Tempo comum XXI Semana
Evangelho: Mt 24, 42-51
42 «Vigiai, pois, porque não sabeis a que hora virá o vosso Senhor. 43
Sabei que, se o pai de família soubesse a que hora havia de vir o ladrão,
vigiaria, sem dúvida, e não deixaria arrombar a sua casa. 44 Por
isso estai vós também preparados, porque virá o Filho do Homem na hora em que
menos pensais. 45 «Quem é, pois, o servo fiel e prudente, a quem o
seu senhor colocou à frente da sua família para lhe distribuir de comer a seu
tempo? 46 Bem-aventurado aquele servo, a quem o seu senhor, quando
vier, achar a proceder assim. 47 Na verdade vos digo que lhe
confiará o governo de todos os seus bens. 48 Mas, se aquele servo
mau disser no seu coração: “O meu senhor tarda em vir”, 49 e começar
a bater nos seus companheiros, a comer e beber com os ébrios, 50
virá o senhor daquele servo no dia em que não o espera, e na hora que não sabe,
51 e mandará açoitá-lo e dar-lhe-á a sorte dos hipócritas; ali
haverá choro e ranger de dentes.
Comentário:
As
pequenas incidências da vida humana – como as grandes – marcam sobretudo pelo
nosso comportamento em relação a elas.
Temos de
ter uma unidade de critério e reacção sejam quais forem as circunstâncias ou o
que sucede.
O cristão
não anda “ao sabor da corrente” sabe muito bem o que quer e, sobretudo, para
onde vai e, assim, não deixa que interfira com o seu objectivo seja o que for
que o distrai dele.
(ama,
comentário sobre Mt 24, 42-51, 2014.05.26)
Leitura espiritual
Documentos do Magistério
CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
INSTRUÇÃO
LIBERTATIS CONSCIENTIA
SOBRE A LIBERDADE CRISTÃ E A
LIBERTAÇÃO
CAPÍTULO
I
A
SITUAÇÃO DA LIBERDADE NO MUNDO DE HOJE
I.
Conquistas e ameaças do processo moderno de libertação
A
herança do cristianismo
Liberdade
de pensar e de querer
9. Enfim e sobretudo, o
movimento moderno de libertação deveria trazer ao homem a liberdade interior,
sob a forma de liberdade de pensar e liberdade de querer. Ele pretendia
libertar o homem da superstição e dos medos ancestrais, percebidos como outros
tantos obstáculos ao seu desenvolvimento. Era seu propósito dar ao homem a
coragem e a audácia de se servir da sua razão, sem que o temor o detivesse
diante das fronteiras do desconhecido. Dessa forma, especialmente nas ciências
históricas e nas ciências humanas, desenvolveu-se um novo conhecimento do
homem, destinado à ajudá-lo a se compreender melhor, no que diz respeito ao seu
desenvolvimento pessoal ou às condições fundamentais da formação da comunidade.
Ambiguidades
do processo moderno de libertação
10. Quer se trate da
conquista da natureza, da vida social e política ou do domínio do homem sobre
ele mesmo, em plano individual e colectivo, todos podem constatar que não
somente os progressos realizados estão longe de corresponder às ambições
iniciais, mas também que novas ameaças, novas servidões e novos terrores surgiram,
à medida que se ampliava o movimento moderno de libertação. É um sinal de que
graves ambiguidades acerca do próprio sentido da liberdade, já desde a sua
origem, corroíam por dentro esse movimento.
O
homem ameaçado pelo seu domínio da natureza
11. Foi assim que, na
medida em que se libertava das ameaças da natureza, o homem passou a sentir um
medo crescente diante de si mesmo. A técnica, subjugando sempre mais a
natureza, corre o risco de destruir os fundamentos de nosso próprio futuro, de
modo que a humanidade de hoje torna-se a inimiga das gerações futuras. Ao
reduzir à servidão, com um poder cego, as forças da natureza, não se está destruindo
a liberdade dos homens de amanhã? Que forças podem proteger o homem da
escravidão do seu próprio domínio? Torna-se necessária uma capacidade de
liberdade e de libertação totalmente nova e que exige um processo de libertação
inteiramente renovado.
Riscos
da potência tecnológica
12. A força libertadora do
conhecimento científico concretiza-se nas grandes realizações tecnológicas.
Quem dispõe das tecnologias, possui o poder sobre a terra e sobre os homens.
Daí nascem formas de desigualdade, até então desconhecidas, entre os detentores
do saber e aqueles que simplesmente utilizam a técnica. A nova potência tecnológica
está ligada ao poder económico e leva à sua concentração. Dessa forma, no
interior dos povos e entre os povos, formaram-se relações de dependência que,
nos últimos vinte anos, deram ocasião a uma nova reivindicação de libertação.
Como impedir que a potência tecnológica não se torne um poder de opressão de
grupos humanos ou de povos inteiros?
Individualismo
e colectivismo
13. Na área das conquistas
sociais e políticas, uma das ambiguidades fundamentais da afirmação da
liberdade, no século das Luzes, está ligada à concepção do sujeito dessa
liberdade como indivíduo que se basta a si mesmo e tendo com fim a satisfação
de seu interesse próprio no gozo dos bens terrestres. A ideologia
individualista inspirada por tal concepção do homem favoreceu, nos inícios da
era industrial, a desigual repartição das riquezas, a um ponto tal que os
trabalhadores se viram excluídos do acesso aos bens essenciais, para cuja produção
tinham contribuído e aos quais tinham direito. Daí nasceram pujantes movimentos
de libertação da miséria mantida pela sociedade industrial.
Cristãos – leigos e
pastores – não deixaram de lutar por um reconhecimento equitativo dos legítimos
direitos dos trabalhadores. Em favor dessa causa, o Magistério da Igreja elevou
a sua voz, em diversas ocasiões.
Muito frequentemente,
porém, a justa reivindicação do movimento operário conduziu a novas servidões,
por se inspirar em concepções que, ignorando a vocação transcendente da pessoa
humana, atribuíam ao homem um fim meramente terrestre. Algumas vezes, voltou-se
para projectos colectivistas, que gerariam injustiças tão graves quanto as que
pretendiam pôr um fim.
Novas
formas de opressão
14. Dessa forma, a nossa
época viu nascer os sistemas totalitários e formas de tirania, que não teriam
sido possíveis em épocas anteriores à expansão tecnológica. Por um lado, a
perfeição tecnológica foi aplicada em genocídios. Por outro lado, praticando o
terrorismo, que causa a morte de inúmeros inocentes, minorias pretendem
derrotar nações inteiras.
O controlo, hoje, pode
insinuar-se até no interior dos indivíduos; e mesmo as dependências criadas
pelos sistemas de prevenção podem representar potenciais ameaças de opressão.
Uma falsa libertação das coacções da sociedade é procurada no recurso à droga,
que, no mundo todo, leva muitos jovens à auto-destruição, lançando famílias
inteiras na angústia e na dor.
Riscos
de destruição total
15. Torna-se cada vez mais
débil o reconhecimento de uma ordem jurídica como garantia do relacionamento
dentro da grande família dos povos. Quando a confiança no direito não parece
mais oferecer uma protecção suficiente, busca-se a segurança e a paz numa ameaça
recíproca, que se torna um risco para toda a humanidade. As forças que deveriam
servir ao desenvolvimento da liberdade servem para aumentar as ameaças. Os
instrumentos de morte que se opõem, hoje, são capazes de destruir toda a vida
humana sobre a terra.
Novas
relações de desigualdade
16. Entre as nações
dotadas de poderio e as que dele são privadas instalaram-se novas relações de
desigualdade e de opressão. A busca do interesse próprio parece ser a regra das
relações internacionais, sem que se leve em consideração o bem comum da
humanidade.
O equilíbrio interno das
nações pobres é rompido pela importação das armas, introduzindo nelas um factor
de divisão que conduz ao domínio de um grupo sobre outro. Que forças poderiam
eliminar o recurso sistemático às armas, restituindo ao direito a sua
autoridade?
Emancipação
das nações jovens
17. É no contexto da
desigualdade das relações de força que apareceram os movimentos de emancipação
das nações jovens, geralmente nações pobres, ainda recentemente submetidas ao
domínio colonial. Muito frequentemente, porém, o povo é privado de uma
independência duramente conquistada, por regimes ou tiranias sem escrúpulos,
que tripudiam impunemente sobre os direitos do homem. Dessa forma, o povo,
reduzido à impotência, apenas mudou de dono.
Permanece, no entanto,
como um dos maiores fenómenos do nosso tempo, em escala de continentes
inteiros, o despertar da consciência do povo que, esmagado pelo peso da secular
miséria, aspira a uma vida na dignidade e na justiça e está pronto a bater-se pela
sua liberdade.
A
moral e Deus obstáculos para a libertação?
18. Com relação ao
movimento moderno de libertação interior do homem, deve constatar-se que o
esforço para libertar dos seus limites o pensamento e a vontade chegou ao ponto
de considerar que a moralidade como tal constituía um limite irracional que o
homem, decidido a se tornar senhor de si mesmo, devia ultrapassar.
Mais ainda: para muitos, é
o próprio Deus que seria a alienação específica do homem. Entre a afirmação de
Deus e a liberdade humana haveria uma radical incompatibilidade. Rejeitando a
fé em Deus, o homem, enfim, tornar-se-ia livre.
Questões
angustiantes
19. Aqui se encontra a
raiz das tragédias que acompanham a história moderna da liberdade. Porque essa
história, apesar de grandes conquistas que, aliás, permanecem sempre frágeis,
experimenta frequentes recaídas na alienação e vê surgir novas servidões?
Porque movimentos de libertação, que suscitaram imensas esperanças, vão
desaguar em regimes para os quais a liberdade dos cidadãos, 8 a começar pela
primeira delas, que é a liberdade religiosa, 9 é o primeiro inimigo?
Quando o homem pretende
libertar-se da lei moral e tornar-se independente de Deus, longe de conquistar
a sua liberdade, ele destrói-a. Fugindo da medida da verdade, torna-se presa do
arbitrário; entre os homens, as relações fraternas são abolidas, para dar lugar
ao terror, ao ódio e ao medo.
O profundo movimento
moderno de libertação permanece ambíguo, porque foi contaminado por erros
mortais acerca da condição do homem e da sua liberdade. Ele carrega,
simultaneamente, promessas de verdadeira liberdade e ameaças de mortais
servidões.
(cont)
(Revisão
da versão portuguesa por ama)
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Notas:
8 Cfr. Instr. Libertatis Nuntius, XI,
10: AAS 76 (1984), 905-906.
9 Cfr. João Paulo II, Enc. Redemptor
Hominis, n. 17: AAS 71 (1979), 296-297; Decl. de 10 de março de 1984 ao 5o
Colóquio dos Juristas: L’Osservatore Romano, 11 de março de 1984, 8.