05/09/2011

Deve-se disputar publicamente com os infiéis?

Parece que não se deve disputar publicamente com os infiéis:


1. Com efeito, como diz o Apóstolo: “Não queiras ocupar-te com discussões. Para nada mais servem senão para dano dos ouvintes.” Ora, não é possível disputar publicamente com infiéis sem discussão. Logo, não se deve disputar publicamente com os infiéis.
2. Além disso, uma lei de Marciano Augusto, confirmada pelos cânones, declara: “Comete injúria ao juízo do Santo Sínodo quem pretender refazer o que já foi rectamente julgado e correctamente decidido e disputar publicamente”. Ora, tudo o que pertence à fé já foi determinado pelos sagrados Concílios. Logo, peca gravemente, cometendo injúria ao Sínodo, quem ousar disputar publicamente as verdades da fé.
3. Ademais, uma disputa deve apoiar-se em argumentos. Ora. O argumento é uma “razão para convencer em matéria duvidosa”. Ora, como as verdades de fé são certíssimas, não devem ser postas em dúvida. Logo, sobre elas não se deve disputar publicamente.
EM SENTIDO CONTRÁRIO, lê-se nos Actos dos Apóstolos: “Saulo falava com poder sempre maior e confundia os judeus”; e depois: “falava aos gentios e disputava com os gregos”.

Duas coisas  devem considerar-se nas discussões sobre a fé: uma, relativa a quem discute; outra, aos ouvintes. Com relação ao que discute, é preciso ter em conta a intenção. Se ele discute, duvidando da fé e não supondo como certas as verdades que procura provar pelos argumentos, sem dúvida peca, como dúbio na fé e infiel. Mas, se alguém discute sobre a fé para refutar erros ou mesmo como exercício é digno de louvor.
Com relação aos ouvintes, deve-se considerar se os que ouvem a discussão são instruídos e firmes na fé, ou se são pessoas simples e vacilantes na fé. Certamente não há nenhum perigo em se discutir na presença de sábios e de firmes na fé. Quanto aos simples cabe uma distinção: ou são provocados e impelidos por infiéis, a saber, judeus, heréticos e pagãos, que se esforçam por lhes corromper a fé ou então de maneira alguma são provocados nessas questões, como nas terras onde não existem infiéis. No primeiro caso, é necessário publicamente discutir sobre a fé, desde que se encontrem pessoas idóneas e capazes para tal e que possam refutar os erros. Assim, os simples na fé se fortalecerão e se tirará dos infiéis a possibilidade de enganar; o silêncio dos que deveriam resistir aos corruptores da verdade da fé seria a confirmação do erro. Por isso, Gregório declara: “Assim como falar incautamente incrementa o erro, assim o silêncio indiscreto abandona no erro os que deveriam ser ensinados”. No segundo caso, porém, é perigoso disputar publicamente sobre a fé, na presença de simples, cuja crença é mais firme por não terem ouvido nada diverso daquilo que crêem. Portanto, não convém que ouçam as palavras de infiéis discutindo a fé.
Suma Teológica II-II, q.10 a.7

Quanto às objecções iniciais, portanto, deve-se dizer que:
1. O Apóstolo não proíbe totalmente a discussão, mas a disputa desordenada que mais se faz pela polémica de palavras do que pela firmeza da doutrina.
2. A lei citada proíbe uma disputa pública sobre a fé, procedente de dúvidas relativas à fé, mas não aquela que serve para conservar a fé.
3. Não se deve disputar sobre artigos da fé, como se tivéssemos dúvidas a respeito, mas a fim de manifestar a verdade e refutar os erros. Às vezes, é preciso disputar com os infiéis para defender a fé, segundo aquilo da primeira Carta de Pedro: “Prontos sempre a defender-vos contra quantos exigirem razões da esperança e da fé que há em vós”; às vezes, para convencer os que estão no erro, segundo o que diz a Carta a Tito: “Para que seja capaz de exortar com instruções certas e arguir os que contradizem”.


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