Art.
3 — Se Cristo devia ser tentado depois do jejum.
O terceiro discute-se assim. — Parece
que Cristo não devia ser tentado depois do jejum
1. — Pois, como se disse Cristo não
devia viver uma vida de austeridades. Ora, parece que nenhuma austeridade era
maior que a de passar sem comer nada quarenta dias e quarenta noites; pois a
expressão — jejuou quarenta dias e
quarenta noites — entende-se como significando que durante esses dias não tomou absolutamente nenhum alimento, como
diz Gregório. Logo, parece que não devia ter-se sujeitado a um tal jejum antes
da tentação.
2. Demais. — O Evangelho diz que
esteve no deserto quarenta dias e quarenta noites e ali foi tentado por
Satanás. Ora, jejuou durante quarenta dias e quarenta noites. Logo, parece que
foi tentado pelo diabo, não depois do jejum, mas durante ele.
3. Demais. — No Evangelho não lemos
que Cristo jejuasse, senão uma vez. Ora, não foi tentado pelo diabo só uma vez;
assim, lemos que, acabada toda a tentação, se retirou dele o demónio até certo
tempo. Logo, assim como a segunda tentação não foi precedida de jejum, nem a
primeira devera tê-lo sido.
Mas, em contrário, o Evangelho: Tendo jejuado quarenta dias e quarenta
noites, depois teve fome; e então chegou-se a ele o tentador.
Era conveniente que Cristo
quisesse ser tentado depois do jejum. — Primeiro, para nos dar exemplo. Pois,
como todos temos o dever de nos defender contra as tentações, o ter Cristo
jejuado antes da tentação futura, adverte-nos que devemos armar-nos contra as
tentações pelo jejum. Por isso, o Apóstolo enumera o jejum entre as armas da justiça. — Segundo, para nos mostrar que
mesmo os que jejuam são atacados pelo diabo com as suas tentações, assim como o
faz os que façam boas obras. Por isso, assim como tentou Cristo depois do baptismo;
assim também depois do jejum. Donde o dizer Crisóstomo: Cristo jejuou, sem precisar de o fazer só para nos instruir quão
grande bem é o jejum e que escudo é contra o diabo; e que, depois do batismo
devemos nos entregar ao jejum e não à sensualidade. — Terceiro, porque ao
jejum seguiu-se a fome, que deu ao diabo a audácia para atacá-la, como
dissemos. Pois, diz Hilário, se o Senhor
teve fome, não foi que a necessidade o surpreendesse, mas porque quis abandonar
o homem à sua natureza. Também, como diz Crisóstomo, não prolongou o seu jejum mais do que o fizeram Moisés e Elias, para
que se não duvidasse da realidade do seu corpo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
A Cristo não convinha abraçar uma vida de austeridades, senão viver a mesma
vida que aqueles a quem pregava. Ora, ninguém deve assumir o ofício de
pregador, antes de ter-se purificado e aperfeiçoado na virtude, como de Cristo
diz a Escritura, que começou a fazer e a
ensinar. Por isso, Cristo, logo depois do baptismo assumiu uma vida de
austeridades, para ensinar que os pregadores só devem exercer o seu ofício
depois de terem dominado a carne, segundo diz o Apóstolo: Castigo o meu corpo e reduzo-o à servidão para que não suceda que,
havendo pregado ao outros venha eu mesmo a ser reprovado.
RESPOSTA À SEGUNDA. — As palavras de
Marcos podem entender-se no sentido que Cristo permaneceu no deserto quarenta
dias e quarenta noites durante os quais jejuou. Quanto à expressão - foi tentado por Satanás — significa que Cristo
o foi, não nesses quarenta dias e quarenta noites em que jejuou, mas depois
deles; pois, na versão de Mateus, tendo
jejuado quarenta dias e quarenta noites, depois teve fome, o que ofereceu
ocasião ao tentador de se aproximar dele. E o que se acrescenta — e eis que os anjos o serviam — deve
entender-se como tendo sucedido depois da tentação, pelo que Mateus diz: Então o diabo deixou-o, isto é, depois
da tentação, e eis que os anjos o serviam.
Quando à interpolação de Marcos — e
habitava com as feras — é para mostrar, segundo Crisóstomo, qual era o deserto, isto é, vazio de homens
e cheio de animais selvagens. — Contudo, segundo a exposição de Beda, o Senhor foi tentado durante os quarenta
dias e as quarenta noites. Mas isso entende-se, não daquelas tentações visíveis
referidas por Mateus e Lucas, que tiveram lugar depois do jejum; mas de alguns
outros ataques que talvez Cristo sofreu do diabo no tempo desse jejum.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz
Ambrósio, o diabo retirou-se de Cristo,
até certo tempo, porque depois se aproximou dele no tempo da paixão, não para
tentá-lo, mas para combatê-la abertamente. - Porém, nessa segunda tentação
Cristo foi tentado a cair em tristeza e no ódio dos próximos; assim como no
deserto o foi pelo prazer da gula e pelo desprezo de Deus, mediante a
idolatria.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.