Art.
10 — Se a plenitude da graça é própria de Cristo.
O décimo discute-se assim. — Parece
que a plenitude da graça não é própria de Cristo.
1 — Pois, o próprio a alguém só a ele
convém. Ora, o Evangelho atribui a certos outros a plenitude da graça, assim
diz da Santa Virgem: Ave, cheia de graça. E o Apóstolo: - Estevão, cheio de
graça e fortaleza. Logo, a plenitude da graça não é própria de Cristo.
2. Demais. — O que pode ser comunicado
aos outros por Cristo não parece próprio de Cristo. Ora, a plenitude da graça
pode ser comunicada aos outros por Cristo, assim, diz o Apóstolo: Para que
sejamos cheios segundo toda plenitude de Deus. Logo, a plenitude da graça não é
própria de Cristo.
3. Demais. — O estado da via proporciona-se
ao estado da pátria. Ora, no estado da pátria haverá uma certa plenitude, pois,
na pátria celeste, onde há a plenitude de todos os bens, embora determinados
dons sejam aí concedidos a alguns de modo mais excelente, ninguém possuirá nada
como próprio, no dizer de Gregório. Logo, cada homem tem, enquanto viandante a
plenitude da graça. E portanto, a plenitude da graça não é própria de Cristo.
Mas, em contrário, a plenitude da
graça é atribuída a Cristo, pelo Evangelho, enquanto o Unigénito do Pai: Vimos
a sua glória, como do Filho Unigénito do Pai: cheio de graça e de verdade. Ora,
ser Unigénito do Pai é próprio de Cristo. Logo, também lhe é a plenitude da graça
da verdade.
A plenitude da graça pode
ser considerada a dupla luz. Em relação à própria graça e a quem a tem. — Em
relação à própria graça, dizemos que há a plenitude dela quando alguém lhe
chega ao sumo grau quanto à sua essência e à sua virtude, isto é, quando tem a
graça na máxima excelência em que pode ser tida e na máxima extensão quanto a
todos os seus efeitos. E tal plenitude da graça é própria, de Cristo. Quanto ao
sujeito, dizemos que há plenitude da graça, quando ele a tem plena, segundo a
sua condição. Quer quanto à intensidade, quando há nele a graça intensa até o
limite que Deus lhe prefixou, segundo a expressão do Apóstolo: A cada um de nós
foi dada a graça segundo a medida do dom de Cristo. Quer também segundo a
virtude, isto é, quando tem a faculdade da graça para tudo o que lhe concerne
ao dever ou ao estado, conforme o Apóstolo: A mim, que sou o mínimo de todos os
santos, me foi dada esta graça de manifestar a todos. E tal plenitude da graça
não é própria de Cristo, mas é por Cristo, comunicada aos outros.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO —
A Santa Virgem é chamada cheia de graça, não relativamente à graça em si mesma
pela não ter tido na suma excelência possível, nem em relação a todos os
efeitos da graça. Mas é chamada cheia de graça relativamente a si própria, isto
é, por ter tido a graça suficiente ao estado para o qual foi escolhida por
Deus, que era o de ser mãe de Deus. — E semelhantemente, Estevão foi chamado
cheio de graça, por a ter suficiente para ser idóneo ministro e testemunha de
Deus, para que foi escolhido. — E pela mesma razão devemos assim pensar dos
demais. Dessas plenitude porém uma é mais plena que outra, enquanto é um preordenado
por Deus para um mais elevado estado.
RESPOSTA À SEGUNDA. — O Apóstolo, no
lugar aduzido, refere-se àquela plenitude de graça recebida pelo sujeito,
relativamente ao que o homem foi divinamente preordenado. E isso é ou algo de
comum, para o que todos os santos são preordenados, ou algo de especial,
pertinente à excelência de alguns. E, assim sendo, há uma certa plenitude de
graça comum a todos os santos, isto é, o terem a graça suficiente para
merecerem a vida eterna, consistente na plena fruição de Deus. E essa plenitude
o Apóstolo deseja-a aos fiéis a quem escreve.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Esses dons
comuns à pátria, a saber, a visão, a compreensão e a fruição e outros
semelhantes, tem certos dons que lhes correspondem, enquanto dura esta vida, e
que são também comuns aos santos. Contudo, os santos têm certas prerrogativas,
tanto na pátria como na via, que os outros não têm.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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