28/04/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Jo 15, 9-11

9 Como o Pai Me amou, assim Eu vos amei. Permanecei no Meu amor. 10 Se observardes os Meus preceitos, permanecereis no Meu amor, como Eu observei os preceitos de Meu Pai e permaneço no Seu amor. 11 Disse-vos estas coisas, para que a Minha alegria esteja em vós e para que a vossa alegria seja completa.

Comentário:

Jesus Cristo fala da alegria com a mesma veemência com que fala da paz, do amor, da união com Ele.

De facto desta união só podem nascer a paz, o amor e a alegria dos filhos de Deus.

(ama, comentário sobre Jo 15 9-11 2015.05.07)


Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO – CONFISSÕES

CAPÍTULO XXIII

A opinião de Agostinho

Ouço e medito essas opiniões na medida do meu fraco entendimento, que confesso a Deus, embora ele bem o conheça. Vejo que se podem originar duas espécies de opiniões sobre um testemunho de intérprete fidedigno. Uma é relativa à veracidade das coisas, e outra à intenção daquele que as enuncia. Procurar conhecer a verdade sobre a criação é uma coisa; procurar saber o que Moisés, grande servo da tua lei, quis o que o leitor ou ouvinte entendessem das suas palavras, é outra.

Quanto à primeira opinião, longe de mim todos os que têm como verdades os seus erros!

Quanto à segunda, longe de mim todos os que julgam falsidade o que Moisés disse. Possa eu unir-me em ti, alegrar-me em ti, Senhor, com aqueles que se alimentam da tua verdade na imensidão da caridade. Aproximemo-nos juntos das palavras do teu Livro, procurando a tua vontade nas intenções do teu servo, a cuja pena as revelaste.

CAPÍTULO XXIV

Qual a verdade?

Quem de nós, entre tantos significados possíveis que ocorrem aos estudiosos quanto às várias interpretações das tuas palavras, poderá atinar com tais intenções e declarar com segurança: “Eis o pensamento de Moisés, este é o sentido que quis dar á sua narração”. – Quem poderá declará-lo, com a mesma segurança que ele, que essa narração é verdadeira, qualquer que tenha sido o pensamento de Moisés?

Eis que eu, meu Deus, teu servo, te consagrei nesta obra o sacrifício das minhas confissões; peço à tua misericórdia que me permita a realização desse desejo, e declaro com toda a segurança que criaste todas as coisas, as invisíveis e as visíveis, pelo teu verbo imutável.

Mas poderei dizer com a mesma certeza que Moisés teve essa intenção, e não outra, quando escreveu: “No princípio, criou Deus o céu e a terra”? – Embora esteja persuadido que isto está claro na tua verdade, não vejo com igual certeza o que Moisés pretendia ao escrever tais palavras. Por essa expressão: “no princípio” pode ter significado: “no começo da criação”. Por céu e terra, pode ter querido dar-nos a entender, a natureza espiritual e corporal, não já formada e perfeita, mas uma e outra, só esboçada e sem forma. Vejo que ambos os sentidos são igualmente plausíveis. Mas não posso atinar em qual dos dois pensava Moisés quando escrevia essas palavras. Fosse porém qual fosse a sua intenção ao exprimir essas palavras, eu não poderia duvidar de que tão grande homem tenha entrevisto a verdade e a tenha formulado adequadamente.

CAPÍTULO XXV

Os diversos partidos

Que ninguém me moleste portanto, dizendo: “O pensamento de Moisés não é o que tu dizes, mas o que eu digo”. – Se apenas me dissessem: “Como sabes que Moisés de facto entendia essas palavras no sentido que lhe atribuis?” – Eu não me agastaria, e responderia talvez o que respondi acima, ou até mais explicitamente, se o meu contraditor fosse insistente.

Quando porém, me dizem: “O pensamento de Moisés não é o que dizes, é o que eu afirmo” – sem contudo provar a veracidade de uma ou outra interpretação, então, ó vida dos pobres, ó meu Deus, em cujo seio não há contradição, inunda de paz o meu coração, para que eu tenha paciência para suportar essas pessoas. Pois não emitem tais opiniões inspirados por Deus, ou porque tenham lido o pensamento do teu servo, mas porque são orgulhosos. Ignoram o pensamento de Moisés, mas só apreciam o deles, e não por que seja verdadeiro, mas por ser o deles. Se assim não fosse, apreciariam igualmente a opinião alheia, quando verdadeira, assim como eu aprecio o que eles dizem verdadeiro, não porque vem deles, mas porque é verdade, e que, por isso mesmo, é tanto deles como minha, pois pertence em comum a todos os amantes da verdade.

Quanto à pretensão de que o pensamento de Moisés não está no que digo, mas no que eles dizem, isso eu não aceito. Ainda que assim fosse, a sua temeridade não é da ciência, mas a da audácia; seria produzida não por uma intuição correcta, mas pelo orgulho.

Senhor, o teu julgamento é terrível. Porque a tua verdade nem é um bem meu, nem o bem deste ou daquele: a verdade é o bem de todos nós; e tu nos conclamas abertamente a que participemos dela, com a advertência severa de não a possuirmos como bem privativo, para não sermos privados dela. De facto, quem reivindica apenas para si o que ofereces para gozo de todos, e quer para si o que é de todos, é rejeitado desse bem comum para o que é seu, isto é, da verdade para a mentira: o que fala mentira fala do que é seu.

Ouvem, pois, juiz excelente, ó Deus, que és a própria Verdade: ouve o que respondo a esse contraditor.

É diante de ti que falo, e na presença dos meus irmãos que usam legitimamente da lei, cujo fim é a caridade. Escuta e vê o que lhes digo, se é do teu agrado. Eis as palavras fraternas e de paz que lhe dirijo: “Quando ambos vemos que as tuas palavras são verdadeiras, ou as minhas palavras são verdadeiras, pergunto: onde o vemos? Certamente não é em ti que eu a vejo, nem tampouco é em mim que tu a vês. Ambos a vemos na verdade imutável, que está acima das nossas inteligências”.

Uma vez que não discordamos sobre essa luz do Senhor, nosso Deus, por quê discutir sobre o pensamento do nosso próximo? Nós não o podemos ver como vemos a verdade imutável.

Se o próprio Moisés nos aparecesse e nos explicasse o seu pensamento – nem assim veríamos esse pensamento, mas apenas acreditaríamos nele. Cuidemos pois, de não nos levantarmos orgulhosamente um contra o outro a respeito das Escrituras. Amemos o Senhor, nosso Deus, de todo o nosso coração, de toda a nossa alma, de todo o nosso espírito, e ao próximo como a nós mesmos. É segundo esses dois preceitos da caridade que Moisés pensou aquilo que escreveu nos seus livros. Não acreditarmos nisso seria considerar o Senhor mentiroso, atribuindo ao seu servo sentimentos distintos daqueles que ele próprio lhe ensinou. Diante de tantos pensamentos igualmente verdadeiros que podem ser deduzidos dessas palavras, vê que estultice é afirmar temerariamente que Moisés teve este pensamento e não aquele, ofendendo com as nossas disputas perniciosas a caridade, por amor da qual ele escreveu as palavras que procuramos interpretar!

CAPÍTULO XXVI

Agostinho no lugar de Moisés

Todavia, meu Deus, que me elevas na minha pequenez, que descansas a minha fadiga, que ouves as minhas confissões e perdoas os meus pecados, tu ordenas-me que eu ame o meu próximo como a mim mesmo; não posso crer que Moisés, teu servo tão fiel, tenha sido aquinhoado com menos dons do que eu teria desejado e apetecido se tivesse nascido no seu tempo, e me tivesses confiado a tarefa de te servir com o meu coração e a minha língua, e disseminar essas Escrituras. Estas, tanto tempo depois, deviam ser úteis a todos os homens e, pelo mundo afora, triunfar com o prestígio da sua autoridade sobre as afirmações das doutrinas falsas e orgulhosas.

Quereria, se estivesse no lugar de Moisés – pois todos procedemos da mesma massa, e que é o homem se não te lembras dele? – e me tivesses confiado a missão de escrever o Génesis, quereria receber de ti tal eloquência, tal qualidade de estilo, que mesmo os espíritos incapazes de compreender como foi que Deus criou, não pudessem rejeitar as minhas palavras como superiores às suas forças; que os que já o pudessem, descobrissem, nas poucas palavras do teu servo, todas as verdades que a sua reflexão já lhes tivesse proporcionado; e que se alguém, à luz da tua verdade, nelas percebesse outro significado, também ele o pudesse encontrar nessas mesmas palavras.

CAPÍTULO XXVII

Os diversos sentidos da Escritura

Assim como uma fonte, no seu pequeno leito, se torna depois mais abundante e, pelos diversos regatos que alimenta, banha espaços muito mais amplos que qualquer um deles, que deslizam através de muitas regiões, assim também a narração do ministro da tua palavra, que deveria alimentar tantos intérpretes, faz brotar do seu estilo sóbrio e conciso torrentes de límpida verdade, de onde cada um tira para si a verdade que pode, para depois desenvolvê-la em longas sinuosidades de palavras.

Alguns, lendo ou escutando aquelas palavras, imaginam a Deus como homem ou como massa material dotada de imenso poder que, por decisão nova e repentina, criara fora de si mesma e como que à distância, o céu e a terra, esses dois grandes corpos, um superior, outro inferior, onde estão contidas todas as coisas. E ao ouvirem dizer: ”Deus disse: faça-se isto! E isto foi feito! – imaginam que se trata de palavras comuns, que começam e terminam, que soam no tempo e passam. Julgam que, logo após pronunciadas, começa existir o que ordenaram que existisse. Todas as suas demais concepções se ressentem do mesmo hábito de pensar de modo carnal.

Nisto são como crianças, pois enquanto essa linguagem humilde sustentar a sua fraqueza como o seio de uma mãe, o que se fortifica salutarmente é a fé, que lhes faz ter como certo que Deus criou todas as realidades, cuja admirável variedade impressiona a seus sentidos.

Mas, se alguém, desprezando a aparente simplicidade das tuas palavras, na sua orgulhosa fraqueza, se lançar para fora do ninho que o nutriu, então cairá miseravelmente, Senhor Deus, tem piedade dele! Que os transeuntes não pisem este passarinho implume; manda o teu anjo para que o reponha no ninho, para que viva até que aprenda a voar!

(Revisão de versão portuguesa por ama)


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