12/02/2014

Tratado dos vícios e pecados 09


Questão 72: Da distinção entre os pecados

Art. 3 ― Se os pecados se distinguem especificamente pelas suas causas.






O terceiro discute-se assim. ― Parece que os pecados se distinguem especificamente pelas suas causas.

1. ― Pois, as coisas especificam-se pelo mesmo princípio donde tiram o ser. Ora, os pecados recebem este das suas causas. Logo, também por elas se especificam, e portanto, diferem especificamente pela diversidade das causas.

2. Demais. ― Entre todas as causas, a material é a menos atinente à espécie. Ora, o objecto é como a causa material do pecado. Se portanto os pecados se especificam pelos seus objectos, resulta, que se especificam muito mais pelas outras causas.

3. Demais. ― Agostinho 1, comentando o salmo ― Ela foi queimada a fogo e escavada ―diz, que todo pecado provém do temor mau que humilha ou do amor que inflama para o mal. Pois, como diz a Escritura (1 Jo 2, 16), tudo o que há no mundo ou é concupiscência da carne, ou é concupiscência dos olhos, ou, soberba da vida. E quando se diz que alguma coisa existe no mundo por causa do pecado, entende-se, pela palavra mundo, os amantes dele, como interpreta Agostinho 2. Por seu lado, Gregório também distingue todos os pecados segundo os sete vícios capitais 3. Ora, todas estas divisões visam as causas dos pecados. Logo, conclui-se que eles diferem especificamente segundo a diversidade das causas.

Mas, em contrário, se assim fosse, todos os pecados seriam da mesma espécie, como procedentes da mesma causa, conforme diz a Escritura (Ecle 10, 15): o princípio de todo pecado é a soberba, e (1 Tm): e raiz de todos os males é a avareza. Ora, como é manifesto, há diversas espécies de pecados. Logo, não se distinguem especificamente pelas diversidades das causas.

Sendo quatro os géneros de causas, elas atribuem-se diversamente a coisas diversas. Assim, a causa formal e a material visam propriamente a substância da coisa, e portanto, pela forma e pela matéria, as substâncias distinguem-se específica e genericamente. Por outro lado, o agente e o fim visam directamente o movimento e a operação, e portanto, os movimentos e as operações distinguem-se especificamente por essas causas. Mas, de maneira diversa. ― Pois, os princípios activos naturais são determinados sempre aos mesmos actos. Por onde, as diversas espécies dos actos naturais se fundam, não só nos objectos, que são os fins ou termos, mas também nos princípios activos, assim, aquecer e esfriar distinguem-se especificamente pelo calor e pelo frio. ― Os princípios activos, dos actos voluntários, porém e tais são os dos pecados, não se realizam necessariamente em relação a um só termo. E portanto, de um mesmo princípio activo ou motivo podem provir diversas espécies de pecados. Assim, o mau temor que humilha pode levar-nos ao roubo, ao assassinato ou ao abandono da grei que nos foi cometida, e tudo isto também pode provir do amor. Donde, é manifesto que os pecados não diferem especificamente pelas diversas causas activas ou motivas, mas só pela diversidade da causa final. Ora, o fim é o objecto da vontade, pois, como já demonstramos (q. 1, a. 3; q. 18, a. 6), os actos humanos especificam-se pelo seu fim.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― O princípio activo dos actos voluntários, não sendo estes determinados a um só termo, não basta a produzir os actos humanos, se a vontade não for determinada a um objecto pela intenção do fim, como claramente o diz o Filósofo 4. Logo, o fim dá a plenitude ao ser e a espécie ao pecado.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Os objectos, comparados aos actos exteriores, exercem a função de matéria sobre o qual versam. Mas comparados ao acto interior da vontade, exercem a função de fins, e por isso especificam o acto. Embora também, enquanto são matéria sobre que eles recaem, exercem o papel de termos, que especificam os movimentos, como diz Aristóteles 5. Contudo também os termos do movimento o especificam, enquanto exercem a função de fim.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― As referidas divisões dos pecados não foram feitas para distinguir as espécies deles, mas para lhes manifestar as causas diversas.

Revisão da tradução portuguesa por ama

­­­­­­_______________________________________
Notas:
1. Super Psalm LXXIX (17).
2. Super Ioan. (tract. II).
3. XXXI Moral. (c. XLV).
4. IX Metaph. (lect. IV).
5. V Physic. (lect. I), X Ethic. (lect. V).




Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.