalho quotidiano, porque aí está também a perfeição cristã. Consideramo-lo uma vez mais, contemplando a vida de Maria.

Não nos esqueçamos de que a quase totalidade dos dias que Nossa Senhora passou na Terra decorreram de forma muito semelhante aos dias de muitos milhões de mulheres, ocupadas a cuidar da sua família, a educar os seus filhos, a levar a cabo as tarefas do lar. Maria santifica as coisas mais pequenas, aquilo que muitos consideram erradamente como não transcendente e sem valor: o trabalho de cada dia, os pormenores de atenção com as pessoas queridas, as conversas e as visitas por motivo de parentesco ou de amizade... Bendita normalidade, que pode estar cheia de tanto amor de Deus!

Na verdade, é isso que explica a vida de Maria: o seu amor. Um amor levado ao extremo, até ao esquecimento completo de si mesma, contente por estar ali, onde Deus quer que esteja e cumprindo com esmero a vontade divina. Isso é o que faz com que o mais pequeno dos seus gestos nunca seja banal, mas cheio de significado. Maria, nossa Mãe, é para nós exemplo e caminho. Temos de procurar ser como Ela nas circunstâncias concretas em que Deus quer que vivamos».

São Josemaría (s. XX), Cristo que passa, n. 148.

* * *

A VOZ DOS POETAS

Endechas a Nossa Senhora

Virgem soberana,
De outros cantos dina:
Falta a voz humana,
Cante a voz divina.

Estrelas e flores,
Areias do mar
Podem-se contar,
Não vossos louvores.

De tal maravilha
Não me maravilho,
Pois sois mãe e filha
De Deus, vosso Filho.

Sois templo divino
Do Espírito Santo:
Quem é Só e Trino
A vós só quis tanto.

Sois cedro em Líbano,
Em Cádis sois palma,
Remédio do dano,
Vida da nossa alma.

Sois jardim cheiroso,
Plátano em ribeira;
Em campo formoso,
Formosa oliveira.

Sois esquadrão forte,
Torre em alto erguida,
Escudo da morte,
Doçura da vida.

Entre espinhos rosa,
Lírio junto de água;
Toda sois formosa,
Em vós não há mágoa.

Fostes escolhida
Por nossa desculpa,
Sem culpa nascida,
Remédio da culpa.

Quanto Eva perdeu
Por vós se cobrou,
Quem de vós nasceu
Tal vos fabricou.

O Verbo nascido
Deu-vos por Mãe sua,
O Sol por vestido,
Por chapins a Lua.

Deu-vos a Trindade
Coroa de estrelas;
Mas a claridade,
Vós lha dais a elas.

Sois fonte suave,
Alívio de tristes;
Sois do Céu a chave,
Vós o Céu abristes!

Quanto o Sol rodeia,
Quanto o Mar abraça,
Tudo encheis de graça,
Sois de graça cheia.

Diogo Bernardes (1532-1605)