Art. 2 — Se a Cristo,
considerado na sua sensibilidade, convinha orar.
O
segundo discute-se assim. — Parece que a Cristo, considerado na sua
sensibilidade, convinha orar.
1.
— Pois, diz a Escritura, da pessoa de Cristo: O meu coração e a minha carne se regozijaram no Deus vivo. Ora, a
sensibilidade significa um desejo da carne. Logo, a sensibilidade de Cristo
podia ascender para o Deus vivo, regozijando-se e, pela mesma razão, orando.
2.
Demais. — Reza quem deseja o que pede. Mas, Cristo pediu o que desejava a sua
sensibilidade, quando disse – Passe de
mim este cálice, como se lê no Evangelho. Logo Cristo, na sua
sensibilidade, orou.
3.
Demais. — É mais unir-se a Deus em pessoa, que ascender a ele pela oração. Ora,
a sensibilidade foi assumida por Deus na unidade de pessoa, assim como qualquer
outra parte da natureza humana. Logo, com maior razão, podia ascender a Deus
pela oração.
Mas,
em contrário, o Apóstolo diz que o Filho
de Deus, pela natureza que assumiu, fez-se semelhante aos homens. Ora, os
outros homens não oram pela sensibilidade. Logo, também Cristo não orou pela sensibilidade.
Primeiro,
de modo que a própria oração seja um acto sensível. E deste modo, Cristo não
orou sensivelmente, pois, a sua sensibilidade foi da mesma natureza e da mesma
espécie que a nossa. Ora, em nós a sensibilidade não pode orar, por duas
razões. — Primeiro, porque o movimento da sensibilidade não pode transcender o
sensível, e portanto, não pode subir até Deus, como o exige a oração. —
Segundo, porque a oração implica uma certa ordem consistente em desejarmos
alguma coisa, como devendo ser realizada por Deus, o que é próprio só da razão.
Donde, a oração é um acto de razão.
Noutro
sentido, dizemos que alguém ora mediante a sensibilidade, porque quando faz a
sua oração propõe a Deus o objecto do desejo da sua sensibilidade. E neste
sentido Cristo orou mediante a sua sensibilidade: enquanto a sua oração
exprimia o afecto da sensibilidade, como se fosse advogado desta. E para assim
nos dar uma tríplice instrução. Primeiro, para mostrar que assumiu
verdadeiramente a natureza humana, com todos os seus afectos naturais. Segundo,
para mostrar que é lícito ao homem, pelo seu afecto natural, querer o que Deus
não quer. Terceiro, para mostrar que o homem deve sujeitar o seu afecto próprio
à vontade divina. Donde o dizer Agostinho:
Cristo, enquanto homem, mostra uma certa vontade particularmente humana, quando
diz — Passe de mim este cálice, pois, essa era uma vontade humana, a querer uma
causa propriamente particular. Mas como quer, com coração recto, ser homem e
ser dirigido para Deus, acrescenta — Contudo, não se faça a minha vontade,
senão a tua, como se dissesse — considera-te em mim pois, posso querer algo
como próprio, embora Deus queira de outro modo.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A carne regozija-se em Deus vivo, não pelo acto
pelo qual ascende para o Deus vivo, mas pelo redundar nela o coração, isto é,
enquanto o apetite sensitivo segue o movimento racional.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Embora a sensibilidade quisesse o que a razão pedia, pedi-lo,
contudo, nas suas orações, não era próprio da sensibilidade, mas, da razão.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — A união, na pessoa, funda-se no ser pessoal, implicado em
qualquer parte da natureza humana. Mas, a ascensão da oração é mediante um acto
só próprio da razão, como se disse. Logo, a comparação não colhe.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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