Art. 3 – Se a criação das coisas teve um princípio temporal.
(II Sent., dist. 1, q. 1, a. 6).
O terceiro discute-se assim. – Parece que a criação das coisas não teve um princípio temporal.
1. – Pois, o que não está no tempo não está em algum tempo. Ora, a criação das coisas não foi no tempo; porque, por ela, a substância é produzida quanto ao ser, e o tempo não mede a substância das coisas, sobretudo das incorpóreas. Logo, a criação não teve um princípio temporal.
2. Demais. – O Filósofo prova que tudo o que está vindo a ser esteve vindo a ser [1], e, assim, todo vir à ser implica anterioridade e posterioridade. Ora, o princípio do tempo, sendo indivisível, não tem anterior e posterior. Logo, como o ser criado é de certo modo vir à ser, parece que as coisas não tiveram um princípio temporal.
3. Demais. – Também o próprio tempo foi criado. Ora, o tempo, sendo divisível, não pode ter um princípio temporal, pois o princípio do tempo é indivisível. Logo, a criação das coisas não teve um princípio temporal.
Mas, em contrário, diz a Escritura (Gn 1, 1): No princípio criou Deus o céu e a terra.
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As palavras da Escritura – No princípio criou Deus o céu e a terra – são construídas de tríplice maneira, para excluir três erros. – Pois, alguns ensinaram que o mundo sempre existiu e o tempo não teve princípio. E para excluir esse erro se constrói – No princípio – isto é, do tempo. – Outros, porém, ensinaram serem dois os princípios da criação: um, dos bens; outro, dos males. E, para excluir este se constrói: No princípio, isto é, no Filho. Pois assim como o princípio efectivo é apropriado ao Pai, por causa do seu poder; assim, o princípio exemplar o é ao Filho, por causa da sua sabedoria. De modo que o dito da Escritura (Sl 103, 24), Todas as coisas fizeste com sabedoria, se entenda no sentido que Deus fez tudo no Princípio, isto é, no Filho, segundo as palavras do Apóstolo (Cl 1, 16): Nele, isto é, no Filho, foram criadas todas as coisas. – Outros, por fim, disseram que os seres corpóreos foram criados por Deus, mediante as criaturas espirituais. E, para excluir este erro constrói-se: No princípio criou Deus o céu e a terra, isto é, antes de todas as coisas. Pois quatro seres se admitem como simultaneamente criados, a saber: o céu empíreo, a matéria corpórea chamada terra, o tempo e a natureza angélica.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Não se diz que as coisas foram criadas num princípio temporal, como se o princípio do tempo fosse a medida da criação; mas que, simultaneamente com o tempo, foram criados o céu e a terra.
RESPOSTA À SEGUNDA. – Essa expressão do Filósofo se entende do vir a ser por movimento ou que é termo deste. Porque, como é forçoso admitir, em qualquer movimento, uma posição de anterioridade e outra de posterioridade, antes de qualquer movimento imaginado, isto é enquanto alguma coisa é movida e vem a ser – deve-se admitir um anterior e também algo que virá depois. Pois o princípio ou o termo do movimento, não é movimento em acto, como já antes se disse [2]. Por onde, alguma coisa é criada, que anteriormente não o era.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Nada vem a ser senão segundo o que é. Ora, da essência do tempo é o momento; por onde, não pode ele vir a ser senão segundo algum momento; não que no tempo o momento seja primariamente tempo, mas que, por ele, começa o tempo.
(são tomás de aquino, Suma Teológica,)
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