É
muito interessante a história de Bucéfalo, aquele cavalo que sou Alexandre
Magno era capaz de montar. Todos os que o tentavam eram incapazes de se
manterem na sua garupa para além de poucos segundos. O animal caracoleava,
encabritava-se, e depois atirava ao chão todos os seus ginetes.
Alexandre
soube observá-lo com atenção e em seguida descobriu o segredo daquele indómito
corcel. Então aproximou-se, agarrou as rédeas e pô-lo frente ao sol.
Acariciou-o, soltou o seu manto, e de um salto montou sobre ele e esporeou-o
com energia. Controlou as corcovas, sem deixar que se afastasse da direcção do
Sol, até que o animal se calmou e seguiu a sua marcha com passo lento e
tranquilo. Soaram os aplausos, e dizem os historiadores que ao vê-lo Filipe,
seu pai, vaticinou que o reino da Macedónia que ele possuía seria pequeno para
a glória a que o seu filho estava chamado.
Qual
era a aquele segredo que só Alexandre soube descobrir? Deu-se conta que aquele
animal se assustava com a sua própria sombra. Bastava não deixar que a visse,
aquele apontar os seus olhos para o sol, para que aquele atormentado cavalo se
esquecesse dos seus medos.
O
mundo está cheio de pessoas com as quais se passa algo parecido. Pessoas
aparentemente normais e desenvoltas, mas que escondem no seu interior toda uma
séria de medos e complexos que lhes encadeiam os fracassos e as mais
experiências que sofreram. Muitas das suas energias estão paralisadas por essa
valoração negativa que tem de si próprias. São reféns do seu próprio passado,
homens e mulheres cujos temores os impedem olhar decididamente o futuro, os
detêm para chegarem a ser o que estão chamados a ser.
Nunca
me agradou a ingenuidade e a veemência com que alguns falam da auto-estima. Mas
sim estou de acordo em que se trata de um problema crescente nos nossos dias.
Educar-se a si mesmo é algo parecido com educar a outro. Para educar a outro há
que exigir-lhe (se não, sairá um mimado insofrido), mas também há que tratá-lo
com afecto, há que vê-lo com bons olhos. Da mesma forma que, para educar-se a
si mesmo também há que exigir-se, mas ao mesmo tempo há que tratar-se a si
mesmo com afecto, e ver-se com bons olhos. Todavia, há demasiada gente que se
maltrata a si mesma, que recrimina áspera e reiteradamente os seus próprios
erros, que se julga a si mesma com demasiada dureza e se considera incapaz da
superar os seus erros e defeitos.
É
verdade que, os que não recordam os seus fracassos do passado, estão
predispostos a repeti-los. Mas há que saber fazê-lo com equilíbrio e sensatez.
Porque o fracasso pode ter um valor frutífero, tal como pode haver êxitos
estéreis. Um fracasso frutífero é o que conduz a novas percepções e ideias que
aumentam a experiência e o saber.
É
muito famosa aquela história de Thomas Watson, o legendário fundador da IBM,
que chamou ao seu gabinete um executivo da empresa que acabava de perder dez
milhões de dólares numa arriscada operação. O jovem estava muito assustado e
pensava que ia ser despedido de modo fulminante. Todavia, Watson disse-lhe:
"Acabamos de gastar dez milhões de dólares na sua formação, esperamos que
saiba aproveitá-los".
Não
se pode viver obcecado pelas sombras e assustando-se com elas. Fracassos todos
temos, todos os dias. O mal é quando se considera que o potro da sua vida é
impossível de dominar, quando arroja toalha em vez de se fixar em quais são as
verdadeiras causas dos seus cansaços e inibições. Se examinamos as coisas com
cuidado, talvez concluamos que, como Alexandre, temos de tomar as rédeas
daquela decisão e manter o olhar de voltado para o ideal que ilumina a nossa
vida.
(
alfonso alguilló, in FLUVIUM, 2008.10.23)
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