Tempo Comum
Semana III
Evangelho:
Lc 10, 1-9
1 Depois disto, o
Senhor escolheu outros setenta e dois, e mandou-os dois a dois à Sua frente por
todas as cidades e lugares onde havia de ir. 2 Disse-lhes: «Grande é
na verdade a messe, mas os operários poucos. Rogai, pois, ao dono da messe que
mande operários para a Sua messe. 3 Ide; eis que Eu vos envio como
cordeiros entre lobos. 4 Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado,
e não saudeis ninguém pelo caminho. 5 Na casa em que entrardes,
dizei primeiro: A paz seja nesta casa. 6 Se ali houver algum filho
da paz, repousará sobre ele a vossa paz; senão, tornará para vós. 7
Permanecei na mesma casa, comendo e bebendo do que tiverem, porque o operário é
digno da sua recompensa. Não andeis de casa em casa. 8 Em qualquer
cidade em que entrardes e vos receberem, comei o que vos puserem diante; 9
curai os enfermos que nela houver, e dizei-lhes: Está próximo de vós o reino de
Deus.
Comentário:
Jesus
Cristo revela a Sua preocupação e cuidado relativamente aos primeiros enviados a anunciar o Reino de Deus.
Faz questão de que não ignorem as dificuldades que irão enfrentar e dá instruções precisas e pormenorizadas de como devem actuar.
Devemos, os cristãos, ter bem presente esta necessidade de preparar com cuidado e esmero a acção apostólica porque por muita experiência que possamos ter de nada nos servirá se previamente não nos colocarmos nas Suas mãos pedindo com confiança: domine, quid me vis facere, Senhor, que queres que faça.
(ama comentário sobre LC 10 1-9, Cascais,
2015.10.01)
Leitura espiritual
Vida cristã
Na tarefa da nova
evangelização
Com
o Ano da fé, Bento XVI quis «introduzir todo o corpo eclesial num tempo de
especial reflexão e redescoberta da fé» [i].
Trata-se
de um convite para considerar o que é crer, o que é ser cristão, para que
fiquemos mais conscientes da grandeza do dom da fé e, assim, realizemos uma
nova evangelização.
Nova
evangelização que o Beato Paulo VI e São João Paulo II já tinham promovido e
que responde a uma necessidade objectiva, pois em muitos países de cultura tradicionalmente
cristã «grupos inteiros de baptizados perderam o sentido vivo da fé ou até já
não se reconhecem como membros da Igreja, levando uma existência afastada de
Cristo e do Seu Evangelho» [ii].
São
João Paulo II destacava que esta situação era um novo desafio para a Igreja.
Com
efeito, «não parece justo equiparar a situação de um povo que nunca conheceu
Jesus Cristo com a de outro que O conheceu, O aceitou e depois O recusou, ainda
que tenha continuado a viver numa cultura que assimilou em grande parte os
princípios e valores evangélicos» [iii].
Num
contexto como este, é necessária a realização uma “nova evangelização" ou
“reevangelização" [iv].
A
criação do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização, ou o
passado Sínodo dos Bispos sobre a Nova Evangelização da fé cristã são sinais
claros de um empenho por levar o Evangelho a sociedades marcadas, em muitos
aspectos, pelo secularismo e o relativismo.
Responsabilidade de todos
Depois
da ressurreição, Jesus enviou os seus discípulos, fazendo-os participantes da
sua própria missão:
como o Pai me enviou,
assim também Eu vos envio a vós [v].
Com
a força do Espírito, os apóstolos e os primeiros cristãos cumpriram esse
mandato; em poucos anos, estenderam a mensagem evangélica por toda a urbe
conhecida.
Eram
poucos, careciam de meios humanos, não contavam entre as suas fileiras – assim
sucedeu, pelo menos, durante muito tempo – com grandes pensadores ou pessoas de
relevo público.
Desenvolveram-se
num ambiente social de indiferentismo, de carência de valores, semelhante, em
muitos aspectos, ao que nos toca agora enfrentar. (…)
Aqueles
primeiros souberam, com o seu comportamento, fazer brilhar diante dos seus
concidadãos essa clareza salvadora e converteram-se em mensageiros de Cristo –
simplesmente, com naturalidade, sem alardes apelativos – com a coerência entre
a sua fé e as suas obras [vi].
A
nova evangelização diz respeito a todos: também a nós Cristo pede que preguemos
o Evangelho a toda a criatura [vii].
Cada
cristão, em virtude do Baptismo, tem a responsabilidade de ser testemunha do
Deus vivo, pois é-nos impossível calar o que vimos e ouvimos [viii].
Cada
cristão é outro Cristo, enquanto identificado com Ele pela graça e pela
correspondência pessoal, e está chamado a «transformar com a força do Evangelho
os critérios de juízo, os valores determinantes, os pontos de interesse, as
linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da
humanidade» [ix].
Todos
temos o dever e o direito de evangelizar, cada um de acordo com o seu próprio
papel na Igreja.
Que
grande trabalho temos pela frente!
Com
humildade, com afã pessoal de santidade, temos que chegar às pessoas, antes de
mais, com o nosso exemplo.
Estejamos
conscientes de que o esforço por nos comportarmos como cristãos cabais – apesar
das nossas misérias pessoais – faz parte da luz que o Senhor deseja acender no
mundo.
Não
tenhamos medo de chocar com o ambiente, nos pontos incompatíveis com a fé
católica, ainda que essa atitude nos possa mesmo acarretar prejuízos materiais
ou sociais [x].
Além
disso, embora nalguns aspectos pareça que nos encontramos numa situação
semelhante à dos nossos primeiros irmãos na fé, não podemos esquecer que, em
comparação com eles, «a nossa época oferece neste campo novas ocasiões à
Igreja:
A
queda de ideologias e sistemas políticos opressores;
A
abertura de fronteiras e a configuração de um mundo mais unido, devido ao
incremento dos meios de comunicação;
O
fixarem-se nos povos os valores evangélicos que Jesus encarnou na sua vida
(paz, justiça, fraternidade, dedicação aos mais necessitados);
Um
tipo de desenvolvimento económico e técnico sem alma que, não obstante, incita
a buscar a verdade sobre Deus, sobre o homem e sobre o sentido da vida» [xi].
Abre-se
diante de nós um imenso panorama, pois muitos estão à procura do sentido da sua
vida, um sentido que só lhes pode dar o encontro com Cristo.
E
é a nossa vida corrente – sem espectáculo – que lhes pode anunciar integramente
o Evangelho, que lhes pode permitir descobrir a força de Jesus Cristo, a quem
Deus fez para nós sabedoria, justiça, santificação e redenção [xii].
Depois
teremos que ajudar os que descobrem ou redescobrem Cristo, a perseverar na sua
decisão de O seguir, oferecendo-lhes a formação humana, intelectual e
espiritual oportuna.
Com as armas da oração, da
caridade e da alegria
Em
mais de uma ocasião, São Paulo exorta os cristãos a revestirem-se da armadura
de Deus.
O
próprio Apóstolo exemplifica esse “revestimento" interior dos filhos de
Deus, quando ensina que – orando em todo tempo movidos pelo Espírito [xiii]
– têm de “armar-se" com o cinturão da verdade e a couraça da justiça, e
empunhar o escudo da fé e a espada do [xiv].
Quem
nasce de novo pelo Baptismo, tem de comportar-se com espírito de misericórdia,
de humildade, de [xv].
Tais
disposições e condutas permitiram aos primeiros cristãos transformar o mundo.
Nestes
começos do terceiro milénio, usando essas mesmas armas, a oração e a caridade,
temos de levar a cabo a nova evangelização.
Antes
de mais nada, com a oração. Perseverai na
oração [xvi].
Tudo quanto pedirdes com
fé na oração alcançá-lo-eis [xvii].
Se
não procurássemos a fortaleza e a eficácia na intimidade com Cristo no Pão e na
Palavra [xviii],
onde a encontraríamos?
São
Josemaria não se cansava de repetir que a arma do Opus Dei é a oração, e é essa
lição que aprendemos a praticar, também convertendo o trabalho em oração, que
temos de transmitir com paixão e dom de línguas em todos os ambientes.
A
oração é o fundamento e o ponto de partida de todo o apostolado.
Católico,
sem oração?...
É
como um soldado sem armas [xix].
Uma
nova evangelização, sem apoio firme e constante na oração? Uma utopia.
A
oração é a arma mais poderosa do cristão.
A
oração faz-nos eficazes.
A
oração faz-nos felizes.
A
oração dá-nos toda a força necessária para cumprir os mandatos de Deus [xx].
O
apostolado, seja ele qual for, consiste numa superabundância da vida interior,
e em consequência, se queremos ajudar os outros, se pretendemos sinceramente
animá-los a descobrir o autêntico sentido do seu destino na terra, é preciso que
nos fundamentemos na oração [xxi].
E,
junto com a oração, contamos com a arma da caridade, que é o sal do apostolado
dos cristãos [xxii].
Nisto conhecerão todos que
sois Meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros [xxiii].
Os
primeiros cristãos deslumbraram muitos dos seus concidadãos, atraindo-os para
Cristo e para a Igreja, com a finura da sua caridade. A Igreja foi enviada para
manifestar o amor de Deus e tem de realizar a sua actividade – também qualquer
acção apostólica pessoal ou colectiva dos cristãos e, mais em concreto, a nova
evangelização – sob o signo da caridade, com a força do amor.
«Hoje
como ontem, Ele envia-nos pelos caminhos do mundo para proclamar o Seu Evangelho
a todos os povos da terra [xxiv].
Com
o Seu amor, Jesus Cristo atrai para Si os homens de cada geração» [xxv].
Com
caridade, transmite-se a alegria, que é outro sinal de vida cristã autêntica:
Disse-vos isto para que a
Minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja completa [xxvi].
Com
efeito, onde está o Senhor goza-se de paz e de alegria, ainda que a alma esteja
em carne viva e rodeada de trevas [xxvii].
O
apostolado cristão pode ser chamado um apostolado do ser feliz e fazer felizes
os outros.
Já
naquelas primeiras comunidades cristãs, que gozavam da simpatia de todo o povo,
reinava essa alegria e simplicidade de coração [xxviii]
que sempre cativa.
E,
com a graça de Deus, muitos se incorporavam na Igreja.
Paulo
VI, na encíclica Evangelii nuntiandi,
falava da alegria de evangelizar e Bento XVI escreve sobre «uma nova
evangelização para redescobrir a alegria de crer e voltar a encontrar o
entusiasmo de comunicar a fé» pois «a fé, com efeito, cresce quando se vive
como experiência de um amor que se recebe e se comunica como experiência de
graça e gozo.
Torna-nos
fecundos, porque liga o coração à esperança e permite dar um testemunho
fecundo: com efeito, abre o coração e a mente dos que escutam para acolher o
convite do Senhor para aceitar a Sua Palavra, para ser Seus discípulos» [xxix].
Em todos os ambientes
Esta
nova evangelização deve ser realizada com o exemplo de caridade e alegria de
cristãos bem formados, capazes de projectar a luz de Cristo e o sentido do
homem.
Cristo,
morrendo na Cruz, atrai a Si a Criação inteira, e, em Seu nome, os cristãos,
trabalhando no meio do mundo, hão-de reconciliar todas as coisas com Deus,
colocando Cristo no cume de todas as actividades humanas [xxx].
O
cristão não está chamado a uma vida dupla: a vida interior, a vida de relação
com Deus, por um lado; e, por outro, diferente e separada, a vida familiar,
profissional e social, cheia de pequenas realidades terrenas (…); há uma única
vida, feita de carne e espírito, e essa é a que tem de ser – na alma e no corpo
– santa e cheia de Deus, deste Deus invisível, que encontramos nas coisas mais
visíveis materiais [xxxi].
Conseguir
iluminar todos os ambientes com a luz de Cristo é o grande encargo que temos
pela frente.
Assim,
todas as circunstâncias em que se desenvolve a nossa vida diária tomarão nova
força e sentido através do encontro com o Senhor.
Não
se trata de fazer nada especial, pois o apostolado não é algo diverso das
tarefas de todos os dias: confunde-se com esse mesmo trabalho, convertido em
ocasião de um encontro pessoal com Cristo [xxxii].
Como?
Com
naturalidade, com simplicidade, vivendo como viveis no meio do mundo, entregues
ao vosso trabalho profissional e aos cuidados da vossa família, participando em
todos o ideais nobres, respeitando a legítima liberdade de cada um.
Desde
há quase trinta anos, Deus pôs no meu coração o anseio de fazer compreender às pessoas
de qualquer estado, condição ou ofício, esta doutrina: a vida corrente pode ser
santa e cheia de Deus; o Senhor chama-nos a santificar o trabalho quotidiano,
porque aí está também a perfeição do cristão [xxxiii].
Ao
mesmo tempo, é evidente que há âmbitos nos quais é especialmente importante
fazer escutar a voz de Deus: a investigação e o ensino, a moralidade pública, a
instituição matrimonial e familiar, as novas tecnologias, etc.
Se
nos empenhamos, contribuiremos para promover uma nova cultura, uma nova
legislação, una nova moda que sejam coerentes com a dignidade do homem.
Actualmente
o mundo necessita que nós, os cristãos, sejamos mais audazes, mais coerentes,
mais vibrantes.
Através
da nossa amizade sincera e leal ajudaremos muitas pessoas a tomar consciência
da sua condição de filhos de Deus, chamados a identificar-se com Cristo.
Descobrir-lhes-emos
o horizonte da santidade pessoal, de modo que eles mesmos contribuirão com as
suas próprias vidas para o desenvolvimento da missão da Igreja, pois conhecer
Jesus (…) é compreendermos que a nossa vida não pode ter outro sentido senão o
de entregar-nos ao serviço dos outros [xxxiv].
Neste
Ano da fé, Santa Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, conceder-nos-á as graças de
que necessitamos para vivermos transbordantes de espírito apostólico e
mobilizar muitos para o serviço da nova evangelização.
j. yániz
(Revisão da versão portuguesa por ama)
[i] Bento XVI, Litt. apost. Porta fidei, 11-X-2011, n.
4.
[ii] São João Paulo II, Discurso à assembleia do CELAM,
9-3-1983.
[iii] São João Paulo II, Litt. enc. Redemptoris missio,
7-12-1990, n. 37.
[iv] Cfr. São João Paulo
II, Litt. enc. Redemptoris missio,
7-12-1990, n. 30.
[v] Jo 17, 18
[vi] D. Javier
Echevarría, Carta pastoral por ocasião do
Ano da fé, 29-XI-2012, n. 11, em «Romana. Boletim da Prelatura da Santa
Cruz e Opus Dei» 55 (2012/2), pp. 343-344.
[vii] Mc 16, 15.
[viii] Act 4, 20
[ix] Beato Paulo VI, Exhort. apost. Evangelii nuntiandi,
8-XII-1975, n. 19.
[x] D. Javier
Echevarría, Carta pastoral por ocasião do
Ano de fé, 29-XI-2012, n. 9, em «Romana. Boletim da Prelatura da Santa Cruz
e Opus Dei» 55 (2012/2), p. 342.
[xi] S. João Paulo II, Litt. enc. Redemptoris missio,
7-12-1990, n. 3.
[xii] cfr. Ef 6, 14-17.
[xiii] Ef 6, 18.
[xiv] 1 Cor 1, 30
[xv] Cfr. Col 3, 12-14.
[xvi] Col 4, 2
[xvii] Mt 21, 22.
[xviii] São Josemaria, Cristo que passa, n. 118.
[xix] São Josemaria, Sulco, n. 453.
[xx] São Josemaria, Forja, n. 439.
[xxi] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 239.
[xxii] Ibidem, n. 234.
[xxiii] Jo 13, 35.
[xxiv] cfr. Mt 28, 19
[xxv] Bento XVI, Litt. apost. Porta fidei, 11-X-2011, n.
7.
[xxvi] Jo 15, 11.
[xxvii] São Josemaria, Cristo que passa, n. 77.
[xxviii] Cfr. Act 2, 46.
[xxix] Bento XVI, Litt. apost. Porta fidei, 11-X-2011, n.
7.
[xxx] São Josemaria, Temas actuais do cristianismo, n. 114.
[xxxi] Ibid.
[xxxii] São Josemaria, Cristo que passa, n. 264.
[xxxiii] Ibidem, n.148.
[xxxiv] Ibidem, n. 145.
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