A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Para ver, clicar SFF.
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Evangelho: Jo 7, 25-53
25 Diziam então alguns de Jerusalém:
«Não é Este Aquele que procuram matar? 26 Eis que fala com toda a
liberdade e não Lhe dizem nada. Terão os chefes do povo verdadeiramente
reconhecido que Este é o Messias? 27 Nós, porém, sabemos donde Este
é; e o Messias, quando vier, ninguém saberá donde Ele seja». 28
Jesus, que ensinava no templo, exclamou: «Vós Me conheceis, e sabeis donde Eu
sou. Eu não vim de Mim mesmo, mas é verdadeiro Aquele que Me enviou, a Quem vós
não conheceis. 29 Mas Eu conheço-O, porque procedo d'Ele, e Ele Me
enviou». 30 Procuraram então prendê-l'O; mas ninguém Lhe lançou as
mãos, porque não tinha ainda chegado a Sua hora. 31 Muitos dentre a
multidão acreditaram n'Ele, e diziam: «Quando vier o Messias, fará maior número
de prodígios que os que Este fez?». 32 Os fariseus ouviram os
comentários que d'Ele fazia o povo; e os príncipes dos sacerdotes e os fariseus
enviaram guardas para O prenderem. 33 Jesus disse-lhes: «Ainda por
um pouco estou convosco, depois vou para Aquele que Me enviou. 34
Vós Me buscareis e não Me encontrareis; nem vós podeis vir para onde Eu estou».
35 Os judeus disseram, pois, entre si: «Para onde é que Ele irá que
não O encontraremos? Irá, porventura, para os que estão dispersos entre as
nações e pregará aos gentios? 36 Que quer dizer esta palavra que Ele
nos disse: Vós Me buscareis, e não Me encontrareis, e onde Eu estou vós não
podeis vir?». 37 No último dia, o mais solene da festa, estava Jesus
em pé, e em alta voz dizia: «Se alguém tem sede, venha a Mim e beba. 38
Quem acredita em Mim, como diz a Escritura, do seu seio correrão rios de água
viva». 39 Ora Ele dizia isto falando do Espírito que haviam de
receber os que cressem n'Ele; porque ainda não tinha sido dado o Espírito, por
não ter sido ainda glorificado Jesus. 40 Entretanto, alguns daquela
multidão, tendo ouvido estas palavras, diziam: «Este é verdadeiramente o
profeta». 41 Outros diziam: «Este é o Messias». Alguns, porém,
diziam: «Porventura é da Galileia que há-de vir o Messias? 42 Não
diz a Escritura: “Que o Messias há-de vir da descendência de David e da aldeia
de Belém, donde era David”?». 43 Houve, portanto, desacordo entre o
povo acerca d'Ele. 44 Alguns deles queriam prendê-l'O, mas nenhum
pôs as mãos sobre Ele.45 Voltaram, pois, os guardas para os
príncipes dos sacerdotes e fariseus, que lhes perguntaram: «Porque não O
trouxestes preso?». 46 Os guardas responderam: «Nunca homem algum
falou como Este homem». 47 Os fariseus replicaram: «Porventura,
também vós fostes seduzidos? 48 Houve, porventura, algum dentre os
chefes do povo ou dos fariseus que acreditasse n'Ele? 49 Quanto a
esta plebe, que não conhece a Lei, é maldita». 50 Nicodemos, que era
um deles, o que tinha ido de noite ter com Jesus, disse-lhes: 51 «A
nossa Lei condena, porventura, algum homem antes de o ouvir e antes de se
informar sobre o que ele fez?». 52 Responderam: «És tu também
galileu? Examina as Escrituras, e verás que da Galileia não sai nenhum
profeta». 53 E foi cada um para sua casa.
CRISTO QUE PASSA 065 a 082
65
Que
estranha capacidade tem o homem de esquecer as coisas mais maravilhosas e de se
acostumar ao mistério! Reparemos de novo, nesta Quaresma, que o cristão não
pode ser superficial. Estando plenamente metido no seu trabalho habitual, entre
os demais homens, seus iguais, atarefado, ocupado, em tensão, o cristão tem de
estar, ao mesmo tempo, imerso totalmente em Deus, porque é filho de Deus.
A
filiação divina é uma feliz verdade, um mistério consolador. A filiação divina
enche a nossa vida espiritual, porque nos ensina a conviver intimamente com o
nosso Pai do Céu, a conhecê-Lo, a amá-Lo, e assim enche de esperança a nossa
luta interior e dá-nos a simplicidade confiante dos filhos pequenos. Mais
ainda: precisamente por sermos filhos de Deus, essa realidade leva-nos também a
contemplar com amor e com admiração todas as coisas que saíram das mãos de Deus
Pai, Criador. E deste modo somos contemplativos no meio o mundo, amando o
mundo.
Na
Quaresma, a Liturgia considera as consequências do pecado de Adão na vida do
homem. Adão não quis ser um bom filho de Deus e revoltou-se. Mas também se faz
ouvir continuamente o eco dessa felix culpa - culpa feliz, ditosa - que a
Igreja inteira cantará, cheia de alegria, na vigília do Domingo de Ressurreição.
Deus
Pai, chegada a plenitude dos tempos, enviou ao mundo o seu Filho unigénito para
que restabelecesse a paz; para que, redimindo o homem do pecado, adoptionem
filiorum reciperemus, fôssemos constituídos filhos de Deus, libertos do jugo do
pecado, capazes de participar na intimidade divina da Trindade. E assim se
tomou possível a este homem novo, a esta nova enxertia dos filhos de Deus
libertar a Criação inteira da desordem, restaurando todas as coisas em Cristo,
que nos reconciliou com Deus.
É
tempo de penitência, pois. Mas, como vimos, não se trata de uma tarefa
negativa. A Quaresma deve ser vivida com o espírito de filiação que Cristo nos
comunicou e que vive na nossa alma. O Senhor chama-nos para que nos acerquemos
d'Ele, desejando ser como Ele: Sede imitadores de Deus, como filhos muito
amados, colaborando humildemente, mas fervorosamente, no divino propósito de
unir o que está quebrado, de salvar o que está perdido, de ordenar o que o
homem pecador desordenou, de conduzir ao seu fim o que está desencaminhado, de
restabelecer a divina concórdia de todas as criaturas.
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A
liturgia da Quaresma toma por vezes acentos trágicos, fruto da consideração do
que significa para o homem afastar-se de Deus. Mas esta consideração não é a
última palavra. A última palavra pertence a Deus, é a palavra do seu amor
salvador e misericordioso e, portanto, a palavra da nossa filiação divina. Por
isso vos repito com S. João: vede que amor teve por nós o Pai, querendo que nos
chamássemos filhos de Deus e que o fôssemos na verdade! Filhos de Deus, irmãos
do Verbo feito carne, d'Aquele de Quem foi dito: n'Ele estava a vida, e a vida
era a luz dos homens! Filhos da Luz, irmãos da Luz - isso é o que somos!
Portadores da única chama capaz de iluminar os corações feitos de carne!
Calando-me
eu agora e continuando a Santa Missa, cada um de vós deve pensar no que lhe
pede o Senhor; que propósitos, que decisões a acção da graça quer provocar
dentro de si. E, ao reconhecer essas exigências sobrenaturais e humanas de
entrega e de luta, lembrai-vos de que o nosso modelo é Jesus Cristo, e que
Jesus, sendo Deus, permitiu que O tentassem, para que assim nos enchêssemos de
ânimo e ficássemos certos da vitória. Porque Ele não perde batalhas; estando
unidos a Ele, nunca seremos vencidos, mas poderemos chamar-nos e ser realmente
vencedores - bons filhos de Deus.
Vivamos
contentes. Eu estou contente. Não o deveria estar olhando para a minha vida,
fazendo esse exame pessoal de consciência que este tempo litúrgico da Quaresma
nos pede... Mas sinto-me contente, porque vejo que o Senhor me procura uma vez
mais, que o Senhor continua a ser meu Pai. Sei que vós e eu, decididamente, com
o resplendor e a ajuda da graça, veremos que coisas há que queimar, e
queimá-las-emos; que coisas há que entregar, e entregá-las-emos!
A
tarefa não é fácil. Mas contamos com uma orientação clara, com uma realidade de
que não devemos nem podemos prescindir: somos amados por Deus e deixaremos que
o Espírito Santo actue em nós e nos purifique, para podermos abraçar-nos assim
ao Filho de Deus na Cruz, ressuscitando depois com Ele, porque a alegria da
Ressurreição está enraizada na Cruz.
Maria,
nossa Mãe, auxilium christianorum, refugium peccatorum, intercede junto de teu
Filho para que nos envie o Espírito Santo, que desperte em nossos corações a
decisão de caminharmos com passo firme e seguro, fazendo soar no mais fundo da
nossa alma o chamamento que encheu de paz o martírio de um dos primeiros
cristãos: veni ad Patrem - vem, volta ao teu Pai, que te espera!
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Lemos
na Santa Missa um texto do Evangelho segundo S. João, que nos relata a cena da
cura milagrosa do cego de nascença. Suponho que todos nos comovemos uma vez
mais perante o poder e a misericórdia de Deus, que não olha com indiferença
para a desgraça humana. Mas preferia agora centrar-me sobre outros aspectos,
para que vejamos, em concreto, que quando há amor de Deus, o cristão não pode
ficar indiferente perante a sorte dos outros homens e deve tratar toda a gente
com respeito; e que, além disso, que quando esse amor diminui, surge o perigo
de se invadir, fanática e impiedosamente, a consciência alheia.
E,
passando Jesus, - diz o Santo Evangelho - viu um homem cego de nascença. Jesus,
que passa... Entusiasma-me com frequência esta forma simples de narrar a
clemência divina. Jesus passa e apercebe-se imediatamente da dor. Reparai, em
contrapartida, como eram diferentes os pensamentos dos discípulos.
Perguntam-lhe: Mestre, quem pecou: este ou os seus pais, para que nascesse
cego?
Os falsos juízos
Não
deve causar estranheza que muitas pessoas, mesmo das que se têm por cristãs, se
comportem de forma semelhante. Antes de mais nada, pensam mal dos outros. Sem
prova alguma, partem desse princípio. E não só o pensam, como até se atrevem a
exprimi-lo em juízos temerários diante de toda a gente.
Com
um pouco de benevolência, a conduta dos discípulos poderia considerar-se
leviana. Naquela sociedade, como hoje - nisto pouco se mudou - havia outros, os
fariseus, que faziam dessa atitude uma norma. Recordai como Jesus os denuncia:
Veio João, que não comia nem bebia, e dizem: Ele tem demónio. Veio o Filho do
homem, que come e bebe, e dizem: Eis um glutão e bebedor de vinho, amigo dos
publicamos, e dos pecadores.
Ataque
sistemático à fama, denegrição de condutas irrepreensíveis. Esta crítica
mordaz, cruel, sofreu-a Jesus Cristo e não é raro que alguns reservem o mesmo
tratamento para aqueles que, conscientes das suas lógicas e naturais misérias e
dos seus erros pessoais, pequenos e inevitáveis - acrescentaria - dada a fraqueza
humana, desejam seguir o Mestre. Mas a verificação dessas realidades não deve
levar-nos a justificar tais pecados e delitos - ou "tagarelices",
como se lhes chama com suspeita compreensão - contra o bom nome de quem quer
seja. Jesus anuncia que, se apodaram ao pai de família de Belzebu, não é de
esperar que tratem melhor com os da sua casa; mas esclarece também que o que
chamar louco ao seu irmão, será condenado ao fogo da geena.
Como
nascerá esta apreciação injusta dos outros? Dir-se-ia que algumas pessoas usam
continuamente uma espécie de lentes que lhes altera a visão. Não acreditam, por
princípio, que seja possível a rectidão ou, pelo menos, a luta constante por se
portar bem. Tudo recebem, como reza o antigo adágio filosófico, de acordo com o
recipiente: com a sua própria deformação. Para eles, até o que há de mais recto
reflecte, apesar de tudo, uma intenção retorcida que procura hipocritamente uma
aparência de bondade. Quando descobrem claramente o bem, escreve S. Gregório,
esquadrinham tudo para examinar se há, para além disso, algum mal oculto.
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É
difícil fazer compreender a essas pessoas, em quem a deformação se torna quase
uma segunda natureza, que é mais humano e mais verídico pensar bem dos outros.
Santo Agostinho dá o seguinte conselho: procurar viver as virtudes que, segundo
julgais, faltam aos vossos irmãos e já não vereis os seus defeitos, porque não
os tereis vós. Para alguns, este modo de proceder é uma ingenuidade. Eles são
mais realistas, mais razoáveis.
Erigindo
como norma de critério o preconceito, ofenderão qualquer pessoa sem ouvir
razões. Depois, objectivamente, bondosamente, talvez concedam ao injuriado a
possibilidade de se defender. Ora isto vai contra todo o direito e toda a
moral, porque em lugar de serem eles a produzir a prova da pretensa falta,
concedem ao inocente o privilégio de demonstrar a sua inocência.
Não
seria sincero se não vos confessasse que as anteriores considerações são algo
mais do que um simples respigar de tratados de direito e de moral. Fundamentam-se
numa experiência que têm sentido muitos na sua própria carne, por terem sido,
com frequência e durante longos anos, o alvo de exercícios de tiro da
murmuração, da difamação, da calúnia. A graça de Deus e um feitio nada
rancoroso fizeram com que nada disso tenha deixado neles o menor rasto de
amargura. Mihi pro minimo est, ut a vobis iudicer, pouco me importa ser julgado
por vós, poderiam dizer com S. Paulo. Às vezes, empregando palavras mais
correntes, terão acrescentado que tudo lhes saiu sempre por uma frioleira. Essa
é a verdade.
Por
outro lado, contudo, não posso negar que a mim me causa tristeza a alma daquele
que ataca injustamente a honra alheia, porque o agressor injusto arruina-se a
si mesmo. E sofro também por tantos que, diante das acusações arbitrárias e
desaforadas, não sabem onde pôr os olhos, ficando aterrados, não as crendo
possíveis e pensando se não será tudo um pesadelo.
Há
alguns dias líamos na Epístola da Santa Missa o relato de Susana, aquela mulher
casta, falsamente incriminada de desonestidade por dois velhos corruptos.
Susana gemeu e disse: De todas as partes me vejo cercada de angústias; porque,
se eu fizer o que vós desejais, incorro na morte, e, se não o fizer, não
escaparei das vossas, mãos. Quantas e quantas vezes a insídia dos invejosos ou
dos intriguistas não coloca muitas pessoas honestas na mesma situação!
Oferece-se-lhes esta alternativa: ofender o Senhor ou ver denegrida a sua
honra. A única solução nobre e digna é, ao mesmo tempo, extremamente dolorosa e
têm de resolver: melhor é para mim cair entre as vossas mãos sem cometer o mal,
do que pecar na presença do Senhor.
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Direito à intimidade
Voltemos
à cena da cura do cego. Jesus Cristo replicou aos seus discípulos que aquela
desgraça não era consequência do pecado, mas uma ocasião para que se
manifestasse o poder de Deus. E, com maravilhosa simplicidade, decide que o
cego veja.
Começa
então, a par da felicidade, o tormento daquele homem. Não o deixarão em paz.
Primeiro são os vizinhos e os que antes o tinham visto a pedir esmola. O
Evangelho não nos diz que se tivessem alegrado, mas que não acreditavam nele,
apesar de o cego insistir que esse, que dantes não via e depois já via, era ele
mesmo. Em vez de o deixarem gozar serenamente aquela graça, levam-no aos fariseus,
que lhe perguntam de novo como foi. E ele responde, pela segunda vez: pôs-me
lodo sobre os olhos, lavei-me e vejo.
A
partir de então, os fariseus querem demonstrar que aquilo que aconteceu, uma
boa coisa e um grande milagre, não aconteceu. Alguns deles recorrem a
raciocínios mesquinhos, hipócritas, muito pouco equânimes: curou num sábado e,
como trabalhar ao sábado está proibido, negam o prodígio. Outros começam o que
hoje se chamaria um inquérito. Vão ter com os pais do cego: É este o vosso filho,
que vós dizeis que nasceu cego? Como vê, pois, agora?. O medo aos poderosos
leva a que os pais respondam com uma frase que reúne todas as garantias do
método científico: sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego; mas não
sabemos como ele agora vê e também não sabemos quem lhe abriu os olhos;
perguntai-o a ele mesmo; tem idade, ele mesmo fale de si.
Os
que fazem o inquérito não podem crer, porque não querem crer. Tornaram, pois, a
chamar o homem que tinha sido cego e disseram-lhe: ... nós sabemos que esse
homem - Jesus Cristo - é um pecador.
Com
poucas palavras, o relato de S. João exemplifica aqui um modelo de atentado
tremendo contra o direito básico, que por natureza a todos corresponde, de ser
tratado com respeito.
O
tema continua a ser actual. Não daria muito trabalho a assinalar, nesta época,
casos dessa curiosidade agressiva que conduz a indagar morbidamente a vida
privada dos outros. Um mínimo sentido de justiça exige que, mesmo na
investigação de um suposto delito, se proceda com cautela e moderação, sem
tomar por certo o que apenas é uma possibilidade. Compreende-se perfeitamente
que a curiosidade malsã por desventrar aquilo que não só não é um delito, como
até é possível tratar-se de uma acção honrosa, deva qualificar-se como uma perversão.
Perante
os negociadores da suspeita, que dão a impressão de organizar um tráfico de
intimidade, é preciso defender a dignidade de cada pessoa, o seu direito ao
silêncio. Nesta defesa costumam coincidir todos os homens honrados, sejam ou
não cristãos, porque se ventila um valor comum: a legítima decisão de uma
pessoa ser ela mesma, de não se exibir, de conservar em justa e íntima reserva
as suas alegrias, as suas penas e dores de família e, sobretudo, de fazer o bem
sem espectáculo, de ajudar os necessitados por puro amor, sem obrigação de
publicar essas tarefas ao serviço dos outros e, muito menos, de pôr a
descoberto a intimidade da sua alma diante dos olhares indiscretos e pouco
rectos de pessoas que nada sabem nem desejam saber da vida interior, a não ser
para troçar impiamente.
Mas
como é difícil ver-se livre dessa agressividade intrometida! Os métodos para
não deixar um homem tranquilo têm-se multiplicado. Refiro-me aos meios técnicos
e também a sistemas de argumentação geralmente aceites, contra os quais é
difícil lutar, se se deseja conservar a reputação. Parte-se, assim, muitas
vezes da ideia de que toda a gente procede mal. Por isso, com esta forma de
pensar errada, torna-se inevitável o meaculpismo, a autocrítica. Se uma pessoa
não lança sobre si uma tonelada de lama, deduzem que, além de incurável, é
hipócrita e arrogante.
Noutras
ocasiões age-se de modo diferente. Quem fala ou escreve, caluniando, está
disposto a admitir que eu sou um indivíduo integro, mas que outros talvez não
tenham a mesma opinião, pelo que podem publicar que sou um ladrão. Ou melhor: o
senhor afirmou sempre que a sua conduta é limpa, nobre, recta. Aborrecer-se-ia
de considerá-la de novo, para comprovar se - pelo contrário - essa sua conduta
não será porventura suja, desleal e retorcida?
70
Não
são exemplos imaginários. Estou persuadido de que qualquer pessoa, ou qualquer
instituição com um pouco de renome poderia aumentar a casuística. Criou-se em
alguns sectores a falsa mentalidade de que o público, o povo, ou como queiram
chamá-lo, tem o direito de conhecer e interpretar os pormenores mais íntimos da
existência dos outros.
Permiti-me
algumas palavras sobre algo que está bem unido à minha alma. Desde há mais de
trinta anos que digo e escrevo de muitas maneiras que o Opus Dei não tem
qualquer finalidade temporal ou política. Pretende única e exclusivamente
difundir, entre pessoas de todas as raças, de todas as condições sociais, de
todos os países, o conhecimento e a prática da doutrina salvadora de Cristo e
contribuir para que haja mais amor de Deus na terra e, portanto, mais paz, mais
justiça entre os homens, filhos de um único Pai.
Muitos
milhares de pessoas - milhões -, em todo o mundo, entenderam. Outros, ou
melhor, um número muito reduzido, pelos motivos que se quiser, parece que não.
Se o meu coração está mais perto dos primeiros, honro e amo também os outros,
porque em todos é estimável e respeitável a sua dignidade e todos estão
chamados à glória de filhos de Deus.
Mas
nunca falta uma minoria sectária que, não compreendendo o que eu e tantos
outros amamos, gostaria que lho explicássemos de acordo com a sua mentalidade,
exclusivamente política, de interesses e de pressões de grupo. Se não recebem
uma explicação assim, errada e amanhada ao seu gosto, continuam a pensar que há
mentira, verdades ocultas, planos sinistros.
Deixai
que vos diga que, nesses casos, nem me entristeço nem me preocupo.
Acrescentaria até que me divirto se se pudesse passar por alto que cometem uma
ofensa ao próximo e um pecado que clama a Deus. Sou aragonês e, mesmo pelo que
há de humano no meu carácter, amo a sinceridade. Sinto uma repulsa instintiva
por tudo o que signifique dissimulação. Sempre procurei responder com a
verdade, sem prepotência, sem orgulho, ainda que os que caluniavam fossem mal
educados, arrogantes, hostis, sem o menor sinal de humanidade.
Veio-me
com frequência à cabeça a resposta do cego de nascimento aos fariseus que
perguntavam pela centésima vez como tinha sucedido o milagre: Eu já vo-lo e vós
já o ouvistes; porque o quereis ouvir novamente? Quereis, porventura, fazer-vos
também seus discípulos?.
71
Colírio nos olhos
O
pecado dos fariseus não consistia em não verem Deus em Cristo, mas em
encerrarem-se voluntariamente em si mesmos, em não tolerarem que Jesus, que é
luz, lhes abrisse os olhos. Este ensimesmamento tem resultados imediatos na
vida de relação com os nossos semelhantes. O fariseu que, por se considerar a
si próprio como luz, não deixa que Deus lhe abra os olhos é o mesmo que trata
soberba e injustamente o próximo: graças te dou, ó Deus, porque não sou como os
outros homens: ladrões, injustos, adúlteros, nem como este publicano, reza ele.
E ao cego de nascença, que persiste em contar a verdade da cura milagrosa,
ofendem-no: Tu nasceste coberto de pecados e queres ensinar-nos? E lançaram-no
fora.
Entre
os que não conhecem Cristo há muitos homens honrados que, por elementar
circunspecção, sabem comportar-se com delicadeza. São sinceros, cordiais,
educados. Se eles e nós não nos opusermos a que Cristo cure a cegueira que
ainda existe nos nossos olhos, se permitirmos que o Senhor nos aplique esse
lama que, nas suas mãos, se converte no mais eficaz colírio, compreenderemos as
realidades terrenas, vislumbraremos as eternas com uma luz nova, a luz da fé, e
adquiriremos um olhar limpo.
Esta
é a vocação do cristão, ou seja, a plenitude dessa caridade que é paciente, é
benigna; a caridade não é invejosa, não é temerária; não se ensoberbece, não é
ambiciosa, não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita
mal, não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; tudo desculpa, tudo
crê, tudo espera, tudo sofre .
A
caridade de Cristo não é apenas um bom sentimento em relação ao próximo. Não se
limita ao gosto pela filantropia. A caridade, infundida por Deus na alma,
transforma a partir de dentro a inteligência e a vontade, fundamenta
sobrenaturalmente a amizade e a alegria de fazer o bem.
Contemplai
a cena da cura do coxo, que os Actos dos Apóstolos nos contam. Subiam Pedro e
João ao templo e, ao passarem, encontraram um homem sentado à porta, que era
coxo desde o seu nascimento. Tudo recorda a cura do cego de que falávamos. Mas
agora os discípulos não pensam que a desgraça se deva aos pecados pessoais do
doente ou às faltas dos seus pais. E dizem-lhe: Em nome de Jesus Cristo
Nazareno, levanta-te e anda. Antes, manifestavam incompreensão, agora
misericórdia; antes, julgavam com temeridade, agora curam milagrosamente em
nome do Senhor. Sempre Cristo, que passa! Cristo, que continua a passar pelas
ruas e pelas praças do mundo, através dos seus discípulos, os cristãos.
Peço-Lhe fervorosamente que passe pela alma de alguns dos que me escutam nestes
momentos.
72
Respeito e caridade
Surpreendia-nos
ao principio a atitude dos discípulos de Jesus diante do cego de nascimento.
Estavam na linha daquele rifão infeliz: pensa mal e acertarás. Depois, quando
conhecem melhor o Mestre, quando se apercebem do que significa ser cristão, as
suas opiniões são inspiradas pela compreensão.
Em
qualquer homem - escreve S. Tomás - existe algum aspecto pelo qual os outros
podem considerá-lo como superior, conforme as palavras do Apóstolo:
"levados pela humildade, julgai-vos uns aos outros como superiores"
(Fil. II, 3). De acordo com isto, todos os homens devem honrar-se mutuamente. A
humildade é a virtude que nos faz descobrir que as manifestações de respeito
pela pessoa - pela sua honra, pela sua boa fé, pela sua intimidade - não são
convencionalismos exteriores, mas as primeiras manifestações da caridade e da
justiça.
A
caridade cristã não se limita a socorrer o necessitado de bens económicos;
leva-nos, antes de mais nada, a respeitar e a defender cada indivíduo enquanto
tal, na sua intrínseca dignidade de homem e de filho do Criador. Por isso, os
atentados à pessoa - à sua reputação, à sua honra - provam, em quem os comete,
que não professa ou não pratica algumas verdades da nossa fé cristã e, sempre,
a carência de um autêntico amor de Deus. A caridade com que amamos a Deus e ao
próximo é a mesma virtude, porque a razão de amar o próximo é precisamente Deus
e amamos a Deus quando amamos o próximo com caridade.
Espero
que sejamos capazes de tirar consequências muito concretas deste bocado de
conversa na presença do Senhor, principalmente o propósito de não julgar os
outros, de não os ofender sequer com a dúvida, de afogar o mal em abundância de
bem, semeando ao nosso redor a convivência leal, a justiça e a paz , e a
decisão de nunca nos entristecermos se a nossa conduta recta for mal entendida
por outros, se o bem que - com a ajuda contínua do Senhor - procuramos
realizar, for interpretado retorcidamente, atribuindo às nossas intenções,
através de um processo ilícito, maus desígnios próprios de uma conduta dolosa e
simuladora. Perdoemos sempre, com um sorriso nos lábios. Falemos com clareza,
sem rancor, quando pensarmos em consciência que devemos falar. E deixemos tudo
nas mãos do Nosso Pai, Deus, com um divino silêncio - Iesus autem tacebat,
Jesus, porém, estava calado -, se se trata de ataques pessoais, por mais
brutais e indecorosos que sejam. Preocupemo-nos apenas em fazer boas obras,
pois Ele encarregar-se-á de que elas brilhem diante dos homens.
73
Como
toda a festa cristã, esta que agora celebramos é especialmente uma festa de
paz. Os ramos, com o seu antigo simbolismo, evocam aquela cena do Génesis:
depois de ter esperado outros sete dias, novamente deitou a pomba fora da arca.
E ela voltou a ele pela tarde trazendo no bico um ramo de oliveira com folhas
verdes. Entendeu, pois, Noé que as águas tinham cessado sobre a terra. Agora
recordamos que a aliança entre Deus e o seu povo é confirmada e estabelecida em
Cristo, porque Ele é a nossa paz. Nessa maravilhosa unidade e recapitulação do
velho no novo, que caracteriza a liturgia da nossa Santa Igreja Católica, lemos
no dia de hoje estas palavras de profunda alegria: os filhos dos hebreus,
levando ramos de oliveira, saíram ao encontro do Senhor, aclamando e dizendo:
glória nas alturas.
A
aclamação a Jesus Cristo une-se, na nossa alma, com aquela que saudou o seu nascimento
em Belém. E, à sua passagem, conta-nos S. Lucas, as multidões estendiam os seus
mantos no caminho. E, quando já ia chegando à descida do monte das Oliveiras,
toda a multidão dos seus discípulos começou alegremente a louvar a Deus em
altas vozes por todas as maravilhas que tinham visto, dizendo: Bendito o Rei
que vem em nome do Senhor. Paz no Céu e glória nas alturas.
Paz na terra
Pax
in coelo, paz no céu. Mas olhemos também o mundo: porque é que não há paz na
terra? Não, não há paz. Há somente aparências de paz, equilíbrio de medo,
compromissos precários. Nem sequer há paz na Igreja, sulcada por tensões que
retalham a branca túnica da Esposa de Cristo. Não há paz em muitos corações que
tentam em vão compensar a intranquilidade da alma com a distracção contínua,
com a pequena satisfação dos bens que não saciam, porque deixam sempre o travo
amargo da tristeza.
As
folhas de palma, escreve Santo Agostinho, são o símbolo da homenagem, porque
significam vitória. O Senhor estava a momentos da vitória, morrendo na Cruz. Ia
triunfar, no sinal da Cruz, sobre o Diabo, príncipe da morte. Cristo é a nossa
paz porque venceu; e venceu porque lutou, no duro combate contra a maldade
acumulada pelos corações humanos.
Cristo,
que é a nossa paz, é também o Caminho. Se queremos a paz, temos de seguir os
seus passos. A paz é consequência da guerra, da luta, dessa luta ascética,
íntima, que cada cristão deve sustentar contra tudo aquilo que, na sua vida,
não é de Deus: contra a soberba, a sensualidade, o egoísmo, a superficialidade,
a estreiteza do coração. É inútil clamar pelo sossego exterior se falta
tranquilidade nas consciências, no fundo da alma, porque é do coração que saem
os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, as fornicações, os furtos,
os falsos testemunhos, as blasfémias.
74
Luta, compromisso de amor
e de justiça
Mas
não parece antiquada esta linguagem? Porventura não foi substituída por um
vocabulário de moda feito de claudicações pessoais encobertas com uma roupagem
pseudo-científica? Não existirá hoje um acordo tácito em que os bens reais são
apenas o dinheiro que tudo compra, o poder temporal, a astúcia para ficar
sempre por cima, a sabedoria humana que se autodefine como adulta e pensa ter
superado o sagrado?
Não
sou nem nunca fui pessimista, porque a fé me diz que Cristo venceu
definitivamente e nos deu, como prémio da sua conquista, um mandato, que é
também um compromisso: lutar. Nós, cristãos, temos um empenho de amor, que
aceitamos livremente com a chamada da graça divina: uma obrigação que nos anima
a lutar com tenacidade. Sabemos que somos tão frágeis como os outros homens,
mas também não podemos esquecer-nos de que, se usarmos os devidos meios,
seremos o sal, a luz e a levedura do mundo. Seremos o consolo de Deus.
O
nosso empenho de perseverar com firmeza neste propósito de Amor é, além disso,
um dever de justiça. E a matéria desta exigência, comum a todos os fieis,
traduz-se numa batalha constante. A tradição da Igreja sempre se referiu aos
cristãos como milites Christi, soldados de Cristo; soldados que dão serenidade
aos outros enquanto combatem continuamente contra as suas próprias más
inclinações. Às vezes, por falta de sentido sobrenatural, por uma descrença
prática, não querem compreender de forma alguma como milícia a vida na Terra.
Insinuam maliciosamente que, se nos consideramos milites Christi, há o perigo
de utilizarmos a fé para fins temporais de violência, de sedições. Esse modo de
pensar é um triste e pouco lógico simplismo, que costuma andar unido ao
comodismo e à cobardia.
Nada
há de mais estranho à fé católica do que o fanatismo. Este conduz a estranhas
confusões, com os mais diversos matizes, entre o que é profano e o que é
espiritual. Tal perigo não existe, se a luta se entende como Cristo no-la
ensinou, isto é, como guerra de cada um consigo mesmo, como esforço sempre
renovado por amar mais a Deus, por desterrar o egoísmo, por servir todos os
homens. Renunciar a esta contenda, seja com que desculpa for, é declarar-se de
antemão derrotado, aniquilado, sem fé, com a alma caída e dissipada em
complacências mesquinhas.
Para
o cristão, o combate espiritual diante de Deus e de todos os irmãos na fé é uma
necessidade, uma consequência da sua condição. Por isso, se alguém não luta,
está a trair Jesus Cristo e todo o Corpo Místico, que é a Igreja.
75
Luta incessante
A
guerra do cristão é incessante, porque na vida interior dá-se um perpétuo
começar e recomeçar, que impede que, com orgulho, nos pensemos já perfeitos. É
inevitável que haja muitas dificuldades no nosso caminho; se não encontrássemos
obstáculos, não seríamos criaturas de carne e osso. Havemos de ter sempre
paixões que nos puxem para baixo e sempre precisaremos de nos defender desses
delírios mais ou menos veementes.
Sentir
no corpo e na alma o aguilhão do orgulho, da sensualidade, da inveja, da
preguiça, do desejo de subjugar os outros, não deveria ser uma descoberta. É um
mal antigo, sistematicamente confirmado pela nossa experiência pessoal. É o
ponto de partida e o ambiente habitual para ganhar a nossa corrida para a casa
do Pai, neste desporto tão íntimo. Por isso ensina S. Paulo: quanto a mim
corro, não como à aventura; combato, não como quem açouta o ar; mas castigo o
meu corpo, e reduzo-o à escravidão, para que não suceda que, tendo pregado aos
outros, eu mesmo venha a ser réprobo .
Para
começar ou sustentar esta contenda, o cristão não deve esperar manifestações
exteriores ou sentimentos favoráveis. A vida interior não é uma questão de
sentimentos, mas de graça divina e de vontade, de amor. Todos os discípulos
foram capazes de seguir Cristo no seu dia de triunfo em Jerusalém, mas quase
todos O abandonaram à hora do opróbrio da Cruz.
Para
amar de verdade é preciso ser forte, leal, com o coração firmemente engastado
na fé, na esperança e na caridade. Só as pessoas levianas mudam caprichosamente
o objecto dos seus amores, que não são amores, mas compensações egoístas.
Quando há amor, há integridade: capacidade de entrega, de sacrifício, de
renúncia. E no meio da entrega, do sacrifício e da renúncia, juntamente com o
suplício da contradição, a felicidade e a alegria, uma alegria que nada nem
ninguém nos poderá tirar.
Neste
torneio de amor não devem entristecer-nos as quedas, nem sequer as quedas
graves, se recorremos a Deus no Sacramento da Penitência, com dor e com um bom
propósito. O cristão não é um maníaco coleccionador de folhas imaculadas de
bons serviços. Jesus Cristo Nosso Senhor comove-se tanto com a inocência e a
fidelidade de João como, depois da queda de Pedro, se enternece com o seu
arrependimento. Jesus compreende a nossa debilidade e atrai-nos a Si como em
plano inclinado, desejando que saibamos insistir no esforço de subir cada dia
um pouco. Procura-nos, da mesma forma que procurou os discípulos de Emaús, ou
seja, saindo-lhes ao encontro; como procurou Tomé e lhe mostrou e lhe fez tocar
com os seus dedos as chagas abertas nas mãos e no peito. Jesus Cristo sempre
está à espera que voltemos para Ele, precisamente porque conhece a nossa
fraqueza.
76
A luta interior
Suporta
os trabalhos como um bom soldado de Cristo, diz-nos S. Paulo. A vida do cristão
é milícia, guerra, formosíssima guerra de paz, que em nada coincide com as
empresas bélicas humanas, porque estas se inspiram na divisão e, muitas vezes,
nos ódios, enquanto a guerra dos filhos de Deus contra o seu próprio egoísmo,
se baseia na unidade e no amor. Porque, embora vivendo na carne, não militamos
segundo a carne. Porque as armas com que combatemos não são carnais, mas
fortaleza de Deus para destruir fortalezas, desbaratando com elas os projectos
humanos e toda a altivez que se levantam contra a ciência de Deus. É a
escaramuça sem tréguas contra o orgulho, contra a prepotência que nos dispõe a
fazer o mal, contra os juízos cheios de soberba.
Neste
Domingo de Ramos, quando Nosso Senhor começa a semana decisiva para a nossa
salvação, deixemo-nos de considerações superficiais e vamos ao que é central,
ao que verdadeiramente é importante. Pensai no seguinte: aquilo que devemos
pretender é ir para o Céu. Se não, nada vale a pena. Para ir para o Céu é
indispensável a fidelidade à doutrina de Cristo. Para ser fiel é indispensável
porfiar com constância no nosso combate contra os obstáculos que se opõem à
nossa eterna felicidade.
Sei
que, imediatamente depois de falar em combater, nos surge pela frente a nossa
debilidade e prevemos as quedas, os erros. Deus conta com isso. É inevitável
que, ao caminharmos, levantemos pó. Somos criaturas e estamos repletos de
defeitos. Eu diria até que tem de os haver sempre, pois são a sombra que faz
com que se destaquem mais, por contraste, na nossa alma, a graça de Deus e o
esforço por correspondermos ao favor divino. E esse claro-escuro tornar-nos-á
humanos, humildes, compreensivos, generosos.
Não
nos enganemos: na nossa vida, se contamos com brio e com vitórias, devemos
também contar com quedas e derrotas. Essa foi sempre a peregrinação terrena do
cristão, incluindo a daqueles que veneramos nos altares. Recordais-vos de
Pedro, de Agostinho, de Francisco? Nunca me agradaram as biografias dos santos
em que, com ingenuidade, mas também com falta de doutrina, nos apresentam as
façanhas desses homens, como se estivessem confirmados na graça desde o seio
materno. Não. As verdadeiras biografias dos heróis cristãos são como as nossas
vidas: lutavam e ganhavam, lutavam e perdiam. E então, contritos, voltavam à
luta.
Não
nos cause estranheza o facto de sermos derrotados com relativa frequência,
habitualmente ou até talvez sempre, em matérias de pouca importância ,que nos
ferem como se tivessem muita. Se há amor de Deus, se há humildade, se há
perseverança e tenacidade na nossa milícia, essas derrotas não terão demasiada
importância, porque virão as vitórias a seu tempo, que serão glórias aos olhos
de Deus. Não existem os fracassos, se agimos com rectidão de intenção e
queremos cumprir a vontade de Deus, contando sempre com a sua graça e com o
nosso nada.
77
Mas
ronda à nossa volta um potente inimigo, que se opõe ao nosso desejo de encarnar
dum modo acabado a doutrina de Cristo: o orgulho que cresce quando não procuramos
descobrir, depois dos fracassos e das derrotas, a mão benfeitora e
misericordiosa do Senhor. Então a alma enche-se de penumbra - de triste
obscuridade - crendo-se perdida. E a imaginação inventa obstáculos que não são
reais, que desapareceriam se os encarássemos com um pouco de humildade. Com o
orgulho e a imaginação, a alma mete-se por vezes em tortuosos calvários; mas
nesses calvários não está Cristo, porque onde está o Senhor goza-se de paz e de
alegria, mesmo que a alma esteja em carne viva e rodeada de trevas.
Outro
inimigo hipócrita da nossa santificarão: pensar que esta batalha interior tem
de dirigir-se contra obstáculos extraordinários, contra dragões que respiram
fogo. É outra manifestação de orgulho. Queremos lutar, mas estrondosamente, com
clamores de trombetas e tremular de estandartes.
Temos
de nos convencer de que o maior inimigo da pedra não é o picão ou o machado,
nem o golpe de qualquer outro instrumento, por mais contundente que seja: é
essa água miúda, que se mete, gota a gota, entre as gretas da fraga, até
arruinar a sua estrutura. O perigo mais forte para o cristão é desprezar a luta
nessas escaramuças, que penetram pouco a pouco na alma, até a tornarem branda,
quebradiça, indiferente e insensível às vozes de Deus.
Oiçamos
o Senhor, que nos diz: quem é fiel no pouco, também é fiel no muito; e quem é
injusto no pouco também é injusto no muito. Isto é o mesmo que recordar-nos:
luta a cada instante nesses pormenores aparentemente pequenos, mas grandes aos
meus olhos; vive com pontualidade o cumprimento do dever; sorri a quem precise,
mesmo que tu tenhas a alma dorida; dedica, sem regateares, o tempo necessário à
oração; acode a ajudar quem te procura; pratica a justiça, ampliando-a com a
graça da caridade.
São
estas e outras semelhantes as moções que cada dia sentiremos dentro de nós,
como um aviso silencioso que nos leva a treinar-nos neste desporto sobrenatural
de nos vencermos a nós mesmos. Que a luz de Deus nos ilumine, para
compreendermos as suas advertências; que nos ajude a lutar, que esteja ao nosso
lado na vitória; que não nos abandone na hora da queda, porque assim nos
encontraremos sempre em condições de nos levantarmos e de continuarmos a
combater.
Não
podemos parar. O Senhor pede-nos uma luta cada vez mais rápida, cada vez mais
profunda, cada vez mais ampla. Somos obrigados a superar-nos, porque nesta
competição a única meta é a chegada à glória do Céu. E se não chegássemos ao
Céu, nada teria valido a pena.
78
Os sacramentos da graça de
Deus
Quem
deseja lutar, usa os devidos meios. E os meios não mudaram nestes vinte séculos
de Cristianismo: oração, mortificação e frequência de Sacramentos. Como a
mortificação é também oração - oração dos sentidos - podemos descrever esses
meios com duas palavras apenas: oração e Sacramentos.
Gostaria
que considerássemos agora esse manancial de graça divina dos Sacramentos,
maravilhosa manifestação da misericórdia de Deus. Meditemos devagar a definição
que se insere no Catecismo de S. Pio V: determinados sinais sensíveis que
causam a graça e, ao mesmo tempo, a declaram, como que pondo-a diante dos
olhos. Deus Nosso Senhor é infinito e o seu amor é inesgotável, a sua clemência
e a sua piedade para connosco não admitem limites. E embora nos conceda a sua
graça de muitos outros modos, instituiu expressa e livremente - só Ele podia
fazê-lo - estes sete sinais eficazes, para que os homens possam participar dos
méritos da Redenção, duma maneira estável, simples e acessível a todos,.
Se
abandonarmos os Sacramentos, desaparece a verdadeira vida cristã. Contudo, não
se nos oculta que particularmente nesta época não falta quem pareça esquecer, e
até a chegue a desprezar, esta corrente redentora da graça de Cristo. É
doloroso falar desta chaga da sociedade que se chama cristã, mas torna-se
necessário, para que nas nossas almas se afinque o desejo de recorrermos com
mais gratidão e amor a essas fontes de santificação.
Decidem
sem o menor escrúpulo retardar o baptismo dos recém-nascidos, privando-os - e
cometendo assim um grave atentado contra a justiça e contra a caridade - da
graça da fé, do tesouro incalculável da inabitação da Santíssima Trindade na
alma, que vem ao mundo manchada pelo pecado original. Pretendem também
desvirtuar a natureza própria do Sacramento da Confirmação, no qual a Tradição viu
sempre unanimemente um robustecimento da vida espiritual, uma efusão calada e
fecunda do Espírito Santo, para que, fortalecida sobrenaturalmente, a alma
possa lutar - milites Christi, como soldado de Cristo - nessa batalha interior
contra o egoísmo e a concupiscência.
Se
se perde a sensibilidade para as coisas de Deus, dificilmente se compreenderá o
Sacramento da Penitência. A confissão sacramental não é um diálogo humano, é um
colóquio divino; é um tribunal de segura e divina justiça e, sobretudo, de misericórdia,
com um juiz amoroso que não deseja a morte do pecador, mas que ele se converta
e viva.
É
verdadeiramente infinita a ternura de Nosso Senhor. Olhai com que delicadeza
trata os seus filhos. Fez do matrimónio um vínculo santo, imagem da união de
Cristo com a sua Igreja, um grande sacramento em que se fundamenta a família
cristã, que há-de ser, com a graça de Deus, um ambiente de paz e de concórdia,
escola de santidade. Os pais são cooperadores de Deus. Daí nasce o amável dever
de veneração, que corresponde aos filhos. Com razão, o quarto mandamento pode
chamar-se - escrevi-o há tantos anos - o dulcíssimo preceito do Decálogo. Se se
vive o matrimónio como Deus quer, santamente, o lar será um lugar de paz,
luminoso e alegre.
79
O
Nosso Pai, Deus, deu-nos, com a Ordem sacerdotal, a possibilidade de que alguns
fiéis, em virtude duma nova e inefável infusão do Espírito Santo, recebam um
carácter indelével na alma, que os configura com Cristo Sacerdote, para
actuarem em nome de Cristo Jesus, Cabeça do seu Corpo Místico. Com este
sacerdócio ministerial, que difere do sacerdócio comum de todos os fiéis,
essencialmente e não com diferença de grau, os ministros sagrados podem
consagrar o Corpo e o Sangue de Cristo, oferecer a Deus o Santo sacrifício, perdoar
os pecados na confissão sacramental e exercitar o ministério de doutrinar as
pessoas in iis quae sunt ad Deum, em tudo e só no que se refere a Deus.
Por
isso, o sacerdote deve ser exclusivamente um homem de Deus, rejeitando o
pensamento de querer brilhar em campos em que os outros cristãos não precisem
dele. O sacerdote não é um psicólogo, nem um sociólogo, nem um antropólogo: é
outro Cristo, o próprio Cristo, para atender as almas dos seus irmãos. Seria
triste que o sacerdote, baseando-se numa ciência humana - que só cultivará como
amador e aprendiz, se se dedicar à sua tarefa sacerdotal - se julgasse, sem
mais nem menos, habilitado a pontificar em teologia dogmática ou moral. A única
coisa que faria, era demonstrar uma dupla ignorância - na ciência humana e na
ciência teológica - ainda que com ar superficial de sábio conseguisse enganar
alguns leitores ou ouvintes indefesos.
É
um facto público que alguns eclesiásticos parecem hoje dispostos a fabricar uma
nova Igreja, traindo Cristo, mudando os fins espirituais - a salvação das
almas, uma a uma - por fins temporais. Se não resistirem a essa tentação,
deixarão de cumprir o seu sagrado ministério, perderão a confiança e o respeito
do povo e produzirão uma tremenda destruição dentro da Igreja, intrometendo-se,
além disso, indevidamente, na liberdade política dos cristãos e dos restantes
homens, com a consequente confusão - tornam-se eles mesmos perigosos - na
convivência civil. A Sagrada Ordem é o sacramento do serviço sobrenatural aos
irmãos na fé; alguns parecem querer convertê-la no instrumento terreno dum novo
despotismo.
80
Mas
continuemos a contemplar a maravilha dos Sacramentos. Na Unção dos Enfermos,
como agora chamam à Extrema Unção, assistimos a uma amorosa preparação da
viagem, que terminará na casa do Pai. E com a Sagrada Eucaristia, sacramento -
se assim nos podemos exprimir - da loucura do amor divino, concede-nos a sua
graça, e entrega-se-nos o próprio Deus, Jesus Cristo, que está realmente sempre
presente nas espécies consagradas - e não apenas durante a Santa Missa - com o
seu Corpo, com a sua Alma, com o seu Sangue e com a sua Divindade.
Penso
repetidas vezes na responsabilidade que incumbe aos sacerdotes, de assegurar a
todos os cristãos esse caminho divino dos Sacramentos. A graça de Deus vem em
socorro de cada alma; cada criatura requer uma assistência concreta, pessoal.
As almas não se podem tratar massivamente! Não é lícito defender a dignidade
humana e a dignidade de filho de Deus, não atendendo a cada um pessoalmente com
a humildade de quem se sabe instrumento para ser veículo do amor de Cristo;
porque cada alma é um tesouro maravilhoso; cada homem é único, insubstituível.
Cada um vale todo o sangue de Cristo.
Falávamos
antes de luta. Mas a luta exige treino, uma alimentação adequada, uma
terapêutica urgente em caso de doença, de contusões, de feridas. Os
Sacramentos, medicina principal da Igreja, não são supérfluos: quando se
abandonam voluntariamente, não é possível dar um passo no caminho por onde se
segue Cristo. Necessitamos deles como da respiração, como da circulação do
sangue, como da luz, para poder apreciar em qualquer instante o que o Senhor
quer de nós.
A
ascética do cristão exige fortaleza; e essa fortaleza encontra-a no Criador.
Nós somos a obscuridade e Ele é resplendor claríssimo; somos a doença e Ele a
saudável robustez; somos a escassez e Ele a infinita riqueza; somos a
debilidade e Ele sustenta-nos, quia tu es, Deus, fortitudo mea, porque és
sempre, ó meu Deus, a nossa fortaleza. Nada há nesta terra capaz de se opor ao
brotar impaciente do Sangue redentor de Cristo. Mas a pequenez humana pode
velar os olhos de modo a que não descortinem a grandeza divina. Daí a
responsabilidade de todos os fiéis e especialmente dos que têm o ofício de
dirigir - de servir - espiritualmente o Povo de Deus, de não fecharem as fontes
da graça, de não se envergonharem da Cruz de Cristo.
81
Responsabilidade dos
pastores
Na
Igreja de Deus, o empenho constante por sermos cada vez mais leais à doutrina
de Cristo é obrigação de todos. Ninguém está isento. Se os pastores não
lutassem pessoalmente por adquirir finura de consciência, respeito fiel ao
dogma e à moral - que constituem o depósito da fé e o património comum -,
voltariam a ser reais as proféticas palavras de Ezequiel: Filho do homem
profetiza acerca dos pastores de Israel; profetiza e diz aos pastores: - Isto
diz o Senhor Deus: Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si próprios!
Porventura não são os rebanhos os que devem ser apascentados pelos pastores?
Vós lhes tomais o leite e vos vestis com as suas lãs e matais as reses mais
gordas, mas não apascentais o meu rebanho. Não fortalecestes as ovelhas débeis,
não curastes as doentes, não pusestes ligaduras às que tinham algum membro
quebrado, não fizestes voltar as desgarradas, nem buscastes as que se tinham
perdido; mas dominastes sobre elas com aspereza e com prepotência.
São
repreensões fortes, mas mais grave é a ofensa que se faz a Deus quando, tendo
recebido o cargo de velar pelo bem espiritual de todos, se maltratam as almas,
privando-as da água limpa do Baptismo que regenera a alma, do óleo balsâmico da
Confirmação, que a fortalece, do tribunal que perdoa, do alimento que dá a vida
eterna.
Quando
é que isto pode acontecer? Quando se abandona esta guerra de paz. Quem não
luta, expõe-se a qualquer daquelas escravidões, que têm o efeito de aferrolhar
os corações de carne: a escravidão duma visão exclusivamente humana, a
escravidão do desejo afanoso de poder e de prestígio temporal, a escravidão da
vaidade, a escravidão do dinheiro, a escravidão da sensualidade...
Se
alguma vez - porque Deus pode permitir essa prova - tropeçais com pastores
indignos deste nome, não vos escandalizeis. Cristo prometeu assistência
infalível e indefectível à sua Igreja, mas não garantiu a fidelidade dos homens
que a compõem. A estes não lhes faltará a graça abundante, generosa - se
puserem da sua parte o pouco que Deus pede: vigiar atentamente, empenhando-se
em remover, com a graça de Deus, os obstáculos para conseguir a santidade. Se
não há luta, quem parece estar nos píncaros pode estar muito baixo aos olhos de
Deus. Conheço as tuas obras, a tua conduta, sei que tens fama de que vives e
estás morto. Sê vigilante e consolida os restos do teu rebanho, que está para
morrer, porque não acho as tuas obras perfeitas diante do meu Deus. Lembra-te,
pois, do que recebeste e ouviste, e observa-o, e faz penitência.
São
exortações do apóstolo S. João, no século primeiro, dirigidos a quem tinha a
responsabilidade da Igreja na cidade de Sardes. Porque a possível decadência do
sentido da responsabilidade em alguns pastores não é um fenómeno moderno; surge
já no tempo dos Apóstolos, no próprio século em que Nosso Senhor Jesus Cristo
tinha vivido na terra. E ninguém está seguro, se deixa de lutar consigo mesmo.
Ninguém pode salvar-se isoladamente. Todos na Igreja precisamos desses meios
concretos que nos fortalecem: da humildade, que nos dispõe a aceitar a ajuda e
o conselho; das mortificações, que nos removem o coração, para que nele reine
Cristo; do estudo da Doutrina segura de sempre, que nos leva a conservar em nós
a fé e a propagá-la.
82
Hoje e ontem
A
liturgia do Domingo de Ramos põe na boca dos cristãos este cântico: levantai,
portas, os vossos dintéis; levantai-vos, portas antigas, para que entre o Rei
da glória. Quem fica recluso na cidadela do seu egoísmo não descerá ao campo de
batalha. Contudo, se levantar as portas da fortaleza e permitir que entre o Rei
da Paz, sairá com ele a combater contra toda essa miséria que embacia os olhos
e insensibiliza a consciência.
Levantai
as portas antigas. Esta exigência de combate não é nova no Cristianismo. É a
verdade perene. Sem luta, não se consegue a vitória; sem vitória não se alcança
a paz. Sem paz, a alegria humana será só uma alegria aparente, falsa, estéril,
que não se traduz na ajuda aos homens, nem em obras de caridade e de justiça,
de perdão e de misericórdia, nem em serviço de Deus.
Agora,
dentro e fora da Igreja, em cima e em baixo, dá a impressão de que muitos
renunciaram à luta - à guerra pessoal contra as suas próprias claudicações -,
para se entregarem com armas e bagagens às servidões que envelhecem a alma.
Esse perigo rondará sempre em tomo de todos os cristãos.
Por
isso, é preciso pedir incessantemente à Santíssima Trindade que tenha compaixão
de todos. Ao falar destas coisas fico perturbado se recorro à justiça de Deus.
Apelo para a sua misericórdia, para a sua compaixão, a fim de que não olhe para
os nossos pecados, mas para os méritos de Cristo e de sua Santa Mãe, e que é
também nossa Mãe, para os do Patriarca S. José, que Lhe serviu de Pai, para os.
dos Santos.
O
cristão pode viver com a segurança de que, se quiser lutar, Deus o acolherá na
sua mão direita, como se lê na Missa desta festa. Jesus, que entra em Jerusalém
montado num pobre burrico, Rei da paz, é quem diz: o, reino dos céus alcança-se
com violência, e os violentos arrebatam-no. Essa força não se manifesta na
violência contra os outros; é fortaleza para combater as próprias debilidades e
misérias, valentia para não mascarar as nossas infidelidades, audácia para
confessar a fé, mesmo quando o ambiente é contrário.
Hoje,
como ontem, espera-se heroísmo do cristão. Heroísmo em grandes contendas, se é
preciso. Heroísmo - e será o normal - nas pequenas escaramuças de cada dia.
Quando se luta continuamente, com Amor e deste modo que parece insignificante,
o Senhor está sempre ao lado dos seus filhos, como pastor amoroso: Eu mesmo
apascentarei as minhas ovelhas e as farei repousar, diz o Senhor Deus. Irei
procurar as que se tinham perdido, farei voltar as que andavam desgarradas,
porei ligaduras às que tinham algum membro quebrado e fortalecerei as que
estavam fracas... E as minhas ovelhas habitarão no seu país sem temor; e elas
saberão que eu sou o Senhor, quando eu tiver quebrado as cadeias do seu jugo, e
as tiver arrancado das mãos daqueles que as dominavam.
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