Tempo de Quaresma Semana IV |
31 «Se dou
testemunho de Mim mesmo, o Meu testemunho não é verdadeiro. 32 Outro é o que dá
testemunho de Mim; e sei que é verdadeiro o testemunho que dá de Mim. 33 Vós
enviastes mensageiros a João e ele deu testemunho da verdade. 34 Eu, porém, não
recebo o testemunho dum homem, mas digo-vos estas coisas a fim de que sejais
salvos. 35 João era uma lâmpada ardente e luminosa. E vós, por uns momentos,
quisestes alegrar-vos com a sua luz. 36 «Mas tenho um testemunho maior que o de
João: as obras que o Pai Me deu que cumprisse, estas mesmas obras que Eu faço
dão testemunho de Mim, de que o Pai Me enviou. 37 E o Pai que Me enviou, Esse
mesmo deu testemunho de Mim. Vós nunca ouvistes a Sua voz nem vistes a Sua face
38 e não tendes em vós, de modo permanente, a Sua palavra, porque não
acreditais n'Aquele que Ele enviou. 39 «Examinai as Escrituras, visto que
julgais ter nelas a vida eterna: elas são as que dão testemunho de Mim. 40 E
não quereis vir a Mim, para terdes vida. 41 A glória, não a recebo dos homens,
42 mas sei que não tendes em vós o amor de Deus. 43 Vim em nome de Meu Pai e
vós não Me recebeis; se vier outro em seu próprio nome, recebê-lo-eis. 44 Como
podeis crer, vós que recebeis a glória uns dos outros e não buscais a glória
que só de Deus vem? 45 Não julgueis que sou Eu que vos hei-de acusar diante do
Pai; Moisés, em quem confiais, é que vos acusará. 46 Se acreditásseis em
Moisés, certamente acreditaríeis também em Mim, porque ele escreveu de Mim. 47
Porém, se não dais crédito aos seus escritos, como haveis de dar crédito às
Minhas palavras?».
Comentário:
As
palavras de Jesus Cristo dirige aos fariseus são, indiscutivelmente duras e não
deixam lugar a qualquer dúvida sobre o que o Senhor pensava deles.
Há
como que uma “cegueira” fruto da má-fé e de preconceitos deformados. Isto
acontece quando se procura nas Escrituras – no Antigo como no Novo Testamento –
o que nos interessa para justificar as nossas necessidades de acreditar. Mesmo
que, como a maior parte das vezes acontece, se usem ou utilizem termos e
sentenças fora do contexto para tingir esse fim.
Mas,
o pior, é que este “cegos” – que nos dias de hoje proliferam por todo o lado –
se arvoram em guias de outros, normalmente pobres criaturas sem uma visão clara
da vida e, sobretudo, da vida como filhos de Deus.
A
ignorância é um mal terrível que esses “guias de cegos” exploram de forma
despudorada para conseguirem os seus fins.
(ama, comentário sobre Jo 5, 31-47,
2014.01.24)
DECLARAÇÃO
DIGNITATIS HUMANAE
SOBRE A LIBERDADE RELIGIOSA
(1
a 8)
O PROBLEMA DA LIBERDADE
RELIGIOSA NA ACTUALIDADE
1.
Os homens de hoje tornam-se cada vez mais conscientes da dignidade da pessoa
humana e [1],
cada vez em maior número, reivindicam a capacidade de agir segundo a própria
convicção e com liberdade responsável, não forçados por coacção mas levados
pela consciência do dever. Requerem também que o poder público seja delimitado
juridicamente, a fim de que a honesta liberdade das pessoas e das associações
não seja restringida mais do que é devido. Esta exigência de liberdade na
sociedade humana diz respeito principalmente ao que é próprio do espírito, e,
antes de mais, ao que se refere ao livre exercício da religião na sociedade.
Considerando atentamente estas aspirações, e propondo-se declarar quanto são
conformes à verdade e à justiça, este Concílio Vaticano investiga a sagrada
tradição e doutrina da Igreja, das quais tira novos ensinamentos, sempre
concordantes com os antigos.
Em
primeiro lugar, pois, afirma o sagrado Concílio que o próprio Deus deu a
conhecer ao género humano o caminho pelo qual, servindo-O, os homens se podem
salvar e alcançar a felicidade em Cristo. Acreditamos que esta única religião
verdadeira se encontra na Igreja católica e apostólica, à qual o Senhor Jesus
confiou o encargo de a levar a todos os homens, dizendo aos Apóstolos: «Ide,
pois, fazer discípulos de todas as nações, baptizando os em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos prescrevi»
(Mt. 28, 19-20). Por sua parte, todos os homens têm o dever de buscar a
verdade, sobretudo no que diz respeito a Deus e à sua Igreja e, uma vez
conhecida, de a abraçar e guardar.
O
sagrado Concílio declara igualmente que tais deveres atingem e obrigam a
consciência humana e que a verdade não se impõe de outro modo senão pela sua
própria forca, que penetra nos espíritos de modo ao mesmo tempo suave e forte.
Ora, visto que a liberdade religiosa, que os homens exigem no exercício do seu
dever de prestar culto a Deus, diz respeito à imunidade de coacção na sociedade
civil, em nada afecta a doutrina católica tradicional acerca do dever moral que
os homens e as sociedades têm para com a verdadeira religião e a única Igreja
de Cristo. Além disso, ao tratar desta liberdade religiosa, o sagrado Concílio
tem a intenção de desenvolver a doutrina dos últimos Sumos Pontífices acerca
dos direitos invioláveis da pessoa humana e da ordem jurídica da sociedade.
I
DOUTRINA GERAL ACERCA DA
LIBERDADE RELIGIOSA
Sujeito, objecto e
fundamento da liberdade religiosa
2.
Este Concílio Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade
religiosa. Esta liberdade consiste no seguinte: todos os homens devem estar
livres de coacção, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou
qualquer autoridade humana; e de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém
seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido de proceder
segundo a mesma, em privado e em público, só ou associado com outros, dentro
dos devidos limites. Declara, além disso, que o direito à liberdade religiosa
se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana, como a palavra
revelada de Deus e a própria razão a dão a conhecer [2].
Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa na ordem jurídica da
sociedade deve ser de tal modo reconhecido que se torne um direito civil.
De
harmonia com própria dignidade, todos os homens, que são pessoas dotadas de
razão e de vontade livre e por isso mesmo com responsabilidade pessoal, são
levados pela própria natureza e também moralmente a procurar a verdade, antes
de mais a que diz respeito à religião. Têm também a obrigação de aderir à
verdade conhecida e de ordenar toda a sua vida segundo as suas exigências. Ora,
os homens não podem satisfazer a esta obrigação de modo conforme com a própria
natureza, a não ser que gozem ao mesmo tempo de liberdade psicológica e
imunidade de coacção externa. O direito à liberdade religiosa não se funda,
pois, na disposição subjectiva da pessoa, mas na sua própria natureza. Por esta
razão, o direito a esta imunidade permanece ainda naqueles que não satisfazem à
obrigação de buscar e aderir à verdade; e, desde que se guarde a justa ordem
pública, o seu exercício não pode ser impedido.
A liberdade religiosa da
pessoa e a vinculação do homem a Deus
3.
Tudo isto aparece ainda mais claramente quando se considera que a suprema norma
da vida humana é a própria lei divina, objectiva e universal, com a qual Deus,
no desígnio da sua sabedoria e amor, ordena, dirige e governa o universo
inteiro e os caminhos da comunidade humana. Desta sua lei, Deus torna o homem
participante, de modo que este, segundo a suave disposição da divina
providência, possa conhecer cada vez mais a verdade imutável [3].
Por isso, cada um tem o dever e consequentemente o direito de procurar a
verdade em matéria religiosa, de modo a formar, prudentemente, usando de meios
apropriados, juízos de consciência rectos e verdadeiros.
Mas
a verdade deve ser procurada pelo modo que convém à dignidade da pessoa humana
e da sua natureza social, isto é, por meio de uma busca livre, com a ajuda do
magistério ou ensino, da comunicação e do diálogo, com os quais os homens dão a
conhecer uns aos outros a verdade que encontraram ou julgam ter encontrado, a
fim de se ajudarem mutuamente na inquirição da verdade; uma vez conhecida esta,
deve-se aderir a ela com um firme assentimento pessoal.
O
homem ouve e reconhece os ditames da lei divina por meio da consciência, que
ele deve seguir fielmente em toda a sua actividade, para chegar ao seu fim, que
é Deus. Não deve, portanto, ser forçado a agir contra a própria consciência.
Nem deve também ser impedido de actuar segundo ela, sobretudo em matéria
religiosa. Com efeito, o exercício da religião, pela natureza desta, consiste
primeiro que tudo em actos internos voluntários e livres, pelos quais o homem
se ordena directamente para Deus; e tais actos não podem ser nem impostos nem
impedidos por uma autoridade meramente humana [4].
Por sua vez, a própria natureza social do homem exige que este exprima
externamente os actos religiosos interiores, entre em comunicação com os demais
em assuntos religiosos e professe de modo comunitário a própria religião.
É,
portanto, uma injustiça contra a pessoa humana e contra a própria ordem
estabelecida por Deus, negar ao homem o livre exercício da religião na
sociedade, uma vez salvaguardada a justa ordem pública.
Além
disso, os actos religiosos, pelos quais os homens, privada e publicamente, se
orientam para Deus segundo própria convicção, transcendem por sua natureza a
ordem terrena e temporal. Por este motivo, a autoridade civil, que tem como fim
próprio olhar pelo bem comum temporal, deve, sim, reconhecer e favorecer a vida
religiosa dos cidadãos, mas excede os seus limites quando presume dirigir ou
impedir os actos religiosos.
A liberdade religiosa das
comunidades religiosas
4.
A liberdade ou imunidade de coacção em matéria religiosa, que compete às
pessoas tomadas individualmente, também lhes deve ser reconhecida quando actuam
em conjunto. Com efeito, as comunidades religiosas são exigidas pela natureza
social tanto do homem como da própria religião.
Por
conseguinte, desde que não se violem as justas exigências da ordem pública,
deve-se em justiça a tais comunidades a imunidade que lhes permita regerem-se
segundo as suas próprias normas, prestarem culto público ao Ser supremo,
ajudarem os seus membros no exercício da vida religiosa e sustentarem-nos com o
ensino e promoverem, enfim, instituições em que os membros cooperem na
orientação da própria vida segundo os seus princípios religiosos.
Também
compete às comunidades religiosas o direito de não serem impedidas por meios
legais ou pela acção administrativa do poder civil, de escolher, formar, nomear
e transferir os próprios ministros, de comunicar com as autoridades e
comunidades religiosas de outras partes da terra, de construir edifícios
religiosos e de adquirir e usar os bens convenientes.
Os
grupos religiosos têm ainda o direito de não serem impedidos de ensinar e
testemunhar publicamente, por palavra e por escrito a sua fé. Porém, na difusão
da fé religiosa e na introdução de novas práticas, deve sempre evitar-se todo o
modo de agir que tenha visos de coacção, persuasão desonesta ou simplesmente
menos leal, sobretudo quando se trata de gente rude ou sem recursos. Tal modo de
agir deve ser considerado como um abuso do próprio direito e lesão do direito
alheio.
Também
pertence à liberdade religiosa que os diferentes grupos religiosos não sejam
impedidos de dar a conhecer livremente a eficácia especial da própria doutrina
para ordenar a sociedade e vivificar toda a actividade humana. Finalmente, na
natureza social do homem e na própria índole da religião se funda o direito que
os homens têm de, levados pelas suas convicções religiosas, se reunirem
livremente ou estabelecerem associações educativas, culturais, caritativas e
sociais.
A liberdade religiosa da
família
5.
A cada família, pelo facto de ser uma sociedade de direito próprio e
primordial, compete o direito de organizar livremente a própria vida religiosa,
sob a orientação dos pais. A estes cabe o direito de determinar o método de
formação religiosa a dar aos filhos, segundo as próprias convicções religiosas.
E, assim, a autoridade civil deve reconhecer aos pais o direito de escolher com
verdadeira liberdade as escolas e outros meio de educação; nem, como
consequência desta escolha, se lhes devem impor directa ou indirectamente,
injustos encargos. Além disso, violam-se os direitos dos pais quando os filhos
são obrigados a frequentar aulas que não correspondem às convicções religiosas
dos pais, ou quando se impõe um tipo único de educação, do qual se exclui
totalmente a formação religiosa.
Promoção da liberdade
religiosa
6.
Dado que o bem comum da sociedade - ou seja, o conjunto das condições que
possibilitam aos homens alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição -
consiste sobretudo na salvaguarda dos direitos e deveres da pessoa humana [5],
o cuidado pela liberdade religiosa incumbe tanto aos cidadãos como aos grupos
sociais, aos poderes civis, à Igreja e às outras comunidades religiosas,
segundo o modo próprio de cada uma, e de acordo com as suas obrigações para com
o bem comum.
Pertence
essencialmente a qualquer autoridade civil tutelar e promover os direitos
humanos invioláveis [6].
Deve, por isso, o poder civil assegurar eficazmente, por meio de leis justas e
outros meios convenientes, a tutela da liberdade religiosa de todos os
cidadãos, e proporcionar condições favoráveis ao desenvolvimento da vida
religiosa, de modo que os cidadãos possam realmente exercitar os seus direitos
e cumprir os seus deveres, e a própria sociedade beneficie dos bens da justiça
e da paz que derivam da fidelidade dos homens a Deus e à Sua santa vontade [7].
Se,
em razão das circunstâncias particulares dos diferentes povos, se atribui a
determinado grupo religioso um reconhecimento civil especial na ordem jurídica,
é necessário que, ao mesmo tempo, se reconheça e assegure a todos os cidadãos e
comunidades religiosas o direito à liberdade em matéria religiosa.
Finalmente,
a autoridade civil deve tomar providências para que a igualdade jurídica dos
cidadãos - a qual também pertence ao bem comum da sociedade nunca seja lesada,
clara ou larvadamente, por motivos religiosos, nem entre eles se faça qualquer
discriminação.
Daqui
se conclui que não e lícito ao poder público impor aos cidadãos, por força,
medo ou qualquer outro meio, que professem ou rejeitem determinada religião, ou
impedir alguém de entrar numa comunidade religiosa ou dela sair. Muito mais é
contra a vontade de Deus e os sagrados direitos da pessoa e da humanidade
recorrer por qualquer modo à força para destruir ou dificultar a religião, quer
em toda a terra quer em alguma região ou grupo determinado.
Os limites da liberdade
religiosa
7.
É no seio da sociedade humana que se exerce o direito à liberdade em matéria
religiosa; por isso, este exercício está sujeito a certas normas reguladoras.
No
uso de qualquer liberdade deve respeitar-se o princípio moral da
responsabilidade pessoal e social: cada homem e cada grupo social estão moralmente
obrigados, no exercício dos próprios direitos, a ter em conta os direitos
alheios e os seus próprios deveres para com os outros e o bem comum. Com todos
se deve proceder com justiça e bondade.
Além
disso, uma vez que a sociedade civil tem o direito de se proteger contra os
abusos que, sob pretexto de liberdade religiosa, se poderiam verificar, é
sobretudo ao poder civil que pertence assegurar esta protecção. Isto, porém,
não se deve fazer de modo arbitrário, ou favorecendo injustamente uma parte;
mas segundo as normas jurídicas, conformes à ordem objectiva, postuladas pela
tutela eficaz dos direitos de todos os cidadãos e sua pacífica harmonia, pelo
suficiente cuidado da honesta paz pública que consiste na ordenada convivência
sobre a base duma verdadeira justiça, e ainda pela guarda que se deve ter da
moralidade pública. Todas estas coisas são parte fundamental do bem comum e
pertencem à ordem pública. De resto, deve manter-se o princípio de assegurar a
liberdade integral na sociedade, segundo o qual se há-de reconhecer ao homem o
maior grau possível de liberdade, só restringindo esta quando e na medida em
que for necessário.
A educação para o
exercício da liberdade religiosa
8.
Os homens de hoje estão sujeitos a pressões de toda a ordem e correm o perigo
de se verem privados da própria liberdade. Por outro lado, não poucos
mostram-se inclinados a rejeitar, sob pretexto de liberdade, toda e qualquer
sujeição, ou a fazer pouco caso da devida obediência
Pelo
que este Concílio Vaticano exorta a todos, mas sobretudo aos que têm a seu
cargo educar outros, a que se esforcem por formar homens que, fiéis à ordem
moral, obedeçam à autoridade legítima e amem a autêntica liberdade; isto é,
homens que julguem as coisas por si mesmos e à luz da verdade, procedam com
sentido de responsabilidade, e aspirem a tudo o que é verdadeiro e justo,
sempre prontos para colaborar com os demais. A liberdade religiosa deve,
portanto, também servir e orientar-se para que os homens procedam
responsavelmente no desempenho dos seus deveres na vida social.
Nota:
Revisão versão portuguesa por ama.
[1] Cfr. Act. 17,26.
[2] Cfr. Sab. 8,1; Act.
14,17; Rom. 2, 6-7;1 Tim. 2,4.
[3] Cfr. Apoc. 21, 23-24
[4] Cfr. 2 Cor. 5, 18-19.
[5] Cfr. S. Gregório
VII, Carta III, 21 a Anazir (Al-Názir), Rei da Mauritânia: ed. E. Gaspar, em
MGH, Ep. sel. II, 1820, I; p. 288, 11-15; PL 148, 451 A.
[6] Cfr. Gál. 3,7.
[7] Cfr. Rom. 11, 17-24.
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