Epifania
Evangelho: Lc 5 12-16
12 Sucedeu que,
encontrando-se Jesus numa cidade, apareceu um homem cheio de lepra, o qual,
vendo Jesus, prostrou-se com o rosto por terra e suplicou-Lhe: «Senhor, se Tu
queres, podes limpar-me». 13 Ele, estendendo a mão, tocou-o,
dizendo: «Quero, sê limpo!». Imediatamente desapareceu dele a lepra. 14
Jesus ordenou-lhe que a ninguém o dissesse. «Mas vai, disse-lhe, mostra-te ao
sacerdote, e oferece pela tua cura o que foi ordenado por Moisés, para lhes
servir de testemunho». 15 Entretanto difundia-se cada vez mais a
fama do Seu nome; e concorriam grandes multidões para O ouvir e ser curadas das
suas doenças. 16 Mas Ele retirava-Se para lugares desertos, e fazia
oração.
Comentário:
Não
obstante a prova da sua divindade Jesus quer que a Lei se cumpra e assim
ensina.
A confiança em Cristo que precede a fé torna-se fundamental para conseguir o
que se pretende.
O Senhor nunca defrauda os que nele confiam.
(ama,
comentário sobre LC 5, 12-16, 2014.01.10)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 301 a 308
301
Mas
não esqueçamos que estar com Jesus é seguramente encontrar-se com a sua Cruz.
Quando nos abandonamos nas mãos de Deus, é frequente que Ele permita que saboreemos
a dor, a solidão, as contradições, as calúnias, as difamações, os escárnios,
por dentro e por fora: porque quer conformar-nos à Sua imagem e semelhança e permite
também que nos chamem loucos e que nos tomem por néscios.
É
a altura de amar a mortificação passiva que vem - oculta, ou descarada e
insolente - quando não a esperamos. Chegam a ferir as ovelhas com as pedras que
deviam atirar-se aos lobos: quem segue Cristo experimenta na própria carne que
aqueles que o deviam amar se comportam com ele de uma maneira que vai da
desconfiança à hostilidade, da suspeita ao ódio. Olham-no com receio, como um
mentiroso, porque não acreditam que possa haver relação pessoal com Deus, vida
interior; em contrapartida, com o ateu e com o indiferente, geralmente rebeldes
e desavergonhados, desfazem-se em amabilidades e compreensão.
E
talvez Nosso Senhor permita que o Seu discípulo se veja atacado com a arma, que
nunca é honrosa para aquele que a empunha, das injúrias pessoais; com lugares
comuns, fruto tendencioso e delituoso de uma propaganda massificada e
mentirosa... Porque o bom gosto e a cortesia não são coisas muito comuns.
Quem
cultiva uma teologia incerta e uma moral relaxada, sem freios; quem pratica, a
seu capricho, uma liturgia duvidosa, com uma disciplina de hippies e um governo
irresponsável, não é de admirar que propague contra os que só falam de Jesus
Cristo invejas, suspeitas, acusações falsas, ofensas, maus tratos, humilhações,
intrigas e vexames de todo o género.
Assim
vai Jesus esculpindo as almas dos Seus, sem deixar de lhes dar interiormente
serenidade e alegria, porque eles entendem muito bem que - com cem mentiras
juntas - os demónios não são capazes de fazer uma verdade: e grava nas suas
vidas a convicção de que só se sentirão bem quando renunciarem à comodidade.
302
Quando
admiramos e amamos deveras a Santíssima Humanidade de Jesus, descobrimos, uma a
uma, as suas Chagas. E nesses tempos de expiação passiva, penosos, fortes, de
lágrimas doces e amargas que procuramos esconder, sentiremos necessidade de nos
meter dentro de cada uma daquelas Feridas Santíssimas: para nos purificarmos,
para nos enchermos de alegria com esse Sangue redentor, para nos fortalecermos.
Recorreremos a elas como as pombas que, no dizer da Escritura, se escondem nos
buracos das rochas na hora da tempestade. Escondemo-nos nesse refúgio, para
encontrar a intimidade de Cristo: e veremos que o seu modo de conversar é
aprazível e o seu rosto formoso, porque os que sabem que a sua voz é suave e
grata, são os que receberam a graça do Evangelho, que os faz dizer: Tu tens
palavras de vida eterna.
303
Não
pensemos que, nesta senda da contemplação, as paixões se calam definitivamente.
Enganar-nos-íamos se supuséssemos que a ânsia de procurar Cristo, a realidade
do seu encontro e do seu convívio e a doçura do seu amor nos tornavam pessoas
impecáveis. Embora não lhes falte experiência disso, deixem-me, no entanto,
recordá-lo. O inimigo de Deus e do homem, Satanás, não se dá por vencido, não
descansa. E assedia-nos, mesmo quando a alma arde inflamada no amor de Deus.
Sabe que nessa altura a queda é mais difícil, mas que - se conseguir que a
criatura ofenda o seu Senhor, ainda que seja em pouco - poderá lançar naquela
consciência a grave tentação do desespero.
Aconselharei
a quem quiser aprender com a experiência de um pobre sacerdote que não pretende
falar senão de Deus, que, quando a carne tentar recobrar os seus foros
perdidos, ou a soberba - que é pior - se revoltar e se encabritar, correr a
abrigar-se nessas divinas fendas abertas no Corpo de Cristo pelos cravos que O
seguraram à Cruz e pela lança que atravessou o Seu peito. Vamos como nos
comover mais; derramemos nas Chagas de Nosso Senhor todo esse amor humano... e
esse amor divino. Que isto é desejar a união, sentir-se irmão de Cristo, ser
seu consanguíneo, filho da mesma Mãe, porque foi Ela que nos levou até Jesus.
304
A Santa Cruz
Afã
de adoração, ânsias de desagravo com sossegada suavidade e com sofrimento.
Far-se-á vida na nossa vida a afirmação de Jesus: aquele que não toma a sua
cruz para me seguir, não é digno de mim. E Nosso Senhor manifesta-se-nos cada
vez mais exigente, pede-nos reparação e penitência, até nos fazer experimentar
o fervoroso desejo de querer viver para Deus, pregado na cruz juntamente com
Cristo. Mas guardamos este tesouro em vasos de barro frágil e quebradiço, para
que se reconheça que a grandeza do poder que se vê em nós é de Deus e não
nossa.
Vemo-nos
acossados por toda a espécie de atribulações e nem por isso perdemos o ânimo;
encontramo-nos em grandes apuros, mas não desesperados, ou sem recursos; somos
perseguidos, mas não desamparados; abatidos, mas não inteiramente perdidos:
trazemos sempre no nosso corpo por toda a parte a mortificação de Jesus.
Parece-nos,
além disso, que Nosso Senhor não nos escuta, que andamos enganados, que só se
ouve o monólogo da nossa voz. Encontramo-nos como se não tivéssemos apoio na
terra e fossemos abandonados pelo Céu. No entanto, é verdadeiro e prático o
nosso horror ao pecado, mesmo ao pecado venial. Com a obstinação da Cananeia,
prostramo-nos rendidamente como ela, que O adorou, implorando: Senhor,
socorre-me. E desaparece a obscuridade, superada pela luz do Amor.
305
É
a hora de clamar: lembra-Te das promessas que me fizeste, para me encher de
esperança; isto consola-me no meu nada e enche o meu viver de fortaleza. Nosso
Senhor quer que contemos com Ele para tudo: vemos com evidência que sem Ele
nada podemos e que com Ele podemos tudo. E confirma-se a nossa decisão de andar
sempre na Sua presença.
Com
a claridade de Deus no entendimento, que parece inactivo, torna-se-nos
indubitável que, se o Criador cuida de todos - mesmo dos inimigos -, quanto
mais cuidará dos amigos! Convencemo-nos que não há mal nem contradição que não
venham por bem: assim assentam com mais firmeza, no nosso espírito, a alegria e
a paz que nenhum motivo humano poderá arrancar-nos, porque estas visitas deixam
sempre em nós algo de Seu, algo divino. Louvaremos o Senhor Nosso Deus que
efectuou em nós coisas admiráveis e compreenderemos que fomos criados com
capacidade de possuir um tesouro infinito.
306
A Santíssima Trindade
Tínhamos
começado com orações vocais, simples, encantadoras, que aprendemos na nossa
meninice e que gostaríamos de não perder jamais. A oração, que começou com essa
ingenuidade pueril, desenvolve-se agora em caudal largo, manso e seguro, porque
acompanha a nossa amizade com Aquele que afirmou: Eu sou o caminho. Se amarmos
Cristo assim, se com divino atrevimento nos refugiarmos na abertura que a lança
deixou no Seu peito, cumprir-se-á a promessa do Mestre: qualquer que me ame
observará a minha doutrina e meu Pai o amará e viremos a ele e nele faremos
morada.
O
coração sente então a necessidade de distinguir e adorar cada uma das pessoas
divinas. De certo modo, é uma descoberta que a alma faz na vida sobrenatural,
como as de uma criancinha que vai abrindo os olhos à existência. E entretém-se
amorosamente com o Pai e com o Filho e com o Espírito Santo; e submete-se
facilmente à actividade do Paráclito vivificador, que se nos entrega sem o
merecermos: os dons e as virtudes sobrenaturais!
307
Corremos
como o veado que anseia pelas fontes da água; com sede, a boca gretada pela
secura. Queremos beber nesse manancial de água viva. Sem atitudes
extravagantes, mergulhamos ao longo do dia nesse caudal abundante e claro de
águas frescas que saltam até à vida eterna. As palavras tornam-se supérfluas,
porque a língua não consegue expressar-se; o entendimento aquieta-se. Não se discorre,
olha-se! E a alma rompe outra vez a cantar um cântico novo, porque se sente e
se sabe também olhada amorosamente por Deus a toda a hora.
Não
me refiro a situações extraordinárias. São, podem muito bem ser, fenómenos
ordinários da nossa alma: uma loucura de amor que, sem espectáculo, sem
extravagâncias, nos ensina a sofrer e a viver, porque Deus nos concede a
Sabedoria. Que serenidade, que paz então, metidos no caminho estreito que
conduz à vida.
308
Ascética?
Mística? Não me interessa. Seja o que for, ascética ou mística, que importa? É
mercê de Deus. Se procuras meditar, o Senhor não te negará a sua assistência.
Fé e obras de fé! Obras, porque o Senhor - tu já reparaste nisso desde o
princípio e eu já to fiz notar a seu tempo - cada dia é mais exigente. Isto já
é contemplação e união; e assim há-de ser a vida de muitos cristãos, avançando
cada um pela sua própria via espiritual - são infinitas - no meio dos afazeres
deste mundo, mesmo sem se darem conta disso.
Uma
oração e uma conduta que não nos afastam das nossas actividades correntes, que
nos conduzem a Nosso Senhor no meio dos nossos nobres empenhos terrenos. Ao
elevar a Deus todas essas ocupações, a criatura diviniza o mundo. Tenho falado
tantas vezes do mito do rei Midas que convertia em ouro tudo aquilo em que
tocava! Podemos converter em ouro de méritos sobrenaturais tudo o que tocamos,
apesar dos nossos erros pessoais.
(cont)