Parece que não cabe ao Sumo Pontífice estabelecer o símbolo da fé:
1. Com efeito, uma nova apresentação do Símbolo é necessária para explicação dos artigos de fé, como já se disse (art. precedente). Ora, no Antigo Testamento, os artigos de fé foram cada vez mais explicados, no correr dos tempos, e a verdade da fé mais se manifestava quanto maior a proximidade de Cristo. Tal motivo não mais existe na nova Lei: os artigos de fé não devem, pois, receber novas explicações. Logo, parece não competir à autoridade do Sumo Pontífice uma nova apresentação do Símbolo.
2. Além disso, o que foi interdito, sob pena de anátema, não depende do poder de homem algum. Ora, a autoridade da Igreja Católica interditou, sob pena de anátema, a publicação de novo Símbolo. Dizem as atas do primeiro concílio de Éfeso que este Concílio, “Uma vez lido o Símbolo de Nicéia, decretou que não seria permitido a ninguém professar, subscrever ou compor outra fé, além da definida pelos Santos Padres, reunidos em Nicéia com o Espírito Santo”. Segue-se a pena de anátema. A mesma coisa é repetida nas atas do Concílio de Calcedónia. Logo, parece que uma nova apresentação do Símbolo não cabe à autoridade do Sumo Pontífice.
3. Ademais, Atanásio não foi Sumo Pontífice, mas patriarca de Alexandria e, contudo, constituiu um Símbolo que é cantado na Igreja. Logo, a publicação de um Símbolo não parece pertencer ao Sumo Pontífice mais do que a outros.
EM SENTIDO CONTRÁRIO, a publicação do símbolo foi feita em concílio geral. Mas, um concílio só pode reunir-se sob a autoridade do Sumo Pontífice como está estabelecido nos Decretos. Logo, a publicação do Símbolo cabe à autoridade do Sumo Pontífice.
Como já explicamos (artigo precedente), uma publicação nova do Símbolo é necessária para evitar erros que surgem. Tem autoridade para fazê-lo quem pode determinar em última instância o que é de fé, para que todos possam a ela aderir de maneira inabalável. Isto, porém, é da alçada do Sumo Pontífice a quem são deferidas as maiores e mais difíceis questões da Igreja, como se diz nos Decretos de Graciano. Por isso, o Senhor, no Evangelho de Lucas, disse a Pedro a quem constituiu Sumo Pontífice: “Eu rezei por ti, para que tua fé não desfaleça; e tu, depois de convertido, confirma os teus irmãos” (22, 32). E a razão disso é que toda a Igreja deve ter a mesma fé, seguindo a recomendação da primeira Carta aos Coríntios: “Dizei todos as mesmas coisas e não haja divisões entre vós” (1, 10). Ora, isso não poderia ser observado, se uma
questão sobre a fé não fosse resolvida por quem governa toda a Igreja, de tal modo que sua sentença seja aceita firmemente por toda a Igreja. Eis porque somente o Sumo Pontífice tem autoridade para uma nova publicação do Símbolo, como sobre todas as coisas que dizem respeito a toda a Igreja, como reunir um concílio geral etc.
Suma Teológica, PII-II,Q1A10
Quanto às objecções iniciais, portanto, deve-se dizer que:
1. Na doutrina de Cristo e dos Apóstolos, a verdade da fé está suficientemente explicada. Mas, como há homens perversos que, segundo o Apóstolo Pedro, “deformam a doutrina apostólica e outras partes da Escritura para sua própria ruína” (2Pe 3, 16), é necessário que haja, no correr dos tempos, esclarecimentos da fé contra erros ocorrentes.
2. A proibição e a sentença do Concílio de Éfeso se estendem às pessoas particulares que não podem decidir em matéria de fé. É claro que esta proposição de um concílio geral não tira o poder ao concílio seguinte de fazer uma nova apresentação do Símbolo, que contenha não uma outra fé, mas a mesma, porém, mais explicada. É isto que todos os concílios têm observado: que o sínodo seguinte possa expor algo além do que o sínodo precedente expusera, por causa da necessidade de se opor a alguma heresia sobrevinda. E isso cabe ao Sumo Pontífice que usa sua autoridade para reunir o concílio e para confirmar as suas decisões.
3. Atanásio não compôs uma manifestação de fé, à maneira de Símbolo, mas a modo de ensino doutrinal, como aparece na sua forma de exprimir-se. Mas, como sua exposição doutrinal continha brevemente a íntegra verdade da fé, foi recebida, pela autoridade do Sumo Pontífice, como regra da fé.
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