RESUMOS DA FÉ CRISTÃ
TEMA 8 Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro
Jesus Cristo assumiu a natureza humana sem
deixar de ser Deus: é verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
1. A
Encarnação do Verbo
«Ao chegar a plenitude dos tempos, Deus
enviou Seu Filho, nascido de mulher» [i].
Cumpre-se, assim, a promessa de um Salvador
que Deus fez a Adão e Eva ao serem expulsos do Paraíso:
«Farei reinar a inimizade entre ti e a
mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta esmagar-te-á a cabeça e tu
tentarás mordê-la no calcanhar» [ii].
Este versículo do Génesis é conhecido com o
nome de proto-evangelho, porque constitui o primeiro anúncio da boa nova da
salvação.
Tradicionalmente, interpretou-se que a mulher
de que se fala, tanto é Eva, em sentido directo, como Maria, em sentido pleno;
e que a descendência da mulher se refere tanto à humanidade como a Cristo.
Desde então até ao momento em que «o Verbo se fez carne e habitou entre nós»
[iii], Deus foi preparando
a humanidade para que pudesse acolher com fruto o Seu Filho Unigénito.
Deus escolheu para si o povo israelita,
estabeleceu com ele uma Aliança e formou-o progressivamente, intervindo na sua
história, manifestando-lhe os seus desígnios através dos patriarcas e profetas
e santificando-o para Si.
E tudo isto, como preparação e figura daquela
nova e perfeita Aliança que havia de concluir-se em Cristo e daquela plena e
definitiva revelação que devia ser efectuada pelo próprio Verbo encarnado [iv].
Embora Deus tenha preparado a vinda do
Salvador, sobretudo, mediante a eleição do povo de Israel, isso não significa
que tenha abandonado os restantes povos, “os gentios”, pois nunca deixou de dar
testemunho de Si mesmo [v].
A Providência divina fez com que os gentios
tivessem uma consciência mais ou menos explícita da necessidade da salvação e
até aos mais recônditos cantos da terra se conservava o desejo de serem
redimidos.
A
Encarnação tem a sua origem no amor de Deus pelos homens:
«nisto
se manifestou o amor que Deus para connosco: Deus enviou o Seu Filho unigénito
ao mundo, para que por Ele tenhamos a Vida» [vi].
A Encarnação é a demonstração, por
excelência, do Amor de Deus pelos homens, já que nela é o próprio Deus quem se
entrega aos homens fazendo-Se participante da natureza humana em unidade de
pessoa. Após a queda de Adão e Eva no paraíso, a Encarnação tem uma finalidade
salvadora e redentora, como professamos no Credo:
«por
nós homens e para nossa salvação, desceu do céu e encarnou pelo Espírito Santo
no seio da Virgem Maria, e Se fez homem» [vii].
Cristo
afirmou de Si mesmo que «o Filho do homem
veio buscar e salvar o que estava perdido» [viii] e que «Deus não enviou o Seu Filho para condenar o
mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele» [ix].
A Encarnação não só manifesta o infinito amor
de Deus pelos homens, a Sua infinita misericórdia, a Sua justiça, o Seu poder,
mas também a coerência do plano divino de salvação;
a profunda sabedoria divina consiste na forma
como Deus decidiu salvar o homem, ou seja, do modo mais conveniente à sua
natureza, que é precisamente mediante a Encarnação do Verbo.
Jesus Cristo, o Verbo encarnado, «não é nem
um mito, nem uma ideia abstracta qualquer;
É um homem que viveu num contexto concreto e
que morreu depois de ter levado a sua própria existência no quadro da evolução
da história.
A investigação histórica sobre Ele é, pois,
uma exigência da fé cristã» [x].
Pertence à doutrina da fé que Cristo existiu,
como também que morreu realmente por nós e que ressuscitou ao terceiro dia [xi].
A existência de Jesus é um facto provado pela
ciência histórica, sobretudo, mediante a análise do Novo Testamento cujo valor
histórico está fora de dúvida.
Há outros testemunhos antigos não cristãos,
pagãos e judeus, sobre a existência de Jesus.
Precisamente por isso, não são aceitáveis as
posições daqueles que contrapõem um Jesus histórico ao Cristo da fé e defendem
a suposição de que quase tudo o que o Novo Testamento diz acerca de Cristo
seria uma interpretação de fé que fizeram os discípulos de Jesus, mas não a Sua
autêntica figura histórica que ainda permaneceria oculta para nós.
Estas posições que, ao longo do tempo,
encerram um forte preconceito contra o sobrenatural, não têm em conta que a
investigação histórica contemporânea coincide em afirmar que a apresentação que
faz de Jesus o cristianismo primitivo se baseia em autênticos factos realmente
acontecidos.
2.
Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro
A Encarnação é «o mistério da união admirável
da natureza divina e da natureza humana, na única Pessoa do Verbo» [xii].
A Encarnação do Filho de Deus «não significa
que Jesus Cristo seja, em parte Deus e em parte homem, nem que seja o resultado
de uma mistura confusa do divino com o humano.
Ele fez-Se verdadeiro homem, permanecendo
verdadeiro Deus.
Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro
homem» [xiii].
A divindade de Jesus Cristo, Verbo eterno de
Deus, estudou-se ao tratar da Santíssima Trindade.
Aqui vamos fixar-nos, sobretudo, no que se
refere à Sua humanidade. A Igreja defendeu e aclarou esta verdade de fé durante
os primeiros séculos face às heresias que a falseavam.
Já no século I, alguns cristãos de origem
judaica, os ebionitas, consideraram Cristo como um simples homem, embora muito
santo.
No século II surge o adopcionismo, que
defendia que Jesus era filho adoptivo de Deus; Jesus seria apenas um homem em
quem habita a força de Deus; para eles, Deus era só uma pessoa.
Esta heresia, foi condenada no ano 190 pelo
Papa São Victor, pelo Concílio de Antioquia, no ano 268, pelo Concílio I de
Constantinopla e pelo Sínodo Romano do ano 382 [xiv].
A heresia ariana, ao negar a divindade do
Verbo, negava também que Jesus Cristo fosse Deus.
Arrio foi condenado pelo Concílio I de Niceia
no ano 325.
Também, recentemente, a Igreja voltou a
recordar que Jesus Cristo é o Filho de Deus subsistente desde a eternidade que
na Encarnação assumiu a natureza humana na Sua única pessoa divina [xv].
A Igreja fez também frente a outros erros que
negavam a realidade da natureza humana de Cristo.
Entre estes, enquadram-se aquelas heresias
que recusavam a realidade do corpo ou da alma de Cristo.
Entre as primeiras encontra-se o docetismo,
nas suas diversas variantes, que tem um pano de fundo gnóstico e maniqueu.
Alguns dos seus seguidores afirmavam que
Cristo teve um corpo celeste, ou que o Seu corpo era puramente aparente, ou que
apareceu de repente na Judeia sem ter tido que nascer ou crescer.
Já São João teve que combater este tipo de
erros:
«muitos sedutores se têm levantado no mundo,
que não confessam que Jesus Cristo tenha vindo em carne» [xvi].
Arrio e Apolinar de Laodiceia negaram que
Cristo tivesse verdadeira alma humana.
O segundo teve particular importância neste
campo e a sua influência esteve presente durante vários séculos nas controvérsias
cristológicas posteriores.
Numa tentativa de defender a unidade de
Cristo e a Sua impecabilidade, Apolinar defendeu que o Verbo desempenhava as
funções da alma espiritual humana.
Esta doutrina, no entanto, implicava negar a
verdadeira humanidade de Cristo composta, como em todos os homens, de corpo e
alma espiritual [xvii].
Foi condenado no Concílio I de Constantinopla
e no Sínodo Romano de 382 [xviii].
(cont)
José Antonio Riestra
Notas:
[iv] Concílio Vaticano II,
Const. Lumen Gentium, 9.
[vii] Concílio de
Constantinopla I, Symbolum, DS 150; cf. Concílio Vaticano II, Const. Lumen
Gentium, 55.
[viii] Lc 19, 10; cf. Mt 18,
11
[x] Comissão Teológica
Internacional, Cuestiones selectas de Cristología (1979), en ID., Documentos
1969-1996, 2ª ed., BAC, Madrid 2000, 221.
[xiv] Cf. DS 151 y 157-158.
[xv] Cf. Congregação para a
Doutrina da Fé, Decl. Mysterium Filii Dei, 21-II-1972, em AAS 64(1972)237-241.
[xvi] 2 Jo 7; Cf. 1 Jo 4,
1-2