Tempo de Quaresma Semana IV |
Santo Isidoro - Doutor da Igreja
Evangelho:
Jo 7, 1-2. 10. 25-30
1
Depois disto, andava Jesus pela Galileia; não queria andar pela Judeia, visto
que os judeus O queriam matar. 2 Estava próxima a festa dos judeus chamada dos
Tabernáculos.
10 Mas, quando Seus
irmãos já tinham partido, então foi Ele também à festa, não publicamente, mas
como que em segredo.
25
Diziam então alguns de Jerusalém: «Não é Este Aquele que procuram matar? 26 Eis
que fala com toda a liberdade e não Lhe dizem nada. Terão os chefes do povo
verdadeiramente reconhecido que Este é o Messias? 27 Nós, porém, sabemos donde
Este é; e o Messias, quando vier, ninguém saberá donde Ele seja». 28 Jesus, que
ensinava no templo, exclamou: «Vós Me conheceis, e sabeis donde Eu sou. Eu não
vim de Mim mesmo, mas é verdadeiro Aquele que Me enviou, a Quem vós não
conheceis. 29 Mas Eu conheço-O, porque procedo d'Ele, e Ele Me enviou». 30
Procuraram então prendê-l'O; mas ninguém Lhe lançou as mãos, porque não tinha
ainda chegado a Sua hora.
Comentário:
Jesus Cristo ensina-nos que não
devemos correr riscos desnecessários mesmo que, como era o Seu caso, só pudesse
vir s ser preso quando Ele próprio o consentisse.
Não basta fiarmo-nos na fé e, muito
menos nas nossas forças, para evitar o mal – o maior mal é o pecado -, bem pelo
contrário, devemos convencer-nos que, nós, não podemos nada. Há que, isso sim,
pedir insistentemente a ajuda do Espírito Santo para que nos ilumine e ter a
coragem de fugir das ocasiões que, de uma forma ou outra, possam constituir perigo
para a nossa alma.
Pôr a nossa fortaleza à prova é
estultícia e, até, tentar a Deus.
(ama,
comentário sobre Jo 7, 1-2; 25-30, 2013.03.15)
DECLARAÇÃO
DIGNITATIS HUMANAE
SOBRE A LIBERDADE RELIGIOSA
(9 a 15)
O PROBLEMA DA LIBERDADE
RELIGIOSA NA ACTUALIDADE
II. A LIBERDADE RELIGIOSA
À LUZ DA REVELAÇÃO
A
liberdade religiosa tem as suas raízes na Revelação
9.
O que este Concilio Vaticano declara acerca do direito do homem à liberdade
religiosa funda-se na dignidade da pessoa, cujas exigências foram aparecendo
mais plenamente à razão humana com a experiência dos séculos. Mais ainda: esta
doutrina sobre a liberdade tem raízes na Revelação divina, e por isso tanto
mais fielmente deve ser respeitada pelos cristãos. Com efeito, embora a
Revelação não afirme expressamente o direito à imunidade de coacção externa em
matéria religiosa, no entanto ela manifesta em toda a sua amplidão a dignidade
da pessoa humana, mostra o respeito de Cristo pela liberdade do homem no
cumprimento do dever de crer na palavra de Deus, e ensinar-nos qual o espírito
que os discípulos de um tal mestre devem admitir e seguir em tudo. Todas estas
coisas iluminam os princípios gerais sobre que se funda a doutrina desta
Declaração acerca da liberdade religiosa. A liberdade religiosa na sociedade é
de modo especial plenamente consentânea com a liberdade do acto de fé cristã.
A
liberdade religiosa está de acordo com a doutrina teológica sobre a fé
10.
Um dos principais ensinamentos da doutrina católica, contido na palavra de Deus
e constantemente pregado pelos santos Padres
[1] é
aquele que diz que o homem deve responder voluntariamente a Deus com a fé, e
que, por isso, ninguém deve ser forçado a abraçar a fé contra vontade [2].
Com efeito, o acto de fé é, por sua própria natureza, voluntário, já que o
homem, remido por Cristo Salvador e chamado à adopção filial por Jesus Cristo [3],
não pode aderir a Deus que Se revela a não ser que, atraído pelo Pai [4],
preste ao Senhor o obséquio racional e livre da fé. Concorda portanto,
plenamente com a índole da fé que em matéria religiosa se exclua qualquer
espécie de coacção humana. E por isso o regime da liberdade religiosa contribui
muito para promover aquele estado de coisas em que os homens podem sem impedimento
ser convidados à fé cristã, abraçá-la livremente e confessá-la por obras em
toda a sua vida.
A
liberdade religiosa está de acordo com o comportamento de Cristo e dos
Apóstolos
11.
Deus chama realmente os homens a servi-lo em espírito e verdade; eles ficam,
por esse facto, moralmente obrigados, mas não coagidos. Pois Deus tem em conta
a dignidade da pessoa humana, criada por Ele mesmo, a qual deve guiar-se pelo
próprio juízo e agir como liberdade. Isto apareceu no mais alto grau em Jesus
Cristo, no qual Deus Se manifestou perfeitamente, e deu a conhecer os seus
desígnios. Com efeito, Cristo, nosso Mestre e Senhor [5],
manso e humilde de coração [6],
atraiu e convidou com muita paciência os seus discípulos [7].
Apoiou e confirmou, sem dúvida, com milagres, a sua pregação; mas para
despertar e confirmar a fé dos ouvintes, e não para exercer sobre eles qualquer
coacção [8].
Censurou, é verdade, a incredulidade dos ouvintes, mas reservando para Deus o
castigo, no dia juízo [9].
Ao enviar os Apóstolos pelo mundo, disse-lhes: «aquele que acreditar e for
baptizado, será salvo; quem não acreditar, será condenado» (Marc. 16,16). Mas
Ele próprio, sabendo que a cizânia tinha sido semeada juntamente com o trigo,
mandou deixar que ambos crescessem até à ceifa que terá lugar no fim dos tempos
[10].
Não querendo ser um Messias político e dominador pela força [11],
preferiu chamar-se Filho do homem, que veio «para servir e dar a sua vida para
redenção de muitos» (Marc. 10, 45). Apresentou-se como o perfeito Servo de Deus
[12],
que «não quebra a cana rachada, nem apaga a mecha fumegante» (Mt. 12, 20).
Reconheceu a autoridade civil e seus direitos, mandando dar o tributo a César,
mas lembrando claramente que se deviam observar os direitos superiores de Deus:
«dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus» (Mat. 22, 21).
Finalmente, realizando na cruz a obra da redenção, com a qual alcançava para os
homens a salvação e verdadeira liberdade, completou a sua revelação. Pois deu
testemunho da verdade [13],
mas não a quis impor pela força aos seus contraditores. O seu reino não se
defende pela violência [14]
mas implanta-se pelo testemunho e pela audição da verdade; e cresce pelo amor
com que Cristo, elevado na cruz, a Si atrai todos os homens [15].
Os
Apóstolos, ensinados pela palavra e exemplo de Cristo, seguiram o mesmo
caminho. Desde os começos da Igreja, os discípulos de Cristo esforçaram-se por
converter os homens a Cristo Senhor, não com a coacção ou com artifícios
indignos do Evangelho, mas primeiro que tudo com a força da palavra de Deus [16].
A todos anunciavam com fortaleza a vontade de Deus Salvador «o qual quer que
todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade» (1 Tim. 2, 4);
ao mesmo tempo, respeitavam os fracos, mesmo que estivessem no erro, mostrando
assim como «cada um de nós dará conta de si a Deus» (Rom. 14, 12) [17]
e, nessa medida, tem obrigação de obedecer à própria consciência. Como Cristo,
os Apóstolos sempre se dedicaram a dar testemunho da verdade de Deus, ousando
proclamar diante do povo e dos chefes «com desassombro, a palavra de Deus»
(Act. 4, 31) [18].
Pois acreditavam firmemente que o Evangelho é a força de Deus, para salvação de
todo o que acredita [19].
E assim é que, desprezando todas as «armas carnais» [20],
seguindo o exemplo de mansidão e humildade de Cristo, pregaram a palavra de
Deus [21]
com plena confiança na sua força para destruir os poderes opostos a Deus e para
trazer os homens à fé e obediência a Cristo [22].
Como o Mestre, também os Apóstolos reconheceram a legítima autoridade civil:
«Não há nenhum poder que não venha de Deus», ensina o Apóstolo, que depois
manda: «cada um se submeta às autoridades constituídas; ...quem resiste à
autoridade, rebela-se contra a ordem estabelecida por Deus» (Rom. 13, 1-2) [23].
Ao mesmo tempo, não temeram contradizer o poder público que se opunha à vontade
sagrada de Deus: «deve-se obedecer antes a Deus do que aos homens» (Act. 5, 29)
[24].
Inúmeros mártires e fiéis seguiram, no decorrer dos séculos e por toda a terra,
este mesmo caminho.
A
doutrina da Igreja fiel à de Cristo
12.
Por isso, a Igreja, fiel à verdade evangélica, segue o caminho de Cristo e dos
Apóstolos, quando reconhece e fomenta a liberdade religiosa como conforme à
dignidade humana e à revelação de Deus. Conservou e transmitiu, no decurso dos
tempos, esta doutrina, recebida do Mestre e dos Apóstolos. Ainda que na vida do
Povo de Deus, que peregrina no meio das vicissitudes da história humana, houve
por vezes modos de agir menos conformes e até contrários ao espírito
evangélico, a Igreja manteve sempre a doutrina de que ninguém deve ser coagido
a acreditar.
O
fermento evangélico trabalhou assim longamente o espírito dos homens e
contribuiu muito para que eles, com o decorrer do tempo, reconhecessem mais
plenamente a dignidade da sua pessoa e amadurecesse a convicção de que, em
matéria religiosa, esta devia ficar imune de qualquer coacção humana na vida
social.
A
liberdade da Igreja
13.
Entre as coisas que dizem respeito ao bem da Igreja, e mesmo ao bem da própria
sociedade terrena, coisas que sempre e em toda a parte se devem manter e
defender de qualquer atentado, sobressai particularmente que a Igreja goze de
toda a liberdade que o seu encargo de salvar os homens requer [25].
É uma liberdade sagrada com que o Filho de Deus dotou a Igreja, adquirida com o
seu próprio sangue. E é de tal modo própria da Igreja, que agem contra a
vontade de Deus quantos a impugnam. A liberdade da Igreja é um princípio
fundamental nas suas relações com os poderes públicos e toda a ordem civil.
Na
sociedade humana e perante qualquer poder público, a Igreja reivindica para si
a liberdade; pois ela é uma autoridade espiritual, fundada por Cristo Senhor, a
quem incumbe, por mandato divino, o dever de ir por todo o mundo pregar o
Evangelho a todas as criaturas [26].
A Igreja reivindica também a liberdade como sociedade que é formada por homens
que têm o direito de viver na sociedade civil segundo os princípios da fé
cristã [27].
E
se a liberdade religiosa está em vigor, não apenas proclamada de palavra ou sancionada
pelas leis, mas sinceramente praticada, então obtém a Igreja finalmente, de
direito e de facto, o condicionalismo estável para a necessária independência
no desempenho da sua missão divina, independência que as autoridades
eclesiásticas com insistência crescente reivindicaram na sociedade civil [28].
Por sua vez, os cristãos têm, como os demais homens, o direito civil de não
serem impedidos de viver segundo a própria consciência. Existe, portanto,
harmonia entre a liberdade da Igreja e aquela liberdade religiosa que a todos
os homens e comunidades se deve reconhecer como direito e sancionar
juridicamente.
Obrigação
da Igreja e dos cristãos de difundir a mensagem de Cristo
14.
Para obedecer ao mandato divino «ensinai todas as gentes» (Mt. 28, 19), deve a
Igreja Católica trabalhar com muita diligência «para que a palavra de Deus se
propague rapidamente e seja glorificada» (2 Tess. 3, 1).
A
Igreja pede, por isso, com instância que, antes de mais, os seus filhos façam
«preces, orações, súplicas, acções de graças por todos os homens... Pois é uma
coisa boa e agradável a Deus nosso Salvador, que quer que todos os homens sejam
salvos e cheguem ao conhecimento da verdade» (1 Tim. 2, 1-4).
Os
fiéis, por sua vez, para formarem a sua própria consciência, devem atender
diligentemente à doutrina sagrada e certa da Igreja [29].
Pois, por vontade de Cristo, a Igreja Católica é mestra da verdade, e tem por
encargo dar a conhecer e ensinar autenticamente a Verdade que é Cristo, e ao
mesmo tempo declara e confirma, com a sua autoridade, os princípios de ordem
moral que dimanam da natureza humana. Além disso, os cristãos, procedendo
cordatamente com aqueles que estão fora da Igreja, procurem «no Espírito Santo,
com uma caridade não fingida e com a palavra da verdade» (2 Cor. 6, 6-7),
difundir com desassombro [30]
e fortaleza apostólica a luz da vida, até à efusão do sangue.
Com
efeito, o discípulo tem para com Cristo seu mestre o grave dever de conhecer
cada vez mais plenamente a verdade d'Ele recebida, de a anunciar fielmente e
defender corajosamente postos de parte os meios contrários ao espírito
evangélico. Ao mesmo tempo, o amor de Cristo incita-o a agir com amor,
prudência e paciência para com os homens que se encontram no erro ou na
ignorância relativamente à fé [31].
Deve-se, pois, atender quer aos deveres para com Cristo, Verbo vivificador, o
qual deve ser anunciado, quer aos direitos da pessoa humana, quer à medida da
graça que Deus, por meio de Cristo, concedeu ao homem, convidado a receber e a
professar livremente a fé.
Exortação
e votos do Concílio
15.
É, pois, manifesto que os homens de hoje desejam poder professar livremente a
religião, em particular e em público; mais ainda, a liberdade religiosa é
declarada direito civil na maior parte das Constituições, e solenemente
reconhecida em documentos internacionais [32].
Mas
não faltam regimes nos quais, embora a liberdade de culto religioso seja
reconhecida na Constituição, no entanto os poderes públicos esforçam-se por
afastar os cidadãos de professarem a religião e por tornar muito difícil e
perigosa a vida às comunidades religiosas.
Saudando
alegremente aqueles propícios sinais do nosso tempo, e denunciando com dor
estes factos deploráveis, o sagrado Concílio exorta os católicos e pede a todos
os homens que considerem com muita atenção quão necessária é a liberdade
religiosa, sobretudo nas actuais circunstâncias da família humana.
Pois
é patente que todos os povos se unem cada vez mais, que os homens de diferentes
culturas e religiões estabelecem entre si relações mais estreitas, que,
finalmente, aumenta a consciência da responsabilidade própria de cada um. Por
isso, para que se estabeleçam e consolidem as relações pacíficas e a concórdia
no género humano, é necessário que em toda a parte a liberdade religiosa tenha
uma eficaz tutela jurídica e que se respeitem os supremos deveres e direitos
dos homens de praticarem livremente a religião na sociedade.
Queira
Deus, Pai de todos os homens, que a família humana, beneficiando da salvaguarda
da liberdade religiosa na sociedade, seja conduzida pela graça de Cristo e pela
força do Espírito Santo à sublime e perene «liberdade da glória dos Filhos de
Deus». (Rom. 8, 21).
7 de Dezembro de 1965.
PAPA PAULO VI
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
[1] Cfr. Ef. 2, 14-16.
[2] Cfr. Lc. 19,44.
[3] Cfr. Rom. 11,28.
[4] Cfr. Rom. 11, 28-29;
Cfr. Conc. Vat. II, Const. dogm. De Ecclesia., Lumen gentium: AAS 57, (1965),
p. 20.
[5] Cfr. Is. 66,23; Salm.
65,4; Rom. 11, 11-32.
[6] Cfr. Jo. 19,6.
[7] Cfr. Rom. 12,18.
[8] Cfr. Mt. 5,45
[9] Cfr. Mat. 11, 20-24;
Rom. 12, 19-24; 2 Tes. 1, 8.
[10] Cfr. Mat. 13,30 e
40-42.
[11] Cfr.
Mat. 11, 8-10; Jo. 6,15.
[12] Cfr. Is. 42, 1-4.
[13] Cfr. Jo. 18.37.
[14] Cfr. Mat. 26, 51-53;
Jo. 18,36.
[15] Cfr. Jo. 12,32.
[16] Cfr. 1 Cor. 2, 3-5;
1 Tes. 2, 3-5.
[17] Cfr. Rom. 14, 1-23;
1 Cor. 8, 9-13; 10, 23-33.
[18] Cfr. Ef. 6, 19-20.
[19] Cfr. Rom. 1,16.
[20] Cfr. 2 Cor. 10,4; 1
Tes., 5, 8-9.
[21] Cfr. Ef. 6, 11-17.
[22] Cfr. 2 Cor. 10, 3-5.
[23] Cfr. 1 Ped. 2,
13-17.
[24] Cfr. Act. 4, 19-20.
[25] Cfr. Leão XIII,
Carta Officio sanctissimo, 22 dez. 1887: ASS 20, (1887), 269; Id. Carta Ex
litteris, 7 abril 1887: ASS 19 (1887) 465.
[26] Cfr. Mc. 16,15; Mt.
28, 18-20; Pio XII, Carta enc. Summi Pontificatus, 20 out. 1939: AAS 31 (1939),
445-446.
[27] Cfr. XI, Carta
Firmissimam constantiam, 28 março 1937: 1937: AAS 29 (1937), 196.
[28] Cfr. Pio XII,
Alocução Ci riesce, 6 dez. 1953: AAS 45 (1953), 802.
[29] Cfr. Pio XII,
Radiomensagem, 23 março 1952: AAS 44 (1952), 270-278.
[30] Cfr. Act. 4,29.
[31] Cfr. João XXIII,
Encíclica Pacem in terris, 11 abril 1963: AAS 55 (1963), 299-300.
[32] Cfr. João XXIII,
Encíclica Pacem in terris, 11 abril 1963: AAS 55 (1963), 295-296.
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