Em seguida devemos tratar do pecado
venial em si mesmo. E nesta questão discutem-se seis artigos:
Art. 1 — Se o pecado venial causa
mácula na alma.
Art. 2 — Se os pecados veniais são
designados convenientemente pela madeira, pelo feno e pela palha.
Art. 3 — Se o homem, no estado de
inocência, podia pecar venialmente.
Art. 4 — Se um anjo bom ou mau pode
pecar venialmente.
Art. 5 — Se os primeiros movimentos da
sensualidade, nos infiéis, são pecados mortais.
Art. 6 — Se o pecado venial pode
coexistir numa pessoa só com o original.
Art.
1 — Se o pecado venial causa mácula na alma.
(III,
q. 87, a. 2, ad3; IV Sent., dist. XVI, q. 2, a. 1, qª 2, ad3; a. 2, qª 1, ad
1).
O primeiro discute-se assim. — Parece
que o pecado venial causa mácula na alma.
1. — Pois, diz Agostinho, que os
pecados veniais, quando multiplicados, exterminam de tal modo a nossa beleza,
que nos privam dos amplexos do esposo celeste. Ora, a mácula não é mais do que
um detrimento da beleza. Logo, os pecados veniais causam mácula na alma.
2. Demais. — O pecado mortal causa
mácula na alma pela desordem no acto e no afecto do pecador. Ora, o pecado
venial é uma desordem no acto e no afecto. Logo, causa mácula na alma.
3. Demais. — A mácula da alma é
causada pelo apegar-se a um objecto temporal, com amor, como se disse (q. 86,
a. 1). Ora, pelo pecado venial a alma apega-se com amor desordenado a um objecto
temporal. Logo, o pecado causa mácula na alma.
Mas, em contrário, diz a Escritura (Ef
5, 27): Para a apresentar a si mesmo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, i.
é, comenta a Glosa, sem qualquer pecado criminal. Logo, parece ser próprio do
pecado mortal o causar mácula na alma.
Como do sobredito se colhe
(q. 86, a. 1), a mácula implica detrimento na beleza, proveniente de algum
contacto. Vemos bem isso nas coisas corpóreas, por semelhança com as quais se
transferiu para a alma o nome de mácula. Ora, a beleza do corpo é dupla — a
proveniente da disposição intrínseca dos membros e da cor, e a do esplendor
externo que se lhe acrescenta. O mesmo se dá com a alma: uma é a sua beleza
habitual, quase intrínseca; outra, a actual, um quase fulgor externo. Ora, o
pecado venial macula certamente a beleza actual, mas não a habitual, por não
excluir nem diminuir o hábito da caridade e das outras virtudes, como a seguir
se dirá (IIa IIae q. 24, a. 10; q. 133, a. 1 ad 2), mas por só lhes impedir o acto.
E sendo a mácula algo de aderente ao ser maculado, conclui-se que ela implica
detrimento, antes da beleza habitual, que da actual. Donde, em sentido próprio,
o pecado venial não causa mácula na alma. E só em certo sentido se pode dizer
que a causa, por empanar o esplendor resultante dos actos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Agostinho refere-se ao caso de muitos pecados veniais levarem,
dispositivamente, ao mortal; pois em contrário, não poderiam impedir o amplexo
do esposo celeste.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A desordem do acto
pecaminoso mortal, corrompe o hábito da virtude; não porém a do pecado venial.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Pelo pecado
mortal a alma busca com amor e como fim um bem temporal. E por isto perde totalmente
o influxo do esplendor da graça, que desce sobre os unidos pela caridade, com
Deus, como fim último. Ora pelo pecado venial o homem não se une a nenhuma
criatura como ao fim último. Portanto, a comparação não colhe.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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